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A Educação Física escolar tem espaço para a ginástica geral?

¿La Educación Física escolar, tiene espacio para la gimnasia general?

 

*Acadêmicas do curso de Licenciatura em Educação Física - UNIPAMPA

**Docente do Curso de Licenciatura em Educação Física – UNIPAMPA

(Brasil)

Patrícia Becker Engers*

patiengers@hotmail.com

Renata Calza*

renata_calza@hotmail.com

Vanessa Cantini Trindade*

vane2008sa@hotmail.com

Paula Bianchi**

paulacbianche@yahoo.com.br

 

 

 

 

Resumo

          A Educação Física escolar no Brasil tem priorizado ao longo da sua história, o esporte como conteúdo principal e deixado de lado o estudo, bem como o trato pedagógico das diferentes manifestações da cultura de movimento presentes na sociedade, como a ginástica geral. A partir desse contexto, surgiu o interesse de investigar, na realidade onde estamos inseridas, a cidade de Uruguaiana (RS) as manifestações da ginástica, especialmente da ginástica geral presentes nas aulas de Educação Física em uma escola da rede municipal de ensino. O estudo mostrou que, são raras as experiências educativas no âmbito da ginástica, sendo que, a ginástica geral não é abordada nas aulas. Percebemos a necessidade de ampliar os estudos sobre a ginástica geral nas escolas, visando a difusão deste tema entre professores e estudantes, além de incentivar a criação de propostas pedagógicas sobre a ginástica geral.

          Unitermos: Ginástica geral. Educação Física. Escola.

 

Abstract

          The Physical Education in Brazil has prioritized throughout its history, the sport as the main content and left out the study, as well as the pedagogical treatment of the various manifestations of the culture of movement in society, such as general gymnastic. From this context, we became interested in investigating in reality where we entered the city of Uruguaiana (RS) demonstrations of gymnastics, especially in the general gymnastic education present classes in a public school. The study showed that educational experiences are rare within the gym, and the gym is usually not discussed in class. We realized the need to expand studies of the general gymnastics in schools, aiming to disseminate this issue between teachers and students, and encourage the creation of pedagogical proposals on general gymnastic.

          Keywords: General gymnastic. Physical Education. School.

 

Esta pesquisa teve apoio financeiro do programa PBDA/UNIPAMPA.

Uma versão deste texto foi apresentada no II Congresso Internacional de Formação Profissional

no campo da Educação Física realizado nos dias 17 a 19 de maio de 2012.

Florianópolis, SC e publicado nos Anais do congresso.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 190, Marzo de 2014. http://www.efdeportes.com/

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Breves considerações a respeito da história da ginástica na Educação Física escolar

    A história da Educação Física nas escolas inicia-se no Brasil após a proclamação da República no final do século XIX, influenciada por pedagogos europeus e médicos sanitaristas, que introduzem a ginástica como seu principal conteúdo. Por um período considerável de tempo, a Educação Física ficou restrita a ginástica e a sua prática nas escolas, visando principalmente a formação de corpos saudáveis e de pessoas com boas condições físicas, aptas para o trabalho e defesa do país.

    No entanto, este cenário vai se modificar ao longo do século XX, quando ocorre no Brasil, um amplo processo de expansão do esporte, que repercutiu sobre diversas práticas corporais, como: a ginástica e a dança, as quais foram, aos poucos, sendo esportivizadas. Tal fenômeno alcançou a Educação Física escolar, onde atualmente destaca-se o esporte enquanto conteúdo hegemônico.

    Segundo Soares (2005), no início do século passado, a ginástica praticada na Educação Física escolar restringia-se a prática de exercícios físicos dirigidos por um instrutor e apresentava como finalidade principal produzir corpos saudáveis, livres de doenças, produtivos e educados/civilizados para servir a pátria brasileira, numa perspectiva que muitos estudiosos chamaram de higienista. Derivando desse contexto histórico, a Educação Física vem sendo confundida no âmbito da escola como uma atividade de caráter meramente prático e detentora de práticas esportivizadas, na sua maioria, voltadas ao esporte de rendimento. Este processo, por sua vez, dá origem, a no mínimo, a três problemas que precisam ser enfrentas pela Educação Física: o primeiro, é que restringe o acesso e a apropriação ao conhecimento, bem como a prática das diferentes manifestações da cultura de movimento; segundo, origina situações de desigualdades entre os estudantes, pois, somente os “mais aptos”, aqueles que apresentaram melhores condições motoras, serão convidados a participar das aulas; e o terceiro, consiste no quase desaparecimento da ginástica geral das aulas de Educação Física.

