Resenha do livro ‘Ensinando Educação Física nas Séries Iniciais: desafios e estratégias’ Reseña del libro ‘Enseñando Educación Física en los grados iniciales: desafíos y estrategias’ |
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Mestrandas em Ciências do Movimento Humano UFRGS (Brasil) |
Mariele Santayana de Souza Maitê Venuto de Freitas |
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Resumo Esta resenha crítica tem como objetivo abordar o livro “Ensinando Educação Física nas Séries Iniciais: desafios e estratégias” publicado em 2006 pelas autoras Nadia Cristina Valentini e Adriana Marques Toigo. Palabras clave: Libro. Resenha. Educação Física. Séries Iniciais.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 19 - Nº 193 - Junio de 2014. http://www.efdeportes.com/ |
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O livro “Ensinando Educação Física nas Séries Iniciais: Desafios e Estratégias” (VALENTINI, Nadia Cristina, TOIGO, Adriana Marques. Editora Salles, Canoas 2006) aborda em suas 139 páginas uma proposta de ensino voltada para o processo de aprendizagem, destacando a importância da mediação do professor nesse processo. O livro é dividido em três partes. A primeira “Desenvolvendo uma proposta pedagógica” trata sobre uma proposta de ensino a partir do conhecimento do contexto de trabalho e dos alunos. A segunda “Estratégias educacionais” fala sobre as estratégias motivacionais, de aprendizagem e de avaliação de um programa de Educação Física. A terceira “Sugestões de atividades” sugere uma série de atividades práticas baseadas nos temas abordados no livro.
Na primeira parte do livro as autoras destacam três pontos relevantes para um bom programa de ensino:
o conhecimento do contexto do aluno;
as metodologias de ensino utilizadas e a
organização do ambiente para favorecer a aprendizagem.
Em relação ao contexto são abordados temas relacionados aos problemas enfrentados por professores de Educação Física nas escolas, como a desvalorização, os materiais e espaços disponíveis, os conflitos entre os professores de Educação Física e de outras disciplinas, a motivação dos professores e a falta de um programa estruturado para a disciplina. É chamada a atenção para as necessidades de conhecer as características físicas, cognitivas, sócio-afetivas e o desempenho motor dos alunos, o que auxilia na motivação e potencializa a aprendizagem de todas as crianças.
Em relação às metodologias são citadas as concepções metodológicas utilizadas por outros autores baseadas na técnica e no jogo, métodos que as autoras não percebem como antagônicos. A partir dos dois métodos é proposto um terceiro que envolve a combinação do jogo e da técnica, uma vez que trabalhando a tática e a técnica juntamente, beneficia o desenvolvimento das habilidades motoras e cognitivas. Na metodologia proposta os jogos são praticados em diferentes contextos e com variações de complexidade. Jogos com habilidades motoras fundamentais beneficiam o desenvolvimento técnico ao utilizarem essas habilidades, assim como também beneficiam o desenvolvimento tático a partir das situações problemas que ocorrem durante os jogos. As autoras destacam que para que essa proposta se concretize nas aulas são necessárias adaptações nas regras dos jogos e esportes conforme o desenvolvimento físico, cognitivo e social da turma. Outro ponto de destaque é a prioridade que deve ser dada ao trabalho das habilidades motoras fundamentais nas aulas de Educação Física, uma vez que essas habilidades são básicas para a prática de atividades mais complexas, como por exemplo as esportivas. Além disso, a prática e domínio dessas habilidades aumentam a probabilidade de manutenção de um estilo de vida ativo e saudável ao longo da vida.
A criação de um ambiente favorável a aprendizagem também é um fator importante para o desenvolvimento social das crianças. Para isso, é importante incentivar e promover o convívio em grupos com diferentes características, incluindo crianças com e sem deficiências em um mesmo grupo, assim promovendo o desenvolvimento de todos e valorizando a diversidade. A partir da convivência com as diferenças as crianças constroem valores que auxiliarão a enfrentar os problemas relacionados à viver em sociedade. Outra estratégias utilizada para criar um ambiente favorável é a construção de protocolos juntamente com os alunos. Os protocolos visam aumentar o tempo ativo e diminuir os conflitos existentes nas aulas, uma vez que com a participação das crianças, as regras passam a ter um significado para elas. Para maximizar o tempo de aula as combinações podem estar relacionadas à entrada e saída da aula, início e fim das atividades, organização dos materiais, das equipes e as regras de convivências. A organização do espaço da aula também auxilia no aumento do tempo ativo, ao evitar indisciplina e acidentes. Por exemplo, organizar os materiais de forma que as crianças se movimentem livremente sem colidirem nos colegas e nos materiais auxilia no aumento do tempo ativo. Além disso, a utilização de materiais adequados a faixa etárias dos alunos também é um ponto relevante para aumentar o engajamento das crianças.
