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Qualidade de vida de cuidadores de crianças 

atendidas em serviço de neurologia infantil

La calidad de vida de los cuidadores de los niños atendidos en el servicio de neurología infantil

 

*Discente do Curso de Fisioterapia

da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA)

**Docente do Curso de Fisioterapia

da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA)

Maurício Santana Pires*

Eloá Maria Dos Santos Chiquetti**

mauricio.spires@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Introdução: Saber lidar com uma criança que demanda mais cuidados do que se espera de uma criança típica é um desafio ainda presente no mundo contemporâneo, ainda que façamos parte da era da velocidade da informação e tecnologia avançadas. Dessa forma, e sabendo-se que o número de estudos que contemplem cuidadores dessas crianças é desigual, desfavorecendo os primeiros, é que se objetivou averiguar a percepção de saúde de cuidadores de crianças atendidas em um serviço de Neurologia Infantil de Uruguaiana/RS/Brasil. Método: 43 pais e/ou cuidadores responderam ao questionário WHOQOL-Bref em sua versão abreviada e na língua portuguesa. Resultados: Quase a totalidade da amostra foi composta por mulheres, donas de casa, na faixa dos 35 anos. A média de pontuação da amostra foi 68 pontos, numa escala de 0 a 100, onde 0 é o pior resultado possível e 100 o melhor. Conclusão: Corroboraram-se muitos dados encontrados na literatura, e constatou-se que este estudo pode e deve ser encarado apenas como um início de trabalho, pois muitas outras variáveis podem ser cruzadas a fim de que se possa conhecer melhor a realidade de pais e cuidadores de crianças portadoras de deficiências.

          Unitermos: Qualidade de vida. Cuidadores. Neurologia Infantil.

 

Abstract

          Introduction: Dealing with a child who requires more care than is expected of a typical child is still present in the contemporary world challenge, even though we are part of the era of speed and advanced information technology. Therefore, and given that the number of studies that address caregivers of these children is uneven, disadvantaging the first, which is aimed at investigating the perception of health of caregivers of children attending a service of Child Neurology Uruguaiana/RS/ Brazil. Method: 43 parents and/or caregivers replied to WHOQOL - Bref in its shortened version and in the English language. Results: Almost the entire sample was composed of women, housewives, in the range of 35 years. The average score was 68 points, on a scale of 0 to 100, where 0 is the worst possible outcome and 100 the best. Conclusion: It is corroborated many data in the literature, and found out that this study can and should be viewed only as an early work, because many other variables can be crossed so that we can better understand the reality of parents and caregivers of children with disabilities .

          Keywords: Quality of life. Caregivers. Child Neurology.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 19 - Nº 193 - Junio de 2014. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    As doenças neurológicas na infância têm sua repercussão do diagnóstico no seio fami­liar, pois marcam a crise de perda de um filho perfeito, bem como a tarefa de se ajustar e aceitar a criança e a sua deficiência ou sua seqüela neurológica. Essa situação desencadeia reações que dependem, em última instância, de fa­tores como o grau de instrução, conceitos e preconceitos familiares, fatores de ordem cultural, bem como o tipo de abordagem utilizada pela equipe de saúde no início do processo e no acompanhamento do caso. Ao lidar com crianças com algum tipo de proble­ma motor e/ou cognitivo-comportamental, é natu­ral que ocorram problemas de ordem significativa para os cuidadores, pois quando há o acometimento da patologia na criança, tem-se um impacto na dinâmica interna de uma família, associado ao fato de que todos ficam con­frontados com uma diferente realidade, exigente de novas funções. As famílias se sentem temerosas em seu papel de cuidador do filho, não sabem como proceder nesse cui­dado e não se sentem preparadas para o enfrentamento dessa condição clínica. Isso tanto pode gerar conflitos como mudar completamente a rotina familiar, afetando geralmente a mãe (PRUDENTE, 2010).

    Um dos principais desafios para os pais é abordar efetivamente os problemas crônicos de saúde da criança, enquanto mantêm as exigências da vida diária (ROCHA et al., 2008). Tal fato pode resultar, em alguns casos, em comprometimento da saúde física e do bem-estar psicológico dos familiares. Há que se acrescentar, ainda, que muitas vezes são as mães que assumem o cuidado dos filhos, o que traz tanto pre­juízos financeiros, como também nas demais funções da família. (CARVALHO, 2010; GONDIN, 2009) A suscetibilidade dos pais das crianças com necessidades especiais à sobrecarga resultante do processo de cuidar de seus filhos varia de acordo com sua habilidade em lidar com os fatores estressores e com diferentes níveis de tolerância aos eventos vitais. Esta experiência estressante afeta as mães em quase todos os aspectos de suas relações e, muitas vezes, leva-as ao isolamento social, a desenvolverem estresse profundo, depressão e uma diminuição subjetiva na qualidade de vida. (MIURA & PETEAN, 2012)

    A Organização Mundial de Saúde (OMS), por sua vez, define o conceito de qualidade de vida fundamentando-o em três pressupostos: subjetividade, multidimensionalidade e presença de dimensões tanto positivas como negativas. Assim, define-se qualidade de vida como “a percepção do indivíduo de sua posição na vida, no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações” (The WHOQOL Group, 1998, Fleck et al., 2000).

