A dinâmica do trabalho policial feminino La dinámica del trabajo policial femenino |
|||
*Mestrando em Desenvolvimento Social, ppgds, unimontes **Professora do Mestrado em Desenvolvimento Social, PPGDS, Unimontes (Brasil) |
Francisco Malta de Oliveira* Maria da Luz Alves Ferreira** |
|
|
Resumo O artigo aborda a questão do trabalho a partir da atuação feminina. Está organizado da seguinte forma: uma breve abordagem acerca do trabalho e sua relevância social, conceituação de gênero e o trabalho feminino, as transformações do mundo do trabalho, cultura organizacional no ambiente policial-militar e divisão sexual do trabalho, desenvolvimento, além das questões afetas ao reconhecimento do trabalho feminino. Foi possível considerar que as questões ligadas ao reconhecimento do trabalho policial feminino apresentam muitas nuances e encontram-se profundamente engendrados na percepção que a sociedade tem do trabalho executado por mulheres. Unitermos : Gênero. Trabalho policial feminino. Divisão sexual do trabalho. Reconhecimento.
|
|||
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 186, Noviembre de 2013. http://www.efdeportes.com/ |
1 / 1
1. Trabalho e sua relevância social
O espaço laboral situa-se como um lugar especificamente organizado para a execução das atividades de produção. Assim, a categoria de trabalho é construída por meio de diferentes tipos de ferramentas que buscam levar as pessoas a terem um modo necessário de sobrevivência. Logo, o trabalho reflete tanto a essência da vida humana como sua evolução.
Karl Marx (1988), na obra “O Capital”, conceitua o trabalho como um processo que se dá entre o homem e a natureza e é através desse trabalho que o homem controla, regula e realiza, por meio de suas ações, um intercâmbio de materiais com a natureza. Para Duarte (1993), é ele - o trabalho - que põe em movimento todas as forças do homem: cabeça e membros superiores e inferiores, para que possa apropriar-se dos recursos naturais na forma mais útil para sua própria vida; o que não significa afirmar, conforme expõe Marx (1982), que o trabalho é uma infinita fonte produtora de valores de uso que produz a riqueza material, mas pelo contrário, significa compreender que o trabalho é a fonte de relações sociais por excelência.
O trabalho ganha ainda uma concepção humanizadora, socializadora e integradora, conforme Langer (2004), que afirma ser o trabalho o fator que permite aos homens a sua humanização e é através dele que os indivíduos se reconhecem e constituem-se seres sociais, conscientes, criativos e reflexivos.
Nessa perspectiva, a categoria de trabalho é, sobretudo, toda atividade que permite ao homem exprimir o seu significado, pois demonstra ao mesmo tempo sua singularidade e participação no gênero humano, servindo de instrumento afirmador e reafirmador de seu pertencimento social, também chamado por Pateman (1983) de “participação”, que a autora caracteriza pelo fato de criar oportunidades para que as pessoas influenciem nas decisões que as afetarão. Influência essa, que pode variar muito ou pouco. A participação é assim, um caso especial de delegação, na qual um subordinado, no contexto das relações de trabalho, obtém maior controle, maior liberdade de escolha em relação às suas próprias responsabilidades.
A partir dessa abordagem, Etulain (s/d) elabora o conceito contemporâneo do trabalho em um cenário de permanentes transformações, sobretudo, nas relações laborais: o mundo globalizado é o produto resultante de um processo histórico-social de vastas proporções, responsável por transformar os quadros sociais e mentais orientadores tanto dos indivíduos como dos coletivos. Esse processo de formação, consolidação e globalização do capitalismo têm repercutido sobre a prática do trabalho, sobre os trabalhadores e sobre o papel e o significado que o trabalho adquire e representa na sociedade atual.
Deste modo, todas as abordagens citadas convergem sempre na mesma direção: a concepção, a execução, e as constantes transformações pelas quais perpassam a esfera do trabalho estão diretamente ligadas à relevância do papel que o indivíduo possui na sociedade, e daí decorrem, em maior ou menor intensidade os reflexos dele (o trabalho) advindos.
