Apresentando os elementos da Cultura Corporal em uma turma do ensino fundamental na perspectiva histórico-crítica Presentando los elementos de la Cultura Corporal en un curso de escuela primaria en la perspectiva histórico-crítica |
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Especialista em Metodologia da Educação Física Escolar pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sudeste de Minas Gerais – IFET Atua como professor nas turmas da EJA no Colégio de Aplicação da UFJF João XXIII |
Bruno Botti Esteves (Brasil) |
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Resumo Vislumbramos ao socializar esta proposta de intervenção, cujo objetivo principal é apresentar os conteúdos da Cultura Corporal a uma turma do Ensino Fundamental, demonstrar uma possibilidade de aplicação da Pedagogia Histórico-Crítica na Educação Física Escolar, proporcionando no dia a dia docente uma nova dimensão nas relações entre os sujeitos envolvidos no processo educacional e os conteúdos inerentes à Educação Básica. Unitermos: Educação Física Escolar. Cultura Corporal. Pedagogia Histórico-Crítica.
Resumen Percibimos que al socializar esta propuesta intervención, cuyo objetivo principal es conocer el contenido de la cultura del cuerpo a una clase de la escuela primaria, demostrar la aplicabilidad de la Pedagogía Histórico-Crítico en Educación Física, proporcionando día tras día la enseñanza de una nueva dimensión en las relaciones entre los sujetos involucrados en el proceso educativo y el contenido inherente a la educación básica. Palabras clave: Educación Física Escolar. Cultura Corporal. Pedagogía Histórico-Crítica.
Recepção: 04/04/2015 - Aceitação: 03/05/2015
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 20 - Nº 204 - Mayo de 2015. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
A partir de nossas experiências na aplicação da Pedagogia Histórico-Crítica no dia a dia como professores, notamos que a partir da discussão dos conteúdos e interesses entre os sujeitos envolvidos no processo ensino-aprendizagem, proposta por este modelo de educação, obtivemos resultados muito bons no que diz respeito ao interesse da turma pelo tema abordado, como também a participação nas aulas e a capacidade do aluno em relacionar o conteúdo prático e teórico e aplicá-lo em sua vida.
Assim, cientes da importância da transmissão dos conhecimentos sobre os elementos da Cultura Corporal, especificidade da Educação Física Escolar, conforme o Coletivo de Autores (1992) elaboramos um plano de intervenção pautado na Pedagogia Histórico-Crítica, tendo como norte Saviani (2008) e Gasparin (2009), no intuito de apresentar os temas da Cultura Corporal a uma turma do Ensino Fundamental ao longo do ano letivo, de forma crítica e contextualizada, para que assim os alunos se apropriem destes elementos utilizando-os da forma que acharem conveniente em seus cotidianos.
Primeiramente, o que entendemos como “Cultura Corporal”?
Teremos como referencial o Coletivo de Autores (1992), para definirmos o significado do termo Cultura Corporal, e a partir deste conceito, formularemos nosso plano de intervenção para apresentar estes elementos aos indivíduos envolvidos no processo educacional em uma turma do ensino fundamental.
Conforme coletivo de Autores (1992), devemos entender como Cultura Corporal, todas as atividades socialmente construídas desde os primórdios da humanidade, que se manifestam através do jogo, do esporte, da luta, da ginástica, da dança e da atividade circense.
Segundo estes autores, este conhecimento deve ser compartilhado nas aulas de Educação Física a fim de transmitir a expressão corporal como forma de linguagem, contemplando também a necessidade de socializar os conhecimentos a respeito dos elementos desta cultura de forma teórico-prática, aumentando assim as possibilidades de movimento e o acervo cultural dos alunos.
Uma breve introdução a Pedagogia Histórico-Crítica
Na hora de propor esta vertente do conhecimento como norteador de nossa proposta de intervenção, consideramos que sua aplicação se mostra extremamente compatível com os desafios da educação básica e com uma socialização justa do conhecimento socialmente construído pelo homem.
A pedagogia histórico-crítica é o modelo de educação, onde através da discussão a cerca dos conteúdos entre os sujeitos, ou seja, educador e educando, estimula-se a crítica a valores e conceitos pré-existentes, no sentido de proporcionar as classes sociais menos favorecidas o acesso ao conhecimento de forma contextualizada, democrática e esclarecedora (Saviani, 2008).
