Sexualidade e dança do ventre Sexualidad y danza del vientre |
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*Educadora Física formada pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões – campus Erechim, RS **Fisioterapeuta, Mestre em Neurociências e Docente da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões – campus Erechim, RS |
Kelly Patrícia Slaviero* Reni Volmir dos Santos** (Brasil) |
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Resumo A dança do ventre é uma arte milenar que, segundo a literatura, nasceu no leste do Egito, por volta de 7.000 a.C., com o intuito de dançar como forma de celebrar a vida, a saúde, a fertilidade, e também o divertimento. Muitos são os benefícios que tal modalidade proporciona a quem a pratica, como melhora do condicionamento aeróbico, fortalecimento de músculos, diminuição de desconfortos ocasionados nas diversas fases da vida da mulher entre outros. O objetivo deste estudo é de verificar a sexualidade. A amostra foi composta por 13 mulheres, com idade média de 27,15 (± 4,43) anos entre 18 e 40 anos, residentes no município de Erechim, que concordaram com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Realizou-se avaliação quociente de sexualidade – versão feminina, antes e após um programa de dança do ventre, que constou de 2 aulas por semana, com duração de uma 1 hora e 30 minutos, por um período de 2 meses, totalizando 17 aulas.. Na mensuração dos dados sobre a sexualidade, de acordo com o teste empregado, observou-se mudanças positivas estatisticamente significativas. Unitermos: Dança do ventre. Sexualidade.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 19 - Nº 193 - Junio de 2014. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
Lyz (1999) afirma que a dança do ventre não teve origem somente em um país ou em uma região. Recebeu as características dos costumes de cada país onde era praticada, dependendo dos deuses que as sacerdotisas consagravam ou cultuavam em seus rituais, e que esses cultos eram destinados à Deusa Mãe e à fertilidade.
Mas, segundo Braga (2008) e Kaha (2011), devido às guerras, invasões e dominações, as danças que eram antes realizadas apenas em templos, foram levadas até palácios de faraós e acabaram se misturando às danças populares, e sendo popularizadas entre as ruas e mercados, assim consideradas como fontes de disseminação, as sacerdotisas ensinavam às mulheres do povo os movimentos ondulatórios que ajudavam na sexualidade e no trabalho de parto. Também, através dos beduínos e ciganos que por serem nômades, conheceram e vivenciaram várias culturas antigas do oriente, e assim, ajudaram a disseminá-la. Podem-se citar as Ghawazee e as Awalim, que são consideradas as principais divulgadoras da dança. E graças a essas situações e ao contato com diferentes povos, em diferentes regiões que foi possível popularizar a Dança do Ventre.
Sobre a história da Dança do Ventre no Brasil, pode-se dizer que é recente. Tudo começou quando a bailarina Shahrazad Sahid Sharkey (de nome Madeleine Iskandarian), decidiu sair da Palestina para viver e fazer parte da história da Dança do Brasil. Shahrazad, que começou dançar aos sete anos, veio para o Brasil em 1957, até que em meados da década de 70 resolveu resgatar a sua dança, mostrando-a para diversos públicos, dançando em bares de São Paulo. Além de dançar, ela cantava, tornando-se assim a primeira cantora árabe do país. Foi a formadora da primeira geração de bailarinas de Dança do Ventre brasileiras, e a partir delas, houve a difusão por todo o Brasil (LYZ, 1999).
A sexualidade pode ser definida como a união de fatores psicológicos, fisiológicos e sociais e a interação destes fatores resultam em quatro fenômenos: desejos, crenças, valores e motivação. O primeiro refere-se a mecanismos biológicos e neuroendócrinos que são responsáveis pela espontaneidade do desejo sexual; as crenças e os valores se dão por experiências que promovem o interesse sexual e a motivação depende principalmente de fatores emocionais, mas também, interpessoais (KINGSBERG, 2002 apud PINTO NETO; VALADARES; COSTA-PAIVA, 2012).
