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A Tendência Progressista Libertadora como teoria 

norteadora para a prática pedagógica na Educação Física

La Tendencia Progresista Liberadora como teoría orientadora para la práctica pedagógica en Educación Física

 

*Doutorando em Educação pela PUC-GO

Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás

**Mestrando em Educação Física pela UCB

***Acadêmica de Educação Física da UNIVERSO

Goiânia, Goiás

(Brasil)

Alcyr Alves Viana Neto*

alcyr.ifg@gmail.com

David Junger da Fonseca Alves**

davidjunger@hotmail.com

Ana Lúcia Junger da Fonseca Alves***

anajngr@gmail.com

 

 

 

 

Resumo

          O objetivo deste trabalho foi apresentar a influência da tendência Progressista Libertadora em relação às abordagens pedagógicas da Educação Física de cunho Dialético. Foi utilizado um estudo teórico (bibliográfico) como tipo de investigação. De acordo com a literatura, as abordagens pedagógicas Sistêmica e Crítica-Emancipatória da Educação Física, sofrem grandes influências da pedagogia progressista Libertadora de Paulo Freire, já que sua proposta pedagógica se opõe a uma educação adestradora e alienante. Conclui-se, que a tendência progressista, foi de grande importância numa proposta de Educação Física contra as falsas ilusões do esporte de alto rendimento implantadas no âmbito escolar pelas pedagogias Positivistas.

          Unitermos: Educação Física. Educação. Tendência Progressista.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 19 - Nº 193 - Junio de 2014. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Pode-se afirmar que a Educação sempre fez parte de nossas vidas, seja através da formalidade nos estabelecimentos de ensino ou através dos espaços pedagógicos do lar, da rua, dos parques, das igrejas e outros. Comenius (século XVII), considerado o pai da didática, foi um dos primeiros estudiosos da educação a propor a difusão dos conhecimentos educativos a todos, sugerindo a sistematização de regras e princípios para uma educação universal. Seus trabalhos, com base em princípios éticos e religiosos que concebiam o homem como uma manifestação divina, eram considerados inovadores e contrários aos interesses conservadores da nobreza e da igreja católica, cujo poder, era, na época, inquestionável.

    Segundo Libâneo (1994), Comenius propunha a educação como um meio de ligação com Deus, desta forma, deveria ser um direito natural de todos. Para Comenius, a didática deveria estudar as peculiaridades da educação e os métodos de ensino de acordo com o desenvolvimento natural do homem. O conteúdo deveria ser ensinado em partes, respeitando a compreensão da criança, partindo do conhecido para o desconhecido, do simples para o complexo.

    Após o período militar em 1984, parte da sociedade almejava restabelecer um estado democrático de direito em nosso país. Este desejo conduziu a população a diversos movimentos sociais na busca pela participação nas decisões políticas e sociais.

    Observa-se que a emergência de um movimento social para resgatar uma nação democrática, levou os educadores a criticarem a forma de como a didática vinha sendo aplicada no âmbito educacional, no caso a tendência liberal tecnicista. Estas críticas vinham de professores adeptos as teorias críticas da educação, que buscavam uma educação que se opunha a reprodução do saber acumulado, da legitimação da cultura dominante e do encaminhamento dos educandos para os postos de trabalho diferenciados.

    Continuando nesta discussão, no primeiro momento são propostas as teorias crítico-reprodutivistas que fortaleciam a necessidade de analisar a relação entre a educação e a sociedade, dando prioridade as discussões das relações sociais no contexto de uma sociedade de classes.

    Para Saviani, havia dificuldade em implantar a teoria crítico-reprodutivista, em virtude das dificuldades do professor em desenvolver uma prática pedagógica crítica, pois esta teoria acabava situando sempre “no âmbito da violência simbólica, da inculcação ideológica, da reprodução das relações de produção”. Desta forma, para que o educador pudesse cumprir suas atribuições, era “(...) é necessário que os educadores desconheçam seu papel; quanto mais eles ignoram que estão reproduzindo, tanto mais eficazmente eles reproduzem.” (2008, p.67).

    Libâneo (1994) mostra que após o período militar, especificamente em 1985, houve pesadas críticas à estrutura sociopolítica do Brasil e às políticas de educação que vigoravam naquele momento. Mas as ideias Marxista acabaram influenciando significativamente a política de esquerda no país, que começaram a fazer fortes críticas às políticas de ensino.

    Diante dessas indagações e conflitos gerados na sociedade, na busca de mais qualidade no ensino, os teóricos da linha crítica, especificamente aqueles vinculados ao materialismo histórico dialético, buscam romper com as tendências não-críticas e reprodutivista, criando a tendência progressista (crítica), na intenção de orientar a prática docente na busca de uma sociedade igualitária.

