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Reestruturação do esporte de competição: 

uma possibilidade de formação humana na Educação Física escolar

La reestructuración del deporte de competición: una posibilidad de formación humana en la Educación Física escolar

 

Licenciado em Educação Física pelo Instituto Metodista Granbery, Juiz de Fora-MG

Acadêmico do Curso de Especialização em Metodologia da Educação Física Escolar

no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sudeste de Minas Gerais, Campus Juiz de Fora

Atua como professor substituto da Rede Equipe – Juiz de Fora

Bruno Botti Esteves

bruno.edu.fisico@gmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Buscamos neste artigo, através da revisão da literatura específica disponível, reestruturar o esporte de competição, em função de uma prática esportiva educacional, constituindo desta forma uma importante ferramenta pedagógica de formação humana nas aulas de Educação Física Escolar. Assim, pautados em autores de renome no meio acadêmico e em documentos oficiais, revertemos o quadro competitivo e excludente do esporte de rendimento em favor de uma reestruturação, almejando um esporte democrático, descompromissado com o rendimento, com uma pedagogia própria, pautada em um viés de formação humana dos envolvidos como objetivo principal, proporcionando a inclusão, a satisfação e a igualdade de condições a todos os alunos, com suas características e interesses próprios.

          Unitermos: Esporte. Educação Física Escolar. Reestruturação. Formação humana.

 

Recepção: 30/08/2014 – Aceitação: 20/09/2014.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 19, Nº 197, Octubre de 2014. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Segundo Lettnin (2005), o esporte pode ser considerado um dos grandes expoentes sociais de todos os tempos, sendo que sua evolução despertou o interesse de diversos setores, inclusive o da educação, podendo sua prática levar a inúmeras possibilidades de crescimento e criação, como também ao regresso e ao declínio dos envolvidos. Concordamos com Stigger e Lovisolo (2009), que afirmam que: “Olhar o desporto isolado, fora do contexto de inter-relações, é atribuir-lhe uma autonomia inexistente [...]” (STIGGER; LOVISOLO, 2009 p.73).

    Porém, acreditamos, pautados em Freire (1993), que se bem ensinado, dentro de uma metodologia voltada ao desenvolvimento humano do aluno, nos diversos aspectos, o desporto pode se tornar uma ferramenta pedagógica de grande importância no dia a dia da Educação Física Escolar; mesmo com a crítica de diversos autores como Betti (1999) e Bracht (2003), ao modelo de esporte praticado na escola como tema único da Educação Física Escolar.

    Assim, como idealizadores do desporto e cientes de sua hegemonia como conteúdo nas aulas de Educação Física Escolar como nos alertam Bracht (2003) e Bassani (2003), buscaremos neste estudo de revisão da literatura específica disponível, formas de minimizar os aspectos negativos do desporto de competição e assim dissociá-lo do esporte de formação humana, por considerarmos esse o modelo mais efetivo a ser aplicado na disciplina curricular, para que possamos dessa forma vislumbrara possibilidade de igualdade de chances, desenvolvimento integral e formação humana de todos os alunos, através das modalidades esportivas abordadas durante as intervenções.

Esporte de competição x esporte de formação

    Conforme nos orienta o Ministério dos Esportes (BRASIL, 2004a, p.13):

    Ensinar esportes deve ser entendido como uma prática pedagógica, desenvolvida dentro de um processo de ensino-aprendizagem, que leve em conta o sujeito aluno, seu contexto, além de seus vários ambientes relacionáveis, criando pos­sibilidades para a construção desse conhecimento, inserindo e fazendo interagir o que o aluno já sabe com o novo.

    Segundo Rodrigues e Darido (2008), um dos maiores erros da Educação Física Escolar foi ter adotado a técnicas esportivas, os movimentos, os códigos, os significados e objetivos do esporte de competição, trazendo para si fatores como a exclusão e a seleção. A Educação Física ao abordar o esporte, deve visar à compreensão de diversas possibilidades de encenação esportiva, como interesses e problemas atrelados a realidade sócio política (KUNZ, 2006a).

