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Ensaios sobre a Teoria Social Cognitiva de Albert Bandura. 

Parte III: o conceito da autoeficácia docente e a 

motivação do professor de Educação Física

Ensayos sobre la Teoría Social Cognitiva de Albert Bandura. Parte III: el concepto 

de la autoeficacia docente y la motivación del profesor de Educación Física

 

Bacharel, Licenciado, Mestre e Doutor em Educação Física

pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)

Laboratório de Psicologia do Movimento Humano. Grupo de Estudos Psicopedagógicos

em Educação Motora (GEPEM/ FEF- Unicamp). Docente do Ensino Superior

nas Faculdades Metrocamp-Veris (Campinas-SP)

Docente da Faculdade de Educação Física

da Universidade Estadual de Campinas (FEF- Unicamp)

Laboratório de Psicologia do Movimento Humano. Grupo

de Estudos Psicopedagógicos em Educação Motora. GEPEM, FEF-Unicamp

Rubens Venditti Júnior

rubensjrv@yahoo.com

Pedro José Winterstein

winterstein@fef.unicamp.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          A idéia destes ensaios é oriunda dos estudos em Psicologia do Esporte, no período de pós-graduação (mestrado e doutoramento) pela Faculdade de Educação Física da Unicamp do primeiro autor, sob orientação do segundo autor deste texto. Este texto é o terceiro de uma trilogia que desenvolverá e permitirá expor nossos referenciais utilizados para os estudos sobre autoeficácia docente em Educação Física. Neste texto - após termos tratado do conceito da Autoeficácia e da Agência Humana no primeiro ensaio (Parte I – maio/2010); seguido das discussões a respeito da Modelação (aprendizagem vicariante), Capacidades Humanas Fundamentais, segundo Bandura (1986, 1991) e o Modelo da Reciprocidade Triádica (Parte II – junho/2010) - trataremos mais afundo sobre a Teoria da Autoeficácia aplicada à Motivação e atuação docente em Educação Física. A proposta dos ensaios é desenvolver uma série de textos derivados de estudos de pós-graduação, vinculados à teoria social cognitiva de Albert Bandura e o conceito de autoeficácia, apropriado para a nossa área de conhecimento, a Educação Física e Esportes. Com esse ensaio, finaliza-se e compartilha-se o referencial de estudos que balizou a trajetória de nossas pesquisas conjuntas e possibilitou-nos a compreensão de diversos mecanismos de autorregulação e motivação docente.

          Unitermos: Autoeficácia. Autoeficácia docente. Motivação. Motivação Docente. Educação Física. Albert Bandura.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 183, Agosto de 2013. http://www.efdeportes.com

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Ensaios sobre a Teoria Social Cognitiva de Albert Bandura. Parte I: conceito de auto-eficácia e agência humana, como referenciais para a área da Educação Física e Esportes
Ensaios sobre a Teoria Social Cognitiva de Albert Bandura. Parte II: reciprocidade triádica, modelação e capacidades humanas fundamentais

Apresentação

    A idéia destes ensaios é oriunda dos estudos em Psicologia do Esporte, no período de pós-graduação pela Faculdade de Educação Física da Unicamp, do primeiro autor, sob orientação do segundo autor deste texto. A proposta dos ensaios foi desenvolver uma série de textos derivados destes estudos, que embasaram esta etapa de nossas vidas: a teoria social cognitiva de Albert Bandura e o conceito de autoeficácia, apropriado para a nossa área de conhecimento: A Educação Física e Esportes. Este texto é o terceiro da trilogia proposta para a revista, que desenvolverá e permitirá expor nossos referenciais utilizados para os estudos sobre a autoeficácia docente em Educação Física. Neste ensaio, trataremos mais afundo sobre a aplicação do conceito da autoeficácia na docência em Educação Física e suas relações com a motivação do professor.

    A escolha desta pesquisa se deve ao nosso interesse pelos aspectos psicológicos que permeiam as atividades do campo da Educação Física (EF) e suas manifestações. Com base na Teoria Social Cognitiva (TSC) e no constructo da autoeficácia de Bandura (1997), podem-se vislumbrar possibilidades de compreensão e verificação dos mecanismos cognitivos subjetivos que interferem na atuação docente e no processo motivacional do profissional de Educação Física. Defendemos a importância e necessidade da melhoria da autoeficácia dos professores, através de práticas, vivências e experiências profissionais adaptadas ao público de atuação, desde o ambiente acadêmico e de formação profissional.