Neste viés, de fomento à discussão sobre os conteúdos entre os sujeitos envolvidos no processo educacional, observando experiências e pré-conceitos adquiridos socialmente, na tentativa de desconstruir idéias fomentadas há anos pelas classes dominantes, podemos definir este modelo como “uma atividade mediadora no seio da prática social global” (Saviani, 1980a, p.129 como citado em Saviani, 2008, p.59).
Este modelo educacional, tem como pressuposto colocar o aluno como protagonista no processo de ensino-aprendizagem, considerando suas opiniões, seus anseios e seus interesses na relação que estabelece com o conteúdo apresentado (Saviani, 2008). Sendo assim, aluno e professor possuem a mesma importância no dia a dia escolar, porém em papeis diferentes (Saviani, 2008).
Neste modelo de educação, o professor deve priorizar a criatividade, a participação e iniciativa dos alunos, porém sem excluir sua iniciativa docente (Saviani, 2008). Para tal, Saviani (2008), afirma que é necessário o diálogo entre os alunos e entre professor e aluno, sempre levando em consideração o diálogo com a cultura historicamente construída.
Segundo Gasparin (2009):
Nessa perspectiva, o novo indicador da aprendizagem escolar consistirá na demonstração do domínio teórico do conteúdo e no seu uso pelo aluno, em função das necessidades sociais a que deve responder. Esse procedimento implica um novo posicionamento, uma nova atitude do professor e dos alunos em relação e à sociedade: o conhecimento escolar passa a ser teórico-prático. Implica que seja apropriado teoricamente como um elemento fundamental na compreensão e na transformação da sociedade (Gasparin, 2009, p. 2).
Desta forma, apresentamos sucintamente às idéias norteadoras da Pedagogia Histórico-Crítica, e a partir destes pressupostos seguiremos nossa proposta de intervenção citando os objetivos que consideramos adequados ao apresentarmos os elementos da “cultura corporal” a uma turma de alunos do ensino fundamental.
Objetivos
Objetivo geral
Apresentar os elementos da Cultura Corporal aos alunos de uma turma do ensino fundamental, durante as aulas de Educação Física.
Objetivos específicos
Transmitir conhecimentos a respeito da Cultural Corporal e seus elementos, proporcionando aos envolvidos, a vivência prática e teórica dos conteúdos, agregando também o acesso a historia e evolução de cada um destes componentes culturais.
Proporcionar aos alunos novas possibilidades de movimento, ampliando assim, seu acervo de conhecimentos sobre a cultura corporal.
Reconstruir idéias e conceitos equivocadamente criados pela mídia e pela sociedade, a respeito de alguns dos elementos da Cultura Corporal, no intuito estimular uma visão crítica nos alunos a cerca destes conteúdos.
Metodologia
A proposta de intervenção foi pautada na perspectiva Histórico-Crítica de Saviani (2008), tendo como referência Gasparin (2009), que sintetizou as idéias deste autor, a fim de possibilitar a aplicação prática da obra “Escola e Democracia” no dia a dia da Educação Básica, onde adaptamos seus pressupostos aos conteúdos da Educação Física Escolar, portanto aos elementos da Cultura Corporal.
Os diversos elementos da Cultura Corporal serão apresentados e vivenciados pelos alunos em ciclos de bimestres, sendo o primeiro ciclo abordando os jogos, no segundo ciclo os esportes, no terceiro ciclo a dança e as lutas, finalizando no quarto ciclo, com as atividades circenses juntamente com a ginástica, encerrando assim o ano letivo convencional.
Os planos de intervenção de cada ciclo, na perspectiva Histórico-Crítica, serão compostos por 5 passos, como nos sugere Gasparin (2009):
1º Passo - Prática Social Inicial do Conteúdo: É o momento inicial, onde no primeiro contato da turma com o conteúdo, o docente descobre em conversar informal, as experiências que os alunos possuem sobre o conteúdo da aula, e o que eles gostariam de saber sobre o tema. Exemplificando, dentro dos elementos da Cultura Corporal, pensemos nas lutas. Neste momento, o professor, de maneira informal, discute com a turma sobre as experiências que eles possuem com os diversos tipos de luta, seus interesses, suas duvidas e os pré-conceitos que eles trazem consigo destas experiências.
