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Automedicação e nível de atividade física

Self-medication and level of physical activity

 

* Professor Doutor do Departamento de Ciências

do Movimento Humano da Universidade Federal de São Paulo

** Professora Doutora do Departamento de Biociências

da Universidade Federal de São Paulo

*** Bacharel em Educação Física

pela Universidade Federal de São Paulo

(Brasil)

Sionaldo Eduardo Ferreira*

sionaldo@gmail.com

Alessandra Medeiros**

ale.med@terra.com.br

Álvaro Carlos de Souza Mendes dos Santos***

alvarocarlosmendes@gmail.com

 

 

 

 

Resumo

          Este estudo analisou o nível de atividade física e aspectos associados à automedicação. Foram entrevistadas 300 pessoas com mais de 18 anos em locais propensos a prática de atividade física, utilizando dois questionários e uma entrevista semiestruturada. Houve alto percentual de sujeitos muito ativos e ativos que se automedicaram no último ano 65,3% e 56,1%, respectivamente. Na população adulta, 68,1%, dos entrevistados se automedica observando-se que 42,6% dos idosos fazem esta prática. Em relação à automedicação, conforme a classificação socioeconômica foi observada para a classe ‘A’ 65,4%, ‘B’ 60,9%, ‘C’ 36,3% e ‘D’ 50,0%. Conclui-se que, apesar de o nível de atividade física e socioeconômico se expressarem altos, um menor uso de medicamentos prescritos e não prescritos não foi garantido. Estes dados sugerem a necessidade de elaboração de campanhas específicas para prevenção dos riscos da automedicação.

          Unitermos: Educação em saúde. Automedicação. Atividade física. Qualidade de vida.

 

Abstract

          This study examined the level of physical activity and aspects associated with self-medication in the city of Santos. We interviewed 300 people over 18 years in places prone to physical activity using two questionnaires and a semistructured interview. A high percentage of subjects very active and assets that self-medicated in the past year 65.3% and 56.1%, respectively. In the adult population, 68.1% of respondents were self medicate noting that 42.6% of older people do this practice. In relation to self-medication, as the socioeconomic classification was observed for class ‘A’ 65.4%, ‘B’ 60.9%, ‘C” 36.3% and ‘D’ 50.0%. We conclude that, although the level of physical activity and high socioeconomic express themselves, less use of prescription and non-prescription was not guaranteed. These data suggest the need for developing specific campaigns to prevent the risks of self-medication.

          Keywords: Health education. Self-medication. Physical activity. Quality of life.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 19, Nº 191, Abril de 2014. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Este estudo foi elaborado a partir da observação de que muitas pessoas compram medicamentos sem prescrição médica, deixando-os armazenados em casa para uma eventual necessidade, e do fato de um elevado número de pessoas consumir medicamentos sem consultar o médico e sem estar consciente dos possíveis riscos à saúde, associados a este comportamento.

    As razões pelas quais as pessoas se automedicam são inúmeras: a propaganda massiva de medicamentos contrasta com as tímidas campanhas para esclarecer os perigos da automedicação; a dificuldade e o custo de se conseguir uma opinião médica; a limitação do poder prescritivo, restrito a poucos profissionais de saúde; o desespero e a angústia desencadeados por sintomas ou pela possibilidade de se adquirir uma doença; informações sobre medicamentos obtidos com amigos e familiares, na internet e em outros meios de comunicação; a falta de regulamentação ou fiscalização daqueles que vendem; e a falta de programas educativos sobre os efeitos muitas vezes irreparáveis da automedicação. Estes são alguns dos motivos que levam as pessoas a utilizarem medicamentos sem a devida prescrição médica (AUTOMEDICAÇÃO, 2010).