Em estudos realizados sobre o trabalho de psicoterapia corporal, o precursor dessa psicoterapia, Wilhelm Reich, médico e psicanalista fala sobre sexualidade com idéias diferentes do padrão estipulado por Sigmund Freud. Segundo ele, o indivíduo é constituído de energia vital, sendo esta a energia da sexualidade, que no desenvolvimento do ser humano é reprimida de alguma forma, em alguma fase da vida, podendo trazer dificuldades em alguns aspectos da vida adulta. Em um de seus artigos Reich fala sobre a repressão na primeira infância, e o quanto a intensidade dessa repressão pode causar uma maior e mais complicada compreensão (MORO, 2004).
Segundo Volpi e Volpi (2002 apud MORO, 2004) a primeira fase do desenvolvimento é denominada ocular ou de sustentação que corresponde ao período da gestação; a fase oral ou de incorporação, diz respeito a amamentação e desmame; a terceira fase é chamada de anal ou de produção que e diz respeito ao controle dos esfíncteres, momento no qual a criança mais percebe o seu corpo; a fase fálica, também chamada de identificação é marcada pela descoberta das diferenças sexuais anatômicas, é o reconhecimento da própria sexualidade, e a última fase, a genital, evidencia a masculinidade nos meninos e a feminilidade nas meninas.
Assim, como existe o desejo, existe a inibição do desejo também, o que é muito comum tanto no homem quanto na mulher, ocorrendo perda de interesse. A pessoa, então, não se entrega à gratificação erótica. As causas da inibição podem ser físicas, psicológicas ou culturais (LECH; MARTINS, 2003).
Desta forma, o objetivo desde estudo foi verificar a sexualidade de mulheres não praticantes de exercício físico regular, antes e após um programa de dança do ventre, num período de 2 meses.
Materiais e métodos
A estratégia metodológica utilizada é o estudo quase experimental de caráter quantitativo e longitudinal. A população foi de mulheres adultas com idade entre 18 e 40 anos, não praticantes de exercício regular, residentes no município de Erechim/RS, com uma amostra de 13 participantes com média de idade de 27,15 (± 4,43) anos. Foram incluídas mulheres que concordaram com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Neste momento foi realizada uma apresentação, onde foram mostrados alguns vídeos de dança do ventre e do trabalho da instrutora. Após foram explanados os seguintes itens: história da dança do ventre; justificativa para o nome; aspectos religiosos, festivos e artísticos; as ghawazee e a vulgaridade; história da dança do ventre no Brasil; benefícios físicos e psicológicos; estilos; e folclore.
Na seqüência foi aplicado o questionário denominado Quociente Sexual – Versão Feminina (QS-F) para avaliação da sexualidade, sendo o mesmo reaplicado após o período interventivo. O QS-F foi desenvolvido e validado no Projeto Sexualidade (ProSex) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo em 2006, e é composto por dez questões autorresponsivas que variam em uma escala gradual de 0 a 5, com 0 indicando “nunca” e 5 indicando “sempre”. Essa escala avalia as fases do ciclo da resposta sexual, contemplando, ainda, outros domínios: desejo e interesse sexual (questões 1, 2 e 8); preliminares (questão 3); excitação pessoal e sintonia com o parceiro (questões 5 e 6), conforto (questões 6 e 7), orgasmo e satisfação (questões 9 e 10) (ABDO et al., 2006). Após foram submetidas ao programa de Dança do Ventre, que constou de 2 aulas por semana, com duração de uma 1 hora e 30 minutos, por um período de 2 meses, totalizando 17 aulas. As aulas foram periodizadas em 3 Mesociclos, de 3 semanas cada um. As aulas tiveram todas, a mesma estrutura, sendo esta: início da aula, aquecimento e alongamento em média 10 minutos; desenvolvimento, com movimentos específicos de dança do ventre, trabalhando a região do quadril, região abdominal e membros inferiores, em média 60 minutos; exercícios de alongamento, em média 10 minutos; volta à calma, deitadas, sentadas, ou em pé, em média 5 minutos. Em todos os momentos, foram utilizadas músicas árabes, exceto no momento da explicação.
