Impactes de um evento de orientação pedestre sobre a vegetação Los impactos de un evento de orientación sobre la vegetación |
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Escola Superior Agrária do IPCB Quinta da Senhora de Mércules Castelo Branco (Portugal) |
Luís Quinta-Nova Miguel Cardoso |
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Resumo A Orientação inclui toda a actividade em que se recorre à utilização de um mapa para se optar sobre o melhor trajecto a realizar entre dois locais. Enquanto modalidade de Desporto de Natureza, o praticante tenta realizar no menor tempo possível um percurso, previamente definido e marcado num mapa, tendo que visitar, pela ordem definida no mapa, um conjunto de postos de controlo colocados no terreno. A identificação das áreas onde ocorrem impactes significativos sobre a vegetação, resultantes do pisoteio, é importante no âmbito do planeamento dos eventos de Orientação Pedestre, de modo a evitar que a sua capacidade de carga seja ultrapassada. Em Novembro de 2006 foi efectuado um estudo com o objectivo de avaliar os impactes na flora e vegetação originados por um evento de Orientação Pedestre de nível nacional sobre a vegetação e sua capacidade de regeneração. Esta prova realizou-se na Serra de Santa Isabel, no concelho de Terras do Bouro (Portugal). Foram seleccionadas vinte e quatro áreas de amostragem considerando a representatividade da vegetação, as áreas de maior passagem de atletas e a vulnerabilidade e valor florístico. Todas as áreas foram caracterizadas e avaliadas, antes, imediatamente após e dez meses após o evento. Procedeu-se a uma caracterização da vegetação arbustiva e herbácea, com registo das espécies ocorrentes e respectivas classes de abundância/dominância. A observação dos efeitos induzidos pela passagem dos praticantes sobre a vegetação foi efectuada in loco e registada em suporte fotográfico e em ficha de observação. Foi igualmente registada a área correspondente afectada. Os efeitos sobre a flora e vegetação assumiram uma magnitude e significado reduzidos, verificando-se uma recuperação das condições anteriores à prova. Porém, foram identificadas situações particulares de maior vulnerabilidade, associadas à presença de formações com menor capacidade de regeneração e a áreas com declive acentuado. Unitermos: Desportos de natureza. Impacte ambiental. Orientação pedestre. Flora e vegetação.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 183, Agosto de 2013. http://www.efdeportes.com |
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1. Introdução
Na sociedade actual os hábitos de desporto e lazer viram-se cada vez mais para a utilização do meio natural para a sua prática, como é o caso da Orientação. Hoje em dia, existe igualmente uma maior consciência da necessidade de uma utilização sustentável dos recursos naturais do nosso planeta. O grande desafio será conciliar a linha de procura (de espaços para praticar orientação) com a linha de oferta (dos espaços naturais e da sua qualidade).
Tem-se verificado ultimamente um aumento da qualidade da organização das provas em Portugal, bem como no número de praticantes, no entanto, essa evolução positiva deverá ser acompanhada por um cuidado acrescido com os impactes originados pela prática da orientação.
O impacte da orientação no ambiente tem duas facetas, por um lado a degradação da sua qualidade, através dos resíduos que são deixados inadvertidamente nas áreas onde se realizam as provas, por outro lado na destruição de vegetação e perturbação de espécies de animais. Ambas as categorias de impactes podem ser minimizadas desde que se cumpram um conjunto de regras de boas práticas ambientais.
O estudo em causa teve como objectivos a avaliação do impacte do Grande Prémio de Orientação de Terras do Bouro sobre a flora e vegetação da serra de Santa Isabel, e da sua capacidade de regeneração subsequente ao evento. Este evento realizou-se nos dias 11 e 12 de Novembro de 2006, e consistiu numa prova da Taça de Portugal de Orientação Pedestre. A primeira etapa correspondeu a uma prova de distância média e a segunda etapa a uma prova de distância longa.
Com o presente trabalho pretende-se contribuir para um melhor conhecimento dos impactes originados pela realização de provas de orientação sobre a vegetação, de forma a fornecer informação que possibilite uma melhor gestão ambiental deste tipo de eventos desportivos.
