A diversidade sexual nas aulas de Educação Física La diversidad sexual en las clases de Educación Física |
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Mestre em Performances Culturais pela Escola de Musica e Artes Cênicas da Universidade Federal de Goiás. Gestor de Politicas Publicas para o Esporte e o Lazer em Goiânia, Goiás |
Samuel Ribeiro Zaratim (Brasil) |
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Resumo Este estudo apresenta uma reflexão sobre a temática da sexualidade na escola, especialmente nas aulas de Educação Física. O artigo objetiva apresentar uma reflexão acerca do respeito à diversidade sexual humana dentro da escola, a partir da análise teórica das ações escolares sob a égide dos princípios da ética e do respeito entre professor/aluno, aluno/professor e aluno/aluno. Nesse contexto, este estudo preocupa-se também em perceber a importância dada a diversidade sexual dentro do ambiente escolar como conteúdo no processo de educação. Unitermos: Sexualidade. Escola. Educação Física.
Recepção: 25/01/2015 - Aceitação: 24/02/2015
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 19, Nº 202, Marzo de 2015. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
A temática sobre a diversidade sexual vem sendo discutida em diferentes âmbitos da sociedade brasileira, possibilitando expressivas discussões no combate à discriminação e a problematização da aceitação de homossexuais enquanto ser social. Também é importante observar que as inovações pedagógicas sustentadas pela inserção dos temas transversais na escola têm provocado discussões sobre os saberes envolvidos no processo ensino-aprendizagem.
A intolerância ou o medo irracional relativos à homossexualidade tem meios específicos para serem expressados pela família, escola e sociedade, num modelo de cultura arraigada na existência das comunidades escolares. A recorrência desse meio hostil, algumas vezes, resulta em humilhações e agressões motivadas pela orientação afetivo-social (MOITA, 2003).
Tal intolerância às vezes é também expressada por meio da violência física e/ou psíquica, totalizando números alarmantes de violência diária contra homossexuais no país. Essa construção de discursos produzidos pela sociedade em relação à inflexibilidade quanto às diferenças vem afirmando certa obrigatoriedade aos modelos tradicionais, certamente implantados ao longo dos séculos por interesses religiosos e/ou políticos.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), até o início dos anos 1990, a homossexualidade era considerada patologia, um desvio da conduta sexual dita normal. posteriormente, a 10ª edição da classificação internacional de doenças – CID-10 (OMS, 1993) e a quarta edição do manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais – DSM-IV (APA, 1995) tiraram a homossexualidade da classificação de “doença”.
É necessário preparar e formar uma sociedade e uma escola livres de preconceitos, a partir da promoção dos direitos humanos, bem como problematizando a discriminação, para assim, controlar e civilizar a homofobia.
Para Rios (2009, p. 59) o termo homofobia é, teoricamente, descrito como “a modalidade de preconceito e de discriminação direcionada contra homossexuais”. O autor ainda afirma que:
As definições valem-se basicamente de duas dimensões, veiculadas de modo isolado ou combinado, conforme a respectiva compreensão. Enquanto umas salientam a dinâmica subjetiva desencadeadora da homofobia (medo, aversão e ódio, resultando em desprezo pelos homossexuais), outras sublinham as raízes sociais, culturais e políticas desta manifestação discriminatória, dada a institucionalização da heterossexualidade como norma, com o conseqüente vilipêndio de outras manifestações da sexualidade humana (RIOS, 2009, p 60).
Também, ultimamente este termo adquiriu um significado próprio e polêmico, onde descreve a aversão generalizada como instrumento de banalização, preconceito e discriminação contra gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transgêneros.
A homofobia na escola, talvez seja invisível mesmo sendo expressada através de agressões físicas e/ou, isolamento dos indivíduos e até mesmo a exclusão do convívio social escolar. Esse contexto abre a discussão sobre a realidade vivida por determinado número de homossexuais nas escolas, onde a investigação poderá ser direcionada ao questionamento sobre a conduta do educador frente a esse problema: silêncio, conivência ou ação? Espera-se que a escola ofereça situações que favoreçam o aprendizado para todos os estudantes, incluindo alunos (as) homossexuais que frequentam as aulas no ensino regular.
Indaga-se aqui sobre que conhecimento em relação à homossexualidade o educador tem, se há a necessidade da integração de políticas públicas para a orientação sexual nas escolas e como essa integração com os conteúdos escolares podem auxiliar nas estratégias educacionais para que seu uso se concentre na escola como um todo. É necessários que os gestores do ambiente escolar proporcione efetivações de ações que contribuam na preparação da mediação e na inclusão da diversidade sexual.
