Constipação intestinal: definição, etiologias e abordagem terapêutica Constipación intestinal: definición, etiologías y abordaje terapéutico |
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*Enfermeiro. Especialista em Didática e Metodologia do Ensino Superior pela Universidade Estadual de Montes Claros. Acadêmico de Medicina, UNIMONTES **Enfermeira. Especialista em Saúde da Família pela Universidade Estadual de Montes Claros (Brasil) |
Antônio Lincoln de Freitas Rocha* Marcela Guimarães Fonseca** |
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Resumo Existe certa dificuldade em definir exatamente o que seja constipação. Muitos definem constipação utilizando um ou mais dos sintomas: fezes endurecidas, evacuações infreqüentes (tipicamente menos de três vezes por semana), necessidade de esforço excessivo para evacuar, sensação de evacuação incompleta, tempo excessivo ou insucesso na defecação. Esta é uma pesquisa bibliográfica, retrospectiva, de natureza descritiva que enfatiza a importância de compreender definição, etiologias fisiopatologia, manifestações clínicas e abordagem terapêutica da constipação intestinal. A população foi composta por cinco artigos que abordaram o tema constipação publicados em periódicos nacionais no período entre 2005 e 2009 e indexados nas bases de dados do Scielo. E também por duas obras literárias a respeito do assunto, para uma melhor fundamentação teórica. A constipação intestinal é um problema freqüente na população dos países ocidentais, apresentando um impacto negativo sobre a qualidade de vida das pessoas, bem como sobre os custos associados a seu tratamento. Unitermos: Constipação intestinal. Fisiopatologia. Dor abdominal.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 189, Febrero de 2014. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
Existe certa dificuldade em definir exatamente o que seja constipação. Muitos definem constipação utilizando um ou mais dos sintomas: fezes endurecidas, evacuações infreqüentes (tipicamente menos de três vezes por semana), necessidade de esforço excessivo para evacuar, sensação de evacuação incompleta, tempo excessivo ou insucesso na defecação. Outra definição refere-se à freqüência (número absoluto) de evacuações por semana relatada pelo paciente, considerando-se como constipados aqueles que referem menos de três evacuações por semana. Uma forma padronizada internacionalmente de diagnosticar constipação baseia-se nos critérios de Roma III para constipação funcional, compostos por seis sintomas: menos de três evacuações por semana, esforço ao evacuar, presença de fezes endurecidas ou fragmentadas, sensação de evacuação incompleta, sensação de obstrução ou interrupção da evacuação e manobras manuais para facilitar as evacuações. São considerados constipados aqueles que apresentam dois ou mais desses sintomas, no mínimo em um quarto das evacuações, referidos por pelo menos três meses (não necessariamente consecutivos), no último ano embora possam ser considerados os últimos três meses (OLIVEIRA et al., 2005).
A constipação intestinal é um sintoma muito comum. Sua alta incidência está comumente associada à dieta imprópria, sedentarismo, medicamentos, alterações endócrinas e metabólicas, além de doenças colônicas, neurológicas, distúrbios psiquiátricos e causas idiopáticas (CESAR et al., 2008).
O objetivo deste estudo foi correlacionar os diferentes dados da literatura médica no que tange à etiologia, fisiopatologia, manifestações clínicas e manejo da constipação.
Metodologia
Esta é uma pesquisa bibliográfica, retrospectiva, de natureza descritiva que enfatiza a importância de compreender definição, etiologia, fisiopatologia, manifestações clínicas e abordagem terapêutica da constipação intestinal.
Optamos pela técnica de pesquisa da revisão bibliográfica, em que os estudos publicados são reunidos e sintetizados, obtendo os resultados evidenciados na ótica de diversos especialistas, trazendo contribuições para melhoria no diagnóstico e tratamento da doença.
A revisão foi composta por cinco artigos que abordaram o tema “constipação intestinal” publicados em periódicos nacionais no período entre 2005 e 2009 e indexados nas bases de dados do Scielo. Também foram incluídas duas obras literárias a respeito do assunto, para uma melhor fundamentação teórica.
Foi realizada a análise de conteúdo dos artigos e obras literárias.
Resultados e discussão
Constipação intestinal é um problema que atinge indivíduos em qualquer momento da vida, do recém-nascido ao idoso. Pesquisas realizadas no Brasil mostraram elevada prevalência de constipação em lactentes, pré-escolares e escolares, com valores variando entre 17,5% e 36,5% (OLIVEIRA et al., 2006).