    Segundo Libâneo (1994) a pedagogia progressista designa as tendências que, partindo de uma análise crítica das realidades sociais, sustentam implicitamente as finalidades sociopolíticas da educação. Essas tendências são denominadas pelo mesmo autor como: Pedagogia Progressista Libertadora, Pedagogia Progressista Libertária e Pedagogia Crítico-social dos Conteúdos e Histórico-Crítica.

    Sendo assim, o problema de investigação desta pesquisa, foi: será que a Tendência Progressista Libertadora da educação, influenciou as abordagens pedagógicas da Educação Física?

    Sendo assim, o objetivo deste estudo foi verificar se há influência da Tendência Progressista Libertadora em relação às abordagens pedagógicas da Educação Física de cunho Dialético.

    Foi utilizada a pesquisa bibliográfica como forma de obter dados a responder ao problema de investigação.

Referencial teórico

    Uma das Tendências Progressistas, conhecida também como tendência crítica da educação, é a Tendência Progressista Libertadora, proposta por Paulo Freire que orienta práticas não-formais de educação. Muitos professores interessados na transformação da realidade social, adotaram esta tendência em suas práticas pedagógicas, utilizando-a como referência para questionar as relações de trabalho objetivando a conscientização da classe social excluída de direitos econômicos e sociais para se engajarem na luta pela melhoria de suas condições de vida (LIBÂNEO, 1994). Esta tendência objetivava um ensino voltado para a denúncia dos meios de opressão da classe dominante.

    Segundo Libâneo (1994), esta pedagogia não tem uma sistematização explícita para a didática. Há, no entanto, uma didática implícita na orientação do trabalho na escola, sendo que a realidade social é o centro do processo de ensino e o educador um coordenador das atividades a serem desenvolvidas de forma conjunta com os alunos.

    Embora Paulo Freire se preocupasse mais com a educação das classes menos favorecidas, fora dos muros educacionais (educação não-formal) suas ideias, princípios e práticas, levaram docentes de diferentes regiões dentro e fora do Brasil a orientarem seus trabalhos baseados nesta teoria. Pode-se afirmar que, alguns desses pontos relevantes que fizeram refletir a prática pedagógica de muitos docentes, foram: a valorização da vida diária do educando; uma educação voltada à consciência crítica do aluno através da teoria e prática; que o aluno se torne sujeito de sua própria história; a relação amigável entre professor e aluno; o docente como mediador entre educando e o objeto de estudo; e a realidade social sendo desvendada pelos conteúdos de ensino (LIBÂNEO, 1994).

    Nesta pedagogia, o papel da escola é a formação da consciência política do educando, principalmente através da problematização do meio cultural do qual este faz parte. E o professor, junto com o aluno, são sujeitos na aplicabilidade da ação do conhecimento. Portanto, o aluno não é um depositário de conteúdos, visto como um ser passivo, nesta pedagogia ele é visto como um ser ativo (LIBÂNEO, 1994). A avaliação, nesta perspectiva, visa o desenvolvimento de uma prática comprometida com a emancipação do sujeito e com a construção coletiva de programas de ação. Processo que se dá por meio de práticas reflexivas por parte do docente e do aluno, de trabalhos escritos e autoavaliação (em relação às atribuições assumidas com o coletivo de alunos) , de grupos de discussões, debates e entrevistas.

    Percebe-se, então, que estas ações e princípios foram fundamentais para elaboração de um entendimento próprio e político quanto à ação de ensinar, através de uma posição filosófica que orienta a prática educativa de muitos docentes no ensino formal, nas diversas instituições de ensino no Brasil.

    A pedagogia libertadora influenciou uma das mais importantes abordagens críticas da Educação Física, conhecida como crítica-emancipatória, proposta por Elenor Kunz, com base nos pressupostos teóricos da escola de Frankfurt, na fundamentação teórica da sociologia da ação comunicativa de Habermas. (BRACHT, 1999).

    Para Darido (2003), nesta abordagem, o movimento humano em sua expressão é relevante no processo de ensino-aprendizagem, já que, está presente em todas as experiências e relações expressivas, abordando o sujeito em suas dimensões social, política e econômica. . Neste caso, o movimento humano é uma forma de linguagem que contribui com o relacionamento com o meio, transformando-o num sujeito a partir do reconhecimento de si no outro.

    É uma abordagem que orienta a prática pedagógica dos professores a trabalhar uma Educação Física que objetive dentro do processo ensino-aprendizagem, a libertação das falsas ilusões, interesses e desejos, estimulados e implantados nos educandos pela visão de mundo que apresentam a partir do conhecimento (DARIDO, 2003).