Em relação aos Mesociclos, o Meso I deu ênfase em movimentos do quadril, o Meso II, incluiu movimentos abdominais, e o Meso III além de movimentos de quadril e abdômen, teve ênfase em exercícios de alongamento.
Como método estatístico, foi utilizado o teste não-paramétrico Wilcoxon (com p<0,05) calculando-se as médias e a significância dos dados obtidos através da avaliação para análise do questionário QS-F.
Esta pesquisa está de acordo com as diretrizes da Resolução 196/1996 do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde, foi encaminhado ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões URI – Erechim, e foi aprovado sob o número 09738912.0.000.5351.
Resultados e discussão
Quanto aos resultados relativos ao desempenho/satisfação sexual, obtidos mediante o escore do questionário QS-F, verificou-se que a maioria das mulheres foram classificadas como estando na categoria regular a bom pré-intervenção e após o grupo se manteve nos dois primeiros escores que são regular a bom e bom a excelente. Neste questionário teve valor significativo onde o valor de p= 0,0021 com significância p<0,05. Conforme apresentado na Tabela 1:
Tabela 1. Avaliação do Quociente Sexual – Versão feminina (QS-F) Pré e Pós – Intervenção.
Na Avaliação do Quociente Sexual, pode-se observar na Tabela que anteriormente à intervenção, o maior número de praticantes apresentavam um desempenho sexual entre regular a bom sendo estas um número de 8, entre bom a excelente, apenas 3, e entre desconfortável a regular, 2. E após o programa, as praticantes ficaram entre regular a bom, e bom a excelente, com os valores de 6 e 7 respectivamente.
A falta de conhecimento sobre a própria sexualidade, de informação sobre fisiologia e resposta sexual, além da ansiedade, depressão, e conflitos conjugais são responsáveis pelo surgimento de problemas, podendo alterar sua resposta sexual. Neste contexto percebe-se claramente a diferença entre sexualidade e relação sexual. A sexualidade é expressa em pensamentos, relacionamentos, atitudes, crenças e sofre influência tanto de fatores externos como fatores biológicos, psicológicos, entre outros. A sexualidade inclui o ato sexual, o prazer, intimidade e reprodução, assuntos estes que são considerados complexos (VIANA et al., 2012).
Muito são os fatores que influenciam tanto positivamente quanto negativamente, e entre os pontos negativos encontramos disfunções como transtorno da disfunção orgásmica (retardo ou ausência de orgasmo após fase normal de excitação), anorgasmia (ausência total de orgasmo), dispareunia (dor recorrente ou persistente durante ou após o ato sexual), vaginismo (espasmo involuntário dos músculos que circundam a vagina, impedindo qualquer penetração) e incontinência urinária (perda involuntária de urina pela uretra). Curiosos estudos realizados por Ferreira, Souza e Amorim (2007 apud VIANA et al., 2012), Laumann, Paik e Rosen (1999 apud SCHVARTZMAN, 2012) e Avis et al. (2000 apud SCHVARTZMAN, 2012) constataram que 36% das mulheres entre 20 e 36 anos de idade têm pelo menos uma disfunção sexual e que isso ocorre entre 20 e 76% das mulheres entre todas as idades.
Viana et al. (2012) procuraram entender o antes e o depois do tratamento de fortalecimento do assoalho pélvico para incontinência urinária. Primeiramente, as mulheres se sentiam envergonhadas, davam desculpas para não manterem relações sexuais com seus parceiros. E após a intervenção, houveram melhoras significativas e como conta Baracho (2007 apud VIANA et al., 2012), o fortalecimento da musculatura feminina aumenta tanto a excitação quanto o apetite sexual.
Com o fortalecimento do assoalho pélvico, aumenta também o prazer durante a relação sexual. Mulheres que antes eram deprimidas, inseguras, com o tempo melhoram, e assim, ficam mais confiantes, ao perceber o aumento de sua força vaginal. Os parceiros, sem serem notificados, em geral, referem com satisfação terem percebido algo diferente no comportamento vaginal, e também em questões psicológicas, sociais, na relação conjugal e familiar (PACIORNIK, 1997).
