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O envelhecimento a partir de narrativas de idosos ativos

El envejecimiento a partir de las narrativas de las personas mayores activas

 

*Bacharel em Educação Física

**Mestre em Educação, Professor do curso de Educação Física

Universidade do Extremo Sul Catarinense

Criciúma, Santa Catarina

Érica Vieira Marques*

Victor Julierme Santos da Conceição**

victorjulierme@yahoo.com.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Estudo sobre a percepção de idoso sobre envelhecimento a partir da inserção em um grupo de atenção a saúde do idoso. Realizamos entrevistas narrativas com 5 idosos participantes do Programa de Atenção Multidisciplinar a Saúde do Idoso (PAMSI) da Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC). Resultados: destacam-se alguns temas: história de infância, contato com as práticas corporais, a influência de uma rotina ativa, envelhecer com saúde. Na experimentação e interpretação dos resultados destacam-se alguns aspectos visíveis das práticas corporais. Os mais relatados, às amizades, o convívio social, a atenção recebida, melhora física, com resgate da autoestima, autoimagem, socialização, autonomia e felicidade.

          Unitermos: Envelhecimento humano. Práticas corporais. Estudo narrativo.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 190, Marzo de 2014. http://www.efdeportes.com/

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Considerações introdutórias

    A vida é mesmo uma obra de arte, e assim é devido às histórias narradas por cada um de nós, que não cansamos de repetir, reviver, relembrar ou simplesmente contar histórias, que aos olhos de quem as enxergam em letras apenas, ainda é tão pouco para sentir o que uma história ouvida transmite. Em uma pesquisa acadêmica essas narrativas se tornam mais do que simples histórias e sim um aprendizado necessário para interpretar histórias narradas. A Narrativa é originária do latim e quer dizer conhecer, transmitir informações. Presente em todos os tempos, em todos os lugares, em todas as sociedades, começa com a própria história da humanidade.

    Sendo assim um baú de grandes surpresas a encantar o ouvinte ou desencorajá-lo, mas o que importa são as interrogações advindas de experiências vividas, culturas diferentes, relatos cotidianos, indivíduos que envelhecem a cada dia de forma tão diferente que nos estimulou ao desafio de realizar essa pesquisa. Detalhadamente o idoso foi ouvido, observado e compreendido com uma característica jamais esquecida, o olhar para aquele que foi ouvido, nunca mais será o mesmo.

    Molina; Molina Neto (2010, p. 167) observam que “[...] a narrativa é também uma forma de prática social por meio do qual o sujeito elege/escolhe/busca/constrói, a partir de um repertório sociocultural de relatos, que melhor expressa a sua narrativa pessoal, em síntese, a sua história.” Dado exposto, alimentou a motivação inicial, desta pesquisa, em conhecer os relatos de idosos participantes do Programa de Atenção Multidisciplinar a Saúde do Idoso1 (PAMSI), cuja relação entre nós pesquisadores e colaboradores é estreita, devido o grande contato com o grupo. A partir disso, houve o interesse de entender como esses idosos envelhecem a partir das histórias narradas por eles mesmos.

    Tal fato se configura a partir do relato de uma idosa de 67 anos participante do grupo: “Quando eu for velha, não quero ser dessas velhas chatas, que ficam reclamando”. A narrativa corrobora com a tentativa de compreender a relação do tempo de vida, ou idade cronológica, com o conceito de envelhecimento assumido pela idosa.

    É nesta perspectiva que surge o seguinte problema de pesquisa: Como idosos participantes de um programa de práticas corporais percebem o seu envelhecer? Já que fica evidente no decorrer do texto que o meio interfere no comportamento de cada indivíduo, a intenção é identificar o que pensa, como se vê, como se sente o idoso ativo. E para descobrir o referido problema de pesquisa, o objetivo geral é compreender a percepção sobre envelhecimento ativo. Para alcançar meu objetivo geral, vou percorrer alguns caminhos descritos como objetivos específicos: Descrever o perfil dos participantes da pesquisa; Identificar como as práticas corporais se manifestam no decorrer de suas vidas; Analisar a influência das práticas corporais na vida cotidiana dos idosos; Entender o que é ter saúde no envelhecimento ativo a partir das diferentes idades.