    Eker e Tuzun (2004) reforçam a necessidade de avaliar a qualidade de vida, tanto de mães quanto de crianças com paralisia cerebral, e Florian e Findler (2001) elucidam as relações entre a saúde mental e o ajustamento marital destas mães.

    Dessa forma, e com o aditivo da escassez de estudos na literatura que contemplem a qualidade de vida de pais e cuidadores de crianças com necessidades especiais é que se objetivou a realização deste trabalho.

Método

    Este é um estudo quantitativo em que a população da amostra foi constituída por pais e/ou cuidadores de crianças atendidas no Estágio de Fisioterapia em Neurologia Infantil da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA) Campus Uruguaiana/RS.

    Como instrumento, foi utilizada a WHOQOL-Bref (World Health Organization Quality of Life), versão abreviada, em sua versão em português, traduzida e validada por Fleck et al. (1999). Elaborada em 1998 pela OMS, a escala WHOQOL tem sido amplamente utilizada no contexto da saúde, em diferentes realidades socioculturais, com ênfase na percepção do próprio respondente avaliado (FLECK, 2000).

    Ao responder às questões do questionário, como por exemplo, a número 1 “Você diria que sua saúde é” ou a número ou a 7 “Quanta dor no corpo você teve durante as últimas 4 semanas?”, sempre com opções de múltipla escolha, o indivíduo estará fornecendo informações acerca de sua capacidade funcional, limitação por aspectos físicos, dor, estado geral de saúde, vitalidade, aspectos sociais, limitação por aspectos emocionais e saúde mental, pois as perguntas têm esse ensejo.

    Anteriormente ao procedimento da resolução do questionário, foi apresentado o Termo de Consentimento livre e esclarecido aos cuidadores, e somente após a concordância – caso houvesse - e assinatura dos mesmos é que se procedeu a resolução do questionário propriamente dito. Houve devida e anterior explanação sobre o objetivo do estudo, bem como a forma que deveria ocorrer a resolução do questionário. Foram sanadas todas as dúvidas que por ventura surgissem, de modo que se tivesse o mínimo de erro possível neste processo.

    Os critérios de inclusão no estudo foram basicamente pertencer ao serviço oferecido pelo Estágio na forma de pai, mãe ou cuidador na criança, passando a maior parte do tempo com a mesma, além de assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Como fator de exclusão considerou-se, além de indivíduos que não pertenciam ao serviço, indivíduos analfabetos e/ou analfabetos funcionais. Não observou-se o fato de o (a) cuidador (a) ser maior de idade para que este (a) pudesse responder ao questionário, contanto que assinasse o TCLE.

Resultados e discussão

    Dos 52 (cinqüenta e dois) pais e/ou cuidadores cujos filhos estão inseridos nos serviço, 3 (três) não quiseram participar da pesquisa, preferindo se resguardar em seus motivos, 2 (dois) responderam de forma equivocada o questionário e não houve tempo hábil para que se retomasse o processo, e outros 4 (quatro) cuidadores não puderam levar seus filhos aos atendimentos por motivos de doença e/ou internação hospitalar dos filhos, consultas médicas em outras cidades ou dificuldade de transporte em razão de mau tempo no período de aplicação do mesmo, de modo que restaram, ao final, 43 questionários respondidos.

    A grande maioria dos cuidadores que responderam ao questionário o fez enquanto seus filhos estavam sendo atendidos, numa antessala dotada de cadeiras confortáveis para que pudessem realizar a tarefa da melhor maneira possível. Entretanto, alguns pais preferiram levar o instrumento para suas residências.

    O distúrbio mais freqüente no local de atendimento foi a Encefalopatia Crônica Não Progressiva da Infância (ECNPI) ou simplesmente, paralisia cerebral, distribuídas nas suas mais diversas formas de manifestação (quadriplegia, diplegia, hemiplegia, espástica, atetóide, etc.), porém, há ainda casos de mielomeningocele e lipomielomeningocele, atraso no desenvolvimento sensório-motor, Síndrome de Legg Calvé Perthes, Síndrome de Pierre Robin, paralisia braquial obstétrica, Síndrome de Down, Síndrome de Angelman e Esquizencefalia.

    Neste estudo não se procurou fazer distinção quanto à natureza das patologias, nem o grau de acometimento das crianças, de modo que essa relação poderá ser feita num estudo futuro.