    As problemáticas destacadas acima se colocam como questões importantes a serem discutidas pela Educação Física escolar, buscando superá-las, por meio de uma concepção de Educação Física que contemple a problematização/ressignificação crítica de todas as representações de movimento produzidas pela humanidade ao longo de sua história, tratando-as pedagogicamente e não priorizando apenas um conteúdo, como acontece atualmente com o esporte na maioria das escolas.

    Considerando que o campo que compreende as manifestações de movimento é bastante amplo, é necessário, nesse momento, fazermos um recorte, enfatizando como objeto de estudo desta pesquisa, a ginástica geral.

    Conceitualmente, podemos afirmar que a ginástica moderna está alicerçada principalmente em três perspectivas: 1) a produção e manutenção de um corpo produtivo; 2) a produção de corpos adestrados; 3) produção de corpos saudáveis, e se propaga majoritariamente por meio de uma pedagogia tecnicista e normativa.

    Nesse sentido, a ginástica por ter vários entendimentos pode abarcar uma infinidade de práticas, que incluem desde as atividades físicas, praticadas informalmente, sem sistematização até os exercícios físicos, praticados regularmente e sistematizados, como a musculação e as ginásticas de academia. Também, existem as ginásticas de competição, mundialmente difundidas e praticadas nas seguintes modalidades: Artística, Rítmica, Aeróbica, Acrobática e de Trampolim. Há também a ginástica geral, que se diferencia das demais por não apresentar caráter competitivo e incluir, durante sua performance, outros elementos da cultura de movimento como: a dança, o teatro, as artes circenses e o jogo.

    A partir disso, é possível perceber que ginástica pode assumir diferentes finalidades, dependendo do interesse do sujeito que a pratica e do contexto social em que ela acontece. Assim, pode ser requerida na preparação esportiva, na melhora da aptidão física, na forma recreativa-educacional e de competição (profissional). Em se tratando da ginástica geral, a mesma inclui a prática com ou sem a utilização de materiais e aparelhos, podendo ocorrer em espaços fechados e ao ar livre, possibilitando, por meio de suas práticas sem fins competitivos, maior conhecimento de si e percepção do próprio corpo no mundo.

    Conforme Santos (2001) a ginástica geral é definida como:

    Um campo abrangente da Ginástica, valendo-se de vários tipos de manifestações, tais como danças, expressões folclóricas e jogos, apresentados através de atividades livres e criativas, sempre fundamentadas em atividades ginásticas (p. 23).

    Entre as principais características da ginástica geral, podemos destacar que: a motivação para a sua prática não se baseia na competição (vitória de um em detrimento da derrota do outro), mas sim, na superação de desafios e de problemas resolvidos coletivamente por seus praticantes; possibilita o desenvolvimento de trabalhos com grupos heterogêneos, formados por homens e mulheres, de diferentes idades, sem restrição quanto ao número de participantes e de habilidades motoras e físicas necessárias para sua prática, sendo vivenciado a partir de uma perspectiva inclusiva, criativa e lúdica. Busca-se por meio da ginástica geral, incentivar a descoberta de novas experiências de movimento e de diferentes formas de interação do sujeito com o contexto onde está inserido.

    Ao entender que o conhecimento a respeito da ginástica geral, é decorrente da produção humana, acreditamos que o mesmo deve ser tratado criticamente na escola como parte do processo social e cultural da humanidade. Assim, nossa investigação apresentou como objetivo principal analisar criticamente manifestações da ginástica geral nas aulas de Educação Física em uma escola municipal de ensino fundamental, a saber, escola José Francisco Pereira da Silva, localizada na cidade de Uruguaiana, RS. A escolha da escola para realização deste estudo se deu, principalmente, pelo fato de se tratar de um espaço-campo de estágio obrigatório do Curso de Licenciatura em Educação da UNIPAMPA, assim os resultados apresentados ajudarão a pensar novas demandas e possibilidades para o estágio supervisionado e para a Educação Física naquela escola e talvez, à rede municipal de ensino.