Decisões metodológicas

    A pesquisa é de cunho qualitativo e a entrevista narrativa foi escolhida como uma forma de dar voz às pessoas que contribuíram para responder a questão norteadora desse estudo. A entrevista foi escolhida porque “[...] valoriza a presença do investigador, oferece todas as perspectivas possíveis para que o informante alcance a liberdade e a espontaneidade necessárias, enriquecendo a investigação” (TRIVIÑOS, 1987, p. 45). Além disso, uma pesquisa qualitativa não estabelece separações rígidas entre a coleta de informações e as interpretações das mesmas. Como colaboradores da pesquisa foram escolhidos cinco idosos participantes a mais de seis meses do PAMSI, com idade entre 60 e 75 anos. Partimos do princípio que os participantes possuem afinidade com a pesquisadora e aceitaram colaborar com a pesquisa de forma voluntária, ou seja, a participação espontânea, para uma maior credibilidade dos dados (MOLINA NETO, 2010).

    O norteador do processo de construção das narrativas foi baseado em um modelo de entrevista que tem origem em uma matriz analítica, um roteiro de questões-guia que dão cobertura ao interesse de pesquisa. Ela “parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses que interessam à pes­quisa, e que, em seguida, oferece amplo campo de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem as respostas do informante” (TRIVINOS, 1990, p. 146).

    Os colaboradores receberam nomes fictícios (Cravo, Flor de Lis, Violeta, Bromélia, Flor do campo) buscando preservar a identidade dos mesmos, assim como, para preservar os aspectos éticos da pesquisa. A justificativa pela escolha dos nomes fictícios se deu em razão da simbologia que as flores representam, pois têm a capacidade de expressarem os nossos sentimentos e pensamentos, traduzindo por isso diversas mensagens. No processo de construção das narrativas, primeiramente foi realizada uma conversa informal esclarecendo os objetivos da pesquisa, a coleta de assinaturas para o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, autorizando a utilização das narrativas e a possível publicação dos resultados. Em um segundo momento, realizamos um encontro, em local e horário acordado por ambas as partes (colaborador e pesquisadora) e realizada a gravação em áudio da narrativa. E a partir de um estímulo do pesquisador “me conte sobre [...]”. Os colaboradores iniciaram suas histórias de vida.

    Neste sentido o estudo foi baseado em Connelly; Clandinin (1995, p. 11), que compreende que a narrativa estabelece uma relação direta entre o objetivo do estudo e as contribuições dos colaboradores. “[...] os seres humanos são contadores de histórias, organismos que, individual e socialmente, vivemos vidas relatadas”.

    Para registrar as informações, foi seguido um processo metodológico sugerido por Negrine (2010): primeira etapa, as informações foram transcritos com fidelidade, sem alteração do vocábulo conforme gravado. A segunda etapa foi a síntese das informações recolhidas, que serviram para análise, a terceira etapa correspondeu à interpretação das informações recolhidas, isto é relacionou-se os fenômenos encontrados com as bases teóricas.

Colaboradores da pesquisa no cenário PAMSI

    CRAVO é um idoso casado com setenta anos de idade, segundo grau completo, aposentado como motorista de caminhão. “Lavrador desde os quatro anos para ajudar em casa. [...] Contra a vontade mais meus pais queriam que eu estudasse no seminário, então fui ser seminarista”.

    FLOR DE LIS é uma idosa de setenta anos de idade, solteira, aposentada como professora. [...] “eu fiquei junto com a minha mãe e cuidei dos irmãos mais novos, eles casaram, e eu não tive tempo de namorar (risos)”.

    VIOLETA é solteira com sessenta anos de idade com primeiro grau incompleto, e ainda trabalha como costureira. [...] “aí casei e tive 3 filhos, meu marido não deixava trabalhar fora.

    BROMÉLIA casada, aposentada, 66 anos, trabalhava na lavoura quando criança, [...] fiz até a quarta série, tentei voltar, mas tinha 3 filhas pequenas não dava.