    A automedicação é um problema de saúde pública, observado há muito tempo e algumas ações vêm sendo adotadas para evitar que as pessoas utilizem medicamentos de forma abusiva, pois esta atitude pode agravar os problemas de saúde dos que utilizam medicamentos sem prescrição médica ou sem a devida orientação. Há poucos estudos sobre o tema, em especial na população brasileira, além da falta de orientações sobre os riscos associados ao mau uso e uso abusivo de medicamentos. Como lembra Haak (1989), é interessante tornar a automedicação uma parte da ‘Assistência Primária à Saúde’ e que essa assistência implicará uma participação ativa do indivíduo. Lefèvre (1987) enfatizou a necessidade de mais estudos sobre procura e oferta de “saúde instantânea” por meio de medicamentos, procurando assim evitar que os medicamentos, como símbolos de Saúde, venham a se tornar substitutos da própria saúde.

    A automedicação, tal como a prescrição errônea, pode ter como consequência efeitos indesejáveis, enfermidades iatrogênicas e mascaramento de doenças evolutivas, representando, portanto, um problema a ser prevenido (ARRAIS, 1997). As pessoas em geral detêm pouca informação sobre os efeitos dos remédios sobre o corpo e de como o corpo é capaz de reagir aos agentes externos, combatendo-os.

    Fatores econômicos, políticos e culturais têm contribuído para o crescimento e a disseminação da automedicação no mundo (PEREIRA et al., 2007). Tais fatores se relacionam, dentre outros, a uma grande disponibilidade de produtos, simbolização da saúde que o medicamento pode representar em publicidade irresponsável, pressão para a conversão de medicamentos de venda condicionada à apresentação da receita em medicamentos vendidos livremente nos balcões de farmácia e supermercados, qualidade da assistência à saúde, dificuldade de acesso aos serviços de saúde, entre outros fatores (PEREIRA et al., 2007).

    No Brasil, os meios de comunicação de massa, que atualmente tendem a estimular o uso de medicamentos, poderiam ser utilizados com a finalidade de esclarecer o público em como estabelecer uma relação saudável com os mesmos. A medicina preventiva poderia desempenhar papel importante, efetuando estudos sobre as condições locais de uso de medicamentos e desenvolvendo campanhas de informações e conscientização. Entretanto, observa-se o contrário, as campanhas publicitárias são planejadas para atingir desde o médico e o farmacêutico até o dono da farmácia, o balconista e o paciente, conseguindo influenciar a prescrição, a venda e o consumo de medicamentos. A mídia é vista como uma poderosa ferramenta capaz de motivar a demanda pelo consumidor final, formar opinião entre os que prescrevem e exercer a pressão sobre as políticas públicas (BATISTA, 2009).

    Para Batista (2009), a forma pela qual a automedicação é praticada no Brasil é resultado de uma série de fatores como a legislação que define os medicamentos isentos de prescrição médica, o medicamento e sua relação como mercadoria, as práticas comerciais do varejo farmacêutico, o acesso restrito da população aos sistemas de saúde, ao medicamento e ao médico e a relação entre o medicamento e os meios de comunicação em massa.

    Como afirma a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), do Ministério da Saúde, cerca de 50% dos remédios controlados são vendidos sem que a receita médica seja exigida (BOCK, 2001).

    De acordo com Automedicação (2010), o problema é universal, antigo e de grandes proporções. A automedicação pode ser considerada uma forma de não adesão às orientações médicas e de saúde. Nessa perspectiva, Hipócrates (AUTOMEDICAÇÃO, 2010) já sentenciou: "Toda vez que um indivíduo diz que segue exatamente o que eu peço, está mentindo". Não há como acabar com a automedicação, talvez pela própria condição humana de testar e arriscar decisões. Há, contudo, meios para minimizá-la. Programas de orientação para profissionais de saúde, farmacêuticos, balconistas e população em geral, além do estímulo à fiscalização efetiva, são fundamentais nessa situação.