2º Passo – Problematização: Neste passo, inicia-se o trabalho do conteúdo sistematizado, a partir das experiências que os alunos possuem, expostas na Prática Social. É este o momento, em que, de modo informal, no início das aulas ou em pausas rápidas durante a instrumentalização, o professor após definir, aborda os aspectos mais significativos do determinado conteúdo, e sua importância para a compreensão dos questionamentos da Prática Social. Utilizando-se novamente da luta como exemplo, o docente deve abordar temas contraditórios como a origem das artes marciais, a diferença entre luta e briga de rua, a relação entre luta e agressividade, se a mulher também pode lutar, dentre outros tópicos.
3º Passo – Instrumentalização: É o momento das ações didático-pedagógicas, onde ocorre o contato prático do aluno com o objeto do conhecimento, selecionado durante prática social e a problematização, a partir dos interesses da turma e da mediação do professor. Adaptando para a aula de Educação Física, é a hora de vivenciar corporalmente o elemento da Cultura Corporal selecionado, de forma lúdica, voltado à construção do conhecimento e da cidadania, valorizando assim a descoberta do novo no âmbito da corporeidade. O professor pode inovar no momento de selecionar os materiais, podendo se utilizar de formas alternativas para proporcionar a vivência corporal de modalidades onde seja inviável a utilização do implemento oficial, como construir um raquete de tênis ou uma peteca com materiais alternativos, ou improvisar uma rede de voleibol, ou mesmo bolinhas para malabares, quando o tema for o circo.
4º Passo – Catarse: É o momento onde se verifica o que foi apreendido pelo aluno sobre aquele conteúdo abordado. Pode ser realizada uma síntese ao final de cada aula. É interessante inovar neste momento, onde uma boa proposta é a organização de apresentações sobre os aspectos e dimensões do elemento da Cultura Corporal em pauta. Utilizaremos como exemplo os esportes, onde com a turma dividida em grupos, cada grupo apresentará da forma que achar mais conveniente uma modalidade esportiva, com suas particularidades, histórico cultural, e o que mais achar pertinente. Esta aula pode ocorrer na ultima intervenção do plano de cada conteúdo, onde os grupos definem-se na Prática Social Inicial do Conteúdo. Ficam a cargo do docente, apresentar a turma os meios para pesquisar o tema abordado e as ferramentas de apresentação.
5º Passo – Prática Social Final: Ao final de cada ciclo, o docente discute com os alunos o que foi aprendido a partir do conteúdo das aulas e suas aplicações em suas vidas fora do ambiente escolar. Neste momento acontece também à avaliação por parte dos envolvidos sobre as aulas e os temas abordados, como também a auto avaliação do trabalho do professor. Exemplifiquemos agora com a ginástica, onde os alunos a partir da mediação do docente expõe o que consideraram proveitoso sobre os tipos de ginástica abordados durante o ciclo, que dimensão terá este conteúdo em seu dia a dia e informalmente avaliam a dinâmica das aulas.
Objetivos e conteúdos no trato com os elementos da cultura corporal
Jogos: Contextualizar os jogos presentes no âmbito cultural, trazendo para as aulas as experiências da infância dos alunos, as brincadeiras, os jogos lúdicos, como a Queimada, as brincadeiras de roda, o Beti, os "Piques", proporcionando assim um ambiente lúdico, favorável à aprendizagem e a momentos de descontração e prazer.
Esporte: Vivenciar na teoria e na prática as modalidades esportivas do interesse da turma, de forma lúdica e inclusiva, colocando em pauta temas inerentes e/ou paralelos, como a relação dos gêneros com determinadas modalidades, colocar em discussão crítica os possíveis benefícios sociais do esporte, além da possibilidade de proporcionar aos alunos o contato com modalidades menos conhecidas, ampliando seu horizonte cultural, e desconstruindo a visão culturalmente construída, a respeito de alguns aspectos referentes ao esporte moderno, como a falsa divisão entre os esportes praticados pela elite e pelas classes populares.