    FLOR DO CAMPO é uma idosa de 75 anos, viúva, mora com uma filha e com um neto. Família com 9 irmãos todos trabalhavam na lavoura, [...] como era mais nova cuidava da casa com a mãe. Estudou até a quinta série.

    A partir das histórias de infância é possível identificar que todos trabalhavam desde muito cedo cuidando da casa, ajudando os pais, obrigações que justificam não terem realizados seus objetivos de vida. E ao seguir na fase adulta, as mulheres, principalmente, eram predestinadas a uma vida de obrigações desde sempre, primeiro na infância servindo os pais e irmãos, depois o companheiro e os filhos. E nos dias atuais onde a expectativa de vida aumenta cada vez mais, há a necessidade de entender o que acontece na senescência e como acompanhar esses indivíduos proporcionando a eles uma melhor qualidade de vida.

    Ao longo dos últimos 50 anos, a população brasileira quase triplicou e o crescimento do número de idosos reflete nos últimos censos com 23, 5 milhões de brasileiros com mais de 60 anos, é mais que o dobro registrado em 1991 (IBGE, 2010). A decorrência desse aumento de idosos na população se dá pela diminuição dos grupos etários de menores de 20 anos, o que subentende que a natalidade no Brasil está cada vez em menor índice, e devido ao avanço da medicina e da tecnologia. E com essa mesma velocidade Santa Catarina atingiu em 2011, mais de 600 mil idosos com 60 anos ou mais. E na capital Florianópolis, aproximadamente, 48 mil (IBGE, 2010). A população criciumense está cotada a partir do IBGE 2010 em 192. 308 habitantes, enquanto isso a população idosa já atinge o número de 17. 977 (IBGE, 2010).

    Esse aumento de idosos na população representa diversas preocupações, para a família, para a sociedade, para os governantes e para profissionais de educação física que pretendem proporcionar atividades que contribuam para a qualidade de vida entre outros aspectos relevantes na vida do idoso. A Organização Mundial de Saúde (OMS, 2003), define qualidade de vida como “a percepção do indivíduo de sua posição na vida, no contexto da cultura e do sistema de valores em que vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”. Existem correntes que defendem o envelhecimento como um processo ocorrido devido à interação do ambiente com o organismo (MAZO; LOPES; BENEDETTI, 2004; FARINATTI, 2002). A partir desses estudos, entendemos que o profissional que atende esse idoso, precisa conhecer o meio em que o mesmo está inserido.

Me conte sobre...

As práticas corporais presentes em sua vida

    Nesse momento procuramos conhecer de onde veio e como chegaram nessa fase da vida os colaboradores, ou seja, quais experiências vividas. Além de analisar em que momento as práticas corporais estiveram presentes em suas vidas, quais práticas e porque, para posteriormente relacionar os motivos de ingresso no grupo.

    “Na academia mesmo faz seis, sete anos na musculação, eu procurei porque eu levava a mulher e ficava esperando lá fora, ai eu pensei o tempo que eu fico aqui fora, eu vou entrar e faço também. Ai depois nós iniciamos na Universidade alternativa aqui em 2006, só que ali não tinha musculação, ginástica nada né, só a yoga, ai eu fiz também”.

Cravo

    “Olha eu até que eu tive uma infância feliz, quando não tinha aula a gente voltava a pé, era mato naquela época, aí a gente ia tudo lá pra casa, aí tomava aquele café e esperava o trem da tarde. Depois que eu me aposentei comecei na academia fazendo hidroginástica, depois fui pra outra fiquei fazendo hidro, e depois em outra, sempre fazendo hidroginástica, ai depois não deu mais, a alergia começou a apertar, ai comecei a fazer musculação”. Eu fazia musculação mas o professor não dava atenção, a gente fazia o que queria, ai fiquei uns 3 meses e não gostei. Ai eu vim aqui, a minha cunhada fazia aqui, mas era pra pessoas obesas, ai não me aceitaram porque eu era magra. Ai voltei quando era pra idoso, e eu fiquei. Aqui eu venho direto, vocês dão atenção e a gente se sente bem, tem os amigos, converso bastante, porque eu gosto né (risos)”.

