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Uma análise da relevância do Programa Central de Apoio às Penas 

Alternativas no município de Montes Claros, Minas Gerais, Brasil

Um análisis de la relevancia del Programa Central de Apoyo a las Penas
Alternativas en el municipio de Montes Claros, Minas Gerais, Brasil

 

*Graduado em Serviço Social pelas Faculdades Santo Agostinho, FASA

Mestre em Desenvolvimento Social pela Universidade Estadual de Montes Claros, Unimontes

**Graduada em Administração Pública pela Unimontes. Graduada em Serviço Social pela FASA

Especialista em Capacitação em Administração Hospitalar pela Universidade Estadual de Montes Claros

***Graduada/o em Serviço Social pelas Faculdades Santo Agostinho, FASA

(Brasil)

Máximo Alessandro Mendes Ottoni*

Aulenita Moreira Silva**

Celestina Veloso Freitas***

Vercy José Gonçalves-Neto***

maximo.ottoni@yahoo.com.br

 

 

 

 

Resumo

          A violência crescente no Brasil, principalmente nos grandes centros urbanos, faz com que seja repensada a atual situação carcerária. Crimes hediondos acontecidos no País, principalmente contra pessoas influentes, foram responsáveis por alguma mudança na legislação brasileira, sobretudo na legislação penal. O sistema penitenciário brasileiro tem preservado o modelo tradicional, sendo visto como falido por vários estudiosos da área e, a aplicação das penas alternativas através do Programa CEAPA, mostra-se como uma forma humanizadora na ressocialização do apenado.

          Unitermos: Inclusão social. Violência. Penas alternativas. Ressocialização. Programa CEAPA.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 185, Octubre de 2013. http://www.efdeportes.com/

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1.     Panorama da criminalidade a partir da realidade brasileira

    Constata-se que nas últimas décadas a violência cresceu assustadoramente no Brasil, especialmente nas grandes capitais. No início da década de 2000, os Estados de São Paulo e Rio de Janeiro disputavam a liderança entre os Estados com maior taxa de mortes violentas de jovens, que inclui desde homicídios até acidentes de trânsito. Em 2001, os paulistas ocupavam o 1º lugar e os cariocas, o 3º - dados do Registro Civil do IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Quatro anos depois, a taxa de São Paulo caiu, mas a do Rio estagnou e depois, levou o Estado ao topo do ranking. Segundo (Góis, 2007, p. 3) São Paulo registrava em 2001, 240 mortes violentas para cada 100 mil homens de 15 a 24 anos. Em 2005, foram 138 por 100 mil – redução de 43%. Ainda é mais do que a média brasileira, mas o Estado passou para a nona posição, uma vez que foram mais atuantes no combate à violência, no recolhimento de armas e na redução da venda de crack, diz o especialista em demografia Celso Simões, do IBGE.

    Para Zaluar apud Góis (2007), professora de antropologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, nesse Estado, os homicídios estão vinculados aos conflitos entre quadrilhas de traficantes e galeras de jovens. Segundo Waiselfisz apud Góis (2007), autor do estudo “Mapa da Violência – Os Jovens do Brasil”, diz que, no Rio de Janeiro, as organizações criminosas estão mais bem estruturadas e têm mais conivência com a polícia do que em São Paulo. Outros fatos vão acontecendo por todo o Brasil e, segundo Francisco (2007, p.6) foi em Salvador, no carnaval, onde foram registrados 53 arrastões em ônibus e 1624 ocorrências, 28% maior que em 2006.

    No Brasil, quando se fala de violência, normalmente se pensa em fatos ligados à vida urbana, como: seqüestros, assaltos, chacinas, violência de trânsito e crimes com o uso de armas de fogo. Segundo Francisco (2007, p. 4) “os furtos estão em primeiro lugar de delitos, seguidos por lesões corporais, roubos agressões físicas, rixas, porte e uso de drogas, tráficos de drogas e tentativas de homicídios.”