A Orientação inclui toda a actividade em que se recorre à utilização de um mapa ou Carta para optar sobre o melhor trajecto a realizar entre dois locais. Enquanto modalidade desportiva, o atleta tenta realizar no menor tempo possível um percurso, previamente definido e marcado num mapa, ultrapassando todos os obstáculos naturais que possam surgir. Sendo obrigado a visitar, pela ordem definida no mapa, um conjunto variável de postos de controlo que estão materializados no terreno por uma "baliza”, o praticante usa o alicate ou picotador, que se encontra em cada um desses postos, para preenchimento do cartão de controlo que recebeu na partida (Baltazar, 1999).
2. O impacte ambiental da orientação
Considera-se que um impacte ambiental corresponde à alteração de um determinado parâmetro do ambiente num determinado período e numa dada área, resultante de uma acção humana comparada com a situação que ocorreria se essa acção não tivesse lugar.
Os impactes podem ter diferentes classificações, sendo negativos quando implicam perdas ou custos, e positivos quando implicam benefícios ou vantagens. Para além do sinal dá-se geralmente relevo à sua magnitude e significado.
A noção de magnitude de um impacte depende da resiliência, ou capacidade de recuperação das condições originais do meio após se fazer sentir uma acção, e da sua reversibilidade. Considera-se que um impacte de sinal negativo tem uma magnitude elevada quando há perda permanente da qualidade das condições originais, sem possibilidade de recuperação, mesmo que se recorra a medidas de minimização.
Já o significado de um impacte corresponde à importância dada aos seus efeitos. Um impacte ambiental considera-se significativo e de sinal negativo quando viola as leis, regulamentos ou planos existentes, provoca importantes alterações nos processos ecológicos, afectando significativamente as espécies, apresenta riscos para a saúde humana, ou provoca prejuízos económicos ou perturbações sociais (Wesman 1985).
Da revisão da literatura verifica-se que, à prática das actividades identificadas como de Desporto de Natureza, das quais a Orientação faz parte, estão associados efeitos negativos sobre o sistema biofísico (Leung e Marion 2000; HAMMIT e Cole 1987).
A GFANC (1997) divide as acções associadas a actividades recreativas geradoras de impactes em cinco categorias: a prática das actividades em si, os equipamentos de apoio à prática, as estruturas de acolhimento, as infra-estruturas básicas e os efeitos induzidos indirectamente.
O pisoteio, o calcamento e a destruição de vegetação em espaços onde ocorrem estas práticas constitui a principal causa de impactes negativos. Outro dos factores geradores de impactes ambientais que é referido como comum a todas as práticas de Desporto de Natureza é a produção de ruído. Embora tenha uma maior dimensão nos desportos motorizados, também se verifica noutras modalidades. Um dos efeitos é de assustar os animais, levando à interrupção de actividades como a alimentação e as posturas ou choco. Outro dos problemas consiste na deposição de resíduos, que poderá originar contaminação de solos e água, com diversas consequências em termos de habitat das espécies animais e vegetais.
A investigação sobre o impacte ambiental da Orientação em particular, tem sido conduzida em duas áreas principais: o pisoteio da vegetação e a perturbação de animais, com particular relevo para os mamíferos e aves. Embora muitos destes estudos não foram publicados ou foram publicados em revistas científicas pouco relevantes.
A IOF (2005) publicou um documento técnico em que é feita uma revisão da investigação realizada sobre o impacte ecológico da Orientação. Nessa revisão foram analisados dez estudos relativos ao impacte sobre a flora e vegetação, nove efectuados em diferentes países europeus e um na Austrália, com um número de participantes compreendido entre 30 e 10000 (Kardell 1974, NCC 1981, Moore e Tacey 1987, Breckle et al. 1989, DOUGLAS 1989, Baldock 1992, Parker 1994, Bader et al. 1998, Myllyvirta et al. 1998, Viti 2001, citados por IOF, 2005), tendo-se concluído que em eventos com menos de 2500 participantes, existe um impacte reduzido e uma rápida recuperação da vegetação. No entanto existem áreas onde ocorre uma vegetação mais sensível aos impactes, tais como vegetação de áreas húmidas (higrófila) e de habitats rochosos (rupícola). A protecção dessas áreas é normalmente tida em consideração no âmbito do planeamento das competições, existindo o cuidado de evitar a passagem por essas áreas ou evitando que a capacidade de carga seja ultrapassada.