Devemos inferir, portanto que a educação de qualidade é aquela mediante a qual a escola promove, para todo, o domínio dos conhecimentos e ao desenvolvimento de capacidades cognitivas e afetivas indispensáveis ao atendimento de necessidades individuais e sociais dos alunos. (Libâneo, 2005, p. 117).
Em alguns casos a própria escola pode estar contribuindo para a hierarquização das diferenças como desigualdade, classificando os seus sujeitos por etnia, sexo e classe social. É importante refletir, incansavelmente, sobre o papel social da escola, já que seu grande desafio é fazer do ambiente escolar um meio que favoreça o aprendizado. A sociedade muda continuamente. Tais mudanças provocam alterações sociais e talvez possam resultar em estímulos para os profissionais da educação na tentativa de compreensão das pedagogias contemporâneas.
Nesse contexto, este estudo objetiva apresentar uma reflexão acerca do respeito à diversidade sexual humana dentro da escola, a partir da análise teórica das ações escolares sob a égide dos princípios da ética e do respeito entre professor/aluno, aluno/professor e aluno/aluno.
A diversidade sexual nas aulas de Educação Física
O educador depara com um universo escolar complexo, em que a liberdade de pensar e agir surgem a partir dos diferentes tipos de sujeitos sociais inseridos na escola. Assim, as possibilidades e limitações do processo ensino-aprendizagem requerem continuidade de construção dos saberes na escola, lembrando aqui, que estudante homossexual é parte desse processo.
Segundo Weber (2002), um dos objetivos da escola é fazer com que alguns indivíduos sejam reconhecidos socialmente por meio de honras sociais positivas ou negativas. Os indivíduos podem se relacionar de acordo com seus interesses comuns, com vistas a alcançar uma determinada posição social. “As possibilidades de alcançar honras sociais são determinadas primordialmente pelas diferenças nos estilos de vida desses grupos e, portanto, principalmente pelas diferenças na educação” (WEBER, 2002, p. 210).
Nesse contexto, é importante observar que a escola deve objetivar a emancipação do desenvolvimento do estudante racional e tolerante face às diversas situações que a sociedade contemporânea apresenta.
Referindo-se à sexualidade, um estudo sobre a homossexualidade na escola tornar-se relevante e interessante, a partir da tentativa de buscar compreender o(a) aluno(a) homossexual de forma global, levando-se em consideração suas maneiras de agir, pensar, expressar, seus comportamentos e não somente pela sua orientação sexual.
Para Foucault (1999), a sexualidade deve ser admitida como um campo de elaboração, compreensão e estilização de condutas, devendo ser explorada com seriedade e rigor. “Da mesma forma, o silêncio e o segredo dão guarida ao poder, fixam suas interdições; mas, também, afrouxam seus laços e dão margem a tolerâncias mais ou menos obscuras” (FOUCALT, 1999 p. 96).
O cotidiano escolar reflete o comportamento dos estudantes e suas interações. Vale ressaltar que esse mesmo ambiente reflete a interação dos educadores com seus estudantes e estudantes com seus educadores. O educador deve considerar o estudante como sujeito de múltiplas relações o que aumenta sua responsabilidade sobre as diversidades sociais apresentadas no cotidiano escolar. Isso assegura o fomento aos estímulos da capacidade de reflexão critica sobre a temática diária, que interfere positivamente no meio social em questão.
Desse modo é importante refletir sobre a conduta do Professor de Educação Física frente à homossexualidade nas sessões diárias no ambiente escolar e também, como esse educador encara e lida com essa problemática em suas aulas. Assim será possível identificar obstáculos internos e externos para os professores referentes ao acesso às informações sobre esta temática para então promover os direitos dos estudantes como um todo nas experiências cotidianas, para que não estimulem, mesmo que inconscientemente, a possível aversão ou a possível intolerância à homossexualidade.
a intolerância não é uma conduta dirigida contra determinada pessoa, decorrente de uma condição peculiar e restrita àquela vítima. A intolerância viola o direito à existência simultânea das diversas identidades e expressões da sexualidade, que é um bem comum indivisível. Uma vez acionada, a intolerância ofende o pluralismo, que é requisito para a vida democrática. (RIOS, 2009, p. 79).