Outra questão levantada pelo mesmo autor, é que exercícios para o assoalho pélvico ajudam mulheres anorgásmicas a chegar ao orgasmo, e as que têm orgasmo na relação sexual, podem ter orgasmos mais intensos e em maior número. É importante lembrar que os exercícios também atuam de forma terapêutica, reabilitação e prevenção. Com isso, é possível prevenir além da incontinência urinária, a cistocele e o prolapso do útero.
Desta forma, Abrão e Pedrão (2005) afirmam que a dança do ventre é uma forma de expansão saudável da sensualidade e sexualidade feminina, que é importante ser satisfatória e equilibrada, pois através do uso desse tipo de dança se busca uma melhor qualidade de vida. E que os momentos de pós-modernidade suscitam atenção especial aos aspectos da sensualidade e sexualidade feminina, pois a educação sexual inclui toda uma parte preventiva e de conscientização, e visa evitar malefícios do uso inadequado do sexo. Sendo que esses aspectos podem ser trabalhados, também, por meio da dança e, particularmente, da dança do ventre, pois propicia uma aproximação e uma valorização da mulher com o próprio corpo.
Referências
ABDO, C. H. N. et al. Elaboração e validação do quociente sexual-versão feminina; uma escala para avaliar a função sexual da mulher. Revista Brasileira Médica. v. 63, p. 477-482, 2006.
ABRÃO, A. C. P; PEDRÃO, L. J. A. contribuição da dança do ventre para a educação corporal, saúde física e mental de mulheres que freqüentam uma academia de ginástica e dança. Revista Latino-americana de Enfermagem. v. 13, n. 2, p. 243-8, mar/abr, 2005.
BRAGA, V. E. B. O resgate do feminino através da Dança do Ventre: uma forma de ser e estar no mundo. São Paulo, Unicid, 2008. Disponível em: http://www.centraldancadoventre.com.br/trabalhos/vivianebraga2.pdf. Acesso em: 13 nov. 2011.
KAHA, L. História da dança do ventre: o ventre e o corpo no tempo. Dança como metáfora de uma meta-linguagem oculta do corpo. Série metaforma e movimento, v. 1, 2. ed. Mogi das Cruzes, SP: Clube dos autores, 2011a.
LECH M.B.; MARTINS, P.C.R. Oscilações do desejo sexual no período gestacional, Revista de Estudos de Psicologia, PUC-Campinas, v. 20, n. 3, p. 37-46, set/dez, 2003.
LYZ, S. Dança do Ventre - Descobrindo sua Deusa Interior. São Paulo: Berkana, 1999.
MORO, E. A dança do ventre como instrumento na psicoterapia corporal para mulheres. In: Convenção Brasil Latino América, Congresso Brasileiro e Encontro Paranaense de Psicoterapias Corporais. 1, 4, 9, Foz do Iguaçu. Anais... Centro Reichiano, 2004.
PACIORNIK, M. Aprenda a nascer e a viver com os índios: parto de cócoras, desempenho sexual e ginástica indiana. Rio de Janeiro: Rosa dos tempos, 1997.
PINTO NETO, A.M.; VALADARES, A.L.R.; COSTA-PAIVA, L. Climatério e sexualidade. Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, v.35, n.3, p. 93-96, 2012.
SCHVARTZMAN, R. Avaliação do potencial de ativação mioelétrico do assoalho pélvico, qualidade de vida e função sexual de mulheres climatéricas com e sem dispareunia. 2012. 82 f. Dissertação (mestrado em ciências médicas). Faculdade de medicina. UFRGS. Porto Alegre, 2012.
VIANA, S.B.P.; VOLKMER, C.; KLEIN, J.A.; PINCEGHER, D. Incontinência Urinária e Sexualidade no cotidiano de mulheres em tratamento fisioterápico: uma abordagem qualitativa. Saúde e Transformação Social, Florianópolis, v. 3, n. 4, p. 62-70, 2012.
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