Flor de lis

    “Quando criança brincava de boneca, correr, fazer casinha, ajudava a minha mãe criar os filhos, eu lembro que a minha mãe lavava roupa pra fora e eu que carregava as trouxas, levava e trazia [...] nos dias de hoje eu me alongo em casa, fazia aquela ginástica no bairro sabe? Sempre faço cada gravidez que eu saia, eu ia, mais alongamento, essas coisas, com os idosos na pastoral da saúde, caminhava também com as vizinhas”.

Violeta

    “[...] Esperava o sábado chegar para ir dançar, mas o pai não deixava só se a mãe fosse junta. [...] adoro dançar, mas meu marido não gosta”. “[...] Quando eu trabalhava andava muito de bicicleta e a pé”.

Bromélia

    “Na infância eu adorava jogar vôlei. Jogava vários jogos e adorava peteca”.

Flor do Campo

    A partir das narrativas é possível perceber que os idosos já estiveram em contato com práticas corporais na infância, ou em grupos de exercício físico em suas comunidades ou em academias de musculação, ginástica e yoga. Tornando a sua adesão ao Pamsi facilmente.

    E o motivo do resgate dessa prática no envelhecimento é justificado por alguns estudos específicos sobre o referido tema como preocupação com a saúde.

    “Idosos revelaram que o fator mais relevante que os levam a adotar a praticar atividade física é a preocupação com a manutenção e melhora da saúde” (PEREIRA; OKUMA, 2009, p. 321). E nessa fase da vida o idoso está em um processo de perdas, é necessário entender quais implicações acarreta na sua vida, ou na sociedade que o presencia.

    Este é o momento também em que eles se preocupam mais com a sua saúde e vão em busca de cuidado antes não existido. E considerando os benefícios do exercício físico, se acredita que as alterações psicológicas decorrentes da velhice devem ser enfrentadas com uma vida mais saudável, através da preparação e orientação sobre as modificações nesta fase, para que o processo de envelhecimento seja natural e com inúmeras possibilidades, apesar dos limites já citados (MAZO; LOPES; BENEDETTI, 2001, p. 65).

A influência de uma rotina ativa

    Com a intenção de torná-los cada vez mais fisicamente ativos e com autonomia para a vida diária, é necessário conhecer a influência do programa de atenção ao idoso após inserção deste. A partir disso analisei a influência do PAMSI na vida cotidiana dos idosos;

    “Nesse meio tempo me deu um derrame, se eu não tivesse nessas atividades eu não sei como eu estaria, a gente se sente bem mesmo, eu me sinto feliz, porque se eu não fizesse (risos), seria bem pior. Inclusive ali no centro a gente conhece bastante gente, e chega assim e diz, o cara eu te conheço e você está assim, sorrindo contando piada, e escutar isso, não é nosso parente nem nada, é muito satisfatório. A gente se sente bem, parece que o organismo da gente parece que responde, chega em casa cansado, mas cansaço também é normal, por causa da seqüela que eu tenho, deito lá 10, 15 min depois já descanso e vou fazer outras coisas”.

Cravo

    “Me sinto bem melhor, acabou aquelas dores, me sinto disposta, mais esperta”.

Flor de Lis

    “Então o médico mandou eu vim pra hidro, ai eu paguei 5 anos, mas ai não tive mais condições, e fiquei sabendo desse programa aqui, ai eu vim, então eu vim pra movimentar o meu corpo, ver pessoas, credo! as meninas dali pra mim é tudo, eu converso com elas, me animo

Violeta

    “Me senti muito bem quando parei de trabalhar, comecei a participar do Pamsi, do grupo de mães, do grupo no hospital. [...] Antes de entrar no programa sentia muita dor nas juntas, agora me sinto leve, ai muito bom. [...] sou responsável pela casa, nunca paguei faxineira, todo dia limpo a minha casa, lavo minhas roupas, faço almoço, e a tarde tenho as minhas atividades né, os grupos, e ainda cuido das netas, elas tão sempre lá em casa. Toda a semana é comprometida”.