    Sendo a prática de exercícios físicos uma alternativa eficiente na busca de mudanças no estilo de vida e na conquista de melhoras em sua qualidade, torna-se interessante a investigação para avaliar se há relação entre o nível de sua prática e uma maior consciência corporal, levando assim a população a não fazer uso de medicamentos sem prescrição; assim como a prática de exercícios físicos acompanhada por um profissional da Educação Física na orientação em caso de alguma alteração imunológica ou presença de alguma doença com sintomas agudos e crônicos, a fim de adequar o programa de exercícios físicos às condições clínicas e avaliação médica dos alunos. Os esforços governamentais e privados do Brasil para a promoção racional de uso de medicamentos são reconhecidos atualmente como efeitos notáveis em nível internacional, com destaque para ações de educação de profissionais da saúde, incluindo-se os profissionais da Educação Física (OPAS, 2007).

    O exercício físico realizado regularmente promove importantes adaptações no sistema nervoso simpático e parassimpático, assim como sanguíneas, que vão influenciar o sistema cardiovascular (RONDON; BRUM, 2003). Através do treinamento físico ocorre a redução nos níveis de repouso da pressão arterial em indivíduos hipertensos, o que é relevante no tratamento da hipertensão arterial de grau leve a moderado, possibilitando a diminuição da dosagem dos medicamentos anti-hipertensivos ou mesmo a interrupção de medidas farmacológicas para tal tratamento (STELLA et al., 2003).

    O exercício físico tem grande influência sobre aspectos fisiológicos do corpo, como para a integridade cerebrovascular, o aumento no transporte de oxigênio para o cérebro, a síntese e a degradação de neurotransmissores, bem como a diminuição da pressão arterial, dos níveis de colesterol e dos triglicerídeos, a inibição da agregação plaquetária, aumento da capacidade funcional e, consequentemente, a melhora de qualidade de vida (MELLO et al., 2005).

    Segundo Santos et al. (1998), o exercício físico pode melhorar funções cognitivas por meio de alterações hormonais (catecolaminas, hormônio adrenocorticotrófico e vasopressina), na produção e liberação de endorfinas, na liberação de serotonina, ativação de receptores específicos e diminuição da viscosidade sanguínea.

    Assim, pode haver uma menor procura, pelos praticantes de atividade física, dos serviços de saúde no que diz respeito a doenças causadas pelo sedentarismo, e mesmo aquelas que dizem respeito ao estresse, transtornos do humor e sono, possibilitando uma melhor qualidade de vida e prevenção da prática de automedicação. De acordo com Antunes et al., (2005), quando se adota hábitos de vida saudável favorece uma economia importante para os cofres públicos na medida em que se diminui a procura por atendimento em postos de saúde e hospitais da rede pública. Assim, argumenta-se que o incentivo à prática regular de exercícios físicos deveria ser rotina na configuração das políticas públicas de saúde no presente e no futuro.

    Diante do exposto, este estudo teve por objetivo verificar o padrão de uso de medicamentos em uma amostra populacional na cidade de Santos-SP e correlacionar com o nível de prática de atividades físicas e indicadores socioeconômicos, bem como conhecer o perfil socioeconômico de indivíduos que praticam a automedicação, conhecer as principais classes e tipos de medicamentos utilizados na automedicação, conhecer as possíveis relações entre o nível de prática de atividades físicas e a automedicação.

MATERIAIS E MÉTODOS

Amostra

    Tratou-se de uma pesquisa de campo, caracterizada pela busca de dados diretamente da fonte (sujeitos) e com método descritivo que teve como características observar, registrar, analisar, descrever e correlacionar fatos ou fenômenos sem manipulá-los, procurando descobrir, com precisão, a frequência em que um fenômeno ocorre e sua relação com outros fatores (MATTOS; JÚNIOR; BLECHER, 2004). A amostra foi composta de 300 (trezentas) pessoas com mais de 18 anos de idade, de ambos os gêneros e nas diferentes fases do ciclo vital.

Instrumentos

    Entrevista semiestruturada, em que são fixados temas a serem abordados, com perguntas previamente elaboradas (MATTOS; JÚNIOR; BLECHER, 2004) e criadas pelos pesquisadores, sobre uso de medicamentos e cuidados gerais à saúde, proposta como instrumento para conhecer os dados gerais sobre a saúde e o uso de medicamentos.

