História da Dança de Salão no
Brasil: século XVIII Historia del Baile de Salón en Brasil: el siglo XVIII y algunos antecedentes |
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Mestre em Ciências Biológicas, UFPR Especialista em Educação, IBPEX Licenciada em Ciências Biológicas, UFPR |
Maristela Zamoner (Brasil) |
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Resumo A literatura não apresenta dados compilados que nos permitam perceber aspectos da história da Dança de Salão no Brasil durante o século XVIII. Este artigo traz alguns fragmentos sobre os contextos das Danças de Bailes extraídos de diversos documentos que permitem a percepção de que neste século havia considerável florescimento cultural, vida social ativa, prática de danças como Minuetos, Contradanças e Valsas. Tendo em vista a natureza destas danças, integrantes da educação de uma elite, seu ensino foi percebido sendo realizado por profissionais que atuavam também em outras áreas como letras, teatro e música. Reconheceram-se, nesta pesquisa, cinco nomes de profissionais que trabalharam produzindo, regendo, ensaiando ou ensinando danças que no século XVIII eram típicas de prática social. Identificou-se o nome de Francisco Mexia, um mulato, profissional que atuava em Minas Gerais e foi contratado em 1751 para produção de Contradanças. Foram identificados também quatro nomes de profissionais, alguns citados textualmente como professores que “regiam” e “ensaiavam” danças como Minuetos e Contradanças em 1790 no Mato Grosso: Joaquim Marianno da Costa, José Duarte do Rego, José Zeferino Monteiro de Mendonça e Francisco Dias Paes, este último, registrado textualmente como “mestre da dança”. Unitermos: Dança de Salão. História. Brasil. Século XVIII. Mestres. Professores.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 184, Septiembre de 2013. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
Atualmente, entende-se que a Dança Erudita (que inclui Minuetos e Gavotas) e a Dança de Salão (iniciada pela Valsa, surgida no século XVIII) entre outras, enquadram-se como Danças de Baile, conforme conceituação proposta por Zamoner (2012; 2013). Para o conhecimento histórico da Dança de Salão, é relevante estudar seu contexto de surgimento, como parte das Danças de Baile do século XVIII.
São escassas as fontes bibliográficas sobre acontecimentos históricos brasileiros relacionados à prática de Danças de Baile no século XVIII. Em geral, estas informações estão dispersas em diversos documentos que tem como foco outros assuntos. Por exemplo, viajantes que vieram ao Brasil colonial escreveram sobre suas observações e entre elas foram descritas brevemente experiências em bailes e saraus (Perez, 2008), compondo parte dos registros preciosos sobre estas práticas.
Objetiva-se neste artigo mostrar diversos fragmentos de várias localidades brasileiras, mostrando a existência das Danças de Bailes no século XVIII e, em determinados casos, referências que permitem a percepção de seu ensino. A identificação de professores de dança em determinada localidade e tempo é importante para o estudo histórico porque pode servir como índice de quanto se dançava (Ellmerich, 1987), portanto, o reconhecimento de nomes destes profissionais também é almejado neste trabalho.
Objetiva-se ainda revelar quais eram as principais Danças de Bailes praticadas, suas características e históricos bem como o contexto da produção de documentos impressos nesta época.
Danças de Baile pelo Brasil do século XVIII, breves apreciações
Relevante é o fato que até mesmo os livros didáticos da Educação Básica se referem à vida da nobreza em Salvador, na Bahia, antiga capital brasileira até 1763. Da mesma forma, são bem conhecidos florescimentos culturais no século XVIII, por exemplo, em Minas Gerais e Mato Grosso, devido à busca por ouro. Mato Grosso ainda desempenhava papel importante de vigilância dos limites do território para impedir a entrada de espanhóis, o que favoreceu a criação da Capitania de Cuiabá em 1748. Estes dados amplamente conhecidos mostram que a nobreza existia no país, aos modos portugueses, dos quais faziam parte os bailes.
Viajantes vindos ao Brasil em séculos passados escreveram sobre suas observações que incluíam experiências em bailes e saraus, compondo parte dos registros preciosos sobre estas práticas (Perez, 2008). Registros mais específicos referenciam danças praticadas no Brasil no século XVIII, conhecidas por serem aprendidas como parte da educação de nobres.
Na seqüência são apresentados alguns exemplos destas atividades ao longo do território brasileiro.