    Esta pesquisa de caráter qualitativo-descritivo, utilizou o método da análise de conteúdo proposto por Bardin (2011) para o tratamento dos dados obtidos. Os participantes da pesquisa foram os dois professores de Educação Física da escola José Francisco Pereira da Silva, os quais estão identificados, no texto, pelos nomes “P1” e “P2”. Foram utilizados para a coleta dos dados, os seguintes instrumentos: observações sistemáticas de aulas de Educação Física, entrevistas com os professores participantes, análise documental do plano de ensino da escola para a área de Educação Física, além de registros das pesquisadoras por meio de fotografias e diário de bordo. As observações ocorreram durante o período de junho até agosto de 2011, nas turmas de Educação Física de 5ᵃ a 8ᵃ séries e compreenderam um total de dezesseis aulas observadas.

    A seguir passamos a apresentação e discussão dos resultados principais da pesquisa.

Apresentação e discussão dos resultados de pesquisa: aspectos gerais

    De modo geral, a partir do problema inicial da pesquisa que consistiu em analisar manifestações da ginástica geral na Educação Física escolar em uma escola da rede municipal de ensino de Uruguaiana, RS, foi possível perceber que o esporte é o conteúdo predominante nas aulas de Educação Física, ratificando o que aponta a literatura na área (BRACHT, 1999, PIRES, 1998, KUNZ, 1991).

    Quanto a organização dos conteúdos da Educação Física na escola, conforme relato da P1, os mesmos são divididos durante o ano, em quatro etapas, nas quais são vivenciadas as seguintes modalidades esportivas: voleibol, futsal/futebol, handebol e basquetebol, sendo que, ao concluir o ensino de um esporte e antes de iniciar outro são realizados treinamentos de atletismo tendo em vista a participação em competições. Também, observamos que nas turmas de 5ª e 6ª séries, nas quais leciona a P1, as meninas vivenciavam o handebol, enquanto os meninos, o futsal. As aulas ministradas por esta professora, geralmente apresentava os seguintes procedimentos metodológicos: iniciava com a realização de aquecimentos baseados em passes e arremessos do esporte que seria praticado e, em seguida acontecia a divisão dos times e, por último, a realização do jogo propriamente dito.

    Acompanhamos as aulas de Educação Física para as turmas de 7ª e 8ª séries, orientadas pelo P2. Neste caso, as meninas praticavam o futsal e os meninos, o voleibol. Quanto a organização metodológica para a realização das aulas, o P2 divide as turmas de acordo com a faixa etária, visando treinamento para competições escolares, como os Jogos Escolares do Rio Grande do Sul (JERGS) e Guri Bom de Bola, que ocorrem anualmente.

    Considerando tais aspectos, identificamos que a metodologia de trabalho e a seleção dos conteúdos de ambos os professores apresentam características da concepção de aulas de Educação Física tecnicista e/ou esportivizada (PIRES, 1993), a qual se refere à supervalorização dos aspectos técnicos, estimulando a prática esportiva de competição, a divisão entre meninos e meninas e uma relação de ensino-aprendizagem centrada no professor, como o maior detentor do conhecimento. Neste sentido, percebermos a ausência de manifestações da ginástica geral nas aulas de Educação Física de 5ª a 8ª série na escola.

A ausência das manifestações da ginástica geral na Educação Física escolar e o esporte como conteúdo hegemônico

    A partir da análise crítica dos resultados obtidos, destacamos a hegemonia do esporte, sob o viés da competição e do desempenho técnico nas aulas de Educação Física na escola pesquisada.

    De acordo com o planejamento dos professores participantes, ao longo do ano letivo, as modalidades esportivas abordadas nas aulas são: o futsal/futebol, voleibol, handebol e o basquete. Como o ano letivo na escola está dividido em 4 bimestres e cada um é ocupado/preenchido por um dos esportes citados, não resta espaço para o tratamento pedagógico de outras manifestações da cultura de movimento, especialmente aquelas que não estão voltadas ao rendimento e a ênfase da técnica, por exemplo, a ginástica geral.

    Se por um lado, na prática pedagógica dos professores, não existe espaço para promover a ginástica geral nas aulas de Educação Física, por outro, no que tange as diretrizes da escola, ao analisar o plano de ensino da escola para a área de Educação Física, verificamos que a ginástica é apontada como dos conteúdos que a Educação Física deveria desenvolver durante os anos escolares. Tal aspecto evidencia uma fragilidade entre o que consta em um documento oficial da escola e o que se observa na realidade.