    Segundo Yarochewsky (2008), professor de Direito Penal da Pontifícia Universidade Católica - PUC de Minas Gerais, toda vez que ocorre um crime considerado hediondo, normalmente gera grande comoção nacional, no qual as vítimas fazem parte de uma camada formadora de opinião, ou têm acesso à mídia, ou fazem parte de uma elite intelectual, a repercussão é muito maior. Logo se pensa em mudança da legislação e a culpa é colocada no Código Penal pela violência e criminalidade. A Lei dos Crimes Hediondos número 8.072, de 1990, é um exemplo, pois foi criada a partir da comoção social com os seqüestros de personalidades, como o empresário Abílio Diniz e o publicitário Roberto Medina.

    Tais acontecimentos motivaram movimentos pelo endurecimento da legislação penal, aumentou penas, cerceou direitos e garantias; acabou com a progressão de regimes para os crimes hediondos e, posteriormente, foi derrubada pelo Supremo Tribunal Federal. Mas durante o período de vigência da lei, a criminalidade não diminuiu. Assim, percebe-se que a partir desses crimes, as leis podem ser criadas ou alteradas em virtude da pressão popular, como no caso da Lei 8.930, de 06 de setembro de 1994, que surgiu devido à campanha liderada pela escritora Glória Perez, mãe da atriz Daniella Perez, assassinada brutalmente no dia 28 de dezembro de 1992. Outro exemplo foi o assassinato brutal do menino João Hélio Fernandes Vieites, de seis anos de idade, que foi vítima de um assalto, ficando preso ao cinto de segurança do carro de sua mãe, e morreu após ser arrastado por quatro bairros na zona norte do Rio de Janeiro. Esse acontecimento reavivou a discussão sobre a necessidade de se reduzir ou não o limite da responsabilidade penal, que é hoje 18 anos.

    A proteção ao adolescente seria justificada por esse estar em uma fase especial da vida, num processo de crescimento que deve ser respeitado e, por isso, não deve ser colocado numa mesma cela com um adulto. Conforme a lei Federal 8069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente, doravante ECA, estabelece que, a partir dos 12 anos, qualquer adolescente que tenha feito um ato contra a lei deve ser responsabilizado. Porém, o sistema de responsabilização dos adolescentes é diferente do sistema dos adultos. O tratamento diferenciado acontece não porque o adolescente não sabe que o que está fazendo é errado, mas sim, devido à condição peculiar do desenvolvimento em que se encontra e, o que se quer com isso é possibilitar a ele um recomeço de vida. Por isso, o ECA prevê seis medidas sócio-educativas: a advertência; a obrigação de reparar o dano; a prestação de serviços à comunidade; a liberdade assistida; a inserção em regime de semi-liberdade; e a internação em estabelecimentos educacionais (Art. 112, ECA). O ECA diz também que a cada seis meses o adolescente privado de liberdade será avaliado para analisar os progressos de sua educação e de sua capacidade de exercer a liberdade. Assim, ele poderá passar para o regime de semi-liberdade. (BRASIL, 2002).

    Sobre o espaço urbano, Carvalho (2004) diz que ele tende a ser causador e provocador de tensões de conflitos, fazendo surgir um ambiente de agressividade, intolerância e desrespeito pela pessoa do outro, fomentando assim a criminalidade e violência através da ruptura de regras estabelecidas pela sociedade. Sendo assim, a criminalidade e a violência ficam associadas a determinantes da realidade urbana e a quebra de regras sociais de comportamento, assim como os agrupamentos que são formados nas grandes cidades, provocando uma desorganização social ao conseguir gerar na população um sentimento de impotência diante das agressões vivenciadas, um descrédito em relação à ação das polícias e a passividade da população diante dos fatos.

    Segundo Pedrazzini (2006), a metrópole é “um espetáculo da violência” e da segregação e, a partir do bairro popular, deve-se rever as questões do urbanismo, uma vez que a violência não é um fenômeno isolado. Para tamanho desafio, espera-se a inclusão do “fora da lei” para reconstruir as sociabilidades urbanas, o diálogo criativo com os indivíduos estigmatizados pelo poder e com os habitantes dos bairros onde vivem os membros das gangues, ou autores da criminalidade. Seria necessário uma democratização verdadeira das cidades para o enfrentamento da criminalidade.

