O lazer enquanto conteúdo das aulas de Educação Física: um estudo de caso nas escolas da rede pública do município de Paripiranga, BA La recreación como contenido de
las clases de Educación Física: un estudio |
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*Licenciada em Educação Física pela Faculdade AGES **Orientadora. Professora Titular da Faculdade AGES (Brasil) |
Wagner Murilo da Silva* Priscila Ellen Pinto Marconcin** |
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Resumo Ao analisar o entendimento acerca do lazer é possível observar que sua prática tem se tornado ao longo dos anos algo considerado secundário por uma parte da população. Seu conceito por mais simples que pareça leva a um leque de significados e opiniões. Desta forma, o presente trabalho tem como objetivo analisar de que maneira os professores de Educação Física do Ensino Fundamental da rede pública da cidade de Paripiranga, BA, trabalham com o conteúdo lazer nas suas aulas. Para responder com o referido objetivo, o estudo tem caráter qualitativo descritivo. Sua amostra foi composta por 04 (quatro) professores de Educação Física do município de Paripiranga, sendo 03 (três) do sexo masculino e 01 (um) do sexo feminino com faixa-etária entre 18 e 30 anos, todos ministram aulas na referida área. Para melhor coletar os dados do estudo, utilizou-se de uma entrevista com perguntas abertas, semi estruturadas, com questões objetivas em relação ao conteúdo lazer, seu entendimento e como é tratado em sala de aula. A apreciação dos dados utilizou a técnica de análise de conteúdos proposta por Bardin (2004) e a discussão teve como principais teóricos utilizados Bramante (1998), Darido; Rangel (2011), Marcelino (1990; 2008), Pinto (2001), Werneck (2000). Os dados apontam que a grande maioria dos professores não desenvolve o lazer em suas aulas, justificando a falta de recursos e uma estrutura física precária, além do poder público que nada faz para esse fim. Concluímos que, mudanças são necessárias, e as articulações em torno dessa temática numa discussão mais aprofundada são essenciais, principalmente no sentido de conceber o lazer sob o prisma do seu duplo aspecto educativo: o paradigma da educação pelo e para o lazer. A escola assume uma importante função nessa transformação, e os profissionais da educação são capazes de inovar e resgatar atividades tidas como antigas e introduzi-las em suas aulas através de movimentos artísticos e corporais, possibilitando um lazer lúdico e educativo, além de contribuir para a formação mais crítica de seus alunos, visando a autonomia e a capacidade de analisar com maior criticidade a realidade que os cercam. Unitermos: Lazer. Educação Física escolar. Políticas públicas.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 184, Septiembre de 2013. http://www.efdeportes.com/ |
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1. Introdução
Estudar o lazer é estudar suas possibilidades de inserção no meio social, em uma sociedade que vive demarcada por traços de violência e desrespeito, onde os sujeitos vivem cada vez mais suas individualidades e deixam de se preocupar com a vida social, em coletivo, quando muitos valores estão sendo subvertidos.
A maioria das pessoas esquece o verdadeiro sentido do lazer, dando importância apenas a eventos ditos “da moda”, numa sociedade que vive marcada por inovações tecnológicas que interferem diretamente nos hábitos de vida vivenciados nos momentos livres, ou seja, nas horas de não trabalho.
O lazer é um conceito complexo de ser definido no campo científico. Para muitos autores, o lazer surge desde a Antiguidade, com jogos e brincadeiras. Entretanto, outros autores afirmam que o lazer é fruto da sociedade moderna, após Revolução Industrial, pois suas características são permeadas por conceitos e significados advindos do contexto de dualidade: tempo livre e tempo de trabalho. O lazer precisa ser entendido como um tempo que pode ser privilegiado para vivência de valores que contribuam para mudanças de ordem moral e cultural, necessárias para solapar a estrutura social vigente.
Como fruto de uma sociedade capitalista, o lazer é muitas vezes visto como o consumo de atividades para divertimento e recreação, nesse sentido acaba sendo excludente e não democrático, pois se torna acessível apenas a uma parcela da população que tem condições financeiras para tal.