Introdução

    Agir, eis a inteligência verdadeira. Serei o que quiser. Mas tenho que querer o que for. O êxito está em ter êxito, e não em ter condições de êxito. Condições de palácio tem qualquer terra larga, mas onde estará o palácio se não o fizerem ali?

(Fernando Pessoa)

    A autoeficácia se caracteriza como a crença nas capacidades individuais de organizar e executar cursos de ação, necessários à realização de determinadas tarefas ou feitos dirigidos a uma meta (BANDURA, 1986). Engloba processos autoperceptivos e avaliativos, que relacionam fatores ambientais, pessoais e comportamentais. Estas correlações podem ser observadas tanto na tríade de determinismo recíproco da Teoria Social Cognitiva (TSC), como na proposta Teoria de Ação de Nitsch (1985), que norteia os estudos em motivação desta obra.

    Neste trabalho, a autoeficácia é aplicada na compreensão do controle interno das crenças e percepções que envolvem a prática docente em Educação Física (EF) e a motivação docente.

    Os resultados obtidos podem evidenciar as associações da autoeficácia com a questão motivacional do professor, através de sua satisfação pessoal e disposição para continuar na carreira docente, bem como os níveis de esforço e persistência.

    A pesquisa engloba a discussão teórica a respeito da autoeficácia no processo de motivação do professor de EF; bem como a compreensão das fontes que compõem esta autoeficácia docente.

    Buscou-se compreender e articular o constructo da autoeficácia com os componentes da Motivação e Motivação para a Realização (WINTERSTEIN, 1992; WINTERSTEIN e VENDITTI JR, 2008).

    Desde as pesquisas sistematizadas, até as situações cotidianas de atuação profissional, percebia-se como existe a influência das crenças individuais na atuação docente. Muitos colegas de profissão e formação apresentavam comportamentos distintos em situações de estágio e atuação profissional, quando se encontravam atuando em EF.

    Diversas situações sempre nos fizeram pensar na importância da motivação para a atuação em Educação Física (EF), bem como quais eram as habilidades e competências necessárias ao profissional de EF para atuar em diferentes contextos.

    Daí o interesse em buscar analisar a autoeficácia do professor, pois ela pode oferecer fatores para a compreensão da formação profissional. Além disso, também oferece a possibilidade preditiva de antecipar comportamentos no ambiente educacional mais que qualquer outra autocrença motivacional dos professores, permitindo antecipações de eventos e fenômenos inerentes à atuação no âmbito educacional (tais como persistência, motivação, comportamento e aderência em relação aos programas educacionais por parte dos professores). A importância de estudos sobre a aplicação da autoeficácia na atuação docente também adquire importância uma vez que existem indícios de que a autoeficácia docente se relaciona muito com a autoeficácia do aluno (PAJARES e SCHUNK, 1997).

    Com base na TSC, na concepção da Agência Humana e no constructo da autoeficácia de Bandura (1997), podem-se vislumbrar possibilidades de compreensão e verificação dos mecanismos cognitivos que interferem na atuação docente, explorando-se o constructo especificamente para a docência em EF.

    A TSC apresenta subsídios satisfatórios para estes três aspectos. E na Agência Humana e no constructo da Autoeficácia (já vistos nos outros ensaios da série), aplicados à atuação docente, é possível compreender melhor a motivação do professor de EF.

    Com base na Teoria da Autoeficácia de Bandura (1997), pretende-se esclarecer a partir de análise mais profunda e específica as relações entre o construto aplicado à atuação docente e o processo de motivação do professor (especificamente o motivo para realização profissional).

    Podem-se vislumbrar novas perspectivas para a formação profissional e acadêmica, uma vez que poderemos destacar quais fontes e como as mesmas compõem a autoeficácia destes professores.