A sociedade traz inúmeras possibilidades à educação. Isso certamente exige novas posturas dos educadores que deverão procurar construir seus conhecimentos baseados nas novas exigências contemporâneas e faz-se primordial entender como produzir abordagens integradas de seus conteúdos e conhecimentos com as novas demandas da sociedade escolar e suas problemáticas atuais, nesse caso a tolerância à diversidade.
Para Seffner (2009, p. 132) “o estigma e a discriminação são barreiras à construção da cidadania plena de qualquer indivíduo. Não devem, portanto, ser admitidos no espaço escolar. Isto não vale apenas para os indivíduos que apresentam orientação sexual diferente daquela tida como ‘normal’”.
A falta de identificação da prática pedagógica utilizada pelo educador e o trato com o tema específico, sem distinção de credo religioso, raça, orientação sexual, cor ou qualquer tipo de discriminação pode ferir ou desestabilizar a lógica do papel transformador da escola.
Tornar a escola um ambiente efetivamente educativo para todas as pessoas, numa perspectiva crítica, democrática, transformadora, libertária e emancipatória, requer, entre outras coisas, que nela a diversidade seja considerada, além de um direito, um fator de estímulo e de enriquecimento. (JUNQUEIRA, 2009, p. 404).
Os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN’s foram instituídos em 1997, com a finalidade de aumentar a abrangência do conhecimento do aluno no ambiente escolar, em relação ao entendimento dos conceitos sobre cidadania, participação social, solidariedade, assim como sobre os temas transversais.
Ao sugerir os temas transversais os PCN’s intencionam estimular os estudos de temáticas que “correspondem a questões importantes, urgentes e presentes sob várias formas, na vida cotidiana” (BRASIL, 1997, p. 15). Este documento legal discute a ampliação do trabalho no ambiente escolar relacionados ao respeito à diversidade.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais incorporam essa tendência e a incluem no currículo de forma a compor um conjunto articulado e aberto a novos temas, buscando um tratamento didático que contemple sua complexidade e sua dinâmica, dando-lhes a mesma importância das áreas convencionais. (BRASIL, 1997, p.25).
Os PCN’s consideram os princípios de liberdade contidos na Constituição Federal de 1988. É nesse sentido que a temática sobre a sexualidade no ambiente escolar deve permitir e valorizar as reflexões que possam aprimorar o entendimento sobre a tolerância em suas diversas facetas.
Nesse contexto, a disciplina Educação Física pode ser considerada como um espaço privilegiado para o trabalho reflexivo sobre a orientação sexual, pois esta trabalha o uso e a educação do corpo nas perspectivas da cultura corporal de movimento. O professor deve considerar certa liberdade de expressão estimulando um ambiente confortável e que gere confiança e respeito em todos os participantes.
O respeito, o reconhecimento de singularidades de indivíduos e grupos e a valorização da pluralidade cultural não só podem humanizar a construção do conhecimento, como também podem se revelar fatores indispensáveis para se desenvolverem a criatividade e o pensamento crítico e consciente. O respeito à diversidade é elemento imprescindível para se garantir a formação para cidadania e a qualidade do processo de ensino-aprendizagem – convém repetir, em favor de cada pessoa. (JUNQUEIRA, 2009, p. 404).
A Educação Física Escolar busca desenvolver e ampliar os conteúdos propostos pela disciplinas, assim o escopo de opções temáticas aumenta facilitando o trabalho do professor em suas aulas. Certamente que as sessões devem valorizar o conhecimento sobre o corpo, além de seu processo de crescimento e desenvolvimento. Segundo os PCN’s, estes conteúdos são:
construídos concomitantemente com o desenvolvimento de práticas corporais, ao mesmo tempo que dão subsídios para o cultivo de bons hábitos de alimentação, higiene e atividade corporal e para o desenvolvimento das potencialidades corporais do individuo, permitem compreende-los como direitos humanos fundamentais. A formação de hábitos de autocuidado e de construção de relações interpessoais colabora para que a dimensão da sexualidade seja integrada de maneira prazerosa e segura (BRASIL, 1997, p. 29-30).
É evidente que o Professor deve considerar a sexualidade como uma opção de conteúdo a mais que possa aprimorar o trabalho de educação do corpo, respeitando os princípios culturais e apelo social que cada indivíduo traz às aulas de Educação Física.