    De acordo com a orientação das práticas pedagógicas, o papel do professor na abordagem crítico-emancipatória busca confrontar,

    (...) num primeiro momento, o aluno com a realidade do ensino, o que o autor denominou de transcendência de limites. Concretamente a forma de ensinar pela transparência de limites pressupõe três fases. Na primeira os alunos descobrem, pela própria experiência manipulativa, as formas e meios para uma participação bem-sucedida em atividades de movimentos e jogos. Devem também manifestar, pela linguagem ou representação cênica, o que experimentaram e o que aprenderam numa forma de exposição, e por último, os alunos devem aprender a perguntar e questionar sobre suas aprendizagens e descobertas, com a finalidade de entender o significado cultural da aprendizagem (DARIDO, 2003, p. 15).

    Deve-se desenvolver uma prática pedagógica que vise um ensino crítico, pois é a partir dele que os discentes passam a entender a estrutura organizada pela alta burguesia e que desenvolvem falsas convicções, interesses e desejos, como é o caso dos esportes (KUNZ, 1994).

    É evidente que para esse entendimento sobre o esporte, os educandos precisam ser instrumentalizados, além de aptidões e noções que lhes conduzam apenas a prática propriamente dita do esporte. Desta forma, é primordial a competência comunicativa, pois possibilita a comunicação, “não apenas sobre o mundo dos esportes, mas para todo o seu com o mundo social, político, econômico e cultural” (KUNZ,1994, p. 29).

    Nesta abordagem, Kunz (1994) orienta para importância do professor de Educação Física trabalhar na formação do aluno, utilizando efetivamente as três competências, que são: Objetiva, Social e Comunicativa. A primeira, é fazer com que o aluno receba “conhecimento e informações, precise treinar destrezas, técnicas racionais e eficientes, precise aprender certas estratégias para o agir de forma prática e competente”. Desta forma, busca-se no aluno “se qualificar para atuar dentro de suas possibilidades individuais e coletivas e agir de forma bem sucedida no mundo do trabalho, na profissão, no tempo livre e, no caso, no esporte” (1994, p. 40).

    Verifica-se que esta abordagem não nega a prática do esporte, sua crítica esta em trabalhar os conteúdos do esporte de forma a copiar os modelos dos esporte de rendimento dentro do ambiente escolar, continuando a reproduzir o esporte excludente e ilusório que sempre foi determinante na dominação e alienação da sociedade.

    Na segunda competência, denominada de Social,

    (...) os conhecimentos e esclarecimentos que o aluno deve adquirir para entender as relações socioculturais do contexto em que vive, dos problemas e contradições dessas relações, os diferentes papéis que os indivíduos assumem numa sociedade, no esporte, e como esses se estabelecem para atender diferentes expectativas sociais. No caso do esporte, especialmente, a competência social deve atuar, também, no sentido de desvelar diferenças e discriminações que se efetivam através da socialização específica para os sexos e que nessas aulas normalmente são reforçadas pela formação de turmas masculinas e turmas femininas (...) as aulas de Educação Física deveriam ser preferencialmente co-educativas, onde fosse possível desvelar e superar os principais problemas de uma socialização específica para os sexos (...) (KUNZ, 1994, p. 40).

    Esta prática de separação de turmas por sexo, que aparece fortemente nas práticas pedagógicas pautadas nos pressupostos teóricos das tendências, tradicional e tecnicista, teve grande influência na orientação do trabalho pedagógico na Educação Física, já que, na visão dos educadores da época, as mulheres atrapalhariam os homens, isso, em função de acreditarem que elas possuíam menor capacidade física e motora. Em relação a essa prática , Castellani Filho (2003) afirma que, este posicionamento, acabou de certa forma prejudicando as mulheres nas práticas de exercícios físicos ao longo da história, portanto, dizer que a mulher possui menor capacidade física que o homem, não é um fator biológico e sim cultural.

    Daí a importância desta competência em mediar a socialização e o convívio social harmonioso entre homens e mulheres, respeitando suas diferenças e limites.

    Segundo Bracht (1999) a competência social, deve conseguir entender o próprio contexto sócio cultural em que está envolvido.