Posteriormente, foi elaborado um estudo por MENDOZA (2007), em que se monitorizou, numa perspectiva de longo prazo, os impactes provocados por uma prova de Orientação no Canadá em 2002, para os três anos seguintes (2002 a 2005). Após a competição os impactes foram considerados negligenciáveis, no entanto dois meses após a competição os impactos foram categorizados como significativos, verificando-se que o pisoteio ao causar a remoção da casca em alguns ramos, provocou a morte da vegetação. Ao fim do terceiro ano não restou nenhuma evidência de afectação da área em resultado da competição.
Para Portugal salienta-se o estudo realizado por CAMPOS (2001), que analisou o impacte sobre a flora e vegetação de uma prova internacional – o Portugal ‘O’ Meeting 2001 - que decorreu no Parque Nacional da Peneda-Gerês. A autora seleccionou a caracterizou treze áreas, antes e após o evento, tendo concluído que os efeitos assumiram uma magnitude e um significado reduzido, e uma incidência breve no que concerne ao tempo de permanência e restituição das condições iniciais.
No que diz respeito à fauna, o facto da Orientação ser uma actividade classificada como efémera faz com que o impacte não seja significativo (Liddle 1997). JeppeRsOn (1984) verificou que, durante uma competição realizada na Dinamarca, sete veados que estavam a ser seguidos por rádio-seguimento procuraram abrigo em áreas de vegetação mais densa e em áreas húmidas localizadas nas imediações, regressando à sua área vital em menos de 48 horas após a competição. Em outros dois estudos realizados com veados na Suécia (Cederlund et al. 1981) e Reino Unido (Douglas 1989 cit. por IOF, 2005) foi verificado um comportamento similar. Parker (2009) ao estudar o impacte de uma prova de Orientação com cerca de 1000 participantes sobre uma espécie de passeriforme nidificante, o chasco-cinzento (Oenanthe oenanthe) concluiu que, na área de competição, não ocorreram impactes observáveis sobre o sucesso reprodutivo da espécie. No entanto, verificou-se que quatro ninhos localizados numa antiga pedreira foram abandonados, em virtude desta área ser utilizada como zona de estacionamento e centro do evento.
3. Caracterização das áreas em estudo
As áreas em estudo - Ventuzelo e Alecrimes - localizam-se na serra de Santa Isabel, que é limitada a Norte pelo rio Homem, a Sul pelo rio Cávado, a Este pelo Parque Nacional da Peneda-Gerês e pela albufeira da Caniçada (Figura 1). As duas áreas ocupam uma superfície total de 456 ha. A sua altitude varia entre os 510 e os 902 m (Chã da Presa).
O relevo é muito acidentado, com declives elevados, na sua maioria superiores a 30%. A rede hidrográfica é muito densa, mas em grande parte tem um carácter temporário, visto algumas linhas de água secarem durante o Verão (Dias 1995).
Constantemente sujeito aos ventos do Atlântico, a serra do Gerês actua como barreira de condensação às massas de ar morno e húmido que alcançam os vales dos rios Minho, Lima e Cávado, causando nas regiões central e oriental uma das maiores precipitações da Europa, situada entre 2000 e 3000 mm de média anual. Para leste dos cumes mais elevados a queda pluviométrica desce para valores inferiores atingindo apenas 1600 mm em alguns pontos do sector oriental do Parque (Pimenta e Santarém 1996).
A humidade relativa é elevada, as amplitudes térmicas são moderadas, excepto nas zonas de maior altitude e nos planaltos onde se verifica alguma continentalidade. Temos assim Verões frescos e húmidos e Invernos relativamente suaves.
A descrição da vegetação que se segue foi baseada no trabalho de Pimenta e Santarém (1996). Na Serra do Gerês a região euro-siberiana pode dividir-se em dois andares bioclimáticos: colino, aproximadamente até aos 700 m, e montano, dos 700 aos 1545 m de altitude. A vegetação potencial da região Euro-siberiana é formada basicamente por espécies de origem atlântica e centro-europeia.