    A relevância social incide na contribuição ao processo de formação profissional (autoconhecimento), por meio da compreensão de mecanismos cognitivos internos que interferem nas crenças dos profissionais de EF, permitindo que sejam agentes ativos, autônomo, críticos que desenvolvam autorreflexões constantes em sua atuação profissional e também contribuir com o processo motivacional contínuo do professor.

Autoeficácia e motivação

    Pode-se assim perceber que a autoeficácia necessita sempre ser compreendida dentro da abordagem social-cognitiva, na qual a autoeficácia é um constructo teórico importante (BANDURA, 1997; 2008), caracterizado como mecanismo cognitivo para mediar motivação e comportamento, voltados a uma determinada meta.

    Por esta característica mediadora de ações, a autoeficácia atua nas tomadas de decisões dos mais diferentes tipos. Geralmente, as pessoas avaliam previamente se estão preparadas ou não para entrarem em ação, sendo que procuram suas potencialidades em resolver tarefas que se considerem capazes e evitam envolver-se em atividades para que não estejam devidamente preparadas.

Autoeficácia docente e Educação Física

    A partir da definição clássica e mais atual da autoeficácia, que seria “a crença na própria capacidade de organizar e executar cursos de ações requeridos para produzir determinadas realizações” (BANDURA, 1997, p.03), podemos começar a esboçar a aplicação deste constructo para a especificidade de atuação em EF.

    A crença de autoeficácia do professor pode ser compreendida como “o julgamento das capacidades (docentes) em alcançar os resultados desejados de engajamento e aprendizagem do aluno, até mesmo entre aqueles alunos que possam ser difíceis ou desmotivados” (TSCHANNEM-MORAN e WOOLFOLK-HOY, 2001, p. 783).

    Schunk em Maddux (1995), também se aproxima desta definição, ao afirmar que o constructo do “teaching efficacy” (autoeficácia docente) se constitui das crenças individuais sobre as capacidades de ajudar os estudantes na aprendizagem.

    Venditti Jr (2005, p. 75) já definiu a autoeficácia docente para a EF como o conjunto de crenças e percepções internas, derivadas de julgamentos e avaliações sobre as competências docentes necessárias para transmitir e ensinar os conteúdos da EF e das práticas corporais, considerando-se as particularidades da EF e sua diversidade de conteúdos e contextos”.

    Woolfolk-Hoy, citada em SHAUGHNESSY (2004), complementa que a construção do senso de autoeficácia do professor, oriundo das crenças nas capacidades, sempre se forma através de percepções e interpretações subjetivas destas mesmas capacidades de fomentar a aprendizagem dos estudantes e garantir seus engajamentos. E, ainda completa que esta característica é muito importante no perfil comportamental de um professor ou agente pedagógico.

    A construção da autoeficácia do professor tem sido associada à extensão da sua experiência docente, sucesso prévio, percepção de habilidade dos alunos e recursos da escola e comunidade (POLYDORO e COLABORADORES, 2004).

    Bzuneck (2000) relaciona, ainda, o elevado grau de autoeficácia do professor com transformações no comportamento de seus alunos, tais como melhores desempenhos em diversas matérias e incremento da crença de autoeficácia nos próprios alunos em consequência das modificações em sua motivação.

    Não se pode desconsiderar que a autoeficácia constitui-se de um construto dinâmico e complexo, podendo ser influenciado por estes fatores e variar durante um espaço de tempo, pelos diversos fatores causais da reciprocidade triádica descrita anteriormente, na TSC. Esta consideração a respeito das crenças dos professores de EF e suas relações no processo de aprendizagem dos conteúdos inerentes à EF transformam o professor na figura mediadora entre os conhecimentos da EF e a aprendizagem dos alunos, considerando-se as características, os interesses, os cenários e contextos nos quais estas práticas e conhecimentos são transmitidos ou aplicados (VENDITTI JR, 2005).

    Muitas vezes, pelo fato da componente eficácia no ensino da EF incidir negativamente na composição da autoeficácia docente em EF (pelo descrédito e falta de relação com o projeto pedagógico escolar e as outras disciplinas), as metas e principalmente o esforço e a persistência dos profissionais são facilmente abandonados.

    A autoeficácia do professor nasce do sucesso real com seus alunos, ou seja, quando é completado o ensino dos alunos através de percepções e reconhecimento do trabalho do professor, em diversos âmbitos (SILVA, 2004).

