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A leitura semiótico-discursiva na escola e as mudanças

 na prática pedagógica: a multimodalidade em debate

La lectura semiótico-discursiva en la escuela y los cambios en la práctica pedagógica: la multimodalidad en debate

 

Acadêmico do Curso de Licenciatura em Letras Português/Espanhol

pela Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE

(Brasil)

Silvio Profirio da Silva

silvio_profirio@yahoo.com.br

 

 

 

 

Resumo

          Neste trabalho, refletimos acerca das modificações ocorridas na prática pedagógica do ensino da leitura. Modificações estas provenientes do brotar de uma concepção de leitura em uma perspectiva semiótico-discursiva, que leva em conta aspectos e traços semióticos presentes na materialidade do texto. Para isto, recorremos a autores advindos das Ciências da Educação [Pedagogia], das Ciências da Linguagem [Linguística Aplicada e Linguística de Texto] e da Teoria da Semiótica.

          Unitermos: Leitura. Imagem. Sentido.

 

Resumen

          En este trabajo, se reflejan sobre los cambios que se producen en la práctica pedagógica de la enseñanza de la lectura. Son cambios advenidos de una concepción de la lectura en una perspectiva semiótica y discursiva, que tiene en cuenta aspectos y rasgos semióticos presentes en la materialidad semiótica del texto. Para eso, recurrimos a los autores derivados de las Ciencias de la Educación [Pedagogía], las Ciencias del Lenguaje [Lingüística Aplicada y Lingüística Textual] y la Teoría de la Semiótica.

          Palabras clave: Lectura. Imagen. Sentido.


Abstract

          In this work, reflect on the changes occurring in the pedagogical practice of teaching reading. These changes from the spring from a conception of reading on a semiotic-discursive perspective. This takes into account semiotic aspects and traits present in the materiality of the text. For this, we resort to authors coming Sciences Education [Pedagogy], of Language Sciences [Applied Linguistics and Text Linguistics] and the Theory of Semiotics.

          Keywords: Reading. Image. Meaning.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 185, Octubre de 2013. http://www.efdeportes.com/

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1.     Palavras iniciais

    Da primazia dada ao código verbal escrito ao espaço dado aos múltiplos recursos linguístico-discursivos do plano visual. Este percurso evidencia as mudanças paradigmáticas ocorridas nas práticas pedagógicas do ensino da leitura presentes no processo de escolarização brasileiro, abarcando, assim, textos que trazem a tona uma gama elementos semióticos e arranjos visuais. Isto, conseguintemente, acarreta modificações nas práticas cognitivas de leitura, na medida em que o ensino da compreensão leitora inclui, agora, novos e diversificados recursos de construção de sentido.

Silvio Profirio da Silva

    No dizer de Barbosa & Souza (2006), por muito tempo, a prática pedagógica do ensino da leitura concedeu primazia à Decodificação de Conteúdos e Informações, pautando-se, para isto, em Práticas Mecânicas de Localização, de Extração e de Reprodução (BARBOSA & SOUZA, 2006). Com base neste norte, percebemos que o ensino desta competência linguística focava em práticas de extração e de reescrita de informações/ mensagens presentes na superfície do texto, em detrimento do ato de primar pela construção de sentido e pela elaboração de significação face o texto. Ora, o ensino da leitura tinha como foco as informações explícitas do texto, erradicando, deste modo, os não-ditos e o plano discursivo do texto.

    Quando se lê, considera-se não apenas o que está dito; mas também o que está implícito: aquilo que não está dito e que também está significado. E o que não está dito pode ser de várias naturezas; o que não está dito mas que de certa forma, sustenta o que está dito; o que está suposto para que se entenda o que está dito, aquilo a que o que está dito se opõe; outras maneiras diferentes de se dizer o que se disse e que significa com nuances distintas, etc. (ORLANDI, 2001, p. 11).

