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Discussão teórica sobre a construção
da imagem corporal da pessoa cega

Discusión teórica sobre la construcción de la imagen corporal de la persona ciega

Theoretical discussion on the construction of body image blind person

 

*Mestranda em Ciências da Atividade Física da Universidade de São Paulo

**Professor Livre Docente da Universidade de São Paulo. Professor do Programa

de Pós-graduação em Mudança Social e Participação Política (USP)

Professor do Programa de Pós-graduação de Ciências da Atividade Física (USP)

(Brasil)

Luzia Mêire Ferreira Rall*

luzia.rall@usp.br

Prof. Dr. Marco Antonio Bettine de Almeida**

marcobettine@gmail.com

 

 

 

 

Resumo

          A corporeidade e suas derivações de um adulto vidente são construídas ao longo de sua vida, por meio de suas experiências, percepções e relações sociais, comparando-se com o outro e formando sua identidade. Portanto, elas não são estáticas e estão em constantes transformações, recebendo influência da sociedade e da mídia, mas também influenciando os outros ao seu redor. Sabendo-se que a deficiência visual modifica as vivências experimentadas pelo corpo, esse artigo tem como proposta trazer para a discussão alguns elementos que possam favorecer a construção da representação mental do corpo da pessoa cega e de como o cego tomaria a consciência do seu corpo. O trabalho busca também contribuir para atuação dos profissionais que lidam com pessoas com deficiências visuais nas áreas da educação e saúde, dando subsídios que auxiliem nos planejamentos para um suporte social e emocional mais adequado.

          Unitermos: Imagem corporal. Deficiência. Cego.

 

Abstract

          The corporeity and its derivations of an adult seer are built throughout his life, through his experiences, perceptions and social relations, comparing with each other and forming his identity. Therefore, they are not static and are in constant transformation, receiving influence of society and the media, but also influencing others around you. Knowing that visual impairment modifies the experiences felt by the body, this article aims to bring to the discussion some elements that may favor the construction of the mental representation of the body of the blind person and as the blind would take the awareness of your body. The work also search to contribute with professionals who deal with people with visual impairments in the areas of education and health, providing subsidies to assist in planning for a better social and emotional support.

          Keywords: Body image. Disability. Blind.

 

Recepção: 29/04/2015 - Aceitação: 27/05/2015

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 20 - Nº 205 - Junio de 2015. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

Corporeidade e Imagem Corporal

    Corporeidade é definida por Gutierrez, Almeida e Marques (2011) como elemento comum a todos os sujeitos sociais e trabalhada de forma homogênea, seguindo os apontamentos de Habermas. Dentro de uma condição específica de corporeidade, novos elementos modificam a comunicação, alterando os objetivos sociais e psicológicos.

    Para a psicanálise, a corporeidade e subjetividade se mantêm numa relação indissociável com o corpo humano. Ele usa símbolos a partir de representações vindas das experiências adquiridas (Grandino, 2009). Ainda de acordo com Simões e Piccolo (2012, p. 19) “a corporeidade é um corpo engendrando vida, experienciando, vivenciando, na perspectiva humana, a caminhada em direção ao mundo”.

    A definição de Imagem Corporal deve ser precedida do significado de cada palavra separadamente. Assim, Imagem nos remete a uma representação mental ou imagem mental, na qual são incorporados aos objetos, conceitos e valores adquiridos por nossas experiências, aprendizados e observações. Corporal nos traz o corpo com sua identidade existencial, isto é, toda a bagagem de uma pessoa.

    Uma análise, compreendida em Tavares (2003, p.20), discute imagem corporal como reflexo da “história de uma vida, o percurso de um corpo, cujas percepções integram sua unidade e marcam sua existência no mundo a cada instante”. Ainda, segundo a mesma autora, as formas pelas quais a pessoa conceitua e vivencia o seu próprio corpo engloba a imagem corporal.

    “Entende-se por imagem do corpo humano figuração de nosso corpo formada em nossa mente, ou seja, o modo pelo qual o corpo se apresenta para nós” (Schilder, 1994, p.11). De acordo com este autor, as estruturas fisiológica, libidinal e social são a base para a formação da imagem corporal e cada corpo é único e singular.

    A imagem corporal, para Tavares (2003, p.100), se define como “a representação mental do nosso próprio corpo, a maneira como nosso corpo aparece para nós mesmos”, representando uma experiência onde cada sujeito vivencia e dimensiona o sentido de seus impulsos, percepções e tomadas de decisões, pois essa imagem tem a ver com a identidade da pessoa. E para o desenvolvimento da representação mental do corpo, deve-se desenvolver a identidade do indivíduo, por meio de intervenções motoras e psíquicas.

    A individualidade é mantida por um eixo pulsional da imagem corporal. A energia das pulsões, própria do corpo, dimensiona nossas ações, sensações e sentimentos em relação ao mundo (Tavares, 2003).

Figura das Pulsões

(Tavares, 2003, p.16)

Pesquisas com Pessoas Cegas

    Oliveira, Denari, Barbosa e Piccolo (2011) realizaram uma pesquisa qualitativa para entenderem a representação social do corpo no jovem deficiente visual. Por meio de entrevistas semiestruturadas, concluíram que o corpo belo, perseguido como modelo ideal para os videntes, não parece ser uma preocupação para as pessoas com cegueira. Apesar disso, os alunos entendiam a influência exercida pelas mídias, ditando comportamentos e idéias sobre a beleza. Para os cegos, o tato, audição e linguagem se evidenciaram como importantes mecanismos para as representações sociais e estreitamento das relações na sociedade - onde a beleza está inserida.

