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O xadrez na educação infantil

El ajedrez en la educación inicial

The chess in the kindergarten

 

Especialista em Atividade Física Desempenho Motor e Saúde

Professora no Centro de Educação Infantil Municipal Sementinha

(Brasil)

Adriana Cavalheiri Gelain

adrianacavalheiri@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          Objetivou-se proporcionar às crianças e as suas famílias um espaço para o conhecimento do jogo de xadrez e para a sua prática. Para isso, diversas atividades com o uso do xadrez foram produzidas pela professora e desenvolvidas junto com os alunos ao longo do ano letivo. Utilizou-se o procedimento técnico de levantamento, pois foram solicitadas informações dos familiares das crianças. O tipo de pesquisa é descritivo. Os resultados foram satisfatórios na medida em que as crianças foram compreendendo a forma correta de inserir e movimentar as peças no tabuleiro. Por fim, notou-se que as famílias interagiram com seus filhos nos seus lares, pois, os relatos na cartilha apresentavam as mais diferentes dúvidas, curiosidades e dificuldades encontradas durante a realização do jogo.

          Unitermos: Educação Física. Jogo de xadrez. Conhecimento. Interação.

 

Abstract

          Aimed to provide children and their families a space for knowledge of the game of chess and for your practice. For this, various activities with the use of chess were produced by the teacher and developed with the students throughout the school year. We used the technical procedure of lifting, for the families of children information was requested. The type of research is descriptive. The results were satisfactory in that the children comprised the correct way to insert and move the pieces on the board. Finally, it was noted that families interact with their children in their homes, because the reports in the booklet had the most different questions, curiosities and difficulties encountered during the course of the game.

          Keywords: Physical Education. Chess game. Knowledge. Interaction.

 

Recepção: 08/12/2014 - Aceitação: 20/02/2015

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 20, Nº 203, Abril de 2015. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    O jogo está presente em todas as fases do desenvolvimento humano, embora1 seja na infância que reside a sua principal importância. Através do jogo a criança se conhece e conhece o próximo, entende que cada pessoa tem um papel a cumprir, se familiariza com o espaço cultural e com as regras da sociedade.

    Pode-se afirmar que os jogos são os coadjuvantes do amadurecimento das funções cerebrais, isto certamente explica sua real importância de execução na fase infantil. É imensa a quantidade de ações envolvidas quando se realiza os jogos. Todos os planos do sistema nervoso, desde os mais básicos até os mais complexos, aí participam: a afetividade (sistema límbico), a conação ou disponibilidade de ação (sistema motor) e a intelectualidade (sistema neocortical). As crianças são atraídas pelos jogos porque eles propiciam prazer e concomitantemente contribuem para o desenvolvimento do sistema nervoso em seus aspectos psicomotores e cognitivos. Em muitos deles estão presentes a indução, a imitação, a perspicácia, a observação, a memória, o raciocínio, os aspectos verbais e não verbais, os melódicos e os harmônicos todos eles auxiliam na integração do ser e na segurança perante si e perante o outro (ANTUNHA, 2010).

    Os jogos se caracterizam como sendo cooperativos, donde promovem efetivamente a cooperação entre as pessoas, observando o próximo como um companheiro e não como um adversário. E também como sendo competitivos, onde visam a competição entre os participantes, sendo os atos vencer/perder muito forte. Neste último, o jogo de xadrez se identifica, embora, que isto dependa da intenção ou da situação em que o jogo é praticado.

    Mas afinal o que é o xadrez? Um esporte, uma arte ou uma ciência? Alguns dirão: “os jogadores de xadrez participam de torneios e disputam partidas, lutam para vencer e o resultado é importante para eles – o que significa que o jogo de xadrez é um esporte” (Kasparov, 1997, p.06). E aqueles que sempre se impressionam com a beleza das combinações e lógica das táticas do xadrez? Para estes um engenhoso sacrifício da Dama em uma partida perdida é uma fonte de prazer, ao passo que uma partida monótona, forçada, os deixa indiferente. Para estes o xadrez é uma arte, capaz de trazer felicidade e dar sentido aos momentos de lazer. Ao mesmo tempo também, há muitos entusiastas capazes de passar noites em claro resolvendo um problema de estratégia que ocorreu numa determinada partida. Para estes, o xadrez é principalmente uma ciência baseada no raciocínio lógico (Kasparov, 1997).

    O jogo de xadrez possui uma versatilidade e uma multiplicidade de possibilidades. Há uma beleza e um brilhantismo nos seus golpes táticos que cativa muito os praticantes (Kasparov, 1997).