2. Gênero e trabalho feminino
Para a contextualização da variante feminina do fator “trabalho”, faz-se necessário abordar o conceito de “gênero”, que alude à referência social do sujeito masculino ou feminino. Desse modo, Joan Scott (1989), estabelece sua discussão para o termo “gênero” sob diferentes pontos de vista relacionados às correntes teóricas, além de ressaltar a sua relevância para produção de pesquisas históricas que associem a categoria “gênero” ao limbo valorativo das linhas teóricas de patriarcado, marxismo e psicanálise, através da explicação para a situação de subordinação da mulher e a dominação dos homens. Scott analisa o gênero como elemento constitutivo das relações sociais baseadas nas diferenças entre os sexos e como a primeira forma de manifestar poder, “ao mesmo tempo [que o termo “gênero” representa] categorias vazias e transbordantes, pois que, quando parecem fixadas, elas recebem, apesar de tudo, definições alternativas, negadas ou reprimidas” (SCOTT, 1989, p.19).
Os imperativos masculinos acabam sendo a tônica que orienta os processos de trabalho organizacionais policiais-militares, e, devido ao peso que exerce, perpetuado através da cultura presente e característica do espaço laboral. Possui papel crucial nas questões afetas à estima e subestima do trabalho, além do reconhecimento da atividade exercida e o senso de pertencimento percebido pelo colaborador.
3. As transformações do mundo do trabalho e a divisão sexual no ambiente policial-militar
As transformações do mundo do trabalho permeiam todas as esferas laborais. No que alude à segurança pública, é claro, não poderia ser diferente. A divisão sexual do trabalho nessa esfera, diante de tais transformações, acaba por merecer contornos bastante peculiares.
A participação feminina nas instituições policiais sempre suscitou discussões interessantes. Desde meados do século XX, quando a Polícia Militar de São Paulo admitiu pela primeira vez mulheres em seus quadros e foi a instituição policial-militar pioneira na inclusão feminina no Brasil (Wolff, 2009), tal situação tem sido alvo de poucos, mas importantes estudos, pesquisas e questionamentos.
Contudo, há uma associação entre a profissionalização do trabalho policial e o ingresso de mulheres no aparelho policial militar, uma polícia menos voltada para o uso da força, direcionada para a capacidade estratégica, exigências advindas das transformações pelas quais vem passando o modelo de polícia e o próprio mundo do trabalho. Talvez o importante seja reconhecermos que as mulheres, mesmo como minorias simbólicas, em uma instituição pautada pelo paradigma da masculinidade, introduziram a lógica da diferença, uma vez que produziram desacomodação, desestabilização e desorganização interna nessas instituições, colocando possibilidades de pensar o medo, o risco do oficio de polícia e um questionamento a respeito da ordem estabelecida. (CALAZANS, 2005, p.33).
A condição feminina no universo policial, sobretudo policial-militar, caracterizado principalmente pela hierarquização, enaltece a figura conhecida como “divisão sexual de gênero”. Segundo Nogueira (2010), a divisão sócio-sexual ganha sentido ao dar a conotação de hierarquização de gênero, ao redundar no desabonamento do trabalho feminino assalariado, desvalorizando sua força de trabalho e, por sua vez, representa uma aguda e pejorativa fragilização feminina no mundo produtivo, já que “a reprodução das relações sociais capitalistas de produção é também a reprodução da divisão sócio-sexual do trabalho”. (NOGUEIRA, 2010, p. 59).
Diante de tal problemática, faz-se necessário pontuar o conceito de cultural organizacional, que segundo Mintzberg e colaboradores (2000), ela - a cultura organizacional - é a base da organização e se caracteriza por crenças comuns que se refletem nos costumes e hábitos, bem como em manifestações mais perceptíveis — histórias, símbolos, ou mesmo edifícios e produtos – que para o autor, a força de uma cultura no ambiente laboral legitima as crenças e os valores difundidos e internalizados pelos membros de uma organização. A cultura organizacional depende das pessoas e não existiria sem elas. A cultura organizacional é um conceito fundamental à construção das estruturas organizacionais. Assim, nota-se então que a cultura de uma organização é um conjunto de características que a diferencia em relação às demais. A cultura tem a função de legitimar o sistema de valores, expresso através de rituais, mitos, hábitos e crenças comuns aos membros de uma organização, que assim produzem normas de comportamento genericamente aceitas por todos.