Nesse sentido, as atividades de lazer culturais e educacionais estão sendo cada vez menos praticadas. Uma parcela da sociedade não valoriza o que é parte de sua cultura, passa a valorizar o novo, dando maior ênfase a produtos “ditos da moda”. Dessa forma, o estudo acerca dessa temática se torna necessário, diante de uma sociedade marcada por inovações tecnológicas que não enxergam a cultura como possibilidade de mudanças e perspectivas educacionais. O lazer visto de um enfoque educacional pode ser adquirido em pequenas atividades e fazer parte de uma metodologia de trabalho. Democratizá-lo é dar oportunidades para sua inserção no meio social, é investigar possíveis espaços para sua vivência, discutir o papel da sociedade e dos poderes públicos nessa democratização.
Embora o conceito da instituição escola esteja se alterando nas últimas décadas, ele esteve, até agora, atrelado à produção e à reprodução da cultura e do trabalho. Contudo, falta neste sentido, espaço para o lazer. Essa falta não se restringe às discussões sobre sua importância, mas se confunde com a falta de espaços, horários, contingente humano, enfim, resume o que a escola pensa sobre o lazer: nada ou quase nada. Poucos são os momentos que o tema é trabalhado na escola, seja na esfera política ou social. Nesse sentido, acredita-se que os alunos necessitam de uma maior discussão acerca desse direito.
Assim, a Educação Física escolar dá oportunidade para que esse quadro possa ser gradativamente revertido, pois em seus conteúdos possibilitam um maior enfoque dessas atividades, eles são elaborados tendo em vista uma sociedade que necessita resgatar padrões culturais, sociais e éticos. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) apontam a importância de educar para o lazer, de questionar e de lutar por melhores condições de vida. Portanto, o tema deve ser trabalhado nas aulas de Educação Física possibilitando uma democratização de acesso às vivências de lazer para todos.
Na realidade educacional existente é importante ressaltar que as aulas de Educação Física escolar têm como função proporcionar a ampliação da cultura corporal do movimento humano, e por meio disto, contribuir para a formação de um sujeito crítico e autônomo na sociedade. Se isso for analisado no âmbito do lazer, proporcionará uma análise crítica das políticas públicas na área, possibilitando reivindicações e lutas por esses direitos que são de todos.
O que se observa na escola, hoje, é a cultura popular que tem se perdido no tempo; as festas, as brincadeiras as danças, enfim, momentos que fazem da atividade um espaço educativo prazeroso, pois é possível nessas práticas resgatar toda uma tradição que tem sido esquecida por boa parte dos professores que não dão a devida atenção a essas possibilidades.
A escola assume papel relevante no processo de democratização do lazer, pois possibilita ao aluno uma maior participação, tornando-o sujeito crítico e autônomo. A Educação Física escolar precisa estar pautada nessas diretrizes e, pronta para exercer uma de suas funções primordiais, o acesso às manifestações culturais, formando criticamente o sujeito capaz de perceber a democratização do lazer.
Diante do exposto, o trabalho em questão tem como objetivo realizar um estudo acerca dessa temática, analisando o entendimento dos professores de Educação Física a respeito do lazer, e como ele está sendo trabalhado em sala de aula, contribuindo dessa forma, para uma melhor ampliação no campo acadêmico, podendo servir como respaldo teórico para futuros trabalhos e a título de conhecimento a quem se fizer interessado. Além de repensar o conteúdo lazer nas aulas da referida área, como possibilidade de ampliar o acesso democrático do sujeito na sociedade.
2. Metodologia
A pesquisa será um estudo de caso que trata de uma metodologia aplicada para avaliar ou descrever situações dinâmicas em que o elemento humano está presente. Busca-se apreender a totalidade de uma situação e, criativamente, descrever, compreender e interpretar a complexidade de um caso concreto, mediante um mergulho profundo em um objeto delimitado. É de natureza qualitativa, mais do que qualquer outra, levanta questões de valores, principalmente, devido à proximidade entre pesquisador e pesquisados. Segundo Richardson (2011), os estudos que empregam uma metodologia qualitativa podem descrever a complexidade de determinado problema, analisar a interação de certas variáveis, compreender e classificar processos dinâmicos vividos por grupos sociais.