    A terceira e última competência sugerida por Kunz é a comunicativa, cuja função da Educação Física constitui-se em fazer com que o aluno desenvolva habilidade para,

    (...) se comunicar e entender a comunicação dos outros é um processo reflexivo e desencadeia iniciativas do pensamento crítico. Mas, a competência comunicativa na Educação Física e Esporte não deve se concentrar apenas na linguagem dos movimentos que precisam, acima de tudo, ser compreendidos pelos integrantes de um jogo ou atividades lúdicas, mas, principalmente, a linguagem verbal deve ser desenvolvida. Fala-se muito pouco numa aula de Educação Física. Diz-se, inclusive, que muita conversa limita as possibilidades ativas, de movimentos, dos alunos e que uma aula de Educação Física deve se constituir essencialmente de movimentos. Se no processo natural/tradicional de ensinar, de praticar esportes em aula, identificamos uma série de problemas sociais e culturais dessa prática, como podemos entendê-los e procurar possíveis soluções se não falarmos sobre eles? (KUNZ, 1994, p 41).

    Para Bracht (1999) esta competência adota um procedimento reflexivo e responsável por despertar o pensamento crítico que ocorre por intermédio da linguagem, que pode ser de caráter verbal, escrita e/ou cinestésica (movimento corporal). Se opondo, portanto, ao mecanicismo a que a Educação Física sempre foi moldada, na obediência das regras e na posição de objeto na relação ensino-aprendizagem.

    Pode-se afirma também que devido a sua proximidade em relação aos objetivos de questionar firmemente a realidade das relações do sujeito com a natureza e com os outros sujeitos, buscando uma mudança na sociedade onde está inserido, a abordagem Sistêmica da Educação Física também se assemelha com a progressista libertadora de Paulo Freire. Esta abordagem surge através dos estudos de Mauro Betti, e segundo Darido (2003) a obra que apresenta esta teoria, denominada de Educação Física e Sociedade, publicada em 1991, sofre influências de estudos sociológicos, filosóficos e da psicologia.

    Nelas, verifica-se que o docente e educandos, orientados através das experiências no meio em que estão inseridos, e também, através da problematização do seu cotidiano e utilizando-se dos grupos sociais para alcançar à conscientização e reflexão crítica, assemelham-se na busca dos mesmos objetivos, que é a transformação social.

    Para Betti (1991) é fundamental na Educação Física que haja a integração e a introdução do aluno na educação básica no universo da “cultura física”, buscando uma formação de cidadãos que irão contribuir com a transformação da cultura corporal, como o esporte, a dança, o jogo, a ginástica e as lutas.

    Para o mesmo autor, não se deve negar o ensino de habilidades motoras, já que é um dos objetivos da disciplina de Educação Física, mas, também, deve-se trabalhar conteúdos que possam contribuir na formação do individuo. Desta forma, as aulas devem proporcionar conhecimentos que o aluno possa, em um futuro próximo, utilizá-los no seu dia a dia.

    Observa-se que o importante não é a prática pela prática e sim buscar o envolvimento do aluno em tudo que se refere o objeto de estudo, neste caso, as vivências corporais.

    Para Darido (2001; 2003) na Abordagem Sistêmica, é primordial que os conteúdos sejam utilizados de forma que os alunos experimentem e explorem os diferentes movimentos da cultura corporal como o jogo, a dança, o esporte, as lutas e as ginásticas, não deixando, portanto, de desenvolver as questões cognitivas e afetivas dentro destas vivências corporais.

    Na literatura, várias são as abordagens da Educação Física publicadas, que trazem diversas formas de atuação profissional quanto ao desenvolvimento de suas aulas. Em relação à influência da pedagogia de Freire, foram apresentadas apenas duas dessas abordagens, escolhidas por este pesquisador, por serem as mais discutidas e utilizadas no meio acadêmico.

Conclusão

    Conclui-se que a Tendência Progressista Libertadora influenciou duas importantes Abordagens da Educação Física escolar, a Sistêmica e a Crítica-Emancipatória, que norteiam o trabalho do professor em suas práticas pedagógicas de forma contrária ao ensino de Educação Física excludente, alienador e ilusório.

Referencial bibliográfico

  • BETTI, M. Educação física e sociedade. São Paulo: Movimento, 1991.

  • BRACHT, V. A Constituição das teorias pedagógicas da educação física. Cadernos Cedes, ano 19, n. 48, ago. 1999.

  • CASTELLANI FILHO, L. Educação Física no Brasil: a história que não se conta. 9ª ed. Campinas: Papirus, 2003.

  • DARIDO, S. C. Educação física no ensino médio: Questões e Reflexões. Guanabara Koogan. Rio de Janeiro. 2003.

  • _________. Os Conteúdos da Educação Física Escolar: influências, tendências, dificuldades e possibilidades. IN: Perspectivas em Educação Física Escolar, v. 2, n. 1, 2001.

  • KUNZ, E. Transformação didático-pedagógica do esporte. Ijuí: Unijuí, 1994.

  • LIBÂNEO, J. C. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.

  • SAVIANI, D. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 10ª ed. Campinas: Autores Associados, 2008.

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