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Violência: questões ligadas a gênero e raça

Violencia: cuestiones ligadas al género y a la raza

Violence: a question of gender and race

 

*Enfermeira, Mestranda em Enfermagem. Salvador, BA

**Enfermeiro, Especialista em UTI Neonatal. Salvador, BA

***Enfermeira, Especialista em Saúde Coletiva. Salvador, BA

****Fisioterapeuta, Mestrando em Ciências da Saúde. Montes Claros, MG

(Brasil)

Ana Cleide Alves*

Josielson Costa da Silva**

Viviane Silva de Jesus***

Árlen Almeida Duarte de Sousa****

arlenduarte@gmail.com

 

 

 

 

Resumo

          Historicamente, o Brasil é marcado por uma grave problemática ligada às questões de gênero e raça; situação que provoca uma séria condição de desigualdade e exclusão. Toda forma de violência contribui para deterioração da condição humana e perpetuação da iniqüidade social. Mulheres negras representam um grupo que, constantemente, é confrontado com situações de violência física e psicológica. Este estudo objetiva, através de uma revisão de literatura, apontar questões cruciais relacionadas à violência quanto a gênero e raça.

          Unitermos: Violência. Gênero. Raça.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 183, Agosto de 2013. http://www.efdeportes.com

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“(...) ser negro não é uma condição dada, a priori.

É um vir-a-ser. Ser negro é tornar-se negro.”

(“Tornar-se negro” – Neusa Santos Souza)

Introdução

    A questão do étnico/cor está presente na sociedade brasileira, através da negação do negro em ser negro, onde é marcado enquanto pessoa pela sua diferença e não pela semelhança.

    A dificuldade de identificação da sociedade brasileira, de quem é o negro e qual a cor da pele pertence, gera um difícil processo de construção de identidade racial por parte dos negros e seus descendentes, pois é um fato que repercute em diversas instituições da sociedade e contribui para a perpetuação do racismo e da discriminação racial, tanto para homens quanto para mulheres (Gomes 1995).

    Sabe-se que no Brasil, durante quatro séculos, o que prevaleceu foi o sistema patriarcal, onde o homem detinha o poder sobre os bens, a família e a mulher. Às mulheres era reservada ao mundo particular e aos homens ao público. Deixando sempre a mulher exercendo a tarefa de casa e a procriação, sobretudo quando se trata da mulher negra onde suas condições históricas sempre foram sombrias, principalmente por sofrer o racismo, que é uma nítida manifestação social de violência, mas não de uma violência praticada gratuitamente, esporadicamente ou espontaneamente, mas sim, aquela que se faz de modo contido, orquestrado, possuindo seu próprio sistema e lógica que pratica rebaixamento moral e, finalmente, o extermínio físico daquele que é visto como portador e merecedor de ódio (FONSECA et AL, 1994).

    Para a socióloga Gonzalez (1982) a condição de ser mulher, negra e pobre, no Brasil, é sinônimo de tripla discriminação, já que os estereótipos gerados pelo sexismo e pelo racismo a colocam no mais baixo nível de opressão.

    Segundo Cruz et al (2004), o conceito de violência contra a mulher deve ser fundamentado na Convenção de Belém do Pará e diz respeito a qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause dano, morte, constrangimento, limitação, sofrimento físico, sexual, moral, psicológico, social, político, econômico. Assim um grupo de mulheres chamado de feministas começou uma luta contra a violência que acabaram construindo a categoria gênero, que envolve quatro dimensões: o aspecto relacional; as representações sociais do que é ser homem e ser mulher, a dimensão normativa que estabelece interpretações dos significados dos símbolos e, em último lugar, a identidade subjetiva (Scott, et al 1990).

    Segundo o Sistema Nacional de Agravos e Notificações (SINAN) de 2009/2010 no Brasil o número violência de qualquer tipologia sofrida por mulheres negras é de 45,3%, e de mulheres brancas é de 37,7%%, por isso o presente estudo tem objetivo de analisar, através da produção bibliográfica, a violência sofrida (experenciada/ vivenciada) por mulheres negras.