    Sendo assim, qualquer experiência ou aprimoramento que ajudá-los a terem sucesso nas tarefas cotidianas de ensino lhes dará uma base para desenvolver um senso de autoeficácia em sua carreira (WOOLFOLK, 2000). Daí a hipótese de estímulo a programas de estágio ou vivências supervisionadas de atuação prática docente ainda no processo de formação, para que se possibilitem espaços de discussão e desenvolvimento desta crença de autoeficácia docente (VENDITTI JR, 2005).

    É preciso que estes programas e as oportunidades de estágio precoce sejam realmente supervisionados e monitorados. Somente assim será possível trabalhar, estimular e desenvolver a autoeficácia docente para a EF.

    O componente “formação profissional” também é defendido como fator importante na construção destas crenças docentes. Uma vez que a formação profissional, acrescida de embasamento acadêmico, traz conhecimentos, “know-how” e estratégias de atuação que, associados e correlacionados, podem contribuir para a formação de profissionais eficazes e eficientes em suas áreas educacionais.

Motivação do profissional de EF

    A motivação é um fenômeno presente no processo de ensino-aprendizagem que interfere no comportamento de professores e alunos. É um assunto altamente complexo que vem sendo estudado há muito tempo, tornando-se trabalhoso o processo de conceituação e compreensão do mesmo. De acordo com Lima (1992, p.150), "[...] a motivação é um processo rico em detalhes, e por isso mesmo rico em maneiras de ser abordada pelas teorias”. Os estudos sobre a motivação, na maioria das vezes, estão centrados no(a) aluno(a), já que o mesmo é o principal sujeito do processo educativo. No entanto, neste trabalho, o enfoque dado será outro: a motivação do próprio professor de EF, ele próprio incluído neste processo de motivação, necessário a sua qualificação profissional.

    A priori, pode parecer fácil estar ou ser motivado... Mas não é assim tão simples como muitos imaginam. A tarefa de um educador em motivar seus alunos é árdua e exige muito trabalho por parte deles. Costumamos dizer que a atividade docente possui muitas oscilações, repercutindo diretamente no aspecto motivacional do agente pedagógico.

    Por isso, é necessário desmistificar a ideia de que a motivação do professor é independente da motivação do aluno. Também podemos dizer que o processo inverso é verdadeiro: "Em qualquer situação, a motivação do aluno esbarra na motivação de seus professores" (BORUCHOVITCH e BZUNECK, 2001, p.28).

    Assim sendo, para realizar esta apropriação, pontuamos alguns aspectos relevantes para a compreensão do tema proposto, dividindo-o em etapas, para uma melhor explanação. A primeira diz respeito à conceituação da motivação a partir do estudo do motivo de realização e seus determinantes: nível de aspiração, atribuição causal e norma de referência. Também foi proposto que fosse agrupado um quarto fator a ser observado: a autoeficácia (WINTERSTEIN E VENDITTI JR, 2008). Os mesmos são importantes para a Educação Física (EF), pois delimitam a análise dos comportamentos em situações de rendimento e desempenho.

    Procuramos ressaltar suas principais tendências e aplicações na área da Educação Física, através de um resgate bibliográfico. No processo de motivação para o esporte e práticas corporais, é fundamental compreender a interação e as fontes de motivação intrínseca e extrínseca que suscitam nas atividades em questão. O ambiente esportivo e de lazer são excelentes para estímulos tanto extrínsecos quanto intrínsecos. A figura 01 abaixo descreve o processo de estimulação da motivação extrínseca até o processo de motivação intrínseca, ou automotivação.

Figura 01. As etapas do processo de motivação segundo Vallerand et al (1989, 1992, 2007). O processo parte da amotivação, passando pelas etapas de regulação externa, 

regulação introjetada e regulação identificada (podendo ser considerada a autorregulação). Estas três etapas se constituem da motivação extrínseca. Finalmente, após passar por estas 

etapas, o indivíduo alcança a motivação intrínseca, derivada de estimulação, realizações e superação de metas e conhecimento ou experiências. Encontrado também em Venditti Jr (2010)

    Vallerand e colaboradores apresentam estas etapas a respeito do processo para a motivação (figura 01). Partindo da total amotivação, o continuum da auto-determinação pode apresentar duas grandes fases diferenciadas: primeiramente a motivação extrínseca e a outra de motivação intrínseca propriamente dita.