    Uma pesquisa bibliográfica de Azzini (2010) discutiu as implicações e possibilidades em relação ao equilíbrio e estabilidade corporal em pessoas que ficaram cegas no decorrer da vida e as conseqüências para as habilidades motoras, pois o sistema visual está envolvido na manutenção do equilíbrio e postura. O autor concluiu que a deficiência visual acarretou mudanças no comportamento motor, com variações na locomoção e controle postural alterando a estabilidade e o equilíbrio corporal.

    Para Nasário e Ernest (2011, p.229) a imagem corporal “é necessária para uma vida saudável nos aspectos motores, sociais, afetivos e psicológicos”. As pesquisas revelaram que o deficiente visual utiliza principalmente o tato e a audição para construir sua imagem corporal e que ele precisa vivenciar experiências corporais para descobrir a si mesmo, o outro e o meio ambiente. A influência dos que estão ao seu redor é muito importante.

    De acordo com Gomes-da-Silva, Almeida e Antério (2015, p.36) “ao jogar goalball, o cego parece ver”, pois por meio da experiência do corpo em movimento, o jogador passa a entender o seu redor, aumentando sua atenção e orientação dinâmica. Para os autores, a prática deste jogo se torna importante para vivenciar a corporeidade e a comunicação com o meio, tanto para cegos como para videntes.

Deficiências

    De acordo com o Relatório Mundial sobre a Deficiência (2012, p. 4) “a deficiência é complexa, dinâmica, multidimensional e questionada”. Este relatório adotou a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), que entende funcionalidade e deficiência de forma mais abrangente, num processo dinâmico entre problemas de saúde e fatores tanto pessoais, quanto ambientais. A CIF categoriza os problemas de funcionalidade humana em três áreas interligadas:

    A deficiência tem como referência as dificuldades encontradas em uma ou nas três áreas de funcionalidade. Ela é tratada como um contínuo pela CIF que não cate­goriza as pessoas com deficiência em um grupo separado: “a deficiência é uma questão de mais ou menos, e não de sim ou não” (Relatório Mundial sobre a Deficiência, 2012, p. 5).

    Qualquer alteração, mesmo que temporária, que necessite de modificação ou intervenção na vida da pessoa, a coloca no grupo de pessoa com deficiência (Silva, 1999).

Deficiência Visual

    Para Silva (1999) a deficiência visual tem como referência a perda da capacidade de captar e interpretar os estímulos visuais do meio ambiente, podendo ser total ou parcial, congênita ou adquirida, permanente ou temporária, progressiva ou estacionária, com várias etiologias, como infecções, malformações, diabetes e outras.

    Segundo Gallahue e Ozmun (2005, p.94) “o corpo permanece em equilíbrio quando o centro de gravidade e a linha de gravidade passam pela base de apoio”. O corpo se posiciona em relação ao ambiente por meio do sistema visual “e os sistemas vestibular e somato-sensorial contribuem com informações sensoriais sobre a posição do corpo e da cabeça em relação à gravidade e à consciência da posição das articulações” (Gallahue & Ozmun, 2005, p.460).

    Lira e Schlindwein (2008) entendem que a pessoa cega ou com baixa visão utiliza de outros meios para se relacionar com pessoas, objetos e coisas que a rodeiam. Também para as autoras, a linguagem é um instrumento, para a criança cega, facilitador para apropriar - se das questões do seu meio e das atividades sociais.

    De acordo com Ormelezi (2000) a criança que nasce cega – cegueira congênita – ou que perde a visão até os cinco anos de idade, não consegue reter imagens visuais, isto é, suas construções mentais não terão a referência de uma memória visual. Porém, outros fatores relevantes também devem ser considerados nesse período da vida da criança, em relação ao desenvolvimento cognitivo - qualidade das relações afetivas, ambiente, mobilidade, coordenação olho-mão, permanência do objeto, imitação, linguagem, abstração – pensando em um desenvolvimento psíquico adequado.

    O cego percebe a realidade de um modo diferenciado de um vidente, sem querer dizer que é melhor ou pior, apenas que sua organização sensorial para adquirir conhecimentos não é igual (Nunes, 2004).

Considerações finais

    A imagem corporal de um adulto vidente é construída ao longo de sua vida, por meio de suas experiências, percepções e relações sociais, comparando-se com o outro e formando sua identidade. Portanto, a representação mental do corpo não é estática e está em constante transformação, recebendo influência da sociedade e da mídia, mas também influenciando os outros ao seu redor.

    A deficiência visual modifica as vivências experimentadas pelo corpo e deste modo surgiu o questionamento de como a pessoa cega construiria a sua imagem corporal e a partir de que elementos o cego tomaria a consciência do seu corpo. Muitas das pesquisas que tratam da pessoa com deficiência visual são bibliográficas e também necessitam de atualização.

    Deste modo, esse artigo teve a proposta de trazer alguns estudos para a discussão teórica, na medida em que pretende compreender a construção da imagem corporal da pessoa cega, o que pode contribuir para atuação dos profissionais que lidam com pessoas com deficiências visuais nas áreas da educação e saúde, dando subsídios que auxiliem nos planejamentos para um suporte social e emocional mais adequado.

Bibliografia

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Lecturas: Educación Física y Deportes - ISSN 1514-3465 - © 1997-2015 Derechos reservados