A constipação constitui um dos sintomas mais comuns na prática médica, sendo a segunda queixa mais freqüente em gastroenterologia, atrás apenas da dor abdominal. Sua ocorrência aumenta muito após os 60 anos, mas isso não reflete um evento natural do envelhecimento (nesse caso, pode ser devido à presença de comorbidades, redução da motilidade e uso de medicamentos). O sexo masculino tende a apresentar mais constipação que o feminino, em se tratando da fase infantil, quadro que se inverte na fase adulta. Também pessoas sedentárias têm maior dificuldade para evacuar (DANI, 2011).
A fisiopatologia da constipação é complexa e de etiologia multifatorial. Destacam-se como etiologias as práticas alimentares, círculo vicioso de evacuação dolorosa gerando comportamento de retenção fecal, distúrbios da motilidade intestinal e fatores constitucionais e hereditários. Pouco se sabe a respeito da influência dos fatores hereditários na fisiopatologia da constipação (OLIVEIRA et al., 2006).
A principal queixa dos pacientes com constipação é a diminuição da freqüência das evacuações. Contudo a freqüência evacuatória está perdendo importância na definição da constipação. Pacientes constipados relatam, freqüentemente, a presença de dor evacuatória, dor abdominal e fezes endurecidas, que perderam sua forma tornando-se fragmentadas. Também é comum a persistência da sensação de evacuação incompleta após o ato evacuatório e o relato da necessidade da utilização de manobras auxiliares manuais, mecânicas ou de supositórios e enemas para a eliminação das fezes (LOPES; VICTORIA, 2008).
A constipação intestinal primária é aquela provocada por situações relacionadas aos hábitos de vida do indivíduo ou por eventos banais, como ingesta alimentar inadequada (ingesta reduzida de fibras e pouco líquido), sedentarismo (associada à postura antifisiológica para defecar, colabora para a ocorrência de constipação), gravidez (por alterações hormonais e compressão extrínseca do útero sobre o intestino), perda do reflexo de evacuação (o bloqueio repetido do desejo de evacuar provoca alterações do reflexo gastrocólico), posição (a posição ereta reduz a velocidade de progressão do bolo alimentar), viagens (devido a alterações na dieta habitual e hábito evacuatório) e pouca disponibilidade de sanitários (principalmente em crianças em idade escolar). Neste caso, não há alterações anatômicas (DANI, 2011).
A constipação intestinal secundária ocorre por causa de uma doença sistêmica, problemas psicossociais ou mesmo iatrogenia. São comuns situações freqüentes as doenças do cólon, doenças neurológicas, distúrbios endócrinos, uso de medicamentos e distúrbios psiquiátricos. No que tange às doenças do cólon, qualquer condição que comprometa o diâmetro da luz do órgão, causando estreitamento ou bloqueio mecânico, pode levar à constipação (por exemplo, tumores, vólvulos, hérnias, estenoses, diverticulite, colite isquêmica, dolicocólon, retocele, proctite ulcerativa). Em se tratando das doenças neurológicas, o Hirschsprung apresenta-se como uma possível etiologia. Trata-se da ausência, ou redução dos plexos nervosos em determinados segmentos do intestino, o que leva a uma falta de estímulo nervoso e a região afetada torna-se espástica, causando estenose funcional. A doença de Chagas, muito comum em nosso meio, caracteriza-se por destruição dos plexos neuronais (principalmente Auerbach) da musculatura lisa do intestino, de forma que os segmentos patológicos ficam atônicos e muito dilatados. Em casos de lesões do Sistema nervoso central a constipação se deve ao comprometimento do sistema motor intestinal. Os distúrbios endócrinos e metabólicos que cursam com constipação compreendem o pseudo-hipoparatireoidismo, infiltração mixedematosa, feocromocitoma e glucagonoma, além do diabetes. Esses distúrbios geram uma diminuição da água no organismo, além de reduzir o peristaltismo. Quanto aos medicamentos, podem-se citar os analgésicos, anestésicos, anticolinérgicos, diuréticos, bismuto, opiáceos, laxantes e parasimpaticolíticos. Pacientes com depressão ou distúrbios psiquiátricos mais graves como psicose, neurose em geral queixam-se de constipação, acreditando, muitas vezes, que são portadores de grave doença intestinal (DANI, 2011).