    Refletindo sobre essa situação, elencamos algumas hipóteses que poderiam nos ajudar a compreender porque isso acontece na escola, entre eles: 1º) que talvez os professores que estão lotados na escola atualmente não tenham participado da elaboração/proposição deste documento (Plano de Ensino) e por isso o desconhecem e não se apropriaram do mesmo; 2º) um fator relevante para a ausência da ginástica geral na escola se dá pelo seu desconhecimento por parte dos professores sobre como trabalhar o conhecimento gímnico, as diferentes manifestações da ginástica na perspectiva educacional, principalmente para além do viés competitivo; 3º) (o mais provável) que o processo de esportivização das práticas corporais na Educação Física escolar é ainda tão forte/enraizado que inviabiliza o trato pedagógico e a re-elaboração da ginástica neste contexto. Porém, estas são questões hipotéticas que surgiram no decorrer do campo de pesquisa e necessitam ser investigadas com mais atenção futuramente por meio da continuidade dos nossos estudos sobre Educação Física escolar e ginástica.

    Além da presença predominante do esporte na Educação Física escolar na realidade observada, compreendemos que alguns fatores interferem para a não realização de experiências pedagógicas com as diferentes manifestações da ginástica na escola, entre os quais destacamos: a falta de infraestrutura adequada, a esportivização da ginástica e a falta de formação adequada aos professores em serviço.

    Quanto ao primeiro aspecto, verificamos que a precariedade do espaço físico e dos materiais existentes para a prática da Educação Física, incluindo a inexistência de materiais específicos para as manifestações da ginástica. A escola possui um espaço pequeno para as aulas práticas de Educação Física, sendo este uma quadra com cobertura, de cimento desgastado, onde, na maioria das vezes, encontramos lixo espalhado pelo local. Além disso, as turmas das séries iniciais têm seu intervalo/recreio em horário diferente dos estudantes das séries finais do ensino fundamental, com isso, ao mesmo tempo em que, o professor de Educação Física está dando aula na quadra da escola, circulam pelo local, entretidos em suas brincadeiras, crianças das séries iniciais (do 1º ao 4º ano) que estão no recreio, o que também se mostra como uma das dificuldades dos professores de Educação Física em desenvolver suas aulas.

    Já, o Ginásio Municipal, local onde também são realizadas aulas de Educação Física, encontra-se em melhores condições de infraestrutura e de materiais, mesmo assim, não registramos presença de materiais para a vivência da ginástica especificamente. Nesse sentido, concordamos com Soares et al. (1992), ao considerar que a falta de infraestrutura é um fator que desestimula o professor a ensinar à ginástica no contexto da escola.

    Por outro lado, e aqui já aproveitamos para abordar o segundo aspecto, quando existem esses meios, espaço físico adequado e materiais, a esportivização da ginástica se sobressai na escola, estabelecendo normas de movimento, divisão por sexo na prática das modalidades da ginástica e como consequência a sua elitização. Acreditamos que isso ocorra devido os professores desconhecerem as possibilidades pedagógicas da ginástica geral e como resultado, acabam não criando oportunidade aos estudantes de conhecer e se apropriar de outras formas de praticar a ginástica e as manifestações gímnicas nas aulas de Educação Física. Conforme Ayoub (1998), a ginástica raramente é abordada na escola devido preconceitos e por consistir em atividades com grau de dificuldade elevado quando seu ensino está associado às práticas competitivas.

    Dessa forma, entendemos a ginástica geral como mais uma possibilidade pedagógica a ser tratada pela Educação Física no contexto escolar, tendo em vista que se refere a uma prática inclusiva, que promove características como: a criatividade, a troca de experiências e saberes entre estudantes e professores, não requer os equipamentos e materiais tradicionais da ginástica, pois pode ser praticada com materiais alternativos, muitas vezes construídos pelos próprios estudantes com a ajuda do professor e rompe com o paradigma da competição nas aulas de Educação Física. Contudo, ao defender a inclusão da ginástica geral na escola por considerar que a mesma é parte da cultura humana, logo os estudantes têm direito de se apropriar deste conhecimento, além de buscar a superação de modelo de aula esportivizado, é fundamental refletir sobre a formação continuada dos professores de Educação Física, terceiro aspecto que destacamos entre os fatores que interferem no ensino da ginástica geral na escola.

    A partir de autores como Schon (1995) e Zeichner (2003), é possível observar a importância da criação de espaços para a formação continuada dos professores, visando o aperfeiçoamento e aprofundamento teórico-metodológico das ações desenvolvidas por estes no âmbito escolar. Conforme Perrenoud (2000), se desejamos a implantação de propostas pedagógicas que tenham implicações em novas posturas frente ao conhecimento e no processo de ensino-aprendizagem, pensar a formação continuada de professores é algo de grande importância.