Bromélia

    “Nunca tinha entrado numa academia, a primeira vez foi aqui. No primeiro ano já passou as minhas dores, no segundo melhorei ainda mais e ai não saio mais daqui. Eu gosto muito dos grupos porque eu tenho muitas amizades. Eu gosto de ter amizades. [...] hoje eu tenho as minhas funções em casa, o almoço é meu, as tardes tenho os grupos que participo na sexta que é dia de descanso eu vou para o centro dar umas voltinhas (risos”).

Flor do Campo

    Nas falas dos idosos quando trata da modificação na vida deles após inserção no grupo, ficam evidentes os benefícios proporcionados tanto fisicamente na diminuição das dores físicas, como nos aspectos psicológicos e sociais, pois a socialização, independência, autonomia, amizade, autoconfiança, alegria, disposição são conseqüências positivas que eles encontram no grupo, que além de se exercitar de forma a manter sua saúde, autoestima, autoimagem, é um momento de aproveitar o que não foi possível no passado, podemos observar a relação de amizade que aparece como um dos motivos de manutenção no grupo. Além da independência do idoso em realizar suas funções diárias e se sentir útil. “[...] Que são atividades e ocupações que proporcionam prazer e felicidade que o idoso necessita estar engajado” (MENDES et al., 2005).

    A atividade em grupo é uma forma de manter o indivíduo em contato socialmente, contribuindo de forma significativa em seu envelhecer. Que acontece de acordo com experiências vividas, o que se conclui disso é que cada organismo independente da idade cronológica, pois ele reage de uma forma diferente, porque cada indivíduo é único, é peculiar.

    O envelhecimento é entendido como parte integrante e fundamental no curso de vida de cada indivíduo. É nessa fase que emergem experiências e características próprias e peculiares, resultantes da trajetória de vida, na qual umas têm maior dimensão e complexidade que outras, integrando assim a formação do indivíduo idoso (MENDES et al., 2005).

    Analisando este contexto é possível perceber que as narrativas de vida tão diferentes umas das outras justifica cada idoso envelhecer de forma distinta. Além disso, Benedetti (2007) afirma que o estilo de vida ativa pode contribuir para retardar o momento em que o corpo sucumbe à fragilidade física e à doença, e como conseqüência direta ocorrerá uma diminuição significativa dos custos com a saúde, ou seja, diminuirão os gastos com a aquisição de medicamentos a serem distribuídos para a população.

Envelhecer com saúde

    Com interesse em conhecer a percepção do idoso ativo sobre a sua saúde, e justificar os fatores que os levam a prática do exercício físico nessa fase da vida. Buscamos entender a partir dos relatos o que é ter saúde no envelhecimento ativo a partir das diferentes idades.

    “Hoje a minha saúde ta bem, se bem que eu tomo remédio, mas sustos que a gente levou na vida, o que mais me forçou a isso, foi o derrame que me deu, então nessas academias coisas assim a gente aprendeu a viver, e hoje me sinto satisfeito, me sinto bem, só eu e a mulher em casa, com a família também, fazem aquelas festas e é bom. “[...] eu vivo em tratamento médico, mas me sinto muito bem, não tenho mais aquele negócio de quando a gente trabalhava na lavoura, não consigo fazer isso, não consigo fazer aquilo, hoje eu consigo, depois de entrar nessas academias, e comecei a movimentar o corpo, eu não sei se me daria o derrame”.

    “[...] eu vejo uma pessoa bem diferente do que eu via alguns anos atrás,

    com vontade de levar a vida, não importa as intemperes, os problemas, porque eles vêm sempre a menos do que a gente pode enfrentar. Tenho mais dificuldades hoje com o passar do tempo, mas foi por causa dos problemas que eu tive né, derrame, acidentes. Mas a academia supre as vontades que eu tenho de fazer as coisas. “[...] considerando as academias, sinto saudade do tempo que eu trabalhava na lavoura, quando o cara fazia um monte de coisa, pegava peso, sem sentir nada, mas claro a gente era jovem, então a gente supre aquela vontade através da academia.