Maranhão
Em referência ao Maranhão há um relato na Gazeta de Lisboa de 1786 que se atem aos festejos pelo casamento dos infantes de Portugal e Espanha, registrando ser possível duvidar que se estivesse na América, de tanto bom gosto como o que havia na Corte. Na Corte portuguesa desta época, por sua vez, a prática de Minuetos e Contradanças era bem conhecida (Zamith, 2011).
Rio Grande do Sul
Polese et al (2009) relatam que no início da formação de Rio Pardo, entre 1754 e 1776 as atividades eram essencialmente bélicas, mas, a localidade já congregava a elite militar do Rio Grande do Sul, naturalmente, acompanhada de suas famílias ilustres, constituindo o que se chamou de “Berço da nobreza gaúcha”. Segundo os autores, foi a partir de 1777 que a paz com os castelhanos favoreceu um surto de desenvolvimento no local. Foram criadas novas estâncias e povoados a oeste e sul da, então, capitania de São Pedro. Seguindo a esta explanação sobre o surto de desenvolvimento local no século XVIII, os autores revelam detalhes da vida social, abordando saraus familiares animados com, entre outras danças, Minuete, Gavota e a Contradança, que mais tarde teria sido substituída pelas quadrilhas.
Rio de Janeiro
O romance histórico “As mulheres de Mantilha”, de Joaquim Manoel de Macedo, ambientado no século XVIII, faz menção a Contradanças e Minuetos ensaiados antes das cantatas dos vice-reis.
Consta, em uma obra dedicada ao tempo dos Vice-Reis do Brasil, especificamente a prática dos Minuetos francês e português na cidade do Rio de Janeiro, no ano de 1773 (Edmundo, 2000).
Cardoso (2011), a partir de estudos em documentos escritos no século XVIII também cita a prática de se dançar Minueto em 1773 no Rio de Janeiro, durante um concerto e um baile realizados em uma residência particular de pessoas mais abastadas. Outros relatos do autor revelam diferentes momentos em que ocorriam bailes com danças em casas particulares citando a prática de Contradanças. O autor reforça que nesta época havia muitos instrumentos disponíveis, até mesmo os mais difíceis de se obter como o cravo, o que facilitava o costume de se realizar bailes particulares.
Bahia
Sobre a Bahia, notam-se relatos de bailes nas salas do Paço dos Governadores e Vice-Reis a exemplo da comemoração do casamento dos príncipes de Portugal e Espanha em 1729, quando a literatura menciona a prática de Contradanças (Pinho, 1970). Conde e Massimi (2008) referem-se a pratica de Minuetos e Contradanças na Bahia durante o século XVIII. Amaral (1998) cita relatos de 1762 em que se escreveu sobre as Contradanças praticadas nas festas realizadas em Santo Amaro. Acayaba et al (2001) citam “Narrativas de uma viagem ao Brasil” de Thomas Lindley, onde encontra-se o Minueto como dança praticada nos círculos mais elevados de Salvador em 1802.
Santa Catarina
Sobre a Capitania de Santa Catarina há um texto relevante de Brito (1829) que descreve as mulheres mais nobres ou mais polidas como:
Civilizadas são dotadas de muita urbanidade, de maneiras dóceis, e meigas; são inclinadas aos divertimentos, sabem cantar, tocar algum instrumento de cordas, e dançar, e não se observa nelas aquella bizonhice, que se encontra nas mulheres de outras Capitanias do Brasil.
A seqüência do texto cita a data de 1797 em que o Governador João Alberto de Miranda Ribeiro teria dado um baile, com atuação de uma “numerosa orquestra”, no qual se dançaram Minuetes, Contradanças e Valsas. Este dado nos revela que já no século XVIII havia prática da primeira Dança de Salão no Brasil, a Valsa.
São Paulo
As danças na cidade de São Paulo são relatadas em períodos anteriores ao século XVIII. Um exemplo é do historiador Afonso de E. Taunay, citado por Ellmerich (1987), no qual são referidos bailes de noite e de dia em 1623.
Claudia Aparecida Polastre escreve em 2008 a tese “A música na cidade de São Paulo, 1765-1822” que chama a atenção em particular. A autora cita diversos momentos que apontam a prática de Minuetos e Contradanças em São Paulo no século XVIII e, em um dos primeiros deles mostra-se intrigada pela dúvida sobre quem os teria composto, argumentando que se tratava de uma dança muito usada em Portugal. Uma de suas referências cita o ano de 1768 em que o teatro é emprestado aos mulatos pelo governador e então registra terem sido dançados Minuetos (referidos como danças de corte) e Contradanças. Estes dois tipos de danças são referidos novamente pela autora, citando o ano de 1790 quando foram praticados após espetáculos realizados no teatro.