Na segunda parte as autoras falam sobre as estratégias educacionais, enfatizando as estratégias motivacionais, de aprendizagem, de avaliação e estratégias para uma prática apropriada. Em relação às estratégias motivacionais a participação dos alunos na construção do currículo é um meio de motivá-los nas aulas, uma vez que elas passam a ser ativas no processo ensino-aprendizagem. Conhecer as experiências prévias dos alunos e a partir disso planejar o currículo propicia um maior conhecimento e domínio de novas habilidades, tendo em vista que novos desafios e aprendizado de novos conteúdos aumentam a curiosidade e motivação dos alunos para aprender. Uma forma de motivá-los é trabalhar as habilidades motoras fundamentais associadas a jogos para que eles percebam a utilidade e importância dessas habilidades para o sucesso nos jogos e assim tenham prazer em praticá-las. Ao praticarem as habilidades motoras, elas passam a ter mais sucesso nas tentativas de execução e passam a dar atenção as táticas de jogo, assim refletindo sobre os desafios do jogo e como solucioná-los. Além disso, materiais quando adequados ao desempenho motor e em quantidade adequada influenciam na motivação dos alunos. Outro fator importante relacionado a motivação é a percepção de competência. Crianças se envolvem mais em atividades que se percebem competentes. Dessa forma, níveis diferentes de dificuldade em uma mesma tarefa, assim como deixar a criança optar pelo nível que se acha capaz de atingir o sucesso, é um importante meio de melhorar suas habilidades, sua percepção de competência, consequentemente, tornando-os mais motivados a prática das atividades propostas.
A respeito das estratégias de aprendizagem as autoras destacam que tais estratégias otimizam o aprendizado dos alunos. Estudos tem reportado o baixo engajamento nas aulas de Educação Física devido ao tempo excessivo esperando em filas, ouvindo instruções dos professores, deslocando-se ao local das aulas, além do pouco interesse dos alunos, o que prejudica o aprendizado das habilidades motoras. Como estratégias para aumentar o engajamento dos alunos, as autoras citam a criação de um protocolo, a redução do tempo de instrução e a utilização de estratégias de aprendizagem, por exemplo a demonstração, dicas verbais e feedback. A demonstração pode ser executada de diferentes maneiras, como o professor, os colegas ou figuras do movimento. Quando a demonstração é realizada por colegas propicia que a turma observe as dificuldades encontradas e reflita sobre como melhorar o movimento. Em relação as dicas verbais, as autoras enfatizam a necessidade das dicas serem curtas e significativas. A participação dos alunos na criação das dicas verbais auxilia que elas sejam adequadas a linguagem da turma, facilitando o entendimento delas. Assim como a demonstração e as dicas verbais, o feedback também é fundamental para corrigir e melhorar os movimentos. Ele pode ser intrínseco ou extrínseco e pode ser voltado para o resultado (quando os alunos já possuem maior experiência no movimento) ou para o processo do movimento (quando os alunos estão iniciando a prática de uma nova habilidade).
Em relação às estratégias de avaliação as autoras afirmam que as avaliações devem ocorrer durante as aulas, em uma unidade de ensino, ao decorrer do ano e também com a participação dos alunos. As avaliações do comportamento motor são muito importantes para que o professor tenha um panorama da aprendizagem e desenvolvimento motor dos alunos, da existência ou não de atrasos motores e se suas estratégias de ensino e metodologia estão adequadas ao grupo. As autoras destacam que as avaliações podem ser tanto de produto, quanto de processo; sendo cada tipo mais indicado conforme o momento da aprendizagem. Para crianças que já dominam as habilidades, a avaliação mais indicada é a que avalia o produto do movimento; por outro lado, para as fases iniciais de aprendizagem em que as crianças ainda não dominam os movimentos a avaliação mais indicada é a que analisa o processo. Dessa forma, elas destacam a importância de monitorar todo o processo de aprendizagem. Tendo em vista que as avaliações devem abarcar questões de diferentes domínios, são sugeridas no livro tabelas avaliativas para cada conteúdo.