    Destacamos, ainda, o fato de o ensino desta ferramenta linguística primar pela linguagem escrita, focando nas palavras e nas frases. Nesta conjectura, a prática pedagógica do ensino da leitura dava ênfase a textos construídos linguisticamente, por intermédio do código verbal escrito. Tal postura erradicava a imagem das práticas pedagógicas. Não estamos afirmando, aqui, que o plano visual não fazia parte dos materiais didáticos. Entretanto, o ensino desta ferramenta linguística não remetia à imagem, uma vez que tinha como foco o plano verbal [leia-se linguagem escrita].

    Este quadro, no entanto, viria a ser alterado. No dizer de Santos (2002a; 2002b), nos anos de 1980, as discussões relativas à Prática Pedagógica do Ensino de Língua Portuguesa expandem-se de maneira considerável, acarretando o brotar de novos paradigmas para a escolarização da leitura e da escrita. Na fala da própria autora, “vários trabalhos, sobretudo a partir de 1980, têm procurado discutir o modo como se vem processando o ensino de língua escrita no Brasil e apontam para algumas questões de nível conceitual e metodológico” (SANTOS, 2002a, p. 1). É, neste contexto paradigmático, que emergem novas teorias, que respaldam novos procedimentos didáticos (SANTOS, 2002b).

    O ensino da linguagem nas escolas brasileiras tem sido alvo de reflexão e análise por parte de diversos pesquisadores. Nas duas últimas décadas, temos visto surgir ampla literatura na qual linguistas, sóciolinguistas (sic) e outros estudiosos têm-se mostrado empenhados não apenas em fazer a crítica de como se processa o ensino da linguagem em nossas escolas, mas, também, em analisar as questões subjacentes a esse processo e propor novos caminhos conceituais e metodológicos para o avanço dessa área de ensino (RECIFE, 1996 apud ALBUQUERQUE, 2001, p. 1).

    Desponta, desta maneira, uma nova concepção de leitura enquanto Construção/ Elaboração de Sentido, marcada pela articulação/ integração do autor e leitor, recorrendo, para tal, à mediação do texto. Na ótica de Koch & Elias (2006), tal concepção é marcada por uma gama de conhecimentos e saberes utilizados pelo leitor – Saberes Linguísticos [conhecimentos gramatiqueiros e vocabular], Enciclopédicos [conhecimentos de mundo e sociais] e Textuais [conhecimentos relativos aos gêneros textuais e/ ou às sequencias tipológicas], bem como marcada por Práticas Cognitivas [antecipações, deduções, inferências, paráfrases etc.] (KLEIMAN, 2004; KOCH & ELIAS, 2006).

    Até a década de 80 do século passado predominou, no Brasil, uma ensino da leitura e da escrita com base em métodos “tradicionais”, como os analíticos e sintéticos, que concebiam a língua como o aprendizado de um “código”, e a alfabetização como processos de “codificação” e “decodificação”. A partir da década de oitenta, esses métodos passaram a ser criticados e o ensino da leitura e da escrita passou a ser influenciado por teorias construtivistas como a psicogênese da língua escrita, desenvolvida por Ferreiro e Teberosky (1986). Vivemos também uma forte influência dos estudos linguísticos vinculados à análise do discurso, às teorias da enunciação ou à linguística textual (ALBUQUERQUE & MORAIS, 2007, p. 128).

    Neste contexto, irrompem as discussões referentes aos mais diversos aspectos do funcionamento dos gêneros textuais, focando, sobretudo, nas suas especificidades e nas suas particularidades (SANTOS et al, 2006). Irrompem, ainda, as discussões tocantes à Multimodalidade, que ocasionou uma gama de modificações na prática pedagógica do ensino da leitura. Neste trabalho, colocamos em discussão as modificações ocorridas na prática pedagógica do ensino da leitura. Modificações estas provenientes do brotar de uma concepção de leitura em uma perspectiva semiótico-discursiva, que leva em conta aspectos e traços semióticos presentes na materialidade do texto. Para tanto, pautamo-nos em autores advindos das Ciências da Educação [Pedagogia], das Ciências da Linguagem [Linguística Aplicada e Linguística de Texto] e da Teoria da Semiótica.