Quanto aos objetivos da pesquisa classificam-se em descritiva exploratória. Para Gil (2010, p. 27-28), a pesquisa descritiva “tem como objetivo primordial a descrição das características de determinada população ou fenômeno ou o estabelecimento de relações entre as variáveis.” Enquanto isso, a pesquisa exploratória “tem como principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e idéias, tendo em vista a formulação de problemas mais precisos [...]”.
O presente estudo procurou descrever e estabelecer relações entre o discurso dos entrevistados. Também procurou esclarecer conceitos e idéias veiculadas ao lazer, na tentativa de contribuir para uma sociedade mais justa onde todos tenham a oportunidade de desfrutar do lazer de forma satisfatória.
A amostra da pesquisa foi composta por 04 (quatro) professores do município de Paripiranga, sendo 03 (três) do sexo masculino e 01 (um) do sexo feminino com faixa-etária entre 18 e 30 anos, residentes no município de Paripiranga. Todos os entrevistados são graduandos em Educação Física.
Foi selecionada a partir de alguns professores que ministram aulas nessa área, no Ensino Fundamental, em escolas da rede pública de ensino, na sede do referido município.
Para melhor coletar os dados do estudo, utilizou-se de uma entrevista com perguntas abertas, semiestruturadas, com questões objetivas em relação ao conteúdo lazer, seu entendimento e como é tratado em sala de aula. O uso da entrevista é um dos meios de recolha de dados utilizados na investigação qualitativa. O objetivo prioritário é a percepção da opinião dos entrevistados sobre o assunto que tem sido abordado, pois a entrevista é “uma forma de diálogo assimétrico, em que uma das partes busca coletar dados e a outra se apresenta como fonte de informação”. (Gil, 2010, p. 109)
Sendo assim, a entrevista continha oito questões abertas, que versavam respectivamente sobre os objetivos das aulas de Educação Física, os conteúdos que são trabalhados nas aulas, concepções e significados do lazer, utilização do conteúdo lazer, a importância da formação para o lazer, a importância das políticas públicas e a expansão do conteúdo na escola.
A Pesquisa em questão foi realizada no município de Paripiranga que está localizado no nordeste baiano, apresenta uma área de 436 km2 e uma população total, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), de 27.778 habitantes. No entanto, o universo da pesquisa está limitado aos professores de Educação Física da rede pública do referido município.
O estudo foi realizado com os professores de Educação Física da rede pública da cidade de Paripiranga. A entrevista foi realizada junto aos professores após o horário das aulas, em uma sala silenciosa, com a presença somente do entrevistador e do entrevistado. Os mesmos assinaram um termo de Livre consentimento, sendo garantido o sigilo absoluto dos dados. Foram classificados em: entrevistado 1, entrevistado 2, entrevistado 3 , entrevistado 4.
3. Análise e discussão dos dados
Para analisar os dados coletados, recorreu-se à técnica de análise de conteúdo, que segundo Bardin (2004), a análise de conteúdo, enquanto método, torna-se um conjunto de técnicas de análise das comunicações que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens.
A partir da definição metodológica e da coleta dos dados, parte-se para a análise e discussão dos mesmos, assim, serão apresentadas tabelas correspondentes a cada uma das questões aplicadas à amostra. Nesta estrutura, estarão as categorias de análise, e para cada categoria as características correspondentes.
A seguir, serão apresentados e discutidos os dados obtidos a partir das entrevistas feitas com os professores, conforme exposto na descrição da amostra, sendo os resultados organizados em categorias de análise bem como suas devidas características.
Tabela 1. Concepção de lazer.
Categorias |
Características |
Descontração (1) |
Alívio do stress. |
Benefícios físicos (1) |
Bem-estar, saúde, prazer. |
Condição social (1) |
Moradia, emprego, educação. |
Oposição ao trabalho (1) |
Sem obrigatoriedade. |
Fonte: Elaboração do autor, 2013
Ao analisar as concepções de Lazer dos entrevistados, foi possível perceber que o mesmo demanda uma série de conceitos e sua significação contínua sendo um campo de enormes estudos e reflexões. Em suas menções, relataram quatro categorias principais: Condição social, benefícios físicos, descontração e oposição ao trabalho.