    De acordo com Lima (2010), o xadrez é um jogo que estimula o desenvolvimento mental das crianças, além de lhes impor uma disciplina atrativa e agradável, aumentando suas capacidades de cálculo, raciocínio e concentração.

    Segundo o estudioso Rezende (2002) a inclusão de atividades enxadrísticas no contexto escolar é uma das possibilidades do aluno desenvolver competências e habilidades que certamente contribuirão para o exercício da paciência, da tolerância, da perseverança e do autocontrole.

    Do mesmo modo, por meio do uso do jogo do xadrez na escola, pode-se trabalhar com os alunos os valores éticos e morais, quando praticam padrões sociais desejáveis de conduta. Padrões estes caracterizados como o “saber ganhar e perder”, o respeito às regras e a interação com os colegas e as demais pessoas, fatores estes essenciais para a aquisição do conhecimento e para a formação humana.

    Não é constante entre os profissionais de educação, de modo especial na educação Infantil, a utilização do jogo de xadrez em sala de aula e/ou até mesmo como instrumento para auxiliar no processo de ensino e aprendizagem. Isto acontece por considerarem difícil de ensiná-lo e por demandar muito tempo.

    Por este motivo torna-se imprescindível a participação da família neste processo de ensino-aprendizagem. E não apenas para o auxílio no ensino do jogo de xadrez, mas também para os demais conteúdos do currículo. Como informa Piaget:

    Uma ligação estreita e continuada entre os professores e os pais leva, pois a muita coisa que a uma informação mútua: este intercâmbio acaba resultando em ajuda recíproca e, freqüentemente, em aperfeiçoamento real dos métodos. Ao aproximar a escola da vida ou das preocupações profissionais dos pais, e ao proporcionar, reciprocamente, aos pais um interesse pelas coisas da escola chega-se até mesmo a uma divisão de responsabilidades (2007, p. 50).

    Nesse sentido, pode-se dizer que o que ocorre é um aprendizado de ambas as partes, quando juntos discutem sobre conceitos, sobre desenvolvimento humano, sobre como a criança aprende; tudo isso é construtivo. E as crianças ao observarem e perceberem esta ligação, também se sentem seguras e confiantes no ambiente escolar, influenciando de certa forma no seu processo de ensino-aprendizagem. Do mesmo modo, Arroyo nos diz: “os aprendizes se ajudam uns aos outros a aprender, trocando saberes, vivências, significados, culturas. Trocando questionamentos seus, de seu tempo cultural, trocando incertezas, perguntas, mais do que respostas talvez, mas trocando” (ARROYO, 2000, p.166).

    Isto explica que a aquisição do conhecimento se dá através das interações sociais, da ajuda do próximo, da troca de saberes e de opiniões, da argumentação. Estas afirmações vêem ao encontro da Teoria Sociointeracionista de Vygotski, na qual explica que o desenvolvimento humano é compreendido não apenas por fatores isolados de amadurecimento, nem tampouco por fatores ambientais que agem sobre seu organismo controlando seu comportamento, mas sim através de trocas recíprocas, que se estabelecem durante toda a vida, entre indivíduo e meio, cada aspecto influindo sobre o outro (REGO, 2012 p. 95).

    Nesta mesma direção verifica-se com Vygotski que o aprendizado acontece entre o conhecimento real e o potencial, ou seja, aquilo que a criança já sabe e o que ela tem a potencialidade de aprender. Assim Zanella (2001) nos esclarece que, aquilo que a criança tem para desenvolver com a ajuda dos adultos ou dos colegas é a zona de desenvolvimento proximal, a qual se manifesta com maior intensidade quando a criança começa a freqüentar a escola.

    Muitos devem se perguntar, mas o que tem a ver o jogo de xadrez com a zona de desenvolvimento proximal? Pode-se afirmar que tem tudo a ver. Por exemplo: caso entregássemos um jogo de xadrez para uma criança de cinco anos de idade sem antes ter apresentado e esclarecido a forma de jogar, certamente ela não saberia o que fazer. Todavia, se o professor e/ou a família e/ou qualquer outro indivíduo auxiliar esta criança, com certeza ela compreenderá as regras e as estratégias de jogadas donde antes sozinha possivelmente apresentaria dificuldades ou não compreenderia. Nesse sentido, é através da consideração da zona de desenvolvimento proximal que é possível verificar não somente os ciclos já completados, como também os que estão em via de formação, o que permite o delineamento da competência da criança e de suas futuras conquistas, assim como a elaboração de estratégias pedagógicas que auxiliem neste processo.