    Já conforme Stigger e Lovisolo (2009, p.150):

    É evidente que a escola não pode ignorar o esporte, e, mais do que isso, deve tê-lo como conteúdo de ensino. Ao ensinar esportes no entanto, ela não deve deixar de considerá-lo em suas múltiplas dimensões, observando que o conhecimento a ser trabalhado a partir do conteúdo esporte não pode equiparar-se, simplesmente, ao aprendizado prático das modalidades, nem às informações relativas às regras e táticas de jogo.

    Stigger e Lovisolo (2009), ainda destacam que o esporte deve ser aprendido por dois motivos; pela mediação reflexiva com os quais se relaciona com o corpo e a corporeidade, e pela dimensão técnica, onde ocorre uma aproximação estética entre sujeito e objeto.

    Só é possível educar através das diversas formas de encenações do esporte concretizando seu conteúdo em situações de um agir comunicativo, onde o aluno se torne reflexivo e critico quanto ao objeto da ação (KUNZ, 2006a). Kunz (2006b, p.9), afirma que; “Ser crítico é ser capaz de questionar, de dialogar, e oferecer diferentes respostas ao próprio questionamento, e só pode realmente questionar e responder sobre aquilo que se está corporalmente envolvido”.

    A prática esportiva na Educação Física Escolar só cumprira sua função educacional se for explorado pedagogicamente, para isso é preciso que acorra uma instrumentalização, para que o praticante possa compreender o fenômeno esportivo (BRACHT, 2003). É de grande importância à instituição escolar na democratização da prática esportiva, mas com a necessidade de um sistema conjunto com o programa da Educação Física para serem atingidos os objetivos educacionais da prática (PAES, 2001).

    Sobre a dialética entre esporte e formação humana, Belbenoit (1976) é citado por Betti (1999), que acredita que o esporte, mesmo sendo capaz de construir o hábito, a necessidade e a vontade de viver de forma sadia, não tem como finalidade a educação, a não ser que o professor disponha-se a inseri-lo no contexto pedagógico de ensino escolar. A partir das possibilidades de intervenção neste contexto, Rossetto Junior; Costa e D’Angelo (2008, p. 21), afirmam que: “[...] Quando vinculado à educação, à cidadania e a comunidade, é necessário, por parte dos professores, ampliar olhares e horizontes para além da formação de ‘atletas’ [...]”.

    Quando praticado na educação formal, o desporto pode desempenhar importante papel no desenvolvimento do indivíduo, desde que relacionado com os objetivos gerais da educação (SHIGUNOV; PEREIRA, 1993). O esporte na Educação Física escolar só desempenhará sua função educacional se levar em conta a especificidade do Ensino Público que deve transmitir, suas finalidades, seus objetivos de democratização e a batalha contra as maneiras de exclusão no acesso à prática cultural; se feito de outra forma, a função educativa perderá o sentido, e o principal objetivo continuará limitando-se a formar indivíduos consumidores de atividades, ou mesmo somente espectadores (CARVALHO, 1987 apud PAES 1996).

    Segundo Lettnin (2005), prática desportiva realizada no âmbito escolar pode se tornar uma útil ferramenta educacional, desenvolvendo capacidades e habilidades corporais como também a integração social, desde que seu objetivo final não seja a especialização. Sua prática deve identificar e considerar, os possíveis e esperados reflexos na vida dos envolvidos, e na estrutura da instituição (LETTNIN, 2005).

    O conteúdo na aula deve ser oferecido de forma que o aluno possa vivenciá-lo integralmente, abrangendo conhecimentos teóricos e práticos, para que assim descubra os seus fundamentos e regras, conhecendo sua história e evolução (PAES, 2001; KUNZ, 2006a).

    Devem ser estimulados fatores como a aquisição de conduta motora e também um processo de ensino-aprendizagem, levando em conta o sujeito aluno, criando formas de aprendizado que possibilitem a construção de conhecimento, fundindo as experiências anteriores às novas possibilidades, aumentando assim a bagagem cultural do aluno (BRASIL, 2004b).