    Nesse sentido, durante as entrevistas, a falta de conhecimento e de formação adequada para trabalhar com a ginástica geral na escola foram destacadas pelos professores (P1 e P2) como alguns dos aspectos que dificultam a sua inclusão entre os conteúdos a serem abordados pela Educação Física. Neste sentido, a formação continuada poderia ser um dos caminhos para superar o problema da falta de conhecimento teórico e prático acerca da ginástica geral. No entanto, sobre a formação continuada de professores de Educação Física da rede municipal de ensino de Uruguaiana, verificamos que a mesma consiste em apenas um encontro mensal promovido pela Secretaria Municipal de Educação/Coordenação da Área de Educação Física, sendo dada ênfase ao esporte.

    Nesses encontros, procura-se contemplar os interesses do professorado, sendo organizados na forma de palestras e relatos de experiência, além de, alguns encontros, destinados ao planejamento de atividades envolvendo a Educação Física escolar. Momentos nos quais os professores adaptam seus planejamentos de trabalho à participação da escola em competições e jogos organizados/realizados pelo município e/ou Estado. É preciso destacar que participar de competições escolares com equipes da escola é uma característica bastante acentuada entre os professores de Educação Física do município de Uruguaiana, o que pode ser percebido não apenas através da hegemonia do esporte enquanto principal conteúdo da Educação Física como também por ser o tema principal dos encontros de formação continuada da área de Educação Física do município.

    No que trata sobre a participação dos professores nos encontros de formação continuada, os mesmos alegam que a falta de tempo gerada pelo excesso de trabalho consiste em um dos principais empecilhos para participar desses encontros. De acordo com Hernández (2010) os planos de formação devem atender aos interesses e necessidades dos docentes, auxiliando-os na solução de problemas oriundos da sua prática pedagógica e que utilizem metodologias de ensino diversificadas, tendo em vista que o modo de aprender dos professores se dá de modo diferenciado.

    A partir disso, acreditamos que o desinteresse nos encontros de formação continuada e a ênfase dada ao esporte na formação continuada repercutem na prática pedagógica dos professores, gerando um fazer pelo fazer, desconectada da reflexão na ação e sobre a ação, como destaca Schon (1995) e a manutenção da hegemonia das práticas esportivas nas aulas de Educação Física na realidade estudada.

Uma pausa para reflexão sobre a Educação Física sexista na escola

    Aula de Educação Física no início do século passado era realizada para turmas separadas: meninas de um lado, meninos de outro. De lá pra cá, tivemos algumas conquistas no sentido de superar tal divisão, pois percebeu-se a importância do convívio entre mulheres e homens. Contudo, a realidade nas aulas de Educação Física na escola-campo da pesquisa ainda permanece como no passado, sendo que se organizam por meio de turmas divididas por sexo feminino e masculino, a partir da 5ª série e/ou 5ª ano do ensino fundamental. Dessa forma, as meninas têm aula de Educação Física na quadra de esportes da escola enquanto os meninos participam das aulas, em um ginásio localizado fora das dependências da escola, no Centro Esportivo Municipal Nova Esperança, que fica aproximadamente a 1 km de distância da escola.

    A divisão entre meninos e meninas reforça a predominância da concepção de aulas de Educação Física tecnicista/esportivizada apontada no início deste texto, facilitando dessa forma ao professor a organização e desenvolvimento da aula, evitando a ocorrência de conflitos entre participantes durante a prática dos conteúdos, no caso o esporte. Ao optar em manter as turmas separadas por sexo, consideramos se tratar de um caso de renúncia pedagógica por parte dos professores de Educação Física, que escolhem esta metodologia a fim de evitar a problematização de conflitos gerados na convivência entre meninos e meninas. Sem falar, que, ao adotar uma metodologia de trabalho “neutra”, o professor juntamente com a escola está contribuindo para a naturalização da divisão sexista da própria sociedade, contribuindo para uma formação educacional, sócio-cultural machista e preconceituosa de crianças e jovens, futuros adultos.

    A escola é um dos espaços sociais formativos que pode promover o tensionamento desta questão sexista, buscando minimizar os efeitos dos valores discriminatórios advindos do contexto social em que circulam os meninos e as meninas. Portanto, consideramos urgente à comunidade escolar, especialmente aos docentes e à direção, repensar esta realidade no contexto da Educação Física da escola pesquisada.

Considerações finais

    A partir dos resultados obtidos, identificamos aspectos importantes a serem discutidos, visando a ampliação e aperfeiçoamento de experiências com as manifestações da ginástica geral no âmbito da Educação Física na rede municipal de ensino de Uruguaiana (RS).

