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Laqueur e Ghiraldelli Jr: perspectivas de análise sobre o corpo

Laqueur y Ghiraldelli Jr: perspectivas de análisis sobre el cuerpo

 

Licenciado em Educação Física pela Escola de Educação Física e Desportos

da Universidade Federal do Rio de Janeiro (EEFD-UFRJ)

Mestrando em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação

da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGE-UFRJ)

Gustavo da Motta Silva

gustavomotta1990@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O presente trabalho foi realizado a partir de dois textos, o primeiro intitulado “Corpos, detalhes e a narrativa humanitária”, do autor Thomas Laqueur e o segundo “Pedagogia e corpo” do autor Paulo Ghiraldelli Jr.. O objetivo principal foi analisar e discutir os significados relacionados ao tema corpo presentes nas concepções dos autores. As contribuições foram relevantes, uma vez que foi possível debater alguns aspectos relacionados ao tema a partir da História e da Educação Física.

          Unitermos: Corpo. História. Educação Física.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 183, Agosto de 2013. http://www.efdeportes.com

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Considerações iniciais

    O presente trabalho será realizado a partir de dois textos, o primeiro intitulado “Corpos, detalhes e a narrativa humanitária”, do autor Thomas Laqueur e o segundo “Pedagogia e corpo” do autor Paulo Ghiraldelli Jr.. Desse modo, pretende-se problematizar alguns aspectos relacionados aos textos como: apontar os principais argumentos dos autores, fazer uma análise crítica destes argumentos e comentar criticamente os argumentos dos autores com o respaldo de outras referências.

    Sendo assim, apresenta-se como objetivo principal, analisar e discutir os significados relacionados ao tema corpo presentes nas produções de Thomas Laqueur e Paulo Ghiraldelli Jr..

A perspectiva de Laqueur

    Apesar de ser um texto que pretenda realizar uma articulação com outras referências, apresentando muitos exemplos que fundamentariam a ideia do autor, já nos seus primeiros parágrafos, foi possível perceber qual a concepção e o objetivo do autor em trabalhar com o tema.

    O autor inicia o texto “perguntando” como os detalhes sobre os corpos sofredores dos outros suscitam a compaixão e de que modo essa compaixão passa a ser entendida como um imperativo de ações mitigatórias (tranquilizantes). Complementando esta análise, Laqueur aponta que no século XVIII um novo corpo de narrativas passou a abordar de forma minuciosa o sofrimento e a morte de pessoas comuns.

    Sendo assim, o autor explica que o romance realista, a autópsia, o boletim médico e a pesquisa social, fontes pesquisadas por ele no texto, receberam influência da evolução empírica do século XVII. Para Le Breton (2011) tanto o século XVI quanto o século XVII foram muito importantes para a difusão dos conhecimentos anatômicos, uma vez que tratados de anatomia como ilustrações da “Fábrica”, obra de Vesalius, foram utilizados até o final do século XVIII.

    Laqueur ainda comenta, que as narrativas abordadas por ele não constituem uma única forma de despertar ação e compaixão, pois para o autor, um conjunto específico de narrativas humanitárias não cria um sentido de pretensos benfeitores, mas de “paixões solidárias”.

    As primeiras reflexões traçadas por Laqueur no texto são relacionadas aos romances, pois para o autor, dentre as “novas narrativas humanitárias” é a mais autoconsciente. Além deste aspecto, ele destaca que o romance liga o leitor e o personagem por um corpo comum e uma consciência orgânica criando uma experiência “viva” e adquirindo autoridade pelo fato de ser, aparentemente um relato da “experiência real”.

    Realizando a transição das análises dos romances para as autópsias, o autor demarca alguns pontos em comum entre os “gêneros”. O primeiro ponto foi a presença de técnicas do romance nos relatos de caso das autópsias e o segundo, a necessidade das primeiras narrativas médicas, assim como nos primeiros romances, de apresentarem justificativas no intuito de se legitimarem.

    Entretanto, além dos pontos em comum, Laqueur comenta um fator que contrastava entre as duas formas de narrativa, pois enquanto os romancistas criavam uma nova ficção a partir de relatos de notícias de veracidade duvidosa, os médicos buscavam desenvolver um relatório médico factual.