Cravo – 70 anos

    “Eu sempre cuidei da minha saúde, eu não tenho colesterol, diabetes, a única coisa que o médico diz que eu tenho e eu digo que não, é pressão alta, a minha pressão é sempre baixa, porque a minha família são hipertenso, o que eu tenho é a minha alergia desde de pequena, alergia de tudo, de pó, de pelo de gato, e agora eu fiz o exame, e é da alimentação,. Eu me sinto saudável”. “[...] Até acho graça porque eu não me sinto velha risos. Quando me vejo no espelho vejo que mudou, naquele tempo eu era bonita agora eu sou feia risos. Mas eu não me sinto velha, nem feia, se eu vejo uma coisa eu compro, mas assim ser vaidosa não.

Flor de Lis – 70 anos

    “[...] Minha saúde acho que é boa, porque cuido da alimentação, faço hidro. Mas quando descobri que tinha que tomar remédio controlado pra diabetes eu só chorava, porque nunca tomei remédio controlado, eu fiquei angustiada, porque o resto da vida vou ter que tomar isso. Mas depois fiquei orando e me conformei porque tanta gente tá pior toma um monte de comprimido”..“[...] quando me olho no espelho eu penso, ai como eu to bonita.”. [...] hoje eu não dependo de ninguém, se eu quiser sair eu saio, tenho meu dinheiro.

    [...] vejo que vai envelhecendo o corpo, o cabelo, mas a mente só fica mais lenta, mas eu não me sinto mais velha não, só quando falta agilidade, que antes eu fazia as coisas mais rápido. “[...] o que é bom na velhice, é que eu chego a hora que quero, saio a hora que quero, tenho meu carro vou aonde eu quero, minha filha mora atrás, não me sinto sozinha não , fico até tonta de tanta gente, eu era bem esperta, mais hoje eu fico zonza.

Violeta - 60

    “Agora é que estou aproveitando bem mais, tive mais conhecimento, convivo mais com as pessoas, A minha saúde eu cuido, de vez em quando vou ao médico, faço os meus exames, tomo só um comprimido pra pressão, estou velha por fora e nova por dentro. Graças a deus tudo que eu fazia antes faço hoje. Quando me olha no espelho me dá um desespero, mas é o envelhecimento faz parte fazer o que. O meu marido sempre dizia, nós não vamos alcançar os netos, não vai dar tempo, e hoje vejo que estamos ai com as netas tudo crescidas, isso é bom vejo que envelheço e continuo aproveitando as coisas boas”.

Bromélia – 66 anos

    “Eu acho que ter saúde é ter cuidado, eu não me cuido, a minha alimentação eu não cuido, talvez eu pudesse ter mais saúde, mas não posso me queixar. [...] com o passar dos anos eu ando mais lenta, eu caia muito, agora estou melhor e nem me sinto velha, eu não sei se é porque eu participo de muita coisa, nem vejo que estou ficando velha. [...] Hoje eu passeio muito mais do que antes, sou bem mais independente”.

Flor do Campo – 75 anos

    O idoso acaba por perceber uma imagem de dependência e fragilidade, como se o envelhecer fosse uma etapa distinta e o aproximasse da morte e do fim de perspectivas possíveis. Quando se autoavalia, confunde saúde com a ausência de doenças, e autonomia com dependência física. Este processo de autoconhecimento é importante para compreender a aceitação sobre as mudanças que o nosso organismo sofre com o passar dos anos, entendendo melhor o que é necessário para viver uma velhice saudável. No processo do envelhecimento uma das características mais marcantes é o declínio gradual da capacidade de desempenho muscular causando assim uma perda de autonomia da ação dos idosos (FARINATTI, 2008).

    Um fator de destaque no envelhecimento nos estudos de Mazo; Lopes; Benedetti; (2001, p. 64) “é que os indivíduos, com o passar dos anos, desenvolvem uma imagem de si através da estrutura social em que estão inseridos. Criam limites próprios, relacionados às capacidades pessoais e à realização humana”. Por isso a importância de estar inseridos em grupos de pessoas com os mesmos interesses, pois se reencontram se reinventam entre eles e na própria sociedade. Sendo assim se avaliam nas narrativas de Cravo e Flor de Lis que ser saudável é não tomar remédios e nem ter doenças, porém, nas mesmas narrativas se encontra a resposta de que se sentem saudáveis, ou seja, aprenderam a viver bem em tratamento médico.