Os carvalhais do Gerês, caracterizados por um clima húmido, compõem-se por elementos atlântico-europeus. As formações deste tipo, dominadas pelo carvalho-alvarinho (Quercus robur), árvore climácica típica da região Euro-siberiana, surgem em áreas ainda pouco afectadas pelo Homem. Para além do carvalho-alvarinho existem outras espécies como a uva-do-monte (Vaccinium myrtillus), o vidoeiro (Betula celtiberica) e o azevinho (Ilex aquifolium). Nas cotas mais baixas da serra do Gerês existe uma variante termocolina em que o carvalho se associa ao sobreiro (Quercus suber), verificando-se, no entanto, uma maior degradação devido à queima e à roça da floresta.
Os matos constituem formações vegetais derivadas da degradação dos bosques climácicos. Cobrem grandes extensões do Gerês, e encontram-se representados por algumas formações básicas, como os giestais, os urzais-tojais e os urzais.
Da destruição dos carvalhais resultam inicialmente comunidades de giestas de flor amarela (Cytisus striatus, C. scoparius e Genista florida). Tais comunidades desenvolvem-se ainda em solos com características florestais, menos ácidos e mais profundos que os solos dos urzais-tojais. Nos locais menos elevados, isto é, no andar colino, predominam os giestais de Cytisus striatus associado ao tojo da espécie Ulex europaeus.
As comunidades vegetais mais comuns são os urjais-tojais, entrando na sua composição, para além do tojo (Ulex minor), da carqueja (Chamaespartium tridentatum) e do sargaço (Halimium alyssoides), as urzes das espécies Erica umbellata e Erica cinerea.
Os urzais constituem, por sua vez, os matos típicos da montanha, atingindo na Serra do Gerês os 1500 m de altitude. São próprios das regiões de clima rigoroso mais frio e continentalizado, sendo dominados pela urze Erica australis ssp. aragonensis, por vezes enriquecidos com zimbro (Juniperus nana). Tanto os urzais-tojais, como os urzais desenvolvem-se sobre solos delgados, de textura ligeira, muito ácidos e com elevado teor de matéria orgânica mal decomposta e com cor escura.
Em alguns locais mais elevados, pode-se ainda observar um tipo muito particular de vegetação, os matos higrófilos, que surgem em pequenas depressões do terreno, e que se caracterizam por uma vegetação composta fundamentalmente por espécies euro-siberianas, destacando-se alguns arbustos baixos como a Erica tetralix, a que se juntam várias espécies de musgos, em especial do género Sphagnum.
Nos rios e ribeiros de montanha as águas são rápidas, o leito é pedregoso e o solo das margens é pouco profundo. É neste meio, que ocorrem os amiais, onde o amieiro (Alnus glutinosa) aparece muitas vezes associado ao vidoeiro, à tramazeira (Sorbus aucuparia) e aos salgueiros (Salix spp.).
O vidoeiro formar, igualmente, pequenas matas nos andares colino e montano. A maioria destes pequenos bosques não deve ser considerada climácica, mas sim de substituição dos bosques de Quercus robur. Para além do amieiro misturam-se, nas zonas de menor altitude espécies como o freixo (Fraxinus angustifolia), o sanguinho (Frangula alnus) e os salgueiros, muitas vezes associados ao carvalho-alvarinho.
No andar montano, a partir da sua base abundam os afloramentos rochosos, torres e escarpas. Aqui, a vegetação rupícola surge em mosaico com comunidades pioneiras de plantas herbáceas e urzais. A composição florística do meio rochoso é muito variável e depende de vários factores, como a exposição, o ensombramento, ou a acumulação de materiais terrosos e de água. Estas comunidades caracterizam-se por um fraco grau de cobertura e incluem plantas tão diversas como líquenes, musgos, fetos e plantas superiores.
4. Metodologia
Foram seleccionadas 27 áreas de amostragem. Quinze no mapa onde se desenrolou a prova de distância média e os outros doze no mapa da prova de distância longa (Figura 2). Os pontos correspondem às áreas envolventes aos postos de controlo. Cada área consiste num círculo de 2 m de diâmetro em cujo centro se situa o posto de controlo, correspondendo a uma superfície de 3,14 m2.
As áreas foram seleccionadas com base nos seguintes critérios:
a representatividade da vegetação da zona abrangida pelo evento;
as áreas de passagem de um elevado número de atletas;
e o valor florístico das espécies presentes.