2.     Os desafios das Penas Alternativas no Brasil

    No Brasil, diante da expansão de um contexto permeado pela violência, o sistema penitenciário se dá num confinado de reclusos, a maioria vive em celas sem qualquer assistência no sentido da ressocialização, como o trabalho, a educação, a religião, a saúde (assistência clínica, psiquiatria, psicologia). Enfim, o sistema de repressão carcerária do país tende a preservar o modelo tradicional, autoritário e totalitário, onde se evidencia práticas repressivas (DELMAS-MARTY, 1992, p. 43) e, com base no Código Penal Brasileiro e de acordo com Gomes (2006), a assistência ao preso e ao “internado” é dever do Estado, e deveria visar à prevenção e à reincidência do delito.

    Muitos dos indivíduos considerados criminosos, em sua maioria, possuem características semelhantes: moradores de regiões com baixos índices de qualidade de vida, com poucas perspectivas de futuro, sem possibilidades de mobilidade social, bem como, as variáveis, de raça, de grau, de escolaridade, idade e gêneros. Sendo que boa parte da população, vítima ou agente da violência, são jovens, de raça negra, do sexo masculino e morador de favelas. Este é o perfil do “criminoso” brasileiro, que tem sua gênese em questões ligadas à exclusão social percebida em um Estado-Capitalista, de ordem dominadora, organizadora de uma política voltada aos interesses mercantilistas.

    Ao que tange às formas de organização da massa populacional, muitas vezes, elas são reprimidas, de forma coercitiva ou de forma estratégica por meio de comunicação da mídia, os artífices de poder sobre o povo. Quanto da atuação do Estado, referente à garantia de segurança a toda sociedade no sentido do exercício do controle social, com vista na prevenção à criminalidade, não existe eficientemente, uma política voltada para a ampliação da compreensão dos fatores causais das criminalidades.

    A partir desses pormenores, pontua-se a ausência de interesses a essa questão por parte dos poderes competentes e, pela falta de organização da sociedade civil. Embora no Brasil, em 1995, a justiça Consensual com a lei 9099 dos Juizados Especiais Criminais, pelo princípio da indisponibilidade da ação penal, busca romper com a tradição positivista-repressiva brasileira, tendendo o paradigma moderno e humano complementado pela Lei 9.714/98. De acordo com essa lei, o Juiz aplica as penas alternativas ou sanções substitutivas à de prisão (carcerária), inclusive da multa, da limitação de fim de semana, da prestação pecuniária, da proibição do exercício de profissão e suspensão de habilitação para dirigir veículo e, dentre outras, a de prestação de serviços à comunidade e/ou entidades.

    Segundo Gomes, (2000, p.42-43), no Estado de São Luiz (MA), aconteceu em 03/09/2004 o II Seminário Estadual de Execução Penal e das Penas Alternativas, com foco na redução de custos, avaliando os preconceitos, os limites, o alcance das reincidências, onde o índice de aplicação das penas alternativas ainda não atende a demanda exigida dentro da lógica jurídico-administrativa que possa garantir os aspectos psicossociais, conforme a realidade contemporânea. Na perspectiva social, o olhar é para o sujeito da ação do delito e, avalia como o beneficiário vai responder aos condicionamentos impostos ao cumprimento da pena determinada, bem como, os aspectos psicossociais dado pelos procedimentos técnicos dos demais profissionais envolvidos, como Assistente Social, Psicólogo, Advogado, etc. Assim, a Central de Apoio e Acompanhamento de Penas e Medidas Alternativas, certamente, atende uma política criminal moderna e humanista, evitando, o encarceramento e beneficiando todo o sistema de pena carcerária. Isto é, se converter em pena alternativa à carcerária, e se oferecer ao apenado às condições necessárias à sua ressocialização. No caso da aplicação da pena à prestação de serviços a uma comunidade ou entidade de caráter público ou de natureza assistencial, o apenado cumprirá sua pena e poderá permanecer no seio familiar e/ou em albergues ou em outro estabelecimento, conforme a situação ou necessidade.

    Conforme Gomes (2006), a característica de uma política criminal repressora no Brasil busca preservar os velhos princípios de um Brasil-Colônia. No seu dizer, a execução penal tem duas opções: “positivista ou humanista e, para não encarcerar tanta gente, é preciso captar os conflitos sociais e flexibilizar os mecanismos jurídicos”. Bem como, articular redes, mobilização comunitária e proteção social, no sentido de cidadania. Segundo Pandolfi (1999, p. 16):

    Uma sociedade será menos violenta quanto mais cidadã de tornar. (...) Posso lembrar situação-limite, em que comunidades, reivindicam o direito de não ter que conviver com a miséria Humana, com o repelente abandono dos mendigos que estão nas ruas (...) assim, dentro do próprio âmbito nacional, questões muito sérias de exclusão/inclusão.