Minas Gerais
Minas Gerais foi o centro econômico brasileiro no século XVIII devido ao auge da mineração. Para Leoni (2007), no século XVIII, Minas Gerais salientou-se dentre os núcleos urbanos, tendo Vila Rica, destacadamente, como centro minerador de importância econômica e estratégica. Para o autor, esta condição provocou uma “ebulição social” que, entre outros desenvolvimentos, levou a localidade, que era o centro da América portuguesa, a ser um referencial da atividade musical. Entretanto, o autor cita que Sílvio Romero admitia uma lacuna no conhecimento sobre as Artes neste período que não deixara documentos impressos, considerando que parte desta produção poderia ser recuperada em arquivos particulares.
Lange (1946, 1969), cujos estudos se concentram mais ou menos no mesmo período e local, faz uma ponte entre música da dança sustentando que estes dois campos de investigação podem se complementar. Neste sentido, Leoni (2007) aborda registros sobre os ofícios de construtores de instrumentos como “saltérios, flautas, clarinetas, fagotes, rabecas, descantes, violas e até órgãos de tubos sediados em Vila Rica” e também revela que era proibido aos músicos tocarem gratuitamente em igrejas, oratórios, ruas públicas e casas particulares, estando sujeitos a multas. Este relato mostra profissionalização em atividades artísticas. O autor ainda faz referência a Minuetos tocados por militares. Seus textos mostram também que músicos atuavam em casas particulares e sabe-se que nesta época eram comuns os saraus e bailes em residências privadas, que, naturalmente, precisavam do trabalho dos músicos.
Figueiredo (1998) faz referência ao hábito de mineiros em práticas envolvendo músicas, banquetes, bailes e saraus no ano de 1747. É possível que danças como as Contradanças e os Minuetos, praticados socialmente em bailes e saraus, tenham sido mantidas por mestres de dança ao longo dos anos. Por isto, não deve surpreender o número 143 do periódico “O Farol Paulistano”, datado de 30 de agosto de 1828 que traz a referência a uma senhora que ensinaria danças, porém, na Vila de São João d'El-Rei, em Ouro Preto, Minas Gerais, onde o jornal também circulava.
Brescia e Lino (2013) relatam, com base em arquivos públicos de Minas Gerais, que em Vila Rica teria ocorrido do profissional Francisco Mexia ser pago pelas músicas e Contradanças que apresentara na organização teatral “Te Deum Laudamos” em 1752. Budasz (2008) apresenta o texto do ajuste assinado por Francisco Mexia em 14 de abril de 1751:
Digo eu Francisco Mexia que eu ajustei com o procurador do Senado o senhor José Correia Maia procurador do Senado na presença do mesmo Senado a Música para a função da coroação Del Rei o senhor Dom José que Deus guarde o primeiro para o Te Deum Laudamos (...) serei obrigado nos 3 dias festivos por na rua contradanças na melhor forma que puder...
Um dado bastante relevante sobre Francisco Mexia é que, segundo Budasz (2008), era mulato, o que sugere fortemente ser um brasileiro descendente de escravos, trabalhando profissionalmente com dança em plena vigência da escravidão. Também é relevante o fato de que foi habitual professores de Danças de Baile realizarem apresentações cênicas destas danças. Nesta época, parecia ainda ser comum homens fazerem papel de damas.
Mato Grosso
Gomes (2010) refere-se a banquetes promovidos em Vila Bela, no Mato Grosso, desde 1760, como parte das estratégias de controle das fronteiras da América portuguesa. Segundo a autora, a principal razão do estabelecimento da capitania de Mato Grosso, que se deu no ano de 1748, era proteger Goiás e Minas Gerais da entrada de espanhóis. E uma das importantes estratégias adotadas, foi a diplomacia, que era exercida pelas práticas de banquetes, muitos dos quais incluíam bailes. Silva (2008) relata que se realizavam saraus no palácio de Luís de Albuquerque, governador da Capitania do Mato Grosso entre 1772 e 1788, com a prática de Minuetos e Contradanças. Piza (1899) cita a prática de Contradanças e Minuetos, entre outras danças, no aniversário de Juiz de Fora comemorado na Praça Real da Vila do Cuiaba em 1790. O ano de 1796 é referenciado por Siqueira (2002) que descreve a ocorrência da recepção do novo capitão-general em Cuiabá, durante festividades com bailes de Contradanças.