É nesse contexto que a cultura organizacional nas instituições policiais reforça as sólidas concepções do imaginário coletivo que, historicamente, é masculino. O próprio histórico da inserção feminina nos ambientes policiais vem impregnados da cultura organizacional fundada em sólidos alicerces, como menciona Moreira (2006), ao afirmar que o papel feminino de ser responsável pela educação das gerações vindouras fora direcionado ao amparo de outras mulheres, crianças e anciãos. Ademais, a imagem idealizada da mulher policial está situada na natureza maternal feminina, justificado pela instituição viril para necessitar sua presença.
Pode-se verificar que culturalmente, na corporação, o emprego da mão-de-obra feminina é frequentemente alocada em determinadas atividades tipicamente consideradas como próprias daquele gênero, e não na área-fim, cujo fato traz à tona a análise do emprego feminino: ao lhe serem atribuídas tais atividades há o reconhecimento do trabalho feminino ou pelo contrário, há a segregação de gênero pelo fato de a policial militar ser vista como incapaz de executar os trabalhos que são dominados pelo gênero masculino?
D’Araújo (2004) analisa a questão do trabalho feminino a partir da percepção que as autoridades brasileiras da área de Segurança Pública têm daquele grupo:
[…] o mundo feminino é classificado de forma diferente e desigual e que as qualidades masculinas são exclusivas, assim como as femininas. E, entre as características femininas, a que mais aparece é a fragilidade. Temos assim, um paradoxo: como admitir mulheres, por natureza fisicamente débeis, em uma instituição que por definição tem que lidar com o monopólio da força bruta? (D’Araújo, 2004: 446).
Nesse sentido, Cappelle e Mello (2010) abordam a instituição policial-militar a partir do ponto de vista de um ambiente “guetizador”, ou seja, culturalmente apropriado e estimulador da segregação sexual do trabalho, por caracterizar pela presença histórica e maciçamente masculina em suas fileiras, além da clara distinção adotada para emprego de mão-de-obra nas atividades meio e fim, esta última, razão de ser da atividade policial – promoção da ordem pública e manutenção da paz social:
A Polícia Militar, analisada como um espaço organizacional de interação social, pode ser considerada uma espécie de gueto masculino no qual se admitiu o ingresso de mulheres há pouco tempo. A inserção de mulheres na organização, principalmente as do oficialato, tem ocorrido, predominantemente, em funções administrativas e de relações públicas – tidas como atividades-meio e não atividades-fim da Polícia –, percebendo-se maior dificuldade de inserção daquelas policiais que optam por seguir carreira no policiamento operacional. Somado a isso, tem-se um contexto em que a questão da violência urbana vem pressionando os órgãos de segurança pública por melhores resultados. E percebe-se também uma ação da Polícia Militar no sentido de mudar sua percepção por parte do público, passando de uma organização com a imagem marcada pela agressividade e repressão para outra que se coloca a serviço da comunidade, com um caráter mais preventivo e educativo. (CAPELLE e MELLO, 2010, s/n).
Deste modo, percebe-se a necessidade de se esmiuçar as questões culturais e sócio-institucionais que permeiam o trabalho feminino diante de suas peculiaridades e limitações.
O ambiente policial-militar, por ser historicamente dominado pelo gênero masculino, tende a privilegiá-lo. As relações de dominação e poder apresentam maior relevo e a figura feminina é relegada a um plano inferior. Young (1991 apud HAGEN, 2006, p.3) caracteriza tal fato como “marginalidade estrutural”, já que o ambiente policial sempre imprimiu aos símbolos masculinos respeito e propriedade, tendo dificuldade em abordar as dificuldades inerentes a gênero, somente porque a masculinidade encontra-se, historicamente, como detentora da posição principal, fato sobre o qual há consenso e compreensão. Assim, ocorre um “culto da masculinidade”, tendo a função de conferir prestígio à estrutura, fazendo com que as mulheres sejam difamadas, relegadas a um nível inferior, tratadas condescendentemente e tenham seu valor social negado, quando são poupadas do trabalho efetivo de polícia, ou seja, seu emprego nas atividades diretamente ligadas ao policiamento ostensivo que visa à preservação da ordem pública e manutenção da paz social.