    Nesse sentido, devem-se observar também as atribuições manifestadas. Um incentivo a atribuições adequadas pode aumentar a responsabilidade pelos erros e evitar a imobilidade em direção à correção de erros e predisposição para o esforço. A exposição ao risco calculado favorece o convívio com a insegurança. No esporte, especificamente, é importante aproximar o treinamento de situações ­reais de competição, principalmente sob pressão de tempo e em inferioridade de per­formance.

    Outro aspecto levantado repetidas vezes no texto está na questão da importância de conhecermos e aplicarmos os conhecimentos da TSC e da Teoria da autoeficácia para entendermos os mecanismos de crenças e motivações dos praticantes de atividade física. Fica muito clara a relação entre autoeficácia e motivação no ambiente esportivo.

    Sendo o profissional de EF o principal agente pedagógico no contexto esportivo e do exercício, o mesmo deve criar condições e estímulos ambientais com os quais sejam estimuladas e valorizadas as potencialidades, habilidades e competências dos seus alunos, suprindo e adaptando as carências, dificuldades e limitações, sem que as mesmas sejam foco ou fonte de perturbações ou ansiedade. Poderíamos pensar em como proporcionar alimentações daquelas quatro fontes de autoeficácia e de que forma poderíamos reestruturar nossas práticas e metodologias de modo que estas fontes fossem sempre nutridas e repletas de estímulos.

    Acreditamos que este seria o papel fundamental do profissional de EF, pois incrementando as fontes de autoeficácia, os interesses e incentivos poderiam perdurar por tempos mais longos, sendo o professor o principal foco de controle destas motivações extrínsecas, permitindo um ambiente seguro, agradável, criativo, desafiador e motivante.

Motivo de realização para o Professor de EF

    Segundo Murray (1978), os motivos podem ser classificados em dois grupos: inatos (ou primários) e adquiridos (ou secundários).

    Um dos mais pesquisados é o motivo de realização - responsável pela motivação em situações de rendimento e desempenho, em diversas áreas de aplicação. Esse motivo é considerado de extrema relevância nas práticas corporais e esportivas em geral e nas aulas de Educação Física, dadas as características presentes no jogo, esporte e nas práticas corporais.

    O motivo de realização (traduzido de need of achievement) foi definido por Heckhausen (1980) sinteticamente como a ação voltada a determinada meta, com o intuito de se obter melhoria ou manutenção da própria capacidade nas atividades em que é possível medir o próprio desempenho, sendo que a execução dessas atividades pode levar a um êxito ou a um fracasso.

    De acordo com Roberts (1993), para a compreensão da motivação e dos comportamentos de realização, devem ser considerados o significado e a função do comportamento; bem como a identificação das metas de ação. Essa meta dirige o comportamento de realização quando a aprendizagem e o domínio são determinados como importantes para o indivíduo (WINTERSTEIN e VENDITTI JR, 2008). Além disso, as percepções das habilidades e das capacidades são de autorreferência, persistentes e estabelecem metas apropriadas a suas capacidades.

    O “pano-de-fundo” destes pensamentos autorreferentes, as autopercepções e o julgamento ou tomada de decisões a respeito dos planos de ação seria efetivamente a autoeficácia em ação, sendo o mecanismo central de autocrenças, regulação, autopercepções e decisões por planos de ação efetivos e eficazes na realização das tarefas (WINTERSTEIN e VENDITTI JR, 2008).

    Segundo Winterstein (1992), a Teoria da Motivação parte da ideia de que existe um (ou vários) motivo(s) que leva(m) a pessoa a executar e a manter uma ação em direção a um objetivo e finalizá-lo. Ou seja, a motivação é um processo ativo, intencional e dirigido a uma meta. A partir disto, podemos dizer que mover-se em direção a um objetivo é estar motivado. E sabemos que, quando não estamos interessados por alguma tarefa, não sentimos prazer, nem vontade de realizá-la, o que implica em falta de metas e desinteresse.