2.     Do código verbal escrito aos arranjos visuais: um olhar sobre as mudanças paradigmáticas na escolarização do leitor

    Consoante Albuquerque (2006), nos dias atuais, as discussões relativas ao ensino da compreensão leitora proliferaram-se consideravelmente, estando presente em uma vasta quantidade de campos de investigação. São exemplos que ilustram estes campos de estudos, a Pedagogia, a Linguística [neste campo, destacam-se os postulados da Linguística Aplicada, da Análise do Discurso, da Análise Crítica do Discurso, da Linguística de Texto, da Pragmática, da Psicolinguística etc.], a Psicologia [neste campo, destacam-se os postulados da Psicologia Cognitiva], a Filosofia e a Sociologia (ALBUQUERQUE, 2006; ALBUQUERQUE et al, 2008). Os postulados advindos destas áreas de investigação respaldam uma nova concepção de leitura como Ato Sociointeracional. Ora, esta ferramenta linguística é, agora, concebida como uma Prática de Atribuição/ Elaboração de Sentido, ancorada na articulação/ integração do autor e do leitor, pautando-se, para isto, na mediação do texto, como apontam Kleiman (2008) e Santos (2002a).

    Se o ensino da leitura sofreu mudanças diversas ao longo da história, nas três últimas décadas variados aspectos têm influenciado e transformado bastante as formas segundo as quais esse ensino tem sido concebido e posto em prática. Fatores como os avanços teóricos na área, mudanças nas práticas sociais de comunicação e o desenvolvimento de novas tecnologias têm forjado novas propostas pedagógicas e a produção de novos materiais didáticos relacionados à alfabetização inicial e ao ensino de línguas em geral. No contexto brasileiro, vivemos desde o início da década de 1980 um amplo debate sobre esses temas. Pesquisadores com formação em distintos campos – psicologia, linguística, pedagogia etc. – têm procurado redefinir a leitura e a escrita, bem como seu ensino e sua aprendizagem (ALBUQUERQUE et al, 2008, p. 1).

    Dentre estes postulados propagados nos anos de 1980, destacamos, aqui, os linguísticos, mais especificamente, os da Linguística de Texto e/ ou Teorias do Texto. Barros (2005) postula que a Linguística de Texto promove uma quebra paradigmática com a perspectiva de texto enquanto frase, mediante o brotar de um novo conceito atrelado ao sentido. Desponta, deste modo, o conceito de texto enquanto Unidade de Sentido (BARROS, 2005; CEREJA, 2002). Tal postura é corroborada por Bentes (2001), que demonstra como a Linguística de Texto promoveu uma ruptura com o conceito de texto enquanto articulação/ junção de elementos/ unidades menores – sílabas, palavras e frases -, articulados/ integrados mediante o uso de conectores de parágrafos. Rompe-se, desta forma, com a perspectiva da sequenciação de frases na constituição do texto advinda das Análises Transfrásticas (BENTES, 2001).

    Nesta mesma direção, os estudos de Luna (2002) e Sargentini (2012) evidenciam uma concepção de texto, que não se limita à escrita. Pelo contrário, esta nova noção de texto abrange/ engloba as múltiplas faces da linguagem - verbal [escrita e oral] e não-verbal. Neste sentido, a construção do texto não se dá, única e exclusivamente, através do código verbal, mas abarca elementos semiótico-discursivos e, conseguintemente, uma gama de arranjos que remetem ao plano visual (DIONÍSIO, 2005; 2011).

    Compreendemos o texto em sua dimensão semiológica e histórica. Nesse sentido, o texto se apresenta como unidade de significação constituída por sistemas semiológicos de natureza verbal (linguística) e não verbal (imagens estáticas e animadas, gestos, sons, sinais, símbolos etc.) e pelo funcionamento enquanto unidade de expressão do discurso. O texto é, portanto, a materialização concreta do discurso em uma ou em diferentes linguagens (SARGENTINI et al, 2012, p. 214).