Bourdieu (2002) expõe que a dominação masculina se faz está presente em todas as sociedades e legitima-se no fato de que todas essas sociedades se constituem de uma perspectiva androcentrista, já que pressupõe e prescreve a dominação do princípio masculino (ativo) sobre o princípio feminino (passivo). Assim, a dominação masculina é uma dominação simbólica que caracteriza a banalização dessa dominação na sociedade, exercendo sobre os corpos um forte poder, sem haver necessidade de força física. Assim, a dominação é imposta e vivenciada pela presença da violência simbólica, uma “violência doce e quase sempre invisível”, um ato sutil, responsável por ocultar as relações de poder que alcançam não somente as relações entre os gêneros, mas toda a estrutura social.
Para Calazans (2003), o ingresso feminino no ambiente laboral policial-militar encontra sustentação ao ser ilustrado pela pretensão do discurso de que atualmente buscam-se outros valores mais favoráveis com o contexto social atual, como inteligência, a capacidade para intermédio na resolução de conflitos, a inovação e o trabalho em equipe. Desta forma, conflitam novas situações em que a força física não é fundamental. Um exemplo é a mediação em situações potencialmente violentas e conflitivas, atendimento a coletivos que exigem tratamento diferenciado (minorias e grupos vulneráveis em situação de vitimização) e demandas não-criminais.
Os critérios considerados para que se faça a alocação das mulheres policiais-militares em determinadas atividades reforça o viés machista institucional. A subestimação do potencial feminino merece ser questionado. Conforme Kliksberg (2001) há necessidade de se superar todas as formas de discriminação que ainda subsistem, como as que são exercidas contra as mulheres, já que todos os seres humanos fazem jus ao pleno respeito e os mesmos direitos.
4. Gênero, desenvolvimento e reconhecimento do trabalho feminino
Para a compreensão do desenvolvimento não apenas como crescimento econômico, mas também como “processo de expansão das liberdades”, a importância de enfrentar a questão da condição da mulher na sociedade torna-se fundamental.
Ao se abordar as questões atinentes ao trabalho feminino, gênero e dificuldades, muito pouco se fala sobre a importância e necessidade do reconhecimento de seu trabalho e sua contribuição para o desenvolvimento, que para SEN (2000, p. 47), “pode ser visto como um processo de expansão das liberdades reais que as pessoas desfrutam”. Assim, o viés machista acaba por subjugar e estigmatizar, relegando o produto laboral das mulheres a um plano inferior, subordinado aos imperativos masculinos, já que inibe, limita, restringe as liberdades que o trabalho (policial) feminino poderia proporcionar.
A partir dessa análise, Sen (2000) destaca a condição de agente das mulheres, que é fundamental à remoção das arbitrariedades que limitam o bem-estar feminino. Pesquisas demonstram que o respeito ao bem-estar feminino aumenta quando elas passam a ocupar posições com maior independência e poder na sociedade - como agentes. Diversas variáveis desempenham o papel de dar poder às mulheres, o poder feminino que influencia os princípios e forças organizadores das instituições sociais e da própria sociedade e da ideia de “mulher”, e traz à tona a questão do reconhecimento vinculado ao trabalho executado por mulheres.
O não reconhecimento do trabalho em função da divisão sexual do trabalho muitas vezes é tido como o ignorar aquele trabalho executado por determinado sexo. Tal concepção é concretamente nociva já que, além de subestimar, rejeitar e discriminar o produto laboral em função de uma segregação sexual, fragiliza, desmotiva e prejudica a produção/produtividade do segmento em questão.
Cabe destacar as considerações de Fraser (2007) acerca da interação que é regulada por um padrão institucionalizado de valoração cultural que representa algumas classes de atores sociais como pertences ao conceito normativo e outros são percebidos como deficientes ou inferiores: o normal é ser heterossexual, o gay está relacionado à perversão, o correto é que as famílias sejam chefiadas por homens, as famílias chefiadas por mulheres são erradas, pessoas brancas obedecem à lei, as pessoas negras são suspeitas. O efeito em todos esses casos consiste na negação para alguns membros da sociedade a condição de parceiros de fato na interação, capazes efetivarem sua participação como iguais com os demais. Em todos os casos, conseqüentemente, uma demanda por reconhecimento é fundamental, porém percebe-se precisamente o que isso significa: com o objetivo de não valorizar a identidade de grupo, mas suplantar a subordinação, as reivindicações por reconhecimento buscam fazer do sujeito subordinado um parceiro integral na vida social, com capacidade de interagir com os outros como um par. Essas reivindicações pro reconhecimento tem por objetivo “desinstitucionalizar padrões de valoração cultural que impedem a paridade de participação e substituí-los por padrões que a promovam.” (FRASER, 2007, p.9).