A pseudo-obstrução intestinal crônica é uma doença rara que ocorre geralmente na infância e resulta da disfunção motora de vários níveis do tubo digestivo e manifestam-se como diarréia e distensão gasosa recorrentes, disfagia, retardo do esvaziamento gástrico e constipação grave. Costuma ser refratária ao tratamento (SUCUPIRA et al., 2002).
A constipação idiopática ou funcional ocorre sem a presença de alteração estrutural ou metabólica, nem qualquer alteração da rotina do paciente, a qual possa justificar o sintoma. Pode ser dividida em constipação intestinal com trânsito normal, constipação intestinal com trânsito lento e obstrução anorretal. A primeira condição é a forma mais comum e revela um trânsito colônico e freqüência de evacuações normais, contudo os pacientes consideram-se constipados, sentindo dificuldade para evacuar e/ou apresentam fezes endurecidas. A constipação com trânsito lento é caracterizada por um aumento no trânsito das fezes através do cólon, o que pode ser devido a uma miopatia, incoordenação da atividade motora ou neuropatia colônicas. A ausência ou diminuição de movimentos peristálticos determina prolongada permanência do bolo fecal no cólon, principalmente ascendente. A defecação dissinérgica ou obstrutiva refere-se a uma contração da musculatura da pelve, em vez de relaxamento, durante a evacuação, provocando acúmulo de fezes na região retossigmoidiana (DANI, 2011).
Há indícios na literatura que sugerem predisposição genética para constipação intestinal, pois se podem encontrar relatos de ocorrência em vários familiares, sem que se identifiquem hábitos alimentares inadequados; histórico de início precoce da sintomatologia e maior prevalência entre gêmeos homozigóticos em relação aos heterozigóticos (SUCUPIRA et al., 2002)
Outros distúrbios associados constituem a encoprese, que significa perda involuntária de fezes inteiras na roupa íntima. A incontinência fecal refere-se a perdas fecais em pequenas quantidades, geralmente líquidas ou pastosas. No que tange à fisiopatologia, não existe diferença entre as duas situações. Mulheres vítimas de abuso sexual também apresentam constipação intestinal como sintoma predominante (DANI, 2011).
Quanto ao diagnóstico de pacientes com constipação, este deve basear-se nos planos orgânico, funcional e psicológico. A avaliação orgânica compreende anamnese criteriosa, procurando esclarecer se a queixa acompanha o paciente desde o nascimento (devido a doenças congênitas, como Hirschsprung, meningocele, etc.). O início recente do sintoma sugere doença orgânica. Quadros arrastados há mais de 2 anos falam contra doença maligna. Em casos de constipação intestinal crônica é comum a ocorrência de queixas gerais, como cefaléia, irritabilidade, distensão abdominal, anorexia, desânimo etc. A anamnese deve abordar, ainda, o grau de dificuldade associado à eliminação das fezes, seu aspecto, mudança de hábito intestinal, presença de soiling e encoprese. O exame físico deve ser minucioso, incluindo avaliação neurológica, no sentido de excluir doença orgânica. O abdome pode estar distendido, revelar hérnias, massas palpáveis ou sinal de fecaloma. O toque retal é imprescindível, pois fornece informação sobre o tônus dos esfíncteres, o calibre do canal anal e a presença de lesões como abscesso, tumores e fístulas. A retossigmoidoscopia é indicada para afastar doenças orgânicas e a colonoscopia para a suspeita de malignidade. Os exames de imagem de importância são a defecografia e o enema opaco (DANI, 2011; SUCUPIRA et al., 2002).
A avaliação funcional compreende a determinação do tempo de trânsito colônico, a manometria anorretal, a eletromiografia do cólon e do esfíncter anal e a avaliação dinâmica da defecação. A avaliação psicológica é importante no sentido de detectar traumas emocionais e conflitos não resolvidos (DANI, 2011).
O plano de tratamento deve visar à correção do distúrbio causal básico, caso seja possível, além da utilização de medidas facilitadoras como adequação alimentar, uso de laxantes, atitudes ou recursos que tornem o hábito de evacuar mais fisiológico (SUCUPIRA et al., 2002).