Dança: Apresentar aos alunos os tipos de dança existentes, as danças Folclóricas, Clássica, Religiosa, de Salão, incentivando a vivência corporal dos diversos estilos, dentro das possibilidades de movimento de cada um. Abordar também os preconceitos presentes na sociedade, como a relação do sexo masculino com certos tipos de dança, a marginalização de algumas modalidades, dentre outros aspectos que considerarmos relevantes no diálogo com a turma. Pensamos que assim o aluno terá um contato abrangente com a dança, levando essa nova cultura para além da escola.
Lutas: Expor as modalidades de luta existentes, suas origens e seus históricos socioculturais, propondo vivencias lúdicas dos movimentos característicos de cada modalidade selecionada, preferencialmente, sem a necessidade do contato físico. Consideramos importante abordar aspectos polêmicos que estão presentes no âmbito da luta, a partir do interesse e dos questionamentos que surgirem durante o contato com a turma. A partir de então esperamos criar uma postura crítica e autônoma nos alunos, seja como espectadores ou praticantes, a respeito do universo das artes marciais.
Ginástica: Caracterizar a ginástica, com seu histórico e as modalidades existentes. Durante a prática, vivenciaremos as modalidades a partir do interesse dos alunos, dando ênfase aos temas atuais, como as ginásticas de academia, laboral, natural, artística, rítmica, dentre outras. Paralelamente, evidenciar temas comuns na sociedade, como o culto exagerado ao corpo, o risco dos anabolizantes, a relação entre atividade física e saúde, dentre outros definidos no contato com os alunos. Sendo dessa forma, podemos criar uma nova cultura de movimento nos alunos, que pode tirá-los do sedentarismo, como também tirar suas dúvidas e alertá-los sobre os perigos da atividade física mal orientada.
Atividade circense: Apresentar o circo como atividade artística corporal e recreativa, com sua história e evolução, buscando as experiências vividas por cada um como espectador. Durante o momento da prática, é possível vivenciar atividades de malabarismo, equilíbrio, saltos, contorcionismo, mágica, de forma lúdica e voltada ao interesse dos alunos. Pretendemos assim, aproximar os alunos da atividade circense, demonstrando que existe a possibilidade de vivenciar o circo de outras formas, além de simplesmente como espectador.
Considerações finais
Acreditamos ter contribuído com esta proposta de intervenção, no sentido de socializar os conhecimentos a cerca da Cultura Corporal com nossos alunos no dia a dia da Educação Física Escolar de forma democrática e participativa, colocando o aluno no mesmo patamar de importância do professor, porém em funções diferentes, como nos sugere nossa referência ao tratarmos de uma educação crítica, voltada a reconstrução de valores, o educador Demerval Saviani e sua obra “Escola e Democracia”.
Esperamos também auxiliar os colegas docentes que tiverem acesso a essa proposta, apresentada a partir de um viés crítico, no sentido de demonstrar uma possibilidade não tão convencional, de apresentar e contextualizar os elementos desta cultura, socialmente construída pelo homem, e que se mostra presentes em várias esferas da sociedade, destacando-se os veículos de comunicação em massa.
Não temos a ilusão de que a Pedagogia Histórico-Crítica resolverá todos os problemas educacionais aos quais estão expostas as classes menos favorecidas no Brasil. Porém, acreditamos que sua aplicação no dia a dia da Educação Física Escolar pode ser uma boa forma de combater um modelo de ensino da disciplina que Bracht (1997) denomina como “adestrante”, onde o aluno simplesmente executa o que é ordenado pelo professor de forma alienada e não-crítica, dando continuidade a um modelo de educação e sociedade que interessa somente a classe dominante, detentora do poder e do capital.
Bibliografia
Bracht, V. (1997). Educação Física e Aprendizagem social (2ª ed.). Porto Alegre: Magister.
Coletivo de Autores (1992). Metodologia do ensino da Educação Física. São Paulo: Editora Cortez.
Gasparin, J. L. (2009). Uma didática para a Pedagogia Histórico-Crítica (5ª ed.). Campinas, SP: Autores Associados.
Saviani, D. (2008). Escola e Democracia (Edição Comemorativa). Campinas, SP: Autores Associados.
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