    Embora o envelhecimento não aconteça de forma e nem em momentos iguais para as pessoas, mas as alterações biológicas ocorrem e são características do avanço da idade, deixando o individuo a mercê de complicações e limitações advindas da soma de aspectos fisiológicos, psicológicos e sociais. Para entender e buscar a eficiência de um programa de atenção ao idoso é importante conhecer os processos fisiológicos, psicológicos e sociais que levaram o individuo ao processo de envelhecimento.

    Para isso, partimos da idéia que a autonomia, para Farinatti (2007), tem uma amplitude de significações – equivalente à liberdade, autodeterminação, dignidade, integridade, independência, responsabilidade e autoconhecimento. Que é importante também para entender nessa fase da vida o que é ter saúde, já que a atual definição da Organização Mundial de Saúde (OMS, 2003) conceitua saúde como “o estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não simplesmente a ausência de doença ou enfermidade”. Refletindo a autonomia que representa um ideal a atingir, uma conquista permanente, uma capacidade para ser exercida, daí sua relação estreita com as condições de saúde (FARINATTI, 2008). Podemos observar que não é compatível ao conceito da OMS, já que o completo bem-estar é uma busca também permanente em qualquer idade.

Considerações transitórias

    A partir do objetivo geral deste estudo: compreender a percepção sobre envelhecimento a partir da inserção em um grupo de atenção ao idoso, às narrativas dos colaboradores nos possibilitou a perceber que grupos incentivados por universidades, clubes, e até pela própria comunidade são positivos na vida de idosos. Inserido em grupos, mantendo uma rotina de atividades diárias o individuo se reintegra a sociedade, família, a vida. Mantendo esse idoso ativo, disposto a realizar suas atividades diárias e também compartilhando experiências de vida, pensamentos, sentimentos, o que contribui positivamente para a compreensão e superação de acontecimentos, dificuldades, limitações advindas do tempo, da idade, da vida. O aumento da população idosa reflete em mudanças em vários ramos da sociedade, principalmente a atenção voltada à saúde e políticas públicas que enfatizem a promoção da saúde, a manutenção da autonomia e a valorização dos espaços sociais prestando assistência aos idosos

    Os caminhos que podem nos levar à vida do outro são muitos e a partir deste estudo foi possível entender que conhecer nossos participantes a partir de suas histórias narradas, foi possível analisar suas experiências, e isso nos possibilitou observar seus estilos de vida no decorrer dos anos, e que a rotina de práticas corporais vivenciadas reintegra socialmente, psicologicamente e espiritualmente. Resgatando hábitos, rotinas, responsabilidades, determinação, autonomia, disposição, felicidade. Por isso a importância de inserir esse idoso na prática de atividades em grupos. E ao fim dessa pesquisa a sensibilidade tomou conta de nossa percepção, concluindo que quando apenas olhávamos os idosos, sem conhecer suas narrativas, apenas enxergava como participantes idosos de um grupo, a partir do momento que os ouvia, sentíamos suas tristezas, fraquezas, traumas, perdas, alegrias, saudades, enfim sentimentos que constroem personalidades, então conhecemos e compreendemos nossos idosos, entendendo que eles não ficaram velhos de uma hora para outra, precisaram de uma vida inteira para que isso acontecesse, então não seria apenas os observando que conheceríamos quem eram realmente nossos idosos. Aprimoramos desse modo nossos conhecimentos profissionais e científicos, com um diferencial, em utilizar a narrativa como forma de aprender a avaliar o idoso por meio de experiências de vida que buscamos aprender a vivenciar para qualificar nosso trabalho.

Nota

  1. Projeto de extensão fomentando por recurso interno da Universidade do Extremo Sul Catarinense, cujo objetivo é Prestar Atendimento à Saúde dos idosos da região Sul de Santa Catarina, oportunizando uma melhora na qualidade de vida, buscando a transformação social a partir da autonomia dos participantes, norteando ações Inter geracionais para um melhor convívio social.

Referências

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  • TRIVIÑOS, Augusto N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987.

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