    Verifica-se que, no Brasil, as dificuldades para prosseguir e evoluir as penas alternativas reside dentre outros, na resistência do preconceito, dos operadores do direito e da própria população, influenciada cada vez mais pelo poder da mídia, que tem o hábito (proposital) de dramatizar a criminalidade dos pobres em favor do “mascaramento” da criminalidade das elites.

3.     Apresentação do Programa CEAPA

    Em Montes Claros (MG), o Programa Central de Apoio às Penas Alternativas (CEAPA), no Núcleo de Prevenção à Criminalidade, foi implantado no dia 05 dezembro de 2005, atuando no controle da criminalidade e da violência, com a aplicação de uma Política de Segurança combinando ações de prevenção, planejamento, coordenação, gestão, controle e avaliação das ações. Por ser um programa preventivo, o CEAPA consegue executar medidas que impedem quantitativamente a consecução da criminalidade como fenômeno social, oferecendo assim, a ressocialização do beneficiário que comete uma infração e também oferta outras medidas alternativas à detenção, visando a prevenção da reincidência criminal. Esta pesquisa buscou realizar uma análise da relevância do Programa Central de Apoio às Penas Alternativas (CEAPA) do Núcleo de Prevenção à Criminalidade no período de maio de 2006 a maio de 2007.

    O Programa CEAPA está inserido na ação da Secretaria do Estado de Defesa Social (SEDS) do Estado de Minas Gerais. Até o ano de 2007, já foram instalados oito Núcleos em todo o Estado, com o objetivo de desenvolver políticas eficazes de prevenção à violência através de uma implementação articulada de ações de natureza preventiva, repressiva e de suporte social em localidades caracterizadas por altos índices de criminalidade.

    O Programa é formado por uma equipe multiprofissional constituída por Psicológicos, Advogados e Assistentes Sociais que, junto com as Instituições locais, efetivam esta política pública. Destina-se a atender pessoas que tem uma condenação igual ou inferior a quatro anos, ou a qualquer pena aplicada em crime culposo (não intencional). É também aplicada aos não-reincidentes em crime doloso (intencional) e para os casos em que a culpa, os antecedentes, a conduta e as circunstâncias do delito indicar que a pena alternativa possa ser aplicada.

    O cumprimento das Penas Alternativas denominadas Prestação de Serviços Comunitários (PSC) são realizadas em Entidades de caráter assistenciais, como hospitais, escolas, creches, asilos, abrigos, postos de saúde e outros programas comunitários e governamentais. As tarefas a serem realizadas são definidas seguindo os conhecimentos e experiências do prestador, sem prejudicar sua jornada normal de trabalho.

    Se a pena de prisão não for superior a quatro anos ou se o delito for culposo (não reincidente), o juiz deve substituir a pena privativa de liberdade pela pena restritiva (alternativa), ainda que a duração das penas restritivas seja a mesma que teria uma pena privativa de liberdade. Uma das justificativas para as penas alternativas seria que

    (...) As estatísticas de diferentes países, dos mais variados parâmetros políticos, econômicos e culturais, são pouco animadoras (...). Apesar da deficiência dos dados estatísticos é inquestionável que a delinquência não diminui em toda a América Latina e que o sistema penitenciário tradicional não consegue reabilitar ninguém, ao contrário, constitui uma realidade violenta e opressiva e serve apenas para reforçar os valores negativos do condenado. (...) Não são realizados estudos que possibilitem deslindar os aspectos que podem ter influência sobre a reincidência, isto é, não há pesquisas científicas que permitam estabelecer se a reincidência pode não ser considerada como um ou o mais importante indicador da falência da prisão (...) (BITENCOURT, 2012, p. 587-588).