    Paes (1996; 2001), defende que na educação formal, o Professor deve dar um trato pedagógico ao esporte, tornando sua prática abrangente, diversificada e reflexiva, para que dessa forma o aluno possa conhecer, aprender, gostar e manter o interesse pelo tema.

    A respeito do tratamento dado ao desporto dentro da Educação Física escolar, Bracht (2000) e Paes (2001), caminham paralelamente na mesma linha de raciocínio quando entendem que, se praticado na escola, deve permitir aos alunos, usufruírem de práticas corporais que valorizam o possível rendimento, a cooperação, a autonomia e a inclusão. A vitória nunca pode ser mais importante que a simples participação do aluno, sendo diferente, não será a dinâmica ideal para os programas esportivos de crianças e adolescentes (DE ROSE JR, 2009).

    Neuenfeldt e Canfield (2007) alertam os professores para que não abordem o desporto somente como cultivo do corpo, justificando que, limitá-lo somente aos aspectos fisiológicos ou ao aprendizado das técnicas esportivas não justifica sua presença no meio escolar. Já segundo Freire:

    São vários os caminhos do conhecimento, entre eles o do esporte, acredito. Todos esses caminhos conduzem a inteligências que buscam compreender a vida. E o universo fica muito pobre quando se reduz a busca desenfreada de limites tão estreitos como apenas fazer o esporte pelo esporte (FREIRE, 1993, p.29)

    Deve-se ter a preocupação de que os envolvidos na aula se apropriem do esporte, e desta forma o transformem de acordo com suas possibilidades materiais ou relativas de movimento corporal (RODRIGUES; DARIDO, 2008). Uma pedagogia critica em Educação Física não propõe a exclusão do ensino da técnica, mas sim o ensino das habilidades esportivas dotadas de outros sentidos, objetivos e fins (BRACHT, 2000).

    Stigger e Lovisolo (2009), consideram de grande relevância a questão da técnica no ensino do desporto, independente se praticado na escola ou não. Segundo os autores:

    [...] Ela não é, evidentemente, importante apenas para o esporte, mas para a vida em geral, já que nos faz refletir sobre uma das características que justamente nos fazem humanos: a capacidade de produzir meios técnicos ou tecnológicos para alcançar fins. [...] é pensando a questão da técnica que nos colocamos a ponto de refletir sobre os instrumentos que podem fazer-nos viver melhor (STIGGER; LOVISOLO, 2009 p.143).

    Mesquita (2000) nos alerta sobre como deve ser pautada uma prática esportiva que tenha como finalidade a formação humana do praticante. Segundo o autor, a abordagem deve conter elementos focando a contribuição para o desenvolvimento físico, social e emocional do aluno; como também praticas que proporcionem a aquisição de valores importantes como autodisciplina, companheirismo e lealdade; deve também permitir ao praticante vivenciar diversas possibilidades de movimento, criando-se um vasto repertorio motor. Segundo Freire: “[...] A criança que pratica esporte tem que aprender com ele, valores humanos fundamentais a sua existência, tornando-se mais hábil, mais inteligente, mais afetiva, mais sociável” (FREIRE, 1993, p.29).

    Portanto, uma perspectiva bem sucedida na transmissão de conhecimentos através do esporte, não se deve prender a gestos pré-determinados e estereotipados, mas sim estimular os praticantes a criarem sua própria conduta motora, caracterizando-se dessa forma a humanização do movimento (BRASIL, 2004b). Seguindo o mesmo raciocínio, Bento (2003, p.83) afirma que:

    A oportunidade de jogar para aprender deve ser entendida como elemento fundamental de aprendizagem. Este fator constitui mais uma importante confirmação de que o modelo por hora utilizado, baseado no ensino de habilidades técnicas isoladas para utilização das mesmas em situação de jogo, não é adequado nem ao desenvolvimento do jogo, nem as necessidades dos alunos.

    O ensino do Desporto deve respeitar uma seqüência dividida em fases, onde cada fase tem objetivos e estratégias de ensino próprias (PAES, 1996). O conteúdo deve ser apresentado em forma de brincadeiras, jogos lúdicos e educação esportiva, representados por manifestações corporais de diferentes significados, como também vivencias práticas capazes de estimular permanentemente a socialização e a inteligência corporal (FREIRE, 1993; BRASIL, 2004a).