O tratamento consiste em medidas gerais e abordagem farmacológica. Entre as medidas gerais, são importantes a manutenção de uma boa relação médico-paciente, orientações como a importância de se estabelecer uma rotina evacuatória e as conseqüências do uso abusivo de lexativos, aumento da ingestão de fibras (disponíveis em vegetais, frutas e cereais), ritualizar a defecação. Se tais medidas não atingirem efeitos satisfatórios, torna-se necessária a prescrição de laxativos (formadores de massa: ágar-ágar, metilcelulose, sementes de plantago, farelo de trigo; emolientes: sulfato de sódio; lubrificantes: óleo mineral, etc.). Os agentes formadores de massa atuam aumentando o bolo fecal e são os mais indicados para o tratamento a longo prazo. Os surfactantes são usados para facilitar a mistura de água e gordura nas fezes, amolecendo-a. Os lubrificantes agem na parede intestinal e diminuem a absorção de água pelo cólon. Os farmacobióticos têm papel relevante no tratamento, no sentido de manipular a flora intestinal com fins terapêuticos. Nessa perspectiva, pode-se utilizar a suplementação com organismos comensais (probióticos), estímulo seletivo a certas espécies comensais (pré-bióticos) e produtos biologicamente ativos obtidos a partir da flora comensal. A intervenção cirúrgica está reservada para casos selecionados, como por exemplo na doença de Hirschsprung, em que se obtém bons resultados com a miotomia anorretal (DANI, 2011).
Para o grupo pediátrico o tratamento medicamentoso pode iniciar-se com o uso de laxantes osmóticos como o hidróxido de magnésia a 8% (1 a 3 ml/kg/dia em uma ou duas doses), sempre associado ao aumento significativo da ingesta hídrica (SUCUPIRA et al., 2002).
Pereira et al. (2009) sugerem que o tratamento da constipação crônica funcional deve abranger orientação geral, esvaziamento do fecaloma (se existir), tratamento de manutenção e recondicionamento esfincteriano. No tratamento de manutenção, recomenda-se uma dieta com alto conteúdo de fibras, devido ao seu efeito sobre o trânsito intestinal.
Pacientes que não melhoram com dieta e laxativos, após avaliação funcional adequada, a cirurgia pode ser realizada, sendo conduta de exclusão. As opções cirúrgicas mais utilizadas para a inércia colônica são a colectomia segmentar ou sub-total com anastomose íleosigmóide e colectomia total com íleo-reto anastomose (CÉSAR et al., 2008).
Considerações finais
A constipação intestinal é um problema freqüente na população dos países ocidentais, apresentando um impacto negativo sobre a qualidade de vida das pessoas, bem como sobre os custos associados a seu tratamento. É comumente referida como evacuação infreqüente; incompleta; eliminação de fezes ressecadas; esforço excessivo; tempo excessivo dispensado no banheiro para evacuação e insucesso na defecação. Dentre os vários tipos de constipação, destaca-se a funcional, que se caracteriza pela ausência de causas orgânicas definidas, detectáveis pelos métodos de investigações atualmente disponíveis. É a forma mais comum da constipação em nosso meio. Destacam-se, na abordagem terapêutica, as medidas gerais, as quais têm potencial para repercussão bastante positiva sobre essa afecção, dispensando, na maior parte das situações, o uso de fármacos laxativos.
Referências
CESAR, Maria Auxiliadora Prolungatti et al. Colectomias no tratamento cirúrgico da constipação intestinal crônica: relato de quatro casos. Rev bras. colo-proctol., Rio de Janeiro, v. 28, n. 2, jun. 2008.
DANI, Renato; PASSOS, Maria do Carmo Friche. Gastroenterologia essencial. 4º ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011. 1291 p.
LOPES, Adriana Cruz; VICTORIA, Carlos Roberto. Ingestão de fibra alimentar e tempo de trânsito colônico em pacientes com constipação funcional. Arq. Gastroenterol., São Paulo, v. 45, n. 1, mar. 2008.
OLIVEIRA, Julyanne Nakagawa et al. Prevalência de constipação em adolescentes matriculados em escolas de São José dos Campos, SP, e em seus pais. Arq. Gastroenterol., São Paulo, v. 43, n. 1, mar. 2006.
OLIVEIRA, Simone Caetano Morales de et al. Constipação intestinal em mulheres na pós-menopausa. Rev. Assoc. Med. Bras., São Paulo, v. 51, n. 6, dez. 2005.
PEREIRA, Vivian Palo et al. Percepção das mães sobre a importância das práticas alimentares no tratamento da constipação crônica funcional. Rev. paul. pediatr., São Paulo, v. 27, n. 1, mar. 2009.
SUCUPIRA, Ana Cecília Lins; BRICKS, Lúcia Ferro; KOBONGER, Maria Elissabeth; SAITO, Maria Ignez; ZUCCOLOTTO, Sandra Maria. Editora Servier. 4ª Edição, 2002.
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