    Questionário sobre o Nível de Atividade Física: o questionário internacional do nível de atividade física (IPAQ) proposto pela Organização Mundial da Saúde (1998) é um instrumento traduzido e validado em diversos países para determinar o nível de atividade física populacional (CELAFISCS, 2010).

    Questionário sociodemográfico: O critério ABIPEME foi desenvolvido pela Associação Brasileira de Institutos de Pesquisa de Mercado com a finalidade de dividir a população em categorias segundo padrões ou potenciais de consumo. Esse critério cria uma escala ou classificação socioeconômica por intermédio da atribuição de pesos a um conjunto de itens de conforto doméstico, além do nível de escolaridade do chefe de família (ABEP, 2008).

Procedimentos

    Após abordagem inicial, apresentação do pesquisador e explicação sobre os objetivos do projeto, as pessoas que concordaram voluntariamente em participar do estudo, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e foram entrevistadas utilizando-se os instrumentos descritos, aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (protocolo 025/11).

    Os voluntários foram abordados em diferentes espaços públicos e privados de Santos-SP, como a orla, academias de ginástica, espaços de lazer, praças públicas e demais ambientes propensos à prática de atividade física, em que o pesquisador teria possibilidade de abordar e entrevistar os voluntários. Durante a coleta de dados, os questionários foram organizados com identificações de 1 até 300 para que, caso ocorresse algum erro de digitação no banco de dados, eles pudessem ser recorridos para consulta, sendo o banco de dados atualizado conforme a realização das entrevistas.

Análise estatística

    Para elaboração do banco de dados foi utilizado o programa Microsoft Excel 2007®. Para análise dos dados foi utilizado o software estatístico R, onde os dados foram plotados e analisados, utilizando-se as ferramentas de estatística descritiva (média, frequência) e inferencial (correlações), sendo adotado nível de significância de 5% (p≤0,05).

Resultados

    A amostra foi composta por 50,6% de homens e 49,4% de mulheres, as classes socioeconômicas predominantes foram ‘B’ e ‘C’, assim como houve prevalência de adultos em relação aos idosos, 77,4% e 22,6% respectivamente. Os resultados obtidos indicam que 45% dos entrevistados estavam utilizando algum medicamento prescrito por médicos na época da entrevista.

    Os resultados da idade dos sujeitos que utilizam medicamentos prescritos pelo médico são apresentados na Tabela 1:

Tabela 1. Distribuição das variáveis ‘Idade’ e ‘Utiliza medicamento prescrito pelo médico’

    Sendo as causas mais frequentes atribuídas à hipertensão 22,0%; hipercolesterolemia 11,0%; anticoncepcional 9,0%; diabetes 9,0%; anti-inflamatórios não-esteróides (AINEs); para gastrite 5,0%; osteoporose 4,0% e 49,0% outras.

    Entretanto quando é realizada a correlação entre a idade e a automedicação no último ano, obtêm-se o resultado de que 68,1% dos Adultos fizeram este uso e 42,6% dos idosos.

    Os resultados sobre o a frequência e a porcentagem de pessoas que se automedicaram no último ano estão apresentados na Tabela 2:

Tabela 2. Distribuição da variável ‘Utilizou medicamento não prescrito no último ano’

    Em relação à utilização do sistema de saúde público (Sistema Único de Saúde - SUS) e privado, os resultados obtidos são que 51,6% dos entrevistados utilizam o SUS, sendo que 5,6% o classificaram como Ótimo; 16,0% Bom; 18,0% Regular; 11,3% Ruim e 49,0% não classificaram. Quanto ao sistema privado, 58,0% o utilizam, sendo que 9,0% o classificam como Ótimo; 30,0% Bom; 14,6% Regular; 3,3% Ruim e 43,0% não o classificaram.