    Abordando especificamente os relatos de caso de autópsias, o autor apresenta que a interpretação do sofrimento de modo a provocar solidariedade e exibir um domínio secular do corpo são pretensões humanitárias destes relatos.

    Deste modo, é pertinente citar dois exemplos dos diversos trabalhados pelo autor, para visualizar como era realizado esse processo de narrativa no que se relacionava aos corpos. O primeiro exemplo é a importância desta narrativa médica em tribunais, uma vez que um os relatos médicos contribuíram para absolver mulheres acusadas de matar seus filhos.

    Outro exemplo utilizado no texto foi a utilização da narrativa médica para investigar os acidentes que aconteciam com mineiros. Sobre este caso, o autor comenta os relatos médicos embora corretos, passavam por uma seleção, apresentando um contraste entre os fatos coletados e os interpretados.

    É importante destacar que qualquer morte causada por defeitos ou qualquer outro problema proveniente das minas iria prejudicar tanto os inspetores quanto a administração da mesma, desta maneira entende-se o motivo de alguns empregados mortos por asfixia após uma explosão, terem como causa de sua morte, em seus relatórios, a “má sorte” e não os defeitos de ventilação das minas.

    Uma última abordagem utilizada pelo autor, e com o intuito de demarcar sua posição teórica é expressa por uma breve crítica ao modelo marxista, embora a obra de Marx tenha sido citada no texto com contribuições importantes para o período estudado por Laqueur. Pois para ele, o fato de se concentrar na narrativa para abordar a questão dos excluídos, por exemplo, não constitui uma negação da relação entre humanitarismo e capitalismo, pois o interesse de classe não é único mediador entre cultura e mercado.

    Em suas considerações finais, Laqueur comenta que espera ter ido além de sugerir que a história social do humanitarismo deva incorporar uma historia e sociologia das formas narrativas, mas para ele, a narrativa atua no sentido despertar as “paixões solidárias” e de pelo menos transformar o “é” em “deve ser”.

A perspectiva de Ghiraldelli Jr

    Paulo Ghiraldelli Jr. desenvolve seu texto a partir de um tema norteador, que seria a relação da Educação com a Educação Física e o corpo. Deste modo, o autor destaca uma relação direta entre a Educação e a Educação Física, abordando aspectos relacionados à pedagogia e sua relação com o desenvolvimento do corpo e da criança.

    O autor também desenvolve uma crítica sobre programas de televisão e outros recursos tecnológicos além de verificar a relação destes recursos midiáticos e da tecnologia com as representações de corpo presentes na sociedade. Além deste aspecto, Ghiraldelli Jr fundamenta sua análise a partir de uma perspectiva histórica, comparando o passado com os dias atuais e busca problematizar a questão do treinamento que para alguns professores é visto como algo positivo e outros como algo que não deva ser valorizado.

    Sobre o primeiro aspecto, onde o autor busca uma relação entre a Educação e a Educação Física, não se pode negar que realmente há uma relação entre ambas, entretanto afirmar que toda “Educação é Educação Física” seria uma aspecto a ser analisado com bastante cautela, pois poderia apresentar um discurso muito generalista, uma vez que comparada às outras licenciaturas, houve um distanciamento entre a Educação Física e as concepções educacionais já na sua inserção no Ensino Superior (MELO, 1996).

    Todavia, compreende-se que, o que o autor queria destacar, seria o olhar que a sociedade possui acerca do corpo atualmente e como isso se relacionaria com a Educação. Sendo assim, destaca-se a importância de se pensar a relação da Educação com a Educação Física, pois para Sobrinho (2011) “não se pode pensar em Educação Física sem se pensar em Educação”.

    Outro aspecto referenciado pelo autor, é que “cada um é o seu corpo tanto negativa quanto positivamente” (p.120) em que o mesmo procura evidenciar o caráter individualizado que o corpo possui atualmente. Neste debate, Courtine (1995) destaca que na sociedade de massa com suas práticas e representações, cada indivíduo torna-se gestor de seu corpo sendo responsável pelas intervenções no mesmo.