    Conforme Woolfolk (2000, p. 568), várias explicações podem ser associadas a essas manifestações que direcionam nosso comportamento, tais como: impulsos, necessidades, crenças, valores, medos, objetivos, pressão social, autoconfiança, interesses, curiosidades, incentivos, expectativas e muitos mais, variando de acordo com traços pessoais ou características próprias de cada pessoa (VENDITTI JR, 2010). E todas estas explicações podem ser aqui utilizadas para buscarmos a compreensão dos motivos de realização do profissional de educação física (figura 02). Quando uma pessoa inicia uma atividade física, muitos fatores comprometem a escolha de determinada prática. Assim também o são a escolha e opção profissional, dentre elas a decisão pela atividade educacional, ou ainda a prática docente nas diversas áreas de conhecimento.

    Diferentes pessoas optam por uma mesma tarefa, impulsionadas por diferentes motivos. Por exemplo, um estudante de EF pode incidentalmente conseguir um estágio em hidroginástica, mas depois, em função de sua adaptação e desenvolvimento com a prática que está envolvido, resolve especializar-se em atividades aquáticas, ou buscar estudar determinado público alvo; enquanto um outro pode iniciar a mesma atividade em busca de convívio social e cumprimento das horas necessárias a seu estágio, ou porque um colega seu de classe arrumou o estágio para ele, em virtude da proximidade do mesmo da academia em questão. Em ambos os casos, um ou mais fatores contribuíram para que essas pessoas realizassem uma determinada ação, que será ou não mantida, dependendo da interferência de novos motivos e da satisfação proporcionada pela atividade.

Figura 02: Esquema gráfico dos fatores que interagem e interferem na motivação dos professores de Educação 

Física e sua motivação profissional. Encontrado em VENDITTI JR E COLABORADORAS (2009, p. 05).

    São diversos os caminhos que levam os indivíduos a seus campos de atuação profissional: uma pessoa pode desde muito cedo ter interesse e curiosidade em trabalhar na área docente (para nosso caso, consideremos a EF), enquanto outra faz esta escolha por falta de opção ou ainda por ter diversas experiências na área (o que acontece muito com ex-jogadores ou praticantes, que passam a atuar como instrutores, professores e treinadores em modalidades com as quais já tinham tido contatos) ou ainda, outros fatores.

    Por meio destes exemplos cotidianos, percebe-se que a motivação trata-se de uma forma de expressão do ser humano que está interligada a uma grande variedade de condições e que depende da interação de fatores pessoais e ambientais.

    Indivíduos com forte motivação para a realização trabalham mais, aprendem mais depressa e são mais competitivos do que aqueles que possuem baixo nível de motivação (WINTERSTEIN e VENDITTI JR, 2008). No plano da ação, são aqueles que assumem responsabilidades pessoais pelos seus atos, que assumem riscos apenas moderados e que tentam atuar de maneira criativa e inovadora, podendo-se dizer dos mesmos que possuem sensos de autoeficácia elevados e autopercepções reguladas e condizentes com seus domínios, habilidades e competências.

    Por outro lado, indivíduos com baixa motivação para a realização escolhem tarefas com dificuldade extrema e apresentam alta taxa de ansiedade quando colocados em situações nas quais são avaliados, além de apresentarem baixos níveis de autoeficácia e autopercepções muitas vezes incoerentes com suas competências e reais habilidades, justamente em virtude de suas crenças, pouco envolvimento e interesse e experiências aversivas no domínio a ser considerado: ambiente das atividades esportivas e práticas corporais.

Finalizando... Considerações e perspectivas

    A teorização da autoeficácia passa a ser fundamental para a compreensão dos fatores influenciadores de determinadas ações ou atividades, dentre eles: a escolha de tarefas e seleção; o esforço empregado nas tarefas; o grau de persistência diante de falhas ou estímulos aversivos na atividade docente.

    Ora, sendo assim, observando os comportamentos do nosso público e os fatores que incidem nas suas percepções e avaliações, pode-se promover o desenvolvimento de crenças de autoeficácia dos praticantes e também dos profissionais de EF, para que assim possibilitem engajamento nos programas de atividades físicas, ou práticas corporais, propostas de maneira mais adequada.