Para avaliar o desempenho motor deve-se ater a diferentes questões como ao a) desenvolvimento das habilidades motoras fundamentais a partir dos movimentos corporais dos alunos; b) comportamento de segmentos corporais importantes para o sucesso nas habilidades, c) níveis de proficiência ao longo do ano ou de anos; d) desenvolvimento das diferentes áreas simultaneamente (habilidades motoras fundamentais, conceitos e socialização); d) reconhecimento das diferentes partes do corpo; e) processual da utilização de habilidades motoras em situações abertas (por exemplo, em jogos), f) desempenho individual e coletivo em relação a estratégias de jogo em jogos e esportes com rede; g) comportamento em jogos de invasão e h) produto de habilidades motoras fundamentais. Para avaliar a conduta social deve-se ater as interações sociais e aos comportamentos em aula, focando no a) sentimento do aluno em relação à Educação Física e b) na expressão física e verbal a respeito dos conhecimentos de aula.
Ao falarem das estratégias para a prática apropriada as autoras enfatizam que é necessário proporcionar práticas adequadas ao desenvolvimento de todas as crianças, independente do seu nível de habilidade. Nessa perspectiva, elas exemplificam através dos Parâmetros Curriculares Nacionais e Council on Physcal Education Practice for Children, que são dois parâmetros diferentes que organizam formas apropriadas de práticas abordando diferentes aspectos. Nesse sentido, propostas pedagógicas adequadas ao desenvolvimento dos alunos propiciam maior valorização dos conhecimentos relacionados a Educação Física por parte dos próprios professores da disciplina, dos professores de outras disciplinas e também dos alunos.
Na terceira parte do livro as autoras trazem atividades que foram desenvolvidas em escolas públicas de Porto Alegre. Elas enfatizam que não pretendem dar receitas, mas sim sugestões que devem ser adaptadas conforme o grupo em que se está trabalhando.
Há um esforço das autoras para exemplificar na prática cada discussão levantada no livro. Os exemplos de aulas são a concretização das teorias e ideias expostas, havendo uma relação entre teoria e prática. Na exposição de todas ideias é utilizada uma linguagem de fácil entendimento, sendo acessível para pessoas sem formação em Educação Física e também acessível e extremamente útil para professores já formados. Apesar do livro ser voltado para séries iniciais, destacamos a relevância dos temas abordados para todas as séries escolares e também para aulas de esportes específicos comumente ofertadas fora da escola, os quais sendo adaptados a faixa-etária e desenvolvimento de alunos mais velhos são de extrema importância para o sucesso no aprendizado de alunos de diferentes idades.
Em cada capítulo do livro há uma parte sobre as experiências das autoras, nas quais elas comentam fatos já ocorridos em aulas da rede pública de ensino, como aplicaram as ideias propostas no capítulo e como solucionaram os problemas. Essas situações problemas e as soluções encontradas pelas autoras auxiliam os professores que buscam a leitura do livro na elaboração de novas estratégias de resoluções de problemas. Nesse ponto, destaca-se a importância dessas partes, principalmente se pensarmos em professores iniciantes, tendo em vista as dificuldades enfrentadas por esses profissionais em virtude da menor experiência prática.
Ao final do livro há um capítulo somente com exemplos de aulas a partir das ideias propostas ao longo da obra. Nessa parte é mostrado como são agrupados e aplicados todas as práticas propostas ao longo do livro. Isso é essencial para o esclarecimento de como colocar em prática a ideia de que os conteúdos técnicos devem ser aprendidos juntamente com a tática e com o jogo, principalmente para profissionais pouco experientes ou que não tem conhecimento da metodologia adotada.