Suzuki (2007) referencia documentos nos quais consta o ano de 1794, quando o professor Joaquim Marianno da Costa teria apresentado Contradanças que ele próprio teria preparado e dirigido, citando ainda outras apresentações destas danças feitas pelo professor José Zeferino. A fonte original desta informação é encontrada na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, do ano de 1850, sob autoria de Joaquim da Costa Siqueira, cujo texto exato é:
Foram continuando as funcções profanas com muito aceio, sahindo em duas tardes o professor Joaquim Marianno da Costa com duas danças que preparou e dirigiu, uma com farça de pássaros, e outra com a farça de macacos, e o professor José Zeferino com três contradanças em tres differentes tardes.
Sobre este período Alamino (2006) considera que as formas musicais deste momento incluem mais de uma orquestra de baile que se alternavam na mesma festa, seguindo noite a dentro.
Piza (1898-1899), traz um relato explícito do ensino de Minuetes e Contradanças que teria sido feito por José Duarte do Rego, referente ao ano de 1790:
À exceção de dois ou três que já tinham entrado nas primeiras contradanças, todos os demais nada sabiam e eram caixeiros de lojas, ou pequenos negociantes ou traficantes. Quem promoveu esta dança ou contradança (de ambas as coisas participava) foi José Duarte do Rego, que a ofereceu.
...
Uma parte da dança era com passos de minuete, a outra era uma contradança comprida, bem sabida e trabalhosa pelos pulos ou quartos que faziam.
O autor, curiosamente, refere-se a José Zeferino Monteiro de Mendonça como professor regente de Contradanças neste mesmo ano de 1790, sendo posteriormente citado por Budasz (2008) que, ainda especificamente sobre o dia 23 de agosto deste ano registra:
À noite foi tempestuosa e serviu para refrigerar o ardor da estação. O mestre da dança foi Francisco Dias Paes.
Estes relatos permitem entender que Joaquim Marianno da Costa, José Duarte do Rego, José Zeferino Monteiro de Mendonça e Francisco Dias Paes eram professores que ensinavam danças como Minuetes e Contradanças em Cuiabá, no Mato Grosso, em 1790. Segundo os relatos, embora fossem danças de corte, este ensino não se reduzia aos nobres.
Contradanças, Minuetos e Valsas, prática e ensino
Segundo Budasz (2006), discorrendo sobre o século XVIII, as principais coreografias dos salões brasileiros das classes dominantes eram o Minuete e a Contradança trazidas da Europa, a exemplo de muitos costumes da época. Esta informação é condizente com Monteiro (2002).
Para Salazar (1962), no século XVIII a dança era mais que um reflexo da etiqueta de corte, era ainda um elemento constituinte da educação da nobreza que deveria ter a função de estabelecer uma distinção social. Para o autor, a hierarquia social da corte é construída e atualizada nos salões sendo que a dança é exercício de uma conduta cortesã que por sua vez é exercida nos bailes. No século XVIII as danças eram ensinadas por mestres que chegavam a trocar informações entre si pelo uso de uma notação coreográfica escrita, o que incluía movimentos coreográficos de Contradanças e Minuetos (Monteiro, 1998).
Aranha (2010) disserta a respeito da influência cultural francesa sobre os costumes portugueses, considerando que a dança era uma forma de conhecimento que tinha papel central na formação dos nobres portugueses, até mesmo como parte do aprendizado da civilidade cortesã. Por esta razão, no século XVIII Lisboa e a cidade do Porto começaram a receber mestres de dança da França e de outras localidades européias, desempenhando funções na corte e oferecendo aulas pela cidade. Neste âmbito a autora cita a prática dos Minuetos e Contradanças como símbolos da corte e comenta que estas danças eram ensinadas.
Considerando o contexto português ao longo do século XVIII, no que diz respeito à prática e ao ensino das Danças de Baile como Minuetos e Contradanças, considerando ainda que o Brasil como colônia, recebia forte influência portuguesa e abrigava nobres em diversas localidades, é razoável considerar a existência de mestres de dança no país. Afinal, há registro da prática de danças ensinadas ao longo do século XVIII na colônia, nomes de professores que as regiam/ensaiavam e até um nome referido especificamente como “mestre da dança”. Desta forma, é prudente sopesar a possibilidade da existência de professores de Danças de Baile no Brasil, no mínimo, a partir do século XVIII e talvez até, vindos da Europa para atender aos nobres.