    Destacamos, ainda, os Postulados Semióticos e seu papel no sentido de evidenciar a dimensão não-verbal da constituição e da materialização do texto. Barros (2005) demonstra que a Teoria da Semiótica se debruça sobre o texto, tendo como foco os atos de descrever e explicar “o que o texto diz e como ele faz para dizer o que diz” (BARROS, 2005, p. 11). Sendo assim, podemos dizer que a Semiótica toma como objeto de estudo os ditos e não-ditos do texto, bem como os recursos linguístico-discursivos mobilizados para a materialização deste. Neste campo de investigação, advém o conceito de Multimodalidade.

    No dizer de Dionísio (2005; 2011), a Multimodalidade consiste nas mais distintas formas e modos de representação utilizados na construção de uma dada mensagem, tais como: palavras, imagens, cores, formatos, traços tipográficos, disposição da grafia, negritos, sublinhados, gestos, padrões de entonação, sons, símbolos etc. (DIONÍSIO, 2005; 2011; SARGENTINI et al, 2012; SILVINO, 2012). Diante desta perspectiva, podemos dizer, então, que o conceito de multimodalidade abrange/ engloba a linguagem e suas múltiplas modalidades – escrita, oral e imagética. Neste estudo, no entanto, focamos na multimodalidade textual-discursiva materializada nos gêneros textuais imagéticos.

    Nos dias atuais, cada vez mais os textos verbo-imagéticos são inclusos não só aos materiais didáticos, mas, sobretudo, às práticas corriqueiras do dia a dia. Segundo Dionísio (2011), nas práticas cotidianas, as pessoas deparam-se constantemente com enunciados construídos linguisticamente, por intermédio de arranjos e recursos visuais. Isto rompe com a primazia dada às letras e às palavras na construção de uma dada mensagem e, por conseguinte, com a perspectiva monomodal. Este contexto paradigmático traz à tona uma nova perspectiva de leitura – a Semiótico-discursiva – que abarca a produção de efeitos de sentido face textos materializados através de arranjos e recursos visuais.

3.     Procedimentos metodológicos

    Para realização deste trabalho, inicialmente, realizamos pesquisa bibliográfica. Diante disto, este estudo ancora-se, teoricamente, em autores do campo da Linguística Aplicada e da Pedagogia, tais como: Albuquerque (2006), Barbosa & Sousa (2006), Bezerra (2001; 2010), Cardoso (2003), Jolibert (1994), Kleiman (2004; 2008), Pietri (2007; 2010), Santos (2002a; 2002b; 2012), Soares (1998) etc..

    Ancora-se, também, em autores da Linguística de Texto, tais como: Bentes (2001), Costa Val (2004), Koch (2002), Koch & Elias (2006), Xavier (2006) etc., bem como autores da Teoria da Semiótica, como: Barros (2005), Catto & Hendges (2010), Dionísio (2005; 2011) e Ferraz (2011).

    Após isto, foram escolhidas e analisadas sete tirinhas, que tecem críticas à degradação ambiental, recorrendo, para tal, a recursos multimodais. Tais gêneros foram publicados pelo Site Qualidade em Quadrinhos, durante o decorrer deste ano. O propósito, aqui, era verificar quais os recursos linguístico-discursivos mobilizados – verbais e visuais -, a fim de materializar o dizer do autor.

4.     Resultados

    Os gêneros textuais analisados evidenciam elementos, que remetem não só ao plano verbal, mas, sobretudo, ao visual, como: cores, expressões faciais, formas, símbolos etc.. Ora, a intenção de dizer do autor frente à temática ambiental é materializada, por intermédio de elementos semióticos. Isto leva para o cenário escolar novas práticas de leitura pautadas nos elementos semiótico-discursivos presentes na materialidade do texto.

    A primeira tirinha traz à tona uma crítica à degradação ambiental, mais especificamente, ao progresso e à derrubada ilegal de árvores. Para tanto, inicialmente, ela traz duas crianças índias, conversando e exteriorizando uma expressão de felicidade diante da natureza [neste caso, a cobra]. No quadrinho seguinte, a expressão facial deles muda completamente. Por fim, no terceiro quadrinho, é revelado o motivo da expressão facial de tristeza – uma vasta quantidade de árvores cortadas. Neste quadrinho, é revelado, também, o fator que ocasiona a degradação ambiental [O Progresso]. Daí percebemos a crítica da tirinha em foco, em relação ao progresso desmedido, que acarreta a degradação ambiental. Aqui, representada pela derrubada ilegal de árvores. Para exteriorizar tal crítica, a tirinha em questão mobiliza recurso verbais [falas das personagens] e não-verbais [expressões faciais e imagens].