    O esporte se desenvolvido de forma lúdica, pode possibilitar ao indivíduo, que sofre no dia a dia escolar com as cobranças dos conteúdos intelectuais, uma atividade descompromissada com o rendimento, e onde se resgata o papel de protagonista do aluno no contexto escolar (NEUENFELDT; CANFIELD, 2007). O processo de transmissão do conhecimento deve ter como foco a pessoa que se movimenta, levando-se em conta os interesses, sentidos e significados atribuídos por cada um ao movimentar-se (RODRIGUES; DARIDO, 2008).

    Segundo o manual do Ministério do Esporte, “O fato de haver um esporte na escola não garante uma atitude crítica em relação a aspectos considerados negativos do esporte de rendimento” (BRASIL, 2004a p.82). Ventorim (2000), aponta alguns fatores dentro do esporte praticado nas aulas de Educação Física que demonstram o caráter competitivo e seletivo da intervenção; são exemplos citados pela autora; o privilegio as modalidades mais populares; o foco na execução da técnica, nas regras e na tática; a luta pelo melhor resultado ao invés do respeito às características individuais de aprendizagem de cada indivíduo; a repetição dos gestos técnicos e mecânicos, ficando em segundo plano os aspectos lúdicos, criativos e culturais; utiliza-se do princípio da competição e não da cooperação; sustenta a imagem de que tudo é valido quando o objetivo é a vitória.

    Para Freire (1993), a competitividade na prática esportiva é um espelho da sociedade extremamente seletiva, porem isso não é motivo para excluí-la como ferramenta pedagógica. Porém segundo Bracht (2000), problemática de inseri-lo no campo pedagógico, é que os princípios da aprendizagem escolar vão de encontro aos princípios e objetivos do esporte de competição, criando assim um conflito entre esporte educacional versus esporte de competição.

    Sobre uma reestruturação do esporte de competição (ver quadro 1) nas aulas de Educação Física, a favor de uma prática voltada à formação integral do aluno, Campos (2012, p.24) afirma que:

    Um caso que, obrigatoriamente na escola, deverá sofrer uma “transformação didática” é a pratica do esporte, pois, normalmente as regras esportivas são internacionais e visam campeonatos de alto nível e a função formativa da escola vai muito além de preparar um campeão [...].

    Bento afirma que: “[...] mudanças são necessárias afim de, dentre outros objetivos, promover um melhor entendimento do jogo e evitar problemas como o da exclusão [...]” (BENTO, 2003, p. 83). Stigger e Lovisolo (2009) afirmam que só é possível evoluir no campo educacional do esporte se aceitarmos que sua prática com fins de competição é uma realidade contraditória e com ela lidarmos pedagogicamente.

    O esporte na Educação Física Escolar, não pode seguir o esporte de competição, deve ter funções próprias, ou seja, se reestruturar (ver quadro1), oferecendo aos indivíduos envolvidos no processo de aprendizagem, o acesso à sua iniciação como um conhecimento da cultura corporal, contribuindo assim para o desenvolvimento humano do aluno (PAES, 1996).

Quadro 1. Reestruturação do esporte de competição para torná-lo ferramenta educacional

Fatores a serem reestruturados

Esporte de competição

Esporte de formação

Tema principal da aula

- Esportivização, o esporte na sua essência.

- Cultura de movimento corporal, o esporte e suas possibilidades educacionais

Método de

Avaliação

-Valorização do melhor desempenho.

- Valorização da participação, do interesse e do possível rendimento individual.