    Neste contexto, notamos no plano de ensino da escola pouca diversidade entre os conteúdos a serem desenvolvidos nas aulas de Educação Física, enfatizando o ensino de esportes individuais e/ou coletivos. Assim, quando presente, a ginástica é proposta na perspectiva do treinamento esportivo, visando preparar os estudantes para competições e em alguns casos (raros), buscando a prevenção de problemas de saúde relativos ao sedentarismo. Num espaço predominado pela concepção esportivizada, a ginástica também é compreendida como um esporte, o que leva priorizar durante o seu aprendizado a técnica, a performance e os bons resultados, dessa forma, é importante destacar que não encontramos nenhum indício do trato científico e pedagógico acerca da ginástica geral nas aulas observadas.

    Paradoxalmente, no plano de ensino da escola, verificamos que há preocupação em estimular o conhecimento das diversas manifestações da cultura de movimento como algo importante para a formação integral dos estudantes, no entanto, entre os conteúdos desenvolvidos percebemos a predominância dos esportes com caráter competitivo.

    A partir do estudado, acreditamos que alguns aspectos dificultam o ensino-aprendizagem da ginástica geral, entre eles destacamos os seguintes: 1) a falta de espaço físico e materiais adequados para a prática desta manifestação gímnica; 2) a falta de formação do professorado para abordar este conteúdo numa perspectiva não competitiva; 3) a excessiva carga horária dos professores que prejudica a participação em atividades da formação continuada e 4) a opção/escolha dos professores de Educação Física pela concepção tecnicista/esportivizada.

    Portanto, identificamos como fundamental para inserir a problematização da ginástica geral no contexto escolar estudado, conceber ações de formação continuada juntamente com os professores de Educação Física da rede municipal de ensino de Uruguaiana, buscando discutir novos métodos de ensinar e aprender, a inserção de outros conteúdos da cultura corporal nas aulas, além de tentar superar a concepção esportivizada de aulas de Educação Física, predominante na ação pedagógica dos professores no contexto estudado.

    Também, é importante pensar em suporte técnico para o ensino e aprendizagem da ginástica geral nas escolas, tendo em vista que a infraestrutura e materiais disponíveis para a Educação Física são precários, o que desestimula o ensino da ginástica no âmbito escolar.

    Acreditamos que este estudo possibilitou uma aproximação com o contexto da Educação Física escolar no município de Uruguaiana, incluindo professores de Educação Física, escola e Secretaria Municipal de Educação. Nesse sentido, consideramos importante o desdobramento deste estudo na perspectiva da pesquisa-ação numa tentativa de contribuir ainda mais com a discussão e produção de conhecimento nesta área, além de estimular a inserção da ginástica geral no contexto escolar e da formação continuada dos professores.

Referências

  • AYOUB, E. A Ginástica Geral na sociedade contemporânea: perspectivas para a Educação Física escolar. Tese de doutorado apresentada à Faculdade de Educação Física da Universidade Estadual de Campinas, 1998.

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  • _________________. A Educação Física Escolar no Brasil: contextualização histórica. Material didático produzido para servir de base para curso de capacitação de professores de Educação Física da rede pública de Florianópolis. Agosto/93. (não publicado).

  • SANTOS, J. C. E. Dos. Ginástica geral – elaboração de coreografias, organização de festivais. Jundiaí, SP: Fontoura, 2001.

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  • SOARES, C. L. Imagens da Educação no Corpo. 3ª Edição. Campinas: Autores Associados, 2005.

  • SOARES, C.L.; TAFFAREL, C.N.Z.; VARJAL, E.; CASTELLANI FILHO, L.; ESCOBAR, M. O.; BRACHT, V. Metodologia do ensino de educação física. São Paulo: Cortez, 1992.

  • ZEICHNER, K. M. Formando professores reflexivos para a educação centrada no aluno: possibilidades e contradições. Página 35 – 55. In: BARBOSA, R.L.L. (Org.). Formação de educadores: desafios e perspectivas. São Paulo: Editora UNESP, 2003.

  • HERNÁNDEZ, F. A formação do professorado e a investigação sobre a aprendizagem dos docentes. Páginas 45 – 59. In: NETO MOLINA, V.; TRIVIÑOS, A.N.S. (Org.). A pesquisa qualitativa na Educação Física. Alternativas Metodológicas. 3ª Edição. Porto Alegre: Sulina, 2010.

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