    A segunda tirinha faz uma crítica à derrubada ilegal de árvores, remetendo, deste modo, à temática da degradação ambiental. Para realizar esta faceta, o gênero textual em foco traz a tona uma situação comunicativa, na qual um caçador portando um machado na mão se prepara para cortar árvores. Isto remete ao desmatamento ambiental. Neste momento, aparece a imagem do Chico Bento, com uma expressão facial enfurecida, apontando para uma placa que diz: “proibido caçar”, o que reflete o posicionamento contrário face ao desmatamento ambiental. Mais à frente, aparece a imagem de sete árvores, que trazem à tona uma expressão facial de medo diante da atitude do homem que pretendia cortá-las. Embora esta tirinha não traga cores nem diversidade de textos verbais, o leitor pode chegar ao seu propósito comunicativo. Para tal, ele deve atentar para todos os elementos semióticos presentes neste gênero textual.

    A terceira tirinha traz uma crítica à jogada de substâncias tóxicas nos ambientes aquáticos. Para isto, mostra a imagem de peixes que fogem diante da grande quantidade de lixo tóxico jogado na água. O leitor, para perceber a crítica à degradação ambiental, deve atentar para os elementos semióticos, como é o caso da cor preta que representa o material tóxico jogado ilegalmente no mar, bem como as expressões faciais dos peixes que fogem da substancia tóxica. Há, ainda, um elemento verbal – Coisas da vida -, que evidencia o fato de estas práticas estarem presentes na sociedade contemporânea. Por meio da mobilização destes elementos verbais e visuais, o autor materializa seu propósito comunicativo de fazer menção à degradação ambiental.

    A quarta tirinha faz alusão à temática ambiental. Para tal, ela traz a imagem de um homem parado em frente a uma árvore. O homem evidencia uma expressão facial de indecisão. Ao lado dele, no lado esquerdo, aparece a imagem de um anjo, que segura um regador, o que representa o ato da formação de uma consciência ecológico-preventiva. No lado direito, aparece a imagem de um diabinho, segurando uma machado, o que representa o mal e, por conseguinte, a degradação ambiental. Há, no olho do diabinho, o símbolo do dinheiro, o que associa a degradação ambiental ao progresso desmedido. A partir da mobilização de todos estes elementos visuais, o autor faz referência à questão ambiental, abarcando, assim, os caminhos que o homem da atual sociedade contemporânea pode trilhar em face da natureza.

    A quinta tirinha traz uma crítica ao desmatamento ambiental ocasionado pelo progresso desmedido. Para tanto, ela traz dois quadrinhos. No primeiro, aparece a imagem de uma paisagem repleta de árvores, montanhas e nuvens bem azuis. No segundo quadrinho, aparece uma vasta quantidade de árvores cortadas, bem como a ausência das montanhas e das nuvens. Esta oposição das perspectivas evidenciadas pelos dois quadrinhos vem acompanhada de um elemento verbal: “Um milagre chamado progresso”. A articulação dos elementos semióticos – árvores cortadas e ausência das cores – e do elemento verbal evidencia a crítica do autor à degradação ambiental.

    A sexta tirinha traz à tona uma crítica ao desmatamento ambiental. Mais uma vez, o gênero textual em tela lança mão da integração dos elementos verbais e não-verbais. Todavia, nesta tirinha, ocorre uma equidade de elementos. Ou seja, tanto os elementos verbais, como os não-verbais aparecem de forma igualitária. Tal tirinha traz à tona a conversa de duas crianças diante da imagem da Bandeira do Brasil. Na bandeira, ocorre a retirada da cor verde, o que sinaliza a crítica à temática ambiental. Na conversa traçada entre as crianças, uma delas questiona o motivo pelo qual a bandeira do nosso país está desbotada. O outro revela que tal fato se dá por conta do desmatamento. Diante da integração dos elementos verbais – fala das personagens – e dos elementos não-verbais – ausência das cores da bandeira -, é possível perceber a crítica elaborada no gênero textual em foco.