    Os medicamentos com maior frequência de uso não prescrito, no último ano, foram AINEs 64,0%, antiespasmódicos 11,0%, antialérgicos 5,0%, analgésicos 5% e outros 15%. Os medicamentos com maior frequência de uso não prescrito, no último mês, foram AINEs 31,0%, antiespasmódicos 9,0%; analgésicos 4,0%; antialérgico 3,0% e outros 21,0%. Os medicamentos com maior frequência de uso não prescrito, na última semana, foram AINEs 19,0%; antiespasmódicos 5,0% e outros 13,0%.

    A frequência de uso de medicamentos não prescritos no último mês foi de 36,6% e na última semana foi de 20,3%. Entre os motivos para a administração de medicação não prescrita, a dor de cabeça, gripe, cólicas, febre e dor de garganta foram as mais relatadas, sendo 36,0%, 13,0%, 7,0%, 7,0% e 7,0% respectivamente.

    Os dados obtidos em relação ao nível de atividade física da amostra são: 26,0% Muito Ativos; 35,0% Ativos; 22,0% Irregularmente ativos ‘A’; 11,0% Irregularmente ativos ‘B’; e 6,0% Sedentários.

    Os dados obtidos sobre o nível de atividade física e a relação com a automedicação no último ano são apresentados na Tabela 3:

Tabela 3. Distribuição das variáveis ‘Nível de atividade física’ e ‘Utilizou medicamento não prescrito no último ano’

    Os dados obtidos sobre classificação socioeconômica e a automedicação no último ano são apresentados na Tabela 4:

Tabela 4. Distribuição das variáveis ‘Classe socioeconômica’ e ‘Utilizou medicamento não prescrito no último ano’

Discussão

    Este estudo demonstra como a população vive sob forte influência medicamentosa, com alta demanda por medicamentos receitados e por automedicação, sendo observadas diferenças em relação às fases do ciclo vital, pois quando jovem se automedicam e quando idosos se medicam com prescrição médica, além de observar que mesmo o nível de atividade física da maioria da amostra demonstre ser de moderado a alto, não se tem a garantia de uma vida livre do uso de medicamentos.

    A automedicação é uma prática popular no Brasil e em diversos outros países, em especial nos países onde o sistema de saúde é pouco estruturado ou de custo elevado, pois a dificuldade de acesso e a precariedade no atendimento fazem com que as pessoas optem por meios mais simples para aliviar suas dores e desconfortos. Isso é demonstrado pelo alto índice de uso de medicamentos sem prescrição, uma vez que 62,3% dos entrevistados afirmaram ter usado algum medicamento sem prescrição no último ano, índice que se aproxima de um estudo realizado na Bahia e que verificou uma prevalência de automedicação de 74% (HAAK, 1989).

    Entretanto, quando analisado o tipo de medicamento utilizado, percebe-se uma diferença, pois, no estudo de Haak (1989), os medicamentos mais consumidos foram antibióticos, anti-helmínticos e antimicóticos, enquanto no presente estudo encontrou-se prevalência de AINEs e antiespasmódicos. Além disso, em um estudo realizado no município de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, encontrou uma prevalência de 53,3% de automedicação, sendo que os analgésicos, antitérmicos e AINEs foram os medicamentos mais consumidos (VILARINO et al., 1998).

    Para aperfeiçoar os caminhos para a obtenção do alívio dos incômodos que afligem, em inúmeras ocasiões, diante de quaisquer sintomas, em especial os mais comuns como aqueles decorrentes de viroses, o brasileiro se vê, de pronto, impulsionado a utilizar os medicamentos para gripe, febre, dor de garganta ou a procurar orientação leiga, seja dos amigos íntimos, familiares mais experientes ou até mesmo do farmacêutico, à busca de solução medicamentosa (AUTOMEDICAÇÃO, 2001), como foi observado no presente estudo, em que a atitude de se automedicar foi utilizada predominantemente para sanar a dores de cabeça e reduzir os sintomas da gripe, por exemplo.