    O objetivo deste estudo é apresentar uma revisão de literatura acerca da violência relacionada às questões de gênero e raça.

Violência contra a mulher negra

    Com a segunda maior população negra fora da África, o Brasil é marcado pelo agravamento da desigualdade e oposição entre brancos (as) e pretos (as), mediante esse cenário, de tamanha desigualdade e problemática com a cor da pele, causando violências que são eternizadas, onde Ribeiro (2006) nos traz que, as mulheres negras foram secundarizada do tratamento vivido pela opressão, nos quais estiveram e estão submetidas ao sistema criado pela sociedade, onde historicamente, as reivindicações das mulheres brancas são refletidas de forma mais eficaz por ser parte de um processo natural, assim, nos faz retomar a um passado distante, no tempo colonial, onde é instituído o poder de sobreposição de uma raça a outra estabelecendo valores distintos entre os indivíduos.

    As análises dos artigos nos mostram que:

    “Nós, mulheres negras, fazemos parte de um contingente de mulheres, provavelmente majoritário, que nunca reconheceram em si mesmas esse mito, porque nunca fomos tratadas como frágeis. Fazemos parte de um contingente de mulheres que trabalharam durante séculos como escravas nas lavouras ou nas ruas, como vendedoras, quituteiras, prostitutas... (...). Fazemos parte de um contingente de mulheres com identidade de objeto. Ontem, a serviço de frágeis sinhazinhas e de senhores de engenho tarados. Hoje, empregadas domésticas de mulheres liberadas e dondocas, ou mulatas tipo exportação” (Carneiro, 2003: 2).

    Assim como Blaser et al (2010) nos traz:

    “Filha de pai negro e mãe branca... Cresci ouvindo minha mãe difamar meu pai e percebi que as mesmas ofensas se dirigiam a mim: “Preto não presta”, “Bem se vê que você é filha de preto”. Aquilo doía muito, não consegui entender tanta hostilidade. Muitas vezes minha mãe ria de mim, dizendo-me que eu era muito feia... Ela me batia e dizia que eu não prestava por ser preta”.

    Logo, o conceito de violência na mulher pode ser entendido como qualquer tipo de ação que provoque a ela dano ou sofrimento físico, sexual, psicológico, econômico. Segundo dados da ONU, até 7 em cada 10 mulheres no mundo serão espancadas, estupradas, abusadas ou mutiladas durante sua vida. Foi através de reivindicações e lutas que as mulheres conseguiram a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/06), promulgada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em agosto de 2006, onde, o Relatório Global do Fundo de Desenvolvimento da ONU para a Mulher (UNIFEM, 2009) classifica como uma das três leis mais avançadas no mundo para o enfrentamento da violência contra as mulheres.

    A violência compreendida por Chauí (1984, p. 35) é:

    [...] A violência perfeita é aquela que obtém a interiorização da vontade e da ação alheia pela vontade da parte dominada, de modo a fazer com que a perda da autonomia não seja percebida nem reconhecida, mas submersa numa heteronímia que não se perceba como tal.”

    Segundo Riscado (2010), a definição da violência física é aquela que provoca na vítima danos ao seu corpo, como chutes, pontapés, tapas, murros, beliscões, queimaduras, sufocamento, ferimentos, lesões corporais e agressão com armas.

    “Ninguém daqui sofre como eu. Meu marido bate em mim, nos filhos. Ele chega doido, quando bebe, sou chamada de tudo, as palavras dele são feroz, ele chuta eu, soca tapa na minha cara, Um dia Deus me ajuda e eu saio dessa vida. Eu trabalho na roça e cuido da casa, ele acha tudo pronto mais não dá valor, choro. Mesmo assim eu gosto dele, eu sofro, tenho dor no coração, na cabeça e não durmo direito. (Aqualtume, 38 anos)

    “Tava na rua ... parei para conversar com uma pessoa aí esse meu namorado veio, do nada me deu uma banda e caí no chão, quando eu levantei, ele me deu um tapa na cara, aí eu perguntei o que estava acontecendo, aí ele falou que não queria que eu conversasse com ninguém fui pra casa chorando”. (Nilza, 28 anos, mulher do grupo de assistidas do projeto Íyà Àgbá: Rede de Mulheres Negras Frente à Violência do Ilê Axé Bory Mesa)

    Dado o exposto nos artigos, a violência é entendida como forma cruel e perversa que contribui para o desonra da dignidade do ser da mulher, coisificando-a, que é construída sob a ótica do patriarcalismo, machismo e racismo, como uma forma nefária de controle e de poder impedindo a mulher de construir sua alteridade (Oliveira, 2006).

