Cheiro, gosto, sabor e cor: experimentando a educação popular como um aprendiz de professor Aroma, gusto, sabor y color: experimentando la educación popular como un