    Os dados obtidos na contabilização dos questionários foram tabulados no Programa Microsoft Office Excel em sua versão 2007, e analisados através de estatística descritiva, utilizando-se média e desvio padrão.

    A média geral de idade da amostra foi de 35,74±9,70 anos, com grande prevalência do gênero feminino, com 41 dos 43 pais ou cuidadores, ou 95,34% da amostra, como refere a tabela a seguir:

Tabela 1. Distribuição da idade e sexo da amostra.

    Esses dados, seja pela prevalência do gênero feminino e também as idades similares dos cuidadores corroboram os resultados encontrados por MIURA & PETEAN, 2012, que encontraram em seu estudo uma média de 33,6 anos numa amostra de 15 mães.

Quanto à ocupação, mais da metade da amostra (25 cuidadores, ou 58% da mesma) respondeu ser “do lar”.

Gráfico 1. Distribuição das ocupações da amostra

    Os resultados encontrados no presente estudo são similares ao estudo de MIURA & PETEAN, 2012, que encontrou 53% das mães analisadas como sendo “do lar”.

    Destas, apenas 8 possuem um tempo de dedicação exclusiva à casa superior à idade da criança. O restante, ou optou por isso a fim de se dedicar unicamente ao filho (a) ou não respondeu o tempo a que se dedica ao lar, de forma exclusiva.

Gráfico 2. Tempo de exercício das atividades em geral exercidas pela amostra

    A média geral da percepção de qualidade de vida dos cuidadores foi de 68,60 pontos, numa escala que vai de 0 a 100, onde zero é o pior resultado e 100 o melhor.

    Com relação à Capacidade Funcional, a média foi a maior: 79,5 pontos, seguida por Aspectos Sociais (77), Saúde Mental (71), Estado Geral de Saúde (69), Dor (67), Vitalidade (64), Limitação por Aspectos Físicos (63), e a pior média foi a Limitação por Aspectos Emocionais, com 55 num total de 100 pontos possíveis.

Gráfico 3. Média geral de cada aspecto do SF-36

    YOUNG et al. (2002) sugerem que rotina de cuidados com os filhos fazem-nas negligenciar os cuidados com elas mesmas, suprimindo a percepção do seu próprio bem-estar.

    Logicamente que estes resultados aqui obtidos sujeitos a sensíveis variações, de acordo com o dia, a hora, temperatura ambiente e estado emocional dos filhos ou deles mesmos.

    Fazendo uma relação de gênero, corroborada por Rizzo (2001), que cita que “as repentinas mudanças geram conflitos e bruscas alterações na rotina, ficando geralmente a mãe com a maior sobrecarga”, ressalta-se que havia apenas 2 homens na amostra, e que a média deles foi de 86,34, enquanto a das mulheres foi de 69,41 pontos, denotando uma importante diferença estatística. Ainda, a melhor e a pior média de pontos pertenceram também ao gênero feminino, com 98 e 41 pontos, respectivamente.

    A relação da gravidade dos filhos com a percepção da qualidade de vida dos pais e cuidadores parece ser uma variável importante de ser observada, e será mais bem destacada em estudos posteriores, com parâmetros e critérios bem definidos para tal. Porque segundo Dumas (1991), crianças com disfunção motora mais grave apre­sentam menor independência para desempenhar habilidade funcional e conseqüentemente, maior dependên­cia do auxílio do cuidador.

Conclusão

    Através da aplicação do Questionário de Qualidade de Vida (SF-36) em sua versão abreviada e traduzida para o português observou-se que a percepção da qualidade de vida dos pais e cuidadores de crianças acometidas pelos mais diversos distúrbios é relativamente baixa. O próximo passo é verificar e comparar os dados obtidos nessa pesquisa com pais e cuidadores de crianças típicas, e ainda, correlacionar o grau de acometimento das crianças com a percepção da saúde por parte desses cuidadores, a fim de que se tenha um importante diagnóstico e, a partir dele, possa haver o planejamento e a proposição de estratégias que visem a melhoria na percepção e, fundamentalmente, da qualidade de vida de pais e cuidadores de crianças portadoras de necessidades especiais.

Referências bibliográficas

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  • MIURA & PETEAN Paralisia cerebral grave: o impacto na qualidade de vida de mães cuidadoras - Advances in Health Psychology, 20 (1-2) 7-12, Jan.-Dez., 2012.

  • PRUDENTE COM, Barbosa MA, Porto CC. Relação entre a qualidade de vida de mães de crianças com paralisia cerebral e a função motora dos filhos, após dez meses de reabilitação. Rev Latino-Am Enfermagem, 2010; 18:149-55.

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  • ROCHA AP; Afonso DRV; Morais RLS. Relação entre desempenho funcional de crianças com paralisia cerebral e qualidade de vida relacionada à saúde de seus cuidadores. Fisioter Pesq 2008; 15:292-6. Consulta: novembro/2013.

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