Como visto, as práticas mais freqüentes nos relatos apresentados que abordam Danças de Baile no Brasil no século XVIII são as Contradanças e os Minuetos. Caso somente as Contradanças fossem citadas, poder-se-ia até supor que a função do seu ensino fosse substituída apenas por sua regência. Entretanto, Minuetos e Contradanças, conforme os costumes portugueses, eram ensinados. Também se constatou pela literatura que no século XVIII havia prática de Valsa, a primeira Dança de Salão. Desta forma, são propostas pontuações sobre estas três danças: Contradanças, Minuetos e Valsa.
Contradanças
Zamith (2011) faz uma abordagem bem consistente sobre as Contradanças, trazida aqui de forma resumida. A autora lembra que o termo “contradança” é derivado de country dance, uma expressão que foi utilizada para designar várias danças praticadas em ambientes rurais da Inglaterra durante muitos séculos. Em Paris a expressão country dance teria se transformado em contre-danse e em seguida na corruptela contredanse. A disseminação desta dança a partir dos salões franceses levaria à contradanza na Espanha e Itália, contredanse na Holanda, contratanz e kontretanz na Alemanha e Áustria, contradança em Portugal e, finalmente, Brasil.
A Contradanças são grupais, realizadas por pares que formam círculos e filas entre outras figuras. Zamith (2011) aborda o fato de ter ocorrido o surgimento de quase mil variações destas danças entre o século XVII e XVIII. Algumas características relevantes são abordadas pela autora. Por exemplo, a interação social, tanto nos espaços rurais quanto cortesãos, era mais importante que a execução precisa da coreografia. Esta característica teria facilitado sua popularização, permitindo inclusive diferentes classes sociais desfrutarem dela na mesma dança. A autora deixa bem claro que para se dançar country dance não havia a necessidade de aprendizado, de educação cortesã, mas, somente “ação conjunta”. Isto nos mostra que sua prática não exigia aprendizado prévio, portanto, poderia ser praticada sem o trabalho de um profissional de seu ensino. Entretanto, no século XVIII o sucesso das Contradanças em Portugal chegou aos livros que pretendiam ensiná-las aos letrados da época. Mesmo assim, a autora considera que na metade do século XVIII, embora fossem praticadas em grandes festas, eram suplantadas pelo Minueto. Aranha (2010) reforça que as Contradanças eram tão populares que foram coreografadas e dançadas até o início do século XIX, período a partir do qual teriam dado origem às quadrilhas.
Minuetos
Minueto, Minuete, Minuet, Menuet, Menuett, Menuetto são nomes encontrados na literatura para designar a mesma dança. Acayaba et al (2001) registram que Minuete é uma dança francesa originária de Poitou, uma província francesa. Segundo Shapiro (1991), embora esta seja uma idéia polêmica, é conhecido um documento de 1589, que se refere a uma dança folclórica de tempo triplo, de nome Branle de Poitou, com muitos aspectos em comum com o Minueto, o que seria reafirmado em 1725 por Pierre Rameau, mestre de dança autor de “Le Maitre a danser”. A autora admite que outros pesquisadores discordam desta tese. Little (2001) considera que a origem do nome também é polêmica, pode referir-se a natureza dos passos utilizados nesta dança, pequenos, curtos, ou pode ter derivado da ação de conduzir danças populares de grupo praticadas no início do século XVII na França. Shapiro (1991) registra que não há polêmica sobre a popularidade que o Minueto ganhou desde a corte de Luis XIV, principalmente a partir de 1664.
Valsa
A Valsa, para alguns autores, também tem sua origem envolta em diferentes teorias. Barbeitas (1995) considera que as divergências se devem a geografia que possibilita origem francesa, alemã, austríaca ou suíça e também a algumas características da dança que a originou. Reis (2010) traz um bom trabalho de revisão onde apresenta teorias de estudiosos brasileiros e estrangeiros. Seus resultados trazem apontamentos distintos conforme segue.