    A sétima tirinha traz à tona uma crítica à degradação ambiental. Para tanto, ela lança mão da integração da linguagem verbal e não-verbal, bem como de uma comparação temporal. Assim como na tirinha anterior, ocorre a primazia à linguagem não-verbal e, por conseguinte, aos elementos semióticos. No primeiro quadro, aparece a imagem do Mapa do Brasil, repleto de árvores e, conseguintemente, da cor verde. Além disso, aparece uma expressão facial de felicidade. Logo abaixo desta imagem, aparece a seguinte fala: “antes da chegada dos colonizadores”. Isto reflete a vida antes da colonização portuguesa, onde não havia o desmatamento ambiental. No segundo quadro, aparece a imagem do Mapa do Brasil sem árvores e com uma expressão facial que se contrapõe veementemente à anterior. Logo abaixo desta imagem, aparece a seguinte fala “num futuro não muito distante”. Diante destes aspectos, é possível perceber não só a crítica à degradação ambiental, como também as estratégias textual-discursivas utilizadas pelo autor. Ora, o autor, diante da sua intenção de dizer, põe em oposição duas imagens distintas. Isto, não só em termos de cores e expressões faciais, como também em termos de temporalidade. Por meio desta junção de cores e de expressões faciais distintas, o autor da imagem tem por objetivo fazer uma crítica ao desmatamento ambiental, que, na sua visão, tem inicio a partir da colonização portuguesa. Mais uma vez, para que o leitor perceba a intenção do autor, deve atentar para todos os elementos – verbais e não-verbais [estes em maior quantidade, como é o caso do jogo de cores e expressões faciais].

    Estas imagens demonstram como se dá a materialização dos conceitos de Multimodalidade e da Leitura em uma Perspectiva Semiótico-discursiva. Neste tipo de leitura, a atribuição de sentido e a elaboração de significação face o texto não abrange somente as letras, mas, sobretudo, uma ampla quantidade de elementos visuais e semióticos, tais como: cores, formas, formatos, aspectos pictóricos etc.. E, até mesmo a ausência das cores e de alguns elementos podem sinalizar aspectos extremamente relevantes acerca da intenção de dizer do autor. Os textos multimodais transcendem, então, a perspectiva monomodal (GASPARETTO SÉ, 2008). Ora, o leitor deve atentar, assim, para uma vasta quantidade de elementos e arranjos visuais, que demonstram os propósitos comunicativos do autor, contribuindo, assim, para a produção de efeitos de sentido, por parte do leitor, face o texto.

5.     Algumas considerações

    Para concluirmos esta escrita, recorremos à fala de Dionísio (2011, p. 138), que diz que, “na atualidade, uma pessoa letrada deve ser alguém capaz de atribuir sentidos a mensagens oriundas de múltiplas fontes de linguagem”. Partindo desta perspectiva, na sociedade contemporânea, a competência leitora é algo de fundamental importância e como tal deve abrangem suas múltiplas modalidades. Em outras palavras, nesta sociedade marcada pela constante proliferação das Tecnologias da Informação e da Comunicação – TICs, as pessoas devem estar aptas a compreender, ou melhor, a elaborar sentido e significação face os mais diversos tipos de textos construídos com base nas mais distintas modalidades da linguagem [escrita, oral e, sobretudo, não-verbal/ imagética] (DIONÍSIO, 2011). Ora, o leitor deve atentar para as mais diversas marcas textuais materializadas no texto, como, por exemplo, ilustrações, cores, formatos, formas, disposição, elementos tipográficos etc. (DIONÍSIO, 2005; SILVINO, 2012). Tal postura reflete a essência da perspectiva da Leitura Semiótico-discursiva.

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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 18 · N° 185 | Buenos Aires, Octubre de 2013
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