    Faz-se necessário desta forma, auxiliar a criança no processo de ensino-aprendizagem, e quando este auxílio ocorre entre a escola e a família, através de uma relação recíproca de ambas, certamente “colhe-se bons frutos”, se tratando de formação/aprendizagem.

    Diante destas constatações, proporcionar às crianças e as suas famílias um espaço para o conhecimento do jogo de xadrez e para sua prática, é o objetivo central deste trabalho. Inclusive, possibilitar que as famílias se aproximem mais do meio escolar, interagindo com seus filhos nas tarefas escolares, bem como demonstrando uma transparência sobre os conteúdos ensinados na escola, e aqui neste caso, sobre o conteúdo do xadrez, oferecido nas aulas de Educação Física.

Metodologia

    Participaram da pesquisa 125 crianças com idades de 5 e 6 anos de ambos os sexos, matriculados no CEI (Centro de Educação Infantil) Sementinha do município de Joinville – Santa Catarina. Os sujeitos foram selecionados pelo método não probabilístico acidental, de modo que a amostra foi composta por um subconjunto de alunos divididos em cinco turmas.

    Este estudo é de caráter descritivo, cujo procedimento técnico é de levantamento, pois, foram solicitadas informações de um grupo de pessoas, neste caso, os familiares das crianças.

    Confeccionou-se uma maleta com o tema xadrez, onde em seu exterior continham breves explicações de como jogar o jogo, e também ilustrações demonstrando as devidas posições de cada peça no tabuleiro. Na parte interior da maleta havia um tabuleiro, as peças e uma pequena cartilha de papel com a questão: “Quais foram as dificuldades encontradas?”.

    Passado o período de adaptação das crianças no CEI, o projeto de xadrez teve seu início. Geralmente as atividades se desenvolviam uma vez na semana com duração de 45 minutos. Na primeira aula, foi apresentado o jogo de xadrez nomeando cada parte do mesmo (tabuleiro, cavalo, rei, rainha...). Em seguida, a história de caráter lúdico sobre os “dois reis egoístas”2 foi contada, a fim de, compreenderem as posições corretas de cada peça e a função das mesmas no tabuleiro. Nas aulas seguintes, cada aluno pode manusear as peças inserindo-as no tabuleiro com auxílio da professora. Na seqüência, deu-se ênfase às movimentações das peças, enfatizando as linhas (reta e diagonal) bem como os lados (frente, atrás, direita, esquerda). Em algumas aulas as crianças desenharam, coloriram e nomearam as peças do jogo, com o intuito de assimilarem ainda mais seu formato e seu nome. As crianças que já apresentavam um domínio e uma ótima compreensão do jogo, a estas eram destinadas a maleta. Essas crianças levavam a maleta para sua casa a fim de jogar o jogo de xadrez com seus familiares e, assim, permitir que o responsável relatasse na cartilha as dificuldades encontradas. Passado dois dias a criança trazia a maleta para a escola e esta era destinada à outra criança.

Resultados

    As crianças permaneceram atentas quando a história sobre os dois reis egoístas foi contada, isto porque durante a narração as peças iam sendo apresentadas e também inseridas no tabuleiro.

    Devido as repetições das atividades realizadas junto com o grande grupo, bem como através da exploração individual (manuseio) do jogo de xadrez, as crianças tiveram facilidade em compreender a forma correta de inserir as peças no tabuleiro.

    Quanto a compreensão das movimentações das peças no tabuleiro (o jogo em si) foi um processo mais lento para a maioria dos alunos. Isto porque cada peça possui uma função no jogo, suas movimentações e capturas se diferem uma das outras. Portanto, a compreensão se dava por partes, ora aprendia a função de uma peça, ora de outra peça e assim por diante. O estudo de Goulart & Frei (2005) informa que cada uma das peças apresentadas à criança terá sentido e movimentos únicos, porém a combinação de suas ações é imprescindível para a sua vitória. Numa partida o jogador deve preparar o movimento de suas peças imaginando imediatamente as respostas possíveis do seu adversário e reagir prontamente exercendo a reversibilidade e a autonomia ao tomar decisões por si mesmo. Neste caso, a criança aprende a pensar quando busca a melhor combinação de lances, aprende a analisar diferentes pontos e a encontrar o melhor caminho para a solução. Todas estas ações proporcionadas pelo jogo de xadrez, certamente exigia-se mais tempo, bem como, maior concentração, atenção e memória.