    O cumprimento das Penas Alternativas conforme o Programa beneficia:

  • Pessoas que cumprem a medida, porque não a priva de sua liberdade; resgata sua dignidade através do trabalho e inclusão social; colabora na Instituição prestando um serviço à comunidade, continuando mantendo seus vínculos familiares e sociais;

  • O Estado, que realiza a execução penal com baixo custo e, apresenta uma alternativa ao sistema penitenciário brasileiro;

  • O Poder Judiciário, que encaminha com mais agilidade o processo judicial e a realização do cumprimento da pena;

  • As Instituições parceiras, que recebem a colaboração de serviços prestados pelas pessoas que cumprem a medida; contribuem como parceiros de responsabilidade social e, possibilita ativamente a inclusão na própria comunidade;

  • A Sociedade, porque diminui os índices de reincidência criminal, e a diminuição da violência;

    Pretendeu-se ainda analisar a relevância do Programa Central de Apoio às Penas Alternativas (CEAPA), a partir dos beneficiários atendidos no período de maio de 2006 a maio de 2007, avaliando os limites e impasses do mesmo.

    Nesta pesquisa, objetivou-se ainda:

  • Traçar o perfil dos beneficiários da Pena Restritiva de Direito (penas alternativas) do Programa CEAPA, em Montes Claros/MG;

  • Avaliar se a Pena alternativa reduz o índice de reincidência na criminalidade;

  • Analisar a percepção dos beneficiários em relação ao Programa CEAPA;

  • Verificar as possibilidades de inclusão social e o resgate da auto-estima oferecido pelo Programa.

    É fundamental que se tenha consciência de que a violência e a criminalidade são problemas sociais complexos, o que exige uma análise aprofundada no sentido de reorganizar e capacitar os órgãos de segurança pública, aperfeiçoando a capacitação dos policiais, a posição do Judiciário, a execução da pena e o desafio dos jovens em conflito com a Lei. Todos esses aspectos são importantes, mas a prevenção acaba sendo o fator principal, uma vez que, segundo Soares (1978, p. 51), “a criminalidade é uma serpente de mil cabeças, sempre renovadas”. Esse é um grande desafio, pois a criminalidade é uma questão social duradoura e emergente que exige do Poder Público, da sociedade e de uma rede articulada entre vários profissionais, cientistas políticos, assistentes sociais, psicólogos, policiais, juízes, advogados e outros para, juntos, buscarem alternativas e soluções que atenuem e possam até inverter o quadro alarmante da violência em nossas cidades.

    O Programa CEAPA insere-se no modelo penal alternativo, que conta com uma potencialidade ressocializadora, servindo de instrumento para a preservação da segurança, sem necessidade de recorrer ao encarceramento do infrator desnecessariamente, trazendo vantagens para o beneficiário e para a sociedade, que alcança a meta de segurança com menores custos e prevenção do delito com a redução da taxa de reincidência.

    Segundo Gomes (2000), no atual Código Penal, considera-se aplicável a prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas quando as condenações são superiores a seis meses de privação da liberdade. Esta pena consiste na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado. É uma obrigação de fazer algo pessoalmente; ninguém pode prestá-lo no lugar do condenado e as tarefas devem levar em consideração as aptidões do infrator, devendo ser cumprida à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho. Penas inferiores a seis meses, podem ser substituídas por multa.

    O juiz deve requisitar a colaboração de entidades públicas ou solicitar entidades assistenciais para a efetivação dos programas, determinando os dias e o horário de cumprimento da pena e quantas horas de tarefas serão executadas. A entidade parceira, beneficiada com a prestação de serviços deve encaminhar mensalmente ao juiz da execução um relatório circunstanciado das atividades do infrator, bem como, a qualquer tempo, comunicação sobre ausência ou falta disciplinar.

4.     Dados coletados em pesquisa realizada no CEAPA

    A referência para a pesquisa no CEAPA foi o período de maio de 2006 a maio de 2007. Nos dados coletados, de um total de 199 beneficiários, 92,9% eram do sexo masculino e 7,03% pertenciam ao sexo feminino. Quanto à idade, 56,7% possuíam entre 21 e 30 anos; 18,5 entre 31 e 40 anos; 13,0 entre 41 e 50 anos; 9,5 entre 18 e 20 anos; 1,5 entre 51 e 60 anos e, 0,5 entre 61 e 70 anos.