Na selecção da amostra foram considerados os dados fornecidos pelo clube organizador do evento (.COM - Clube de Orientação do Minho), relativos ao número de atletas inscritos em cada escalão de competição e aos percursos dos mesmos, permitindo calcular o número de atletas que passaria em cada posto de controlo.
Todas as áreas foram caracterizadas e avaliadas, antes do evento, imediatamente após o evento e dez meses após o evento. Para tal procedeu-se a uma caracterização detalhada da vegetação arbustiva e herbácea da área envolvente aos postos de controlo seleccionados. No levantamento de campo procedeu-se ao registo e recolha das espécies ocorrentes.
Foram registadas todas as espécies presentes com as respectivas classes de abundância/dominância de acordo com a escala, adaptada de BRAUN-BLANQUET (1979):
+ - Indivíduos pouco frequentes, com muito fraca cobertura, raros ou isolados
1 - Indivíduos bastante abundantes mas de fraca cobertura
2 - Indivíduos muito abundantes ou cobrindo, pelo menos, 1/20 da superfície
3 - Qualquer número de indivíduos ou cobrindo, pelo menos, 1/4 a 1/2 da superfície
4 - Qualquer número de indivíduos ou cobrindo, pelo menos, 1/2 a 3/4 da superfície
5 - Qualquer número de indivíduos ou cobrindo mais de 3/4 da superfície
Os taxa registados em inventário foram recolhidos e identificados recorrendo, essencialmente, às publicações de Franco (1971 e 1984), Franco e Afonso (1994 e 1998).
Foi ainda registada informação relativa à taxa de cobertura e à classificação das espécies em função do estrato vertical que ocupam (estratos arbóreo, arbustivo ou herbáceo).
Na avaliação pós evento foram registados os efeitos sobre o solo e a vegetação. Foram observados os seguintes efeitos: intensidade de pisoteio, com a eventual demarcação de trilhos e afastamento, trituração e/ou esmagamento da folhagem. Os restantes itens prendem-se com efeitos sobre a vegetação passíveis de causar a morte da planta ou de afectar o desenvolvimento normal do seu ciclo fenológico, afectando, por exemplo, a capacidade reprodutiva nesse ciclo. Foi igualmente registada a área correspondente afectada.
A caracterização da vegetação e a observação dos efeitos induzidos pela passagem dos atletas e da regeneração da flora, antes, imediatamente após a competição e dez meses após o evento, foram efectuadas in loco e registadas em suporte fotográfico e, em ficha de observação elaborada para o efeito.
Figura 2. Localização das áreas de amostragem
Antes do evento, foi possível prever o número de atletas que passaria em cada posto de controlo, com base no conhecimento dos percursos e do número de inscrições por escalão. Do número de passagens previsto para cada área apenas não se concretizaram as referentes aos atletas que por algum motivo não efectuaram a prova ou, que não controlaram o posto de controlo correspondente à mesma, e que por esse motivo foram desclassificados.
Nas etapas realizadas nos dias 11 e 12 de Novembro de 2006 participaram, respectivamente, 504 e 501 atletas, existindo diferenças significativas no que concerne ao número de atletas que pisoteou cada uma das áreas de amostragem. As classes de competição e o escalão etário dos atletas envolvidos no pisoteio de cada uma das áreas do Tipo I é muito diversificado, à excepção do círculo 45, que apenas foi pisoteado por homens de alguns dos escalões mais competitivos (H20, H21E e H35).
5. Resultados
Nas Tabelas 1 e 2 são apresentados os resultados do levantamento de campo realizado nas áreas das provas de Ventuzelo e Alecrimes, respectivamente. Nesta as colunas correspondem às quinze áreas de amostragem, já as linhas correspondem às espécies de plantas inventariadas e elementos físicos relevantes. A classificação que consta nas células fornece informação sobre a classe de abundância/dominância, o estrato ocupado e a taxa de cobertura da espécie na área de amostragem em causa.