Critérios de Participação

- Seleção dos mais habilidosos

- Inclusão ativa de todos os interessados em participar

Objetivos

- Resultados de expressão no âmbito nacional e internacional como medalhas e quebras de recordes

- Benefícios para o desenvolvimento humano do indivíduo nas diversas perspectivas motoras, afetivas, sociais e cognitivas

Relação Praticante/regras

- Respeito às regras pré-determinadas da modalidade como tempo, espaço, implementos utilizados, categorias de peso

- Regras adaptadas aos objetivos da aula, as características individuais dos participantes e ao material disponível

Abordagem pedagógica

- Pedagogia Tecnicista

- Pedagogias Humanista, crítico emancipatória e didática comunicativa, e estruturalista

Estratégias de ensino

- Diretamente baseado na pratica sistemática da modalidade

- Não diretiva, lúdica, com a conscientização do sentido de fazer o esporte

Relações interpessoais entre os praticantes

- Adversário, rival, concorrente, inimigo

- Colega, companheiro, parceiro, amigo

Adaptado de COLETIVO DE AUTORES, 1992; BRACHT, 1999; MESQUITA, 2000; AZEVEDO; SHIGUNOV, 2001; BRASIL, 2004a; 

KUNZ, 2006a; LETTNIN, 2005; NEUENFELDT; CANFIELD, 2007; RODRIGUES; DARIDO, 2008; STIGGER; LOVISOLO, 2009; CAMPOS, 2012

    Mesmo com diversos autores evidenciando a necessidade de sua aplicação quando o tema esporte é o foco da aula, Gaya (2000), vai de encontro à teoria da reestruturação (ver quadro 1), afirmando que ao abordar a prática esportiva como conteúdo, inserido na Educação Física Escolar, não há necessidade de reformulação. Segundo o autor minimizar seus aspectos centrais como o rendimento e a competição não muda nada em sua essência: [...] Se o objetivo do esporte na escola é a apropriação da cultura esportiva porque devo redesenhar sua configuração? [...]” (GAYA, 2000, p.10).

    Porém, Gaya (2000), reconhece haver alguns pontos do esporte que precisam ser revisto quando praticado na escola. Segundo o autor o mais evidente é a exclusão da maioria em favorecimento dos mais habilidosos, onde a aula de Educação Física é utilizada para o treinamento das equipes da escola. À prática esportiva realizada na escola, como parte da disciplina curricular ou não, tem objetivos diferentes do esporte profissional, onde se deve priorizar o princípio do auto rendimento, onde todos possam participar e atingirem seus próprios objetivos (GAYA, 2000).

    Já na visão de Kunz (2006a), a principal mudança do esporte dentro da Educação Física escolar deve ser o de garantir que todos os alunos participem da aula, em igualdade de condições, com satisfação e com sucesso em suas práticas. O autor ainda afirma na mesma obra, que dentro de uma metodologia crítico emancipatória, o professor deve ensinar o esporte incluindo conteúdos de caráter teórico práticos ao invés de habilidades e técnicas, de forma que os alunos possam organizar a sua realidade de esporte, movimentos e jogos a favor de suas possibilidades e necessidades (KUNZ, 2006a).

    Conforme Bento (2003), numa nova perspectiva de prática desportiva, a criatividade pode ser um fator motivacional determinante no desenvolvimento da aula, permitindo a criação de novas atividades e adaptação das já existentes na cultura esportiva. O autor cita como exemplo o jogo dos 10 passes. Segundo Bento (2003, p. 25):

    Lembramo-nos do ‘jogo dos dez passes’ (jogo no qual para se obter um ponto a equipe deve trocar dez passes consecutivos evitando a recuperação da bola pela equipe adversária) onde os alunos poderiam estar explorando diferentes formas de passar sem se preocuparem com a questão da técnica de cada modalidade, uma vez que o objetivo neste momento é a compreensão do passe e de alguns fatores que possam estar influenciando o bom desenvolvimento desta ação.

    De acordo com Coletivo de Autores (1992), o desporto quando praticado na escola, deve abranger atividades onde o objetivo privilegie valores como o coletivo, a solidariedade, e o respeito humano. O colega deve ser visto como companheiro, e não como adversário (COLETIVO DE UTORES, 1992).