    Sabe-se que o número de indivíduos portadores de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) vem aumentando no Brasil principalmente as do aparelho circulatório, respiratório, metabólico (diabetes), musculoesquelético e câncer, por exemplo. Há pelo menos quatro décadas os brasileiros convivem com as doenças cardiovasculares como primeira causa de morte (LESSA, 1998). Assim, percebe-se na amostra avaliada que as DCNT estão presentes de maneira significativa, observando-se 22,0% com hipertensão arterial sistêmica, 11,0% hipercolesterolemia e 9,0% com diabetes, o que constitui um sério problema de saúde pública e uma correlação com os dados obtidos no Brasil (PORTAL DE SAÚDE, 2012).

    Foi observado que em idosos o uso de medicamentos sem prescrição médica foi inferior ao observado em adultos jovens, pois os idosos têm mais consciência sobre os efeitos colaterais dos medicamentos e têm mais precaução, em especial pela experiência e conhecimento de que com o avanço da idade estão mais suscetíveis a doenças, assim como aos efeitos adversos dos medicamentos. Entretanto, eles utilizam mais medicamentos prescritos por médicos do que os adultos jovens, devido ao aparecimento de mais dores músculo-esqueléticas e do desenvolvimento de DCNT. Nos adultos jovens observou-se um uso relevante de medicamentos não prescritos, em especial de AINEs e antiespasmódicos, utilizados em sua maioria por alguns dias para aliviar dores cotidianas do trabalho e estresse, enquanto há pouco uso de medicamentos prescritos pelo médico.

    De acordo com as informações coletadas durante as entrevistas, observou-se que todas as classes socioeconômicas utilizam medicamentos sem prescrição médica, apesar de ter sido observado predominância na classe ‘A’, pois é uma forma rápida e fácil de aliviar as dores diárias que atingem a todos, independente da classe social e do nível de prática de atividades físicas. Desta forma, é plausível o que afirma Pereira (1996), quando nos apresenta que a automedicação constitui uma prática universal, presente nas diversas camadas sociais e culturais, independente do grau de desenvolvimento, e que segundo a Associação Brasileira das Indústrias Farmacêuticas (ABIFARMA), no Brasil, cerca de 80 milhões de pessoas se automedicam.

    Como os locais de entrevista foram predominantemente ambientes onde os sujeitos praticavam atividade física ou eram propícios para esta prática, como centros esportivos, calçadão da orla de Santos, academias, parques e praças públicas, foi observado alto nível de atividade física na amostra, 94%, contrastando com os achados de levantamentos epidemiológicos sobre a prática de atividades físicas feitos na cidade de São Paulo, em que, somente 1/3 realizava algum tipo de atividade física (MELLO; FERNANDEZ; TUFIK, 2000). Entretanto, no presente estudo não se sabe quanto dessa amostra está engajada em atividade física com supervisão de um profissional qualificado, isto leva a hipótese de que não é somente a inatividade que pode causar o uso de medicamentos, mas também a falta de supervisão profissional durante a realização da atividade física.

    Foram observadas características no perfil de automedicação conforme a idade, uma vez que adultos entre 18 e 60 anos consomem medicamentos, na sua maioria em regime de automedicação de AINEs, antiespasmódicos e pílulas anticoncepcionais, enquanto os idosos entre 61 e 90 anos consomem medicamentos tanto quanto os adultos, mas de forma prescrita, como hipotensivos, hipoglicemiantes e hipocolesterolemiantes.

    Pensando na atividade física como um potente promotor de benefícios fisiológicos, metabólicos e emocionais, visualizou-se que embora o uso de medicamentos sem prescrição tenha sido elevado nos praticantes de atividade física, parece haver uma redução da frequência deste uso com o passar dos meses, já que no último ano, 62% fizeram automedicação, no último mês 36,6% e na última semana esse percentual foi reduzido para 20,3%. Desta forma, deverão ser realizados outros estudos correlacionando o uso de medicamentos à prática de atividade física controlada por educadores físicos e não controlada, de forma que possa identificar a existência de diferenças em longo prazo da prática de atividade física como atenuante do uso de medicamentos daqueles que fazem automedicação e evitar o uso de medicamentos prescritos, em especial dos medicamentos utilizados para DCNT.

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