Violência e desigualdade de gênero

    A identidade de gênero forma-se a partir do sentimento e convicção que se tem de pertencer a um sexo, sendo, pois, uma construção social feita a partir do biológico. Neste processo, o sexo e os aspectos biológicos ganham significados sociais decorrentes das possibilidades físicas e sociais de homens e mulheres, demarcando suas características e espaços onde podem atuar. Portanto, são estabelecidas as desigualdades entre os sexos, sendo vistas como normais e fruto da “natureza” de cada um deles (BADINTER, 1993 apud PASSOS, 1999).

    A violência de gênero compõe se do social, cultural, econômico e político, a partir da concepção de que os seres humanos estão divididos entre machos e fêmeas. Historicamente, os machos estruturaram o poder patriarcal de dominação sobre as fêmeas.

    A discriminação racial agrava, portanto, o quadro da realidade das mulheres negras, tornando-as extremamente vulneráveis a qualquer tipo de violência e privações, com terríveis conseqüências para sua saúde física e mental.

    [...] “as pessoas do sexo feminino tornaram-se membros de um gênero subordinado, na medida em que, em uma sociedade é culturalmente determinada, pela posse de certas qualidades. E, o acesso a certos papéis vem percebido como naturalmente ligados somente a um sexo biológico, e não a outro. Esta conexão ideológica e não ‘natural’ (ontológica) entre os dois sexos condicionam a não repartição dos recursos e a posição vantajosa de um dos dois gêneros. No entanto, para que a mulher negra consiga ultrapassar as barreiras naturais da sociedade enquanto mulher terá ainda de vencer o racismo, o preconceito e a discriminação racial”. (Custódio, 2007)

    Segundo Silva (1992), as relações estabelecidas entre homens e mulheres são, quase sempre, de poder deles sobre elas, pois a ideologia dominante tem papel de difundir e reafirmar a supremacia masculina, em detrimento à correlata inferioridade feminina, constituindo um polo dominador na relação, onde é o papel que a sociedade impõe a ela, ocorrendo assim às manifestações de violência psicológica e física.

    Portanto, observa-se que ao longo da história social do Brasil a mulher negra enfrenta um luta ainda maior contra a discriminação, o preconceito racial e, sobretudo contra a conjugação desses à questão de gênero, pois, para ela as manifestações sociais do preceito gênero é duplamente suportado (LOURO, 1997) entende que:

    “É preciso demonstrar que não são propriamente as características sexuais, mas é a forma como essas características são representadas ou valorizadas, aquilo que se diz ou se pensa sobre elas que vai constituir, efetivamente, o que é feminino ou masculino em um dado momento histórico. Para que se compreenda o lugar e as relações de homens e mulheres numa sociedade importa observar não exatamente seus sexos, mas sim tudo o que socialmente se construiu sobre os sexos”.

    Talvez o grande desafio certamente seja reconhecer as diferenças de gênero existe e fazer com que os avanços através do diálogo desenvolvam estratégias para de integração dos indivíduos.

Conclusão

    As diferentes violências (físicas, emocionais simbólicas; de classe e de raça) a que estão sujeitas as mulheres, acentuam a situação de opressão e vulnerabilidade, em especial, a das mulheres negras. A pesquisa bibliográfica mostrou que violência foi construída a partir de um processo histórico, onde acomete mais principalmente a mulher, fazendo com que esta seja responsável pelo enfrentamento desse drama, muitas vezes vivido e intensificado no cotidiano. Diante disso, a vítima na maioria das vezes não encontra apoio e suporte familiar muito menos social, o que poderia ajudar para ser uma válvula propulsora da denúncia.

Referências

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