Nas Tabelas 3 e 4 são apresentados os dados referentes às modificações observadas na vegetação em cada uma das áreas de amostragem, em Ventuzelo e Alecrimes, respectivamente, registadas imediatamente após a competição, tendo como referência e termo de comparação as avaliações efectuadas na semana que antecedeu o evento. As linhas correspondem às quinze áreas de amostragem e as colunas aos estratos de vegetação afectados. A classificação que consta nas células fornece informação sobre a magnitude dos impactes verificados.
As áreas de amostragem voltaram a ser visitadas decorridos 10 meses do evento, de forma a ser avaliada a recuperação da vegetação. Esta análise incidiu nos pontos em que se verificou um maior impacte logo após a realização do evento.
Verificou-se uma total recuperação da vegetação, tendo-se evidenciado como único vestígio de afectação, o facto da altura da vegetação herbácea ser inferior à da vegetação periféricas à área de amostragem. No entanto é de prever que com o passar do tempo esta vegetação atinja o mesmo crescimento que na envolvente.
Tabela 1. Resumo dos resultados da caracterização da vegetação - Ventuzelo
Legenda: O primeiro dígito da sigla corresponde à respectiva classe de abundância/dominância (consultar o ponto 4)
As abreviações seguintes correspondem ao estrato ocupado pela espécie em causa (arb - arbustivo ou her - herbáceo).
O valor numérico que se encontra no final da sigla representa a taxa de cobertura da espécie em causa, em percentagem.
Tabela 2. Resumo dos resultados da caracterização da vegetação – Alecrimes
Legenda: O primeiro dígito da sigla corresponde à respectiva classe de abundância/dominância (consultar o ponto 4)
As abreviações seguintes correspondem ao estrato ocupado pela espécie em causa (arb - arbustivo ou her - herbáceo).
O valor numérico que se encontra no final da sigla representa a taxa de cobertura da espécie em causa, em percentagem.
Tabela 3. Impactes na vegetação - Ventuzelo
Tabela 4. Impactes na vegetação - Alecrimes
Legenda: O valor numérico que se encontra no início da sigla representa a taxa de cobertura da espécie em causa, em percentagem.
As abreviações seguintes correspondem ao impacte verificado (P - vegetação prostrada; A - vegetação arrancada).
6. Considerações finais
Os efeitos do evento sobre a flora e vegetação assumiram uma magnitude pequena e de pouca importância para o ambiente, e uma incidência breve relativamente ao tempo de permanência e à restituição das condições iniciais, o que indicia que o impacte do evento pode ser considerado reduzido.
Não obstante, julgamos que os nossos resultados conjugados com os obtidos nos estudos referenciados na revisão da literatura, permitem extrair as seguintes conclusões, nomeadamente:
As comunidades de briófitas têm uma capacidade de regeneração lenta; como tal, deve ser evitada a marcação de postos de controlo em áreas em que os mesmos estejam presentes;
A progressão em terrenos com declive muito acentuado parece aumentar a magnitude dos efeitos; assim sendo, deve ser evitada a passagem e marcação de postos de controlo nessas áreas, aquando da presença de espécies vulneráveis ou detentoras de estatutos especiais de protecção e se não for possível, nessas áreas, induzir os atletas a progredir por carreiros ou caminhos;
A magnitude e incidência dos efeitos sobre a flora e a vegetação parecem ser, também, determinadas pela altura do ciclo fenológico das plantas em que se processa a acção que os origina; por conseguinte, parece ser importante conhecer as espécies presentes para determinar a altura do ano mais adequada à prática desportiva;
A magnitude dos efeitos, no que concerne à quantidade do factor ambiental afectado, de uma forma geral, parece assumir uma correlação elevada com o grau de pisoteio; assim sendo, o planeamento de percursos deve prever, tanto quanto possível, a dispersão dos atletas pelo terreno, evitando a visita de um elevado número de atletas a cada posto de controlo e a definição de pernadas similares;
As zonas de partidas e chegadas são certamente as áreas mais pisoteadas, como tal, a sua selecção deve evitar a opção por zonas vulneráveis ou dotadas de importância ambiental.
Agradecimentos
Este trabalho é financiado por Fundos Nacionais através da FCT - Fundação para a Ciência e a Tecnologia no âmbito do projecto PEst-OE/AGR/UI0681/2011. Agradece-se, igualmente, o apoio da Federação Portuguesa de Orientação e do Clube de Orientação do Minho.
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