    Perguntados sobre a cor, dos 176 entrevistados, 50% se declararam brancos; 18,8 negros e, 30,1 pardos. Quanto à religião, dos 183 pesquisados, 63,9% se declararam católicos; 19,6% evangélicos; 1,0% espíritas e, 15,3% pertencentes a outras religiões. Sobre a escolaridade, dos 170 entrevistados, 4,1% se declararam analfabetos; 5,8% ensino fundamental completo; 54,1% ensino fundamental incompleto; 19,4% ensino médio completo; 7,6% ensino médio incompleto; 2,9% ensino superior completo; 2,9% ensino superior incompleto e, 2,9% outros.

    Sobre a área de interesse profissional, dos 87 entrevistados, 26,4% preferiam mecânica; 25,2% informática; 6,8% eletricista; 4,5% não tem área específica; os demais, citaram áreas como segurança, serralheria, torneiro, soldador, eletrônica e outros. Quanto ao estado civil, 49,2% se declararam solteiros; 21,1% casados; 1,5% divorciados; 0,5% separados; 6,0% viúvos e, 21,6% em união estável.

    Em relação ao número de filhos, dos 208 entrevistados, 42,3% possuem entre 1 a 2 filhos; 19,7% de 3 a 4 filhos; 6,2% de 5 a 6 filhos; 7,2% possuem acima de 7 filhos e, 24,5% não possuem filhos. Sobre a situação ocupacional, dos 202 entrevistados, 25,7% estavam desempregados; 11,8% possuíam emprego com carteira assinada; 16,3% emprego sem carteira assinada; 1,4% eram trabalhadores rurais; 4,4% trabalhavam como autônomo com Previdência Social; 24,2% trabalhavam como autônomo sem Previdência Social; 0,9% estavam afastados do INSS; 11,3% faziam “bicos”; 0,4% era do lar; 1,4% era empregados e, 1,4% disseram outros.

    Sobre a renda familiar, dos 192 entrevistados, 14,5% disseram receber menos de 1 salário mínimo mensal; 66,1% recebem de 1 a 3 salários mínimos; 9,8% de 3 a 6 salários mínimos; 5,7% de 6 a 9 salários mínimos e, 3,6% afirmaram receber acima de 9 salários mínimos. Sobre os casos especiais, dos 324 beneficiários entrevistados, 36,4% fazem uso de bebidas alcoólicas; 25,3% usam drogas; 7,7% possuem doenças crônicas; 1,5% são deficientes físicos; 2,4% tinham sofrimento mental; 2,1% sofriam de violência doméstica; 21,2% estavam desempregados e, 3,0 disseram outros fatores.

    Referindo-se ao tipo de droga, dos 327 entrevistados, 41,8% utilizam o álcool; 7,0% cocaína; 6,4% crack; 3,9% codeína (xarope); 11,9% maconha; 1,2% ecstasy; 1,5% cola; 1,5% tinner e, 24,4% fazem uso de nicotina. Sobre as penas recebidas, dos 330 entrevistados, 12,7% realizam prestação pecuniária; 5,1% pagam cesta básica; 81,8% prestam serviços à comunidade e, 0,3% possui interdição temporária de direitos.

    Sobre o tipo de delito cometido, dos 251 entrevistados, 10,3% disseram porte ilegal de arma de fogo; 2,3% receptação; 9,9% tráfico de entorpecentes; 1,1% associação ao tráfico; 3,9% estelionato; 25,0% furto; 0,3% exortação; 2,7% apropriação indébita; 0,3% crime de resistência; 9,5% uso de documento falso; 11,1% roubo; 1,5% falsificação de documento público; 2,3% homicídio privilegiado; 4,3% homicídio culposo de trânsito; 7,5% uso de entorpecentes; 0,7% tortura; 1,9% homicídio; 0,3% falsa identidade; 0,7% denunciação caluniosa e, 2,7% disseram suspensão condicional do processo.

5.     Entrevistas com os beneficiários

    A pesquisa se deu em caráter qualitativo, enfocando a percepção de alguns beneficiários em relação ao CEAPA. Perguntou-se aos envolvidos qual a sua opinião em relação ao Programa e as respostas foram as seguintes: “Foi uma solução boa para minha vida. Muita coisa boa começou a partir da minha participação no Programa.” (Entrevistado 01). “Achei bom porque está me ajudando bastante” (Entrevistado 02). “Bom, porque ajuda a reabilitar na sociedade. O trabalho que faço ajuda os outros” (Entrevistado 03).