    Já segundo Lettnin (2005), ao assumir uma proposta como meio de formação humana, a prática esportiva deve flexibilizar seus procedimentos didáticos pedagógicos para se tornar compatível com as capacidades de todos os envolvidos e suas características próprias. O esporte se abordado de forma a valorizar a socialização e o convívio escolar, deve considerar no planejamento da atividade, as diferenças corporais e técnicas entre os alunos, como também questões afetivas (BRASIL, 2004a).

    Um aspecto de exclusão e que deve ser repensado, na opinião Bento (2003), é o espaço do jogo, quando somente os limites formais com dimensões oficiais da modalidade são utilizados, dificulta-se um bom desenvolvimento da aula por parte dos alunos menos experientes, devido às inúmeras possibilidades de ações e a complexidade lógica da atividade. O autor cita o exemplo do Voleibol e a dificuldade dos alunos para pegar a bola sem que ela toque ao chão. Segundo Bento (2003, p.26):

    [...] dentro do nosso entendimento isso talvez se deva ao fato das crianças praticantes ainda não estarem preparadas para responder dentro do lapso de tempo de vôo da bola, às exigências motoras de deslocamento dentro de uma área que pode se mostrar enorme [...].

    Neuenfeldt e Canfield (2007), defendem uma visão particular do esporte quando conteúdo das aulas, o Esporte Prática. Essa concepção tem como objetivo a realização pessoal do praticante através de ações lúdico desportivas, que segundo afirmam os autores, podem oferecer maiores benefícios aos alunos.

    Tendo como referencial a definição de Esporte Prática de Cagigal (1966), que define o esporte como um jogo, praticado de forma lúdico competitiva, Neuenfeldt e Canfield (2007), estabeleceram quatro princípios que devem ser considerados durante a prática desportiva na Educação Física Escolar: Princípio cinestésico, Princípio Lúdico, Princípio Agonístico e o Princípio Ético:

    Só é possível conseguir ensinar o esporte formativo de tal forma que os alunos possam crescer, desenvolver-se e entrar na vida adulta através dele, para assim poder praticá-lo ludicamente, desta maneira podemos chegar a uma prática pedagogicamente correta (KUNZ, 2006a). Rosseto Junior; Costa e D’Angelo (2008 p. 26) afirmam que:

    A boa pedagogia do esporte passa, necessariamente, pela qualidade de seu planejamento, que se relaciona diretamente com a qualidade dos resultados, o que exige dos professores uma postura reflexiva e autônoma no planejamento e na prática pedagógica.

    A partir da inserção de uma pedagogia voltada à formação humana, são estes os benefícios educacionais possíveis através da prática esportiva que gostaríamos de destacar: desenvolver habilidades motoras básicas, estimular as diversas capacidades cognitivas, promover a discussão e possibilitar a transformação de valores, estimular a autoestima, autoconfiança, e tomada de decisões; estabelecer relações de cooperação, empatia e respeito (LETTNIN, 2005; BRASIL, 2004a).

Considerações finais

    Detectamos através dos autores citados em nosso estudo que existem diversas formas de abordagem do esporte a favor de uma reestruturação, num viés diferente do competitivo e seletivo, embora o que vemos no dia a dia escolar na maioria dos casos é uma mera reprodução do esporte de competição nas aulas de Educação Física.

    Pensamos que só o professor pode mudar essa realidade, com planejamento de aulas onde a prática do esporte tenha algum significado cognitivo, motor, afetivo e social para o aluno, ao invés de simplesmente repetir o esporte competitivo e excludente. O primordial objetivo do esporte quando tema na Educação Física Escolar é garantir todos tenham satisfação e igualdades de condições durante as aulas, para assim, poderem usufruir dos benefícios e prazeres deste importante elemento da cultura corporal de movimento, que é o esporte.

    Estamos cientes de que este tema gera muita polemica no meio acadêmico e também que existem diversos estudos apontando inúmeras direções para um prática esportiva na Educação Física Escolar diferente dos moldes do esporte competitivo, contudo, esperamos ter dado nossa contribuição aos professores inseridos na Educação Básica, no intuito de repensarem seus planejamentos e objetivos pedagógicos quando o tema de suas aulas estiver pautado em alguma modalidade esportiva.

Referências

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