    Nossas sistematizações ou planos de ação tornar-se-iam mais efetivos para o ensino da EF, com maior participação e envolvimento dos alunos e alunas nas atividades; incidindo, portanto, no processo motivacional dos mesmos para a realização das práticas corporais. Assim sendo, podemos considerar a autoeficácia como mais um dos componentes no processo de Motivação para a Realização (VENDITTI JR, 2010).

    Associada a esta linha teórica, a Agência Humana (BANDURA, 1982; 1989) pode ser muito utilizada em nossa área de atuação, para a compreensão das escolhas e motivações para as atividades físicas e também às escolhas profissionais dentro da área da educação física. Já nas ações dos sujeitos deste estudo, os professores de EF, finalmente identificar-se-iam fatores determinantes destes comportamentos, compreendendo os mecanismos que neles interferem e suas consequências ou efeitos na prática docente e na aprendizagem dos seus respectivos alunos e alunas em contextos de atuação diversificados.

    O professor de Educação Física normalmente encontra alguns desafios que podem ou não dificultar, ou até mesmo impedir, que a aprendizagem e desenvolvimento do professor ocorram de maneira completa e significativa.

    A pouca quantidade de estudos que enfocam a motivação dos professores especificamente na EF, é um fato que impede muitas vezes que estes profissionais superem as dificuldades e encontrem alternativas.

    Segundo Witter apud Lima (1992, p.160), muitos fatores incidem contra esta dinâmica motivacional:

    [...] a falta de formação adequada, os baixos salários, a desvalorização social do professor, as condições materiais em que se vê compelido a trabalhar, a falta de um sistema adequado de reforços (ou recompensas) pelo empenho em concretizar um bom trabalho, a diversidade dos alunos, a falta de uma boa administração do tempo, planejamentos deficientes, a sobrecarga de trabalho (em número de alunos, de turmas e até de escolas que atua), a falta de envolvimento com os alunos, entre outras variáveis a que estão sujeitos, conduzem à apresentação de respostas de manutenção da situação atual, de falta de iniciativa, de desinteresse pela mudança e não engajamento efetivo em qualquer inovação.

    A compreensão do processo motivacional e a simples ciência de que esses fatores destacados acima repercutem no processo profissional e na atuação dos professores de Educação Física permite um melhor entendimento da prática pedagógica e consequentemente uma melhor atuação profissional.

    Dada a conceituação e considerações correlatas sobre autoeficácia apresentadas neste ensaio e os resultados sobre estudos que investigaram autoeficácia docente (NEVES, 2002; IAOCHITE, 2007; ROCHA, 2009; VENDITTI JR, 2005; 2010), pesquisados em estudos anteriores a este trabalho, parece-nos evidente que é preciso continuar investigando o tema, pois inerente a ele existem, além da relevância teórica e metodológica, as implicações educacionais decorrentes dos resultados encontrados nesta área de investigação. E, lembrando do alerta de que a percepção de autoeficácia é dirigida a um contexto específico é preciso envidar esforços de estudo em diferentes áreas de atuação docente para que possamos trabalhar pela identificação de aspectos similares relacionados à autoeficácia de professores, bem como compreender as nuances e especificidades dos diferentes grupos docentes.

    Esta não é uma causa perdida, por meio deste trabalho esperamos despertar o interesse de outros pesquisadores por este tema, ampliando assim o campo de estudo nesta área. Sabendo que os motivos têm a função de explicar os comportamentos, ao estudar o processo motivacional, o professor pode reconhecer quais são os objetivos que seus alunos perseguem e quais são as suas próprias metas como profissionais e educadores.

    Quando o professor sabe identificar suas necessidades, mais fácil será manter um nível adequado de motivação e consequentemente um bom trabalho e atuação nas situações práticas de nossa profissão. Por meio deste trabalho, buscamos apontar os fatores que interferem no comportamento do educador, para estimular um pensamento crítico dos profissionais desta área em busca de novas propostas para, talvez, solucionar os problemas encontrados durante a atuação cotidiana dos mesmos.

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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 18 · N° 183 | Buenos Aires, Agosto de 2013  
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