Fica evidente que o conjunto de posturas e movimentos corporais representam valores e princípios culturais. Consequentemente, atuar no corpo implica atuar sobre a sociedade na qual este corpo está inserido. Todas as práticas institucionais que envolvem o corpo humano sejam elas educativas, recreativas, reabilitadoras ou expressivas, devem ser pensadas neste contexto, a fim de que não se conceba sua realização de forma reducionista, mas se considere o homem como sujeito de sua vida social (DAOLIO, 2004, p. 50).
Ao considerar o homem como sujeito de sua vida social, o autor pretende especificar a importância dos significados que as práticas corporais podem exercer sobre o aluno, pois existem adjetivos gravados no corpo que se relacionam com a cultura local. Adjetivos estes que às vezes são expressados por trejeitos e condutas diferenciadas do contexto individual do aluno.
A natureza e a cultura proferem uma interação com a prática corporal e não se restringem apenas ao formato do corpo, mas acresce ao que o cotidiano vivido e pensado em sociedade pode significar. Assim, as aulas de Educação Física devem primar pelo desenvolvimento de ideias colaborativas que certifiquem a dignidade e respeito ao diferente do conceito heteronormativo.
Considerações finais
A orientação sexual nas aulas de Educação Física deve se caracterizar como parte do processo de aprendizagem do aluno. A temática sobre a sexualidade deve aprimorar a discussão sobre dignidade, respeito e ética entre os elementos que fazem parte desse contexto e ultrapassar os muros da escola.
O respeito às diferenças e às escolhas dos cidadãos voltam-se para o preparo de um ambiente que acolhe o ser humano tal qual ele é. O ambiente escolar, nessa perspectiva, deve permanecer reflexivo para que o aluno sinta-se confortável e confiante para desenvolver o seu processo de aprendizagem.
Analisar o respeito à diversidade dentro da escola, especialmente nas aulas de Educação Física, passa a ser uma necessidade de perceber o direito de ser e estar. Esta percepção traz uma melhor compreensão sobre o combate à discriminação de indivíduos e grupos que estão inseridos no cotidiano da escola.
A inclusão de metodologias que priorizam o respeito à diversidade sexual nas atividades escolares, por sua vez, age diretamente na promoção de mudanças no comportamento de alunos e professores auxiliando na superação de preconceitos e discriminações. Tal ação poderá ser consolidada e alicerçada através do esforço em incluir temas que priorizam o respeito às várias expressões da sexualidade dentro da escola.
Referências bibliográficas
BRASIL. Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996. Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB.
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: pluralidade cultural, orientação sexual. Brasília: Secretaria de Educação Fundamental, 1997.
DAOLIO, Jocimar. Educação Física e o conceito de cultura. Campinas – SP: Autores Associados, 2004.
JUNQUEIRA, Rogério Diniz. Educação e Homofobia: o reconhecimento da diversidade sexual para além do multiculturalismo liberal. In Diversidade Sexual na Educação: problematizações sobre a homofobia nas escolas. Organizador Rogério D. Junqueira / Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, UNESCO, 2009.
FOUCAULT. Michel. História da sexualidade: a vontade de saber. Trad. Mariatereza da Costa Albuquerque e J. A. Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro, edições Graal, 1999.
LIBÂNEO, J. C.; OLIVEIRA J. F.; TOSCHI M. S.; Educação escolar: políticas estrutura e organização. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2005. (Coleção Docência em Formação).
MOITA LOPES, Luiz Paulo. Discurso de identidades: discurso como espaço de construção de gênero, sexualidade, raça, idade e profissão na escola e na família. Campinas: Mercado das Letras, 2003.
RIOS, Roger Raupp. Homofobia na Perspectiva dos Direitos Humanos e no Contexto dos Estudos sobre Preconceito e Discriminação. In Diversidade Sexual na Educação: problematizações sobre a homofobia nas escolas / Rogério Diniz Junqueira (organizador). Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, UNESCO, 2009.
SEFFNER, Fernando. Equívocos e armadilhas na articulação entre diversidade sexual e políticas de inclusão escolar. In Diversidade Sexual na Educação: problematizações sobre a homofobia nas escolas / Rogério Diniz Junqueira (organizador). Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, UNESCO, 2009.
WEBER, Max. A Psicologia Social das Religiões Mundiais. In: Ensaios de Sociologia. 5.ª ed. Rio de Janeiro, LTC Editora S.A., 2002. p. 189-211.
Organização Mundial de Saúde – OMS (Coord.). (1993). Classificação de transtornos mentais e de comportamento da CID-10: Descrições clínicas e diretrizes diagnósticas. (D. Caetano, Trad.). Porto Alegre (RS): Artes Médicas.
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