    Perguntados sobre a opinião dos beneficiários quanto ao cumprimento da pena alternativa através da prestação de serviços comunitários, as respostas foram:

    A prestação da pena através de serviços comunitários é muito melhor do que ficar preso sem liberdade. A pessoa trabalhando se recupera, e a pessoa na prisão fica pior (Entrevistado 01). Ave Maria de ficar presa. Pagá assim é muito melhor. Eu fiquei lá 1 ano, 5 meses e 25 dias e eu nunca vou esquecer (Entrevistado 02). É melhor para cumprimento. É melhor que pagar feira. O CEAPA entende muito o beneficiário. Dão muitas informações (Entrevistado 03).

    Uma vez levantada a opinião dos beneficiários entrevistados, foi solicitado uma avaliação do Programa CEAPA no que se refere à sua inclusão social, tendo como respostas:

    O programa pra mim foi muito bom, porque através dele consegui trabalho numa serralheria, e nos finais de semana, trabalho como segurança. E hoje, até participo da Igreja (Entrevistado 01). Através dele (programa), consegui um “trabalho” numa entidade onde recebo R$82,00 por mês e vales transportes (Entrevistado 02). Ajuda a pensar melhor nas coisas. Incentiva a fazer coisas boas, a ajudar os outros. Se não fosse o projeto, eu estaria desinteressado (Entrevistado 03).

    Ao perguntar se os beneficiários acreditam em uma reabilitação através de penas alternativas, foram obtidas as seguintes respostas:

    Porque é mais fácil para as pessoas encontrar um trabalho através de outras pessoas elas vão se conhecendo (Entrevistado 01). Eu melhorei, os outros também podem melhorar. Tendo força de vontade e querendo mudar, a pessoa consegue (Entrevistado 02). Porque recebo conselhos. Aqueles que não tem jeito, o projeto não adiantaria. Depende da pessoa querer ou não (Entrevistado 03).

    Finalizando a entrevista com os beneficiários, foi perguntado se gostariam de dar alguma sugestão no sentido de melhorar o Programa CEAPA: "Não gostaria de dar sugestão” (Entrevistado 01). “Sim. Gostaria que fossem aumentadas as horas para o pagamento da pena” (Entrevistado 02). “Sim. Não moro aqui. Está faltando advogado no CEAPA. Gostaria de cumprir a pena em minha cidade, mas não posso. Estou desempregado e fica difícil pra mim” (Entrevistado 03).

6.     Considerações finais

    A partir dos dados coletados no CEAPA, pode-se traçar um perfil dos beneficiários atendidos pelo Programa, entre os anos de 2006 a 2007, no qual a maioria é do sexo masculino; possuem idade entre 21 a 30 anos; se consideram brancos; são católicos; possuem ensino fundamental incompleto; tem preferência pelas áreas de mecânica e informática; são solteiros; possuem média de 1 a 2 filhos; estão desempregados ou trabalham como autônomos, e não contribuem para a Previdência Social; recebem entre 1 a 3 salários mínimos; fazem uso de álcool; prestam serviço à comunidade (pena alternativa) e, o principal delito cometido é o furto.

    Nas análises dos relatórios do Programa CEAPA realizados no período de maio 2006 a maio de 2007, foi percebido uma preocupação em efetivar o cumprimento das penas alternativas através da prestação de serviços à comunidade. Pelas análises, vários encaminhamentos foram e vem sendo realizados através das parcerias que possibilitam a inclusão social dos beneficiários deste Programa. Nas respostas dos beneficiários, a partir das entrevistas realizadas, houve um auto-reconhecimento no processo de inclusão a partir do acompanhamento dos profissionais existentes no Programa. Isso auxiliou no cumprindo da pena, na inclusão à sociedade, no resgate da dignidade e, em novas oportunidades de trabalho.

    Dessa forma é percebido que o Programa Central de Apoio às Penas Alternativas (CEAPA), do município de Montes Claros (MG), utilizando-se das penas alternativas, promove inclusão social, prestação de serviço à comunidade e alternativa ao sistema penitenciário tradicional, proporcionando uma ressocialização humanizada para as pessoas que cometem delitos que tenham condenação igual ou inferior a quatro anos, ou penas em que o crime seja considerado culposo.

Referências

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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 18 · N° 185 | Buenos Aires, Octubre de 2013
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