    Dentre as dificuldades relatadas na cartilha, tiveram destaque duas situações: o fato dos pais e/ou família não saber jogar o xadrez, logo isso dificultava o auxílio, a compreensão e o desenvolvimento do jogo. Outro fator foi a de que alguns alunos apresentaram dificuldades para movimentar determinadas peças e isto os deixava inseguros e ansiosos durante a partida. Neste último caso, houve relatos de que o irmão (a) mais velho auxiliou nas movimentações das peças.

    Os relatos da cartilha apresentaram elogios por parte dos pais com relação ao projeto e, sobretudo com relação ao jogo de xadrez. Alguns descreveram sobre a importância de ensinar o xadrez na escola e de modo especial a partir da Educação Infantil, para auxiliar na concentração e no raciocínio das crianças. Outras famílias comentaram que nunca tiveram contato com o xadrez, apenas ouviam falar do jogo e o fato de compreender algumas situações do jogo com o filho foi algo fantástico e inusitado. Houve situações descritas na cartilha de que os pais tiveram que adquirir o jogo, devido a insistência do filho em querer praticar o jogo de xadrez todos os dias.

    Percebeu-se que devido ao projeto, as famílias tiveram uma aproximação maior com a escola, no sentido do diálogo, da observação e da interação de muitos em certos momentos da aula.

Considerações finais

    Pode-se constatar que o xadrez desenvolve e estimula as áreas do conhecimento, trazendo benefícios para o processo de ensino-aprendizagem, além de proporcionar a integração com as demais pessoas seja no ambiente familiar ou escolar.

    Este projeto proporcionou uma relação recíproca entre a escola e a família, pois, as crianças aprenderam a praticar o jogo de xadrez na escola e em casa receberam dicas e estratégias de jogo dos familiares. Sendo que em algumas situações foram as crianças que exerceram o papel de ensinar, uma vez que os pais não tinham conhecimento sobre o jogo e suas regras.

    É notório que o que ocorreu neste percurso foi uma troca de saberes através da interação, do diálogo, da argumentação, entre professor/aluno e aluno/família. Esta troca de saberes, certamente nos leva a aquisição do conhecimento que por sua vez ocorre vagarosamente e dependente das interações sociais e da troca de idéias.

    As dificuldades que as crianças encontraram quanto à compreensão da movimentação das peças com certeza serviram como reflexão para seu aperfeiçoamento. Neste caso, suponha-se que um tempo mais longo de trabalho durante o ano letivo com a participação efetiva dos pais e de todo o grupo escolar auxiliaria neste processo.

    Assim, sugere-se que o ensino do xadrez na Educação Infantil não seja apenas desenvolvido como um “jogo de mesa” pela disciplina de Educação Física, mas também pelos professores de sala através do ensino de diferentes temas como a matemática (contagem das casas), a arte (desenho das peças do tabuleiro) e a história (explicando como, quando e onde o jogo surgiu).

Notas

  1. O presente trabalho não constou com apoio financeiro de nenhuma natureza para a sua realização.

  2. Disponível em: http://professorclovisclaro.blogspot.com.br/p/texto-3-nocoes-sobre-o-jogo-de-xadrez.htm. Acessado no dia 06/11/2014.

Referências

  • ANTUNHA, E. L. G. “Jogos sazonais” – coadjuvantes do amadurecimento das funções cerebrais. In: OLIVEIRA, V. B. de (Org.). O brincar e a criança do nascimento aos seis anos. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.

  • ARROYO, Miguel G. Ofício de mestre: imagens e auto-imagens. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

  • GOULART, E. FREI, F. O jogo de xadrez como ferramenta para o ensino da matemática às crianças do ensino fundamental. 2005. Disponível em: http://www.unesp.br/prograd/PDFNE2005/artigos/.../ojogodexadrez. Acessado em 16/10/2014.

  • KASPAROV. G. Aprenda Xadrez com Garry Kasparov. Ediouro Publicações S.A., 1997.

  • LIMA, Sandra Vaz de. O xadrez e a formação dos alunos. 2010. Disponível em: http://www.artigonal.com/advertising-artigos/o-xadrez-e-a-formacao-dos-alunos 1863438.html. Acessado em 11/09/2014.

  • PIAGET, Jean. Para onde vai à educação. Rio de Janeiro. José Olímpio, 2007.

  • REGO, Teresa Cristina. Vygotski: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.

  • REZENDE, S. Xadrez na escola: uma abordagem didática para principiantes. Rio de Janeiro: Ciência Moderna, 2002.

  • ZANELLA, Andréa Vieira. Vygotski: contexto, contribuições à psicologia e o conceito de zona de desenvolvimento proximal. Itajaí: Univali, 2001.

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