Segundo Taylor (2000, p.249), “[...] a projeção de uma imagem inferior ou desprezível sobre outra pessoa pode na verdade distorcer e oprimir na medida em que a imagem é internalizada.” Há, assim, a instalação de um conflito ainda mais intenso, já que a subestimação favorecida pelo meio laboro-social acaba por induzir os sentimentos, de autosubestimação, autoflagelação, autopiedade.
Honneth (2003) afirma que ocorre uma tensão entre as pretensões da individuação e a vontade global internalizada na esfera da auto-relação prática, que, assim, leva a um conflito entre o sujeito e seu ambiente social.
Nesta perspectiva, a discussão acerca das questões presentes na relação “instituição versus gênero” faz-se necessária para a compreensão dos dilemas femininos num ambiente onde o gênero masculino perfaz a esmagadora maioria de seu efetivo, e contribui para a dominação historicamente sociolaboral daquele meio, daquele grupo, daquela instituição.
5. Considerações finais
O trabalho feminino, por mais incrível que possa parecer, ainda é visto com relativo desdém, descaso, desprestígio, desmerecimento. Tal fato é confirmado pelas recentes e freqüentes estudos que demonstram que a remuneração do trabalho feminino ainda é menor que a remuneração do trabalho masculino. Até hoje, em nenhum lugar do mundo há um real equilíbrio entre os laboros de homens e mulheres.
A situação feminina no mercado de trabalho realmente é bastante peculiar: dupla – ou até tripla – jornada, vitimização à violência simbólica, subestimação, negação de seu valor social, dentre outros fatores. Espera-se que a médio e longo prazo - sobretudo nos meios policiais, ambiente historicamente marcado pela presença masculina, no qual o viés machista acaba por impor condições, limites e dificuldades mais perceptíveis aos olhos vitimizados e subestimados em sua capacidade técnica e intelectual - a mão-de-obra feminina consiga administrar melhor e impor os elementos femininos e masculinos na sua profissão. Inclusive, porque a coerção para que haja os padrões de homogeneização e padronização em função da dominância masculina é mais presente nos primeiros anos de ingresso nas instituições policias. Com o passar dos anos na profissão, a mulher também tem chances (e não necessariamente oportunidades) de ocupar cargos de comando. O que é bastante salutar, já que está mais do que constatada a importância do papel feminino e sua contribuição para a preservação da ordem pública e promoção da paz social, pilares das atuais políticas de segurança. Além do mais, nota-se claramente que a contribuição que a inserção da mulher nas atividades econômicas e sociais pode trazer melhorias para a situação tanto da própria mulher, como também mudança das estruturas sociais como um todo, afinal, para Sen (2000), o desenvolvimento pode ser compreendido com um processo de expansão das liberdades reais que as pessoas desfrutam. Conseqüentemente faz-se necessário que as mulheres policiais tenham a condição de agentes, melhorando seu potencial para cuidar de si mesmas e influenciar o mundo.
Os contornos do circundam as questões ligadas ao reconhecimento do trabalho feminino apresentam muitas nuances e encontram-se profundamente engendrados na percepção que a sociedade tem do trabalho executado por mulheres. Ainda assim sabe-se que os desafios são muitos, assim como as barreiras e a solidez da cultura consolidada ao longo dos séculos, que acabam por dar a tônica do preconceito institucional, muitas vezes (quase sempre) velado; o que não impede a união de esforços para que a força e a qualidade do trabalho feminino seja cada vez mais notada e enaltecida, visto suas características extremamente peculiares e necessárias.
Não se sugere aqui que haja uma sobreposição de trabalho de uma categoria sexual em detrimento de outra. Não. Propõe-se que se faça uma reflexão acerca dos papeis de cada uma, seus espaços públicos, áreas de atuação e complementaridade, além de uma atenta e profunda análise para as questões que caracterizam a divisão sexual do trabalho e sua influência para o desenvolvimento de um gênero - que tem um pesa maior quando há o histórico da maciça presença masculina – há razão de ser? Há justificativa outra que não o peso da misoginia? Tal costume encontra de fato fundamento prático?