Os professores diversificaram seus entendimentos acerca desse campo, pois em suas respostas foi perceptível o caráter de descontração que essas atividades podem oferecer, um momento que pode ser reservado ao prazer naquilo que se faz, como foi frisado na fala do entrevistado 3: “é o momento que foge da obrigação, focando no prazer no que está fazendo.”
Tema esse que vem sendo bastante discutido na sociedade, isso porque poucas pessoas usufruem desse direito ou até mesmo lhe é negado. Na atual conjuntura social, ainda prevalece a cultura do “novo”, ou seja, as inovações tecnológicas, que deixam os jovens cada vez mais “alienados”, tarefas simples são esquecidas como visitar um amigo, fazer um passeio no fim de semana, visitar um museu, assistir a uma peça de teatro, participar de um grupo de danças, enfim uma infinidade de possibilidades que, na maioria das vezes, foram sendo esquecidas. Dessa forma, não há melhor espaço, para que seu conceito seja aprendido, que a escola, uma instituição capaz de transformar mentes, democratizar indivíduos e torná-los sujeitos críticos da sua realidade, que conseguem aproveitar os momentos e reivindicar seus direitos.
Para Bramante (1998) O lazer tem um papel significativo, pois é possível de se realizar no tempo livre fora do tempo das obrigações, em que as pessoas podem se expressar sentirem prazer, utilizarem de sua criatividade para se divertirem, descansarem e se desenvolverem. Isso pode agregar sujeitos com desejos e necessidades semelhantes, num mesmo ambiente.
Um dos professores entrevistados menciona o lazer como sendo fruto de uma condição social, ou seja, para ter lazer tem que usufruir de uma boa educação, emprego digno, saúde e moradia. Questão essa que se perde dos seus reais significados, uma vez que o acesso ao lazer deveria ser gratuito e não depende de condição social ou financeira, é uma questão pessoal, cada indivíduo pode usufruí-lo de diferentes maneiras, uma prática que pode ser realizada de variadas formas. Para Balseiro (2011), consiste na prática de descanso, recreação e atividades praticadas tanto individualmente como socialmente.
Em outra menção um dos entrevistados diz que o lazer está ligado diretamente à saúde e à qualidade de vida, através de benefícios físicos proporcionados por essa prática. Magalhães Pinto (2001) concorda com a idéia da importância do lazer para a saúde e qualidade de vida, sendo esta importante para humanização e a conquista da cidadania.
A prática do lazer deve estar focada nestes princípios, tendo como um de suas conseqüências, a saúde física e mental. Os indivíduos devem estar atentos para suas possibilidades e buscá-las nos mais variados momentos de sua vida.
Tabela 2. Percepção do lazer nas aulas de Educação Física.
Categorias |
Subcategorias |
Características |
Lazer |
Participação ativa independente da atividade (2) |
Prazer na prática, envolvimento e participação dos alunos. |
Educação Física |
Oposição às demais disciplinas (2) |
Momento de descontrair, divertimento. |
Fonte: Elaboração do autor, 2013
A partir da análise da percepção do lazer nas aulas de Educação Física, os entrevistados mencionaram duas categorias principais. Dois (02) deles citam que o lazer é perceptível a partir da participação ativa dos alunos nas atividades, o prazer com que fazem aquilo. É percebido que o lazer faz parte do homem e ele o demonstra de diferentes formas, basta que para isso esteja fazendo o que gosta, sem as cobranças e sem obrigação, conforme é percebido na fala do entrevistado 4: “o lazer acontece a partir do momento em que vemos os alunos se divertindo nas aulas”.