    Deste mesmo modo no que se relaciona também ao aspecto de individualização do corpo, só que em um olhar a partir dos discursos da Saúde sobre o mesmo, Ortega & Zorzanelli (2010) apontam que atualmente nota-se há um deslocamento da responsabilidade do Estado pelos procedimentos relacionados à saúde da população, para uma autogestão de cada indivíduo.

    A partir desta visão Ghiraldelli Jr. busca analisar como a pedagogia iria atuar sobre este corpo e, sobretudo sobre o corpo da criança, que segundo ele é um dos elementos do trabalho educativo. Sendo assim, o autor retoma alguns pensadores que contribuíram de maneira positiva para os pensamentos sobre a Educação como Jean Jacques Rousseau e John Dewey, onde o primeiro era adepto de uma educação sensitiva, foi contra a memorização no processo de ensino e aprendizagem, preconizava a prática de exercícios ao ar livre e defendia a necessidade da criança correr, gritar e trabalhar para que pudesse expressar seu vigor (SOARES, 2007), e o segundo defendia que a Educação deveria tecer teias entre os indivíduos e a cultura (CAVALIERE, 2007).

    Com relação à crítica que o autor faz às tecnologias, o mesmo busca problematizar o caso das crianças e o seu contato com jogos eletrônicos, ressaltando que por algum motivo elas se movimentam, mas que se deve pensar a pertinência de se ficar horas na frente de um jogo. Neste debate, pode-se dizer que de alguma forma a “indústria dos games” está tentando responder a essas críticas de que enquanto as crianças jogam não se movimentam, uma vez que, grande parte das produtoras mundiais de vídeo games já possuem um sistema que capta, através de sensores, os movimentos das pessoas que estão jogando, então alguns jogos são apenas para dançar, outros para a pessoa se alongar, jogar tênis, dentre outros.

    A partir desta reflexão, não se pretende defender a “indústria dos games”, nem mesmo condená-la, busca-se corroborar a concepção do autor (mesmo com Ghiraldelli destacando que o foco central não é discutir a passividade ou hiperatividade motora), que na atualidade, de certa forma as crianças se movimentam e que tecnologias não são em grande parte vilãs.

    Ainda neste debate, Darido (2004), em seu estudo com 15 mil alunos entre 10 e 15 anos, todos estudantes das Escolas Públicas localizadas na cidade de Rio Claro, detectou que grande parte dos alunos pratica algum esporte ou atividade física além das aulas de Educação Física, apresentando assim, indícios de que as crianças apresentam-se ativas, de maneira geral.

    Sobre a crítica que Ghiraldelli faz aos programas presentes na mídia, destaca-se a feita ao programa Malhação, onde o objetivo seria transmitir corpos jovens e silhuetas perfeitas. Quanto a este assunto, Soares & Fraga (2003) ressaltam que a “[...] pedagogia dos corpos retos desencadeia verdadeiras cruzadas pela busca do corpo jovem” (p.87). Complementando a discussão, Le Breton (2006) aponta que a aparência corporal está relacionada ao modo com que o indivíduo se apresenta e o que mesmo representa em um determinado contexto cultural.

    Ademais, uma crítica feita ao texto seria à questão da abordagem histórica que o autor utilizou como exemplo para ilustrar sua crítica feita ao programa Supernanny, pois o mesmo afirma que antigamente (nas décadas de 1910, 1920 e 1930) as crianças obedeciam ordens por respeito aos mais velhos, por sabedoria, dentre outros. Entretanto, alguns estudos demostram que não era assim que os fatos realmente ocorriam, pois Paulilo (2007), em seu estudo analisando periódicos escolares do final da década de 1930 detectou que mesmo com a influência de um modelo classificatório (através das fichas de inspeção médica) e ordenado de Educação, houve indícios de práticas transformadoras e recriadoras por parte dos alunos através destes periódicos, que eram utilizados para legitimar a identidade do alunado perante o universo escolar.

Conclusão

    Portanto, o primeiro texto apresentou uma discussão entre as narrativas e os corpos, analisando através de alguns exemplos, como os detalhes podendo compor o discurso e influenciar as ideias e os sentidos das pessoas sobre um determinado tema. Já o segundo, demonstrou-se bastante adequado para um debate amplo acerca da Educação Física e suas relações com a Educação, o corpo e os recursos midiáticos.

Referências

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