Maurício Murst não acredita em uma origem alemã devido a afirmação de que a Valsa seria conhecida na Provença (Itália), no século XII, sendo chamada de Volta e tendo originado a Walzer germânica;
Renato Almeida atribui a Valsa uma origem francesa no século XVI, reconhecendo que já seria praticada em meios urbanos austríacos no século XVIII;
Mariza Lira coloca a Volta provençal como originadora da Valsa na França e posteriormente Walzer na Alemanha que teria advindo de uma dança de roda chamada Drehtanz;
João Batista Siqueira admite a dificuldade de uma conclusão definitiva, mas, entende que a Valsa tem origem alemã, derivando da Walzer que por sua vez teve origem na dança alemã rústica de nome Landler, de Landel, distrito do Vale do Reno;
Andeli de Paola aponta que a Valsa é alemã, derivada do Landler, chegada à França ao final do século XVIII e à Inglaterra no início do século XIX;
Bruno Kiefer admite o surgimento da Valsa nas regiões alpinas austríacas, vinda especialmente do Landler, muito embora reconheça que suas origens são obscuras;
Luis Ellmerich atribui o surgimento da Valsa a partir do Minueto sob influência da Deutscher Tanz e pelo Landler;
Enrico Pichetti sustenta que para os alemães a Valsa é originária do Langaus, sendo sua origem suíça;
Andrew Lamb considera que não há evidências de relação entre a Volta do século XI e a Walzen do século XVIII;
Joseph Wechsberg aponta que a origem da Valsa estaria em uma dança rústica inglesa, o Landler, e na dança da Bavária praticada no século XIV, chamada Teutsche. Descarta as relações entre a Valsa e o Minueto, como também entre a Valsa e a Volta.
Garcia e Has (2003) entendem que a Valsa é derivada de danças populares conhecidas pelos nomes de Alemandas e Lander, esta última, praticada na Baviera e Boemia.
Boyle (2011) cita Montaigne, filósofo francês que teria escrito sobre uma dança que vira em 1580 em Augsburg, na qual dançarinos abraçavam-se tão próximos ao ponto dos rostos colarem. A autora cita que por volta de 1750 camponeses da Baviera, Tirol e Styria dançavam Walzer, uma dança para casais, período durante o qual a nobreza praticava o Minueto. Zamoner (2012) reforça a possibilidade de nobres entediados com o Minueto participarem de festas populares, conhecendo a Walzer. Para a autora, isto teria provocado a passagem da Walzer para os salões aristocráticos com alterações técnicas que tornaram os passos largos e selvagens em movimentos curtos, elegantes e com maior distanciamento entre o casal, levando a Valsa a se estabelecer como moda nos salões a partir de 1780. O papel dos mestres de dança neste processo não passou por esclarecimentos históricos suficientes para que possa ser entendido de forma definitiva. De qualquer forma, a Valsa parece ter chegado ao Brasil por mais de uma via, em diferentes momentos e circunstâncias.
Documentações da imprensa do século XVIII
Com a digitalização e disponibilização de documentos antigos e as descobertas de fontes que remontam ao século XVIII, é possível que se identifique com mais profundidade a atividade de ensino de Danças de Baile neste período.
Assim, é relevante lembrar ainda que houve, antes da imprensa oficial brasileira, várias atividades de publicação de periódicos e materiais. Algumas delas, notadamente em localidades como Pernambuco, Bahia, Minas Gerais, Paraná e Rio de Janeiro, em certos casos, remontando pelo menos ao século XVII (Pereira, 1960; Gonsalves, 1997; Sodré, 1999; Lopes, 2003; Gomes, 2007). Estes e outros documentos, podendo conter informações relevantes sobre os hábitos brasileiros em relação às Danças de Baile desta época, ainda não estão suficientemente recuperados, portanto, o avanço nesta área pode trazer novas informações nos próximos anos.
Conclusões
Nota-se que a prática das Danças de Baile no século XVIII ocorria em diversos pontos do Brasil e demandava seu ensino, por sua natureza e pelo que se pode entender a partir de parte das fontes consultadas.
Neste contexto e conforme os métodos utilizados nesta pesquisa é importante atentar para as referências feitas a cinco nomes de profissionais, alguns citados textualmente como professores que “regiam” e “ensaiavam” danças como Minuetos e Contradanças: No ano de 1751, em Minas Gerais, Francisco Mexia e em 1790, no Mato Grosso, Joaquim Marianno da Costa, José Duarte do Rego, José Zeferino Monteiro de Mendonça e Francisco Dias Paes, este último, citado explicitamente como “mestre da dança”.
A recuperação e disponibilização pública futura de documentos mais antigos e o acesso a impressos produzidos no país antes de se instalar a imprensa oficialmente, podem trazer mais esclarecimentos sobre a prática e o ensino das Danças de Baile no século XVIII e talvez até antes dele.
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Periódicos consultados
Gazeta de Lisboa. Número 4. Segundo suplemento. 24 de janeiro de 1786.
O Farol Paulistano. Número 143. 30 de agosto de 1828.
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