Na Educação Física os alunos têm essa oportunidade de descontração, desde que não fiquem soltos os objetivos. O professor, além da prática deve trabalhar o sentido do lazer mostrando aos seus alunos que eles têm o direito de usufruí-lo em suas vidas e o dever de cobrar e questionar quando não é oferecido. Dessa forma, o lazer não pode ser confundido apenas com a prática, ele precisa estar expresso em atitudes.
Sendo a Educação Física uma disciplina que trabalha com a cultura corporal do movimento, dá oportunidade aos alunos de participarem das diversas manifestações dessa cultura. Os professores precisam ter o maior cuidado na preparação de suas aulas para que eles não fiquem dispersos e confundam liberdade com libertinagem. O lazer pode se manifestar em um ambiente lúdico e privilegiado basta que esteja propício para isso. Como afirma Marcelino (1990, p. 31).
[...] como a cultura – compreendida no seu sentido mais amplo – vivenciada (praticada ou fruída) no “tempo disponível”. O importante, como traço definidor, é o caráter “desinteressado” desta vivência. Não se busca, pelo menos fundamentalmente, outra recompensa além da satisfação provocada pela situação.
Em outras menções, os entrevistados citam o lazer como um momento lúdico da Educação Física, uma oposição às demais disciplinas como foi percebido na fala do entrevistado 2: “Uma descontração das cobranças das outras aulas.” Conceito esse que se afasta dos objetivos educacionais propostos para a disciplina. A educação física dá oportunidade ao professor de trabalhar com os mais diversos conteúdos, levando a uma reflexão acerca de pontos importantes para viver em sociedade, como por exemplo, a exclusão, a violência, as drogas, e acima de tudo o respeito que todos devem ter uns com os outros e o lazer, um conteúdo que precisa ser trabalhado dentro e fora das aulas e não a própria aula. O lazer precisa ser visto como um direito que pode ser vivenciado nos momentos livres, um atividade lúdica e cultural. Marcelino (2008) acredita num lazer vivenciado em práticas culturais que possibilitem socialização entre as pessoas, o que nos faz perceber que os entrevistados não vêem o lazer como prática cultural e educacional.
Tabela 3. Utilização do conteúdo lazer nas aulas de Educação Física.
Categorias |
Características |
Atividades lúdicas (2) |
Participação ativa dos alunos, recreação, música |
Não trabalho (2) |
Não considera o lazer como conteúdo, conseqüência das atividades. |
Fonte: Elaboração do autor, 2013
A partir da análise da utilização do conteúdo lazer nas aulas de Educação Física foram feitas 2 menções, ressaltando sua utilização em atividades lúdicas como músicas, dinâmicas. Dessa forma, os mesmos enxergam o lazer como fruto das atividades e não como conteúdo em si, que merece um destaque na disciplina, fato percebido na fala do entrevistado 3: “Não trato o lazer como conteúdo, pois o mesmo é encarado como uma conseqüência das atividades propostas.” Outros dois entrevistados mencionaram que não trabalham o lazer em suas aulas.
Diante das falas, percebemos que os professores pouco utilizam o lazer em suas aulas. Apesar de entenderem seu significado e sua importância no âmbito educacional, não o utilizam como deveria , falta uma maior aplicabilidade e interesse dos profissionais em fazer de suas aulas um espaço para que ele aconteça. Entender o lazer como um momento privilegiado da educação é um passo importante para isso. Para Marcelino (1990), uma escola cidadã precisa acolher e compreender o lazer como “veículo e como objeto da educação” e ver o lazer com lentes críticas e lúdicas. Trata-se de um posicionamento baseado em duas constatações: a primeira de que o lazer é um veículo privilegiado de educação; e a segunda de que, para a prática qualitativa das atividades de lazer, é necessário considerá-la como espaço de aprendizado, de estímulo, de iniciação que possibilita a passagem de níveis menos elaborados, simples, para níveis mais elaborados, complexos, com o enriquecimento do espírito crítico, na prática ou na observação da cultura corporal.
Tabela 4. Importância da formação para o lazer.
Categorias |
Subcategorias |
Características |
Formação do professor (2) |
Segurança, mais embasamento. |
Maior participação das atividades. |
Formação do aluno (2) |
Compreender o real sentido. |
Direito ao lazer. |
Desenvolvimento pessoal. |
Fonte: Elaboração do autor, 2013
A análise da importância da formação para o lazer mostra um duplo sentido na fala dos entrevistados quando dois deles mencionam a importância da formação do professor, ou seja, a qualificação profissional para se trabalhar com o tema, pois entendem que só a partir dela é que o profissional terá subsídios, ou seja, uma maior segurança para trabalhar com os alunos conforme aponta o entrevistado 2: “Tendo formação, o professor tem segurança do conteúdo, traçando estratégias para uma maior participação das atividades.” Nesse sentido, será possível um enfoque no campo sociocultural.
O lazer precisa ser compreendido na perspectiva crítico-criativa – entendê-lo como gerado historicamente, e dele podendo emergir, de modo dialético, valores questionadores da sociedade como um todo, e sobre ele também sendo exercidas influenciais da estrutura social vigente. (MARCELLINO, 2008, p.12).
A formação profissional é importante em qualquer área, principalmente na Educação Física, uma disciplina que por muito tempo vem lutando para ser melhor reconhecida pela sociedade.
Desta forma, podemos analisar a importância da formação profissional observando proposta destacada por Werneck (2000), que busca:
(..) sujeitos comprometidos com o processo de construção do saber, sujeitos que questionem a realidade, que perguntem pelo sentido de seu exercício profissional, que assumam uma atitude reflexiva face aos processos sociais e às contradições do nosso meio, fazendo do lazer não um mero (e alienante) produto a ser consumido, mas uma possibilidade lúdica, crítica, criativa e significativa a ser vivenciada com autonomia e muita responsabilidade. WERNECK (2000, p. 144)
Em outra menção, 2 dos entrevistados consideram a importância da formação do aluno, uma conscientização crítica de realidade, sujeitos que a partir de suas vivências escolares sejam capazes de questionar seus direitos reivindicando quando for preciso e sabendo usá-los da melhor forma possível.
O lazer é um direito que precisa ser adquirido e nada melhor que o profissional capacitado para esse fim. Cabe a cada cidadão ter a devida consciência e aproveitá-lo bem. Fato esse que foi percebido na fala do entrevistado 2: “conhecer qual é o real sentido do lazer para puder buscar o direito de tê-lo”. O lazer é uma conquista da dimensão humana em tempos em que a jornada de trabalho se torna cansativa diante de vários fatores presentes na sociedade. Para Bramante (1998), “é uma dimensão privilegiada da expressão humana dentro de um tempo conquistado, materializado através de uma experiência pessoal e criativa de prazer e que não se repete no tempo/espaço, cujo eixo principal é a ludicidade...”.
4. Considerações finais
Diante dos estudos realizados sobre o entendimento dos professores de Educação Física acerca do lazer, podemos afirmar que se trata de uma área bastante necessitada. Faltam recursos materiais e financeiros, boa vontade por parte de alguns profissionais e do poder público em destinar suas verbas para esse fim.
A prática regular de atividades físicas e de lazer constitui um dos fatores indispensáveis para o indivíduo conservar corpo e mentes saudáveis, aumentar o potencial criativo e produtivo, melhorando assim, sua qualidade de vida. As atividades desenvolvidas nas aulas de Educação Física têm como finalidade permitir a todos os educandos a prática do lazer através da diversidade cultural existente, visando adquirir uma boa qualidade de vida, além de contribuir para a inclusão social. Lazer é um direito dos cidadãos e é um pré-requisito fundamental para uma vida saudável. Para grande parte das crianças e adolescentes o lazer é uma conquista, mas no Brasil os adultos muitas vezes se esquecem desta parte importante da vida e dedicam-se demais as atividades produtivas, onde o trabalho, a realização ou a superposição de atividades remuneradas se tornam uma necessidade e vem em primeiro lugar.