A forma como o livro foi organizado relaciona o desenvolvimento das habilidades motoras ao desenvolvimento dos outros domínios dos sujeitos. As autoras mostram que a partir do aprendizado de habilidades básicas também se desenvolvem outros aspectos da vida, como psicológico (ex.: percepção de competência e motivação), sociais (ex.: promoção de grupos inclusivos) e cognitivos (ex.: desenvolvimento da tática em jogos). Além do desenvolvimento de aspectos relacionados a diferentes domínios da vida, o aprendizado de habilidades motoras fundamentais vem sendo associado a benefícios relacionados a saúde. Uma das grandes preocupações atuais é a redução dos níveis de atividade física já durante a infância, a qual é caracterizada por um período ativo da vida (GALLAHUE; OZMUN, 2005) e que o aprendizado de habilidades básicas é influenciado pelo envolvimento em atividades ativas (HAGA, 2008). Estudos (FISHER et al., 2005; WILLIAMS et al., 2008; SPESSATO; GABBARD; VALENTINI, 2013) reportam que crianças mais ativas não mais habilidosas do que crianças menos ativas. Dessa forma, a proposta centrada no aprendizado de habilidades motoras fundamentais também pode auxiliar na promoção de um estilo de vida ativo e prevenção de problemas relacionados a inatividade física. Sendo assim, destaca-se que o livro aborda os diferentes domínios do desenvolvimento humano, não ficando centrado somente no movimento.
O tema avaliação abordado no livro é um fator importante para as aulas de educação física, tendo em vista que muitos professores ainda encontram dificuldades de avaliar os alunos sem uma bateria de testes. São dados exemplos de diversas tabelas que avaliam diferentes domínios abordados na educação física, as quais são de fácil adaptação conforme o conteúdo abordado pelo professor. As tabelas são baseadas no processo de aquisição das diferentes habilidades (sociais, cognitivas e motoras), facilitando o acompanhamento contínuo do aprendizado dos alunos. Além disso, essas tabelas não buscam nivelar os alunos conforme os níveis de habilidades, como muitas vezes é visto nas aulas de educação física escolares. Ainda mais, o acompanhamento contínuo possibilita que o professor perceba os pontos fortes e frágeis do seu planejamento, permitindo que, caso necessário, ele modifique-o ao longo do período das aulas conforme as necessidades dos alunos, não prejudicando o aprendizado das crianças.
Na área da Educação Física carecemos de propostas de ensino para as séries iniciais, uma vez que os Parâmetros Curriculares Nacionais abordam de maneira muito ampla e subjetiva os objetivos e conteúdos a serem trabalhados nas séries iniciais. Nesse sentido, o livro preenche essa lacuna encontrada na área de Educação Física, apresentando de maneira clara e objetiva uma proposta de ensino fundamentada no desenvolvimento global de crianças nas séries iniciais. Portanto, o livro é de grande relevância para pessoas que trabalham com crianças nas séries iniciais, para alunos e professores de Educação Física que trabalham com crianças em diferentes séries, tendo em vista a facilidade de adaptação do conteúdo, e também para pessoas que se interessem por assuntos relacionados à infância e à criança.
Referências bibliográficas
FISHER, A.; REILLY, J. J.; KELLY, L. A.; MONTGOMERY, C.; WILLIAMSON, A.; PATON, J. Y.; GRANT, S. Fundamental movement skills and habitual physical activity in Young children. Medicine and Science in Sports and Exercise, v. 37, n. 4, p. 684-688, 2005.
GALLAHUE, D. L.; OZMUN, J. C. Compreendendo o desenvolvimento motor: bebês, crianças, adolescentes e adultos. São Paulo: Phorte, 2005.
HAGA, M. The relationship between physical fitness and motor competence in children. Child: Care, Health and Development, v. 34, n. 3, p. 329-334, 2008.
SPESSATO, B. C.; GABBARD, C.; VALENTINI, N. C. The role of motor competence and body mass index in children’s activity levels in physical education classes. Journal of Teaching in Physical Education, v. 32, p. 118-130, 2013.
VALENTINI, N. C. VALENTINI, N. C.; TOIGO, A. M. Ensinando educação física nas séries iniciais: desafios e estratégias. Canoas: Unilasalle, Salles, 2006.
WILLIAMS, H. G.; PFEIFFER, K. A.; O’NEILL, J. R.; DOWDA, M.; MCIVER, K. L.; BROWNS, W. H.; PATE, R. R. Motor skill performance and physical activity in preschool children. Obesity, v. 16, n. 6, p. 1421-1426, 2008.
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