É sobre estas questões que se nota uma ausência de reflexão. Reflexão que se faz necessária e que pode ter uma conseqüência verdadeiramente libertadora para o grupo em desvantagem no ambiente organizacional, reflexo da imagem social da qual aquele grupo é visto. Deve haver um ambiente no qual existam oportunidades e condições de participação de todos, independentemente das questões de gênero, a todos os envolvidos. Identidade, reconhecimento, valorização, senso de pertencimento, afirmação individual e de grupo do papel social: fatores responsáveis pelo envolvimento e desenvolvimento da nossa sociedade.
Afinal, a sociedade é plural e necessita do olhar público para sua diversidade. Diversidade presente na pluralidade institucional que dirige os esforços institucionais para o social.
Referências
BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Educação e Realidade, v. 20, no 2. Porto Alegre, jul./dez. 1995, pp. 133-184.
–––––––. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.
CALAZANS, Márcia Esteves de. A constituição de mulheres em policiais: um estudo sobre policiais femininas na Brigada Militar do Rio Grande do Sul. Dissertação (Mestrado) – UFRGS, Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social e Institucional, Porto Alegre, 2003.
CAPPELLE, M. C. A. ; MELO, Marlene Catarina de Oliveira Lopes . Mulheres Policiais, Relações de Poder e de Gênero na Polícia Militar de Minas Gerais. RAM. Revista de Administração Mackenzie, v. 11, p. 1-25, 2010.
D’ARAÚJO, Maria Celina. Pós-modernidade, sexo e gênero nas Forças Armadas. Security and Defense Studies Review, vol.3, nº.1, 2003. Disponível em: http://www3.ndu.edu/chds/journal/index.htm
DUARTE, R. A. P. Mimeses e Racionalidade: A concepção de domínio da natureza em Theodor W. Adorno. São Paulo: Loyola, 1993.
ETULAIN, C. R.. Trabalho: Mal com ele, pior sem ele, s/d.
FOUCAULT, Michel; MACHADO, Roberto. Microfísica do poder. 2. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1981.
FRASER, Nancy. Reconhecimento sem Ética? São Paulo, Lua Nova, 2007, p.108.
HAGEN, Acácia Maria Maduro. O trabalho policial: estudos da policia civil do Estado do Rio Grande do Sul. São Paulo: IBCCRIM, 2006 (Monografias/IBCCRIM; 39).
HONNETH, Axel. Luta por reconhecimento: a gramática moral dos conflitos sociais. Trad. Luiz Repa. São Paulo: Ed. 34, 2003.
KLIKSBERG, Bernardo. Falácias e mitos do desenvolvimento social. São Paulo: Editora Cortez; Brasília: UNESCO, 2001. 175p.
LANGER, André. O trabalho como essência do Homem. Revista Vinculando. 2004.
MARX, Karl. O Capital. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil Editora, 1988.
–––––––. Manuscritos económico-filosóficos. Lisboa: Edições 70, 1993.
MINTZBERG, H et al. Safári de estratégia: um roteiro pela selva do planejamento estratégico. Porto Alegre: Bookman, 2000.
MOREIRA, Rosemeri. Entre o escudo de Minerva e o manto de Penélope: a feminização da polícia Militar do Paraná, uma prática dicotomizada (1975-1980). Exame de qualificação. Universidade Estadual de Maringá, 2006.
NOGUEIRA, C. M. As relações sociais de gênero no trabalho e na reprodução. Aurora, Marília, ano IV, n.6, agosto 2010.
PATEMAN, Carole. Participation and Democratic Theory. New York: Cambridge University Press, 1983.
SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
TAYLOR, C. A política do reconhecimento. In: TAYLOR, C. Argumentos Filosóficos. São Paulo: Loyola, 2000.
WOLFF, Cristina Scheibe. A ditadura militar e a face maternal da repressão. Espaço Plural (Unioeste) v. X, p. 56-65, 2009.
Outros artigos em Portugués
Búsqueda personalizada
|
|
EFDeportes.com, Revista
Digital · Año 18 · N° 186 | Buenos Aires,
Noviembre de 2013 |