Os dados apontam que a grande maioria dos professores não desenvolve o lazer em suas aulas, justificando a falta de recursos e uma estrutura física precária, além do poder público que nada faz para esse fim. Percebe-se uma falta de interesse por parte dos profissionais em desenvolver atividades pensando nesse enfoque. O lazer precisa ser encarado como possibilidade de resgate cultural, um resgate da cultura do movimento. As atividades socioculturais precisam ser democratizadas para que sirvam de amparo aos vários setores da sociedade. É comum ouvir a todo instante nas mais variadas esferas da população que os cidadãos são livres com diversos direitos e deveres instituídos para a manutenção e bom andamento da sociedade, porém é comum perceber que só os deveres são cobrados e dificilmente os direitos são conseguidos. Talvez isso aconteça pelo processo educacional que não considera efetivamente alguns espaços alternativos para o processo educativo do ser, como a cultura, por exemplo, que ao longo dos anos vem sendo esquecida e deixada de lado, na sua relação com o lazer, esquecendo o seu potencial social e formador.
Dessa forma, acredita-se que mudanças são possíveis, as articulações em torno dessa temática numa discussão mais aprofundada e o lazer sob o prisma do seu duplo aspecto educativo: o paradigma da educação pelo e para o lazer, sendo assim possível pelo campo cultural, assumindo papel transformador nas mais diversas esferas sociais. A escola assume uma importante função nessa transformação. Os profissionais da educação são capazes de inovar e resgatar atividades tidas como antigas e introduzi-las em suas aulas através de movimentos artísticos e corporais, possibilitando um lazer lúdico e educativo. Portanto, para esse trabalho é necessário que as pessoas e órgãos responsáveis possam distribuir suas funções, articulando idéias e distribuindo os recursos de maneira igualitária visando o lazer pelo prazer, o lazer pela cultura.
É importante destacar que as políticas públicas precisam ocorrer em conjunto nas esferas municipal, estadual e federal, e de forma independente de filiações partidárias. Além disso, é necessário que ocorra um maior incentivo à participação das pessoas em eventos culturais nas diversas esferas da sociedade. Elas, então, devem ser construídas e implantadas de maneira participativa e reivindicatória, de forma a possibilitar a superação da visão fragmentada do lazer, possibilitando sua inserção na sociedade.
Portanto, acreditamos que essa pesquisa não finaliza com os fatos aqui levantados, pois a partir dessa teremos uma nova visão acerca do lazer na Educação Física escolar e das políticas públicas para esse fim. Assim, pretendemos aprofundar o assunto em questão, construindo novos olhares a esse respeito.
Referências
BALSEIRO, J. F. Vivência do Idoso Institucionalizado. Universidade Fernando Pessoa, Faculdade de Ciências da Saúde. PORTO: 2011.
BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo. 3 ed. Lisboa: edições, 2004.
BRAMANTE, Antônio Carlos. Lazer: Concepções e significados. Licere, Belo Horizonte, v.14, n.1, p. 9-17, 1998.
GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2010.
MARCELINO, Nelson Carvalho. Lazer e Educação. 2ª edição, Campinas/SP: Papirus, 1990.
MARCELLINO. N. C. (Org.). Lazer e Sociedade: Múltiplas relações. Campinas/SP: Alínea: p. 11-26, 2008.
MARCELLINO, Nelson Carvalho. Política pública de lazer. Campinas, SP: Editora Alínea, 2008. (coleção estudos de lazer)
PINTO, Leila Mirtes santos de Magalhães. Formação de educadores e educadoras para o lazer: Saberes e competências. Rev. Bras. Cienc. Esporte, v.22, n.3, p.53-71, Maio 2001.
PINTO, Leila Mirtes Santos de Magalhães. Lazer concepções e significados: Licere, Belo Horizonte. V.1, n.1, p. 18-27, 1998.
PINTO, Leila Mirtes de Magalhães. Políticas públicas de Esporte e lazer: caminhos participativos. Revista Motrivivência. Ano 10, n°. 11. Editora da UFSC. Set. 1998.
RICHARDSON, Roberto Jarry et al. Pesquisa social: métodos e técnicas. 13. Reimpr. São Paulo: Atlas, 2011.
WERNECK, Cristiane L.G. Lazer, trabalho e educação: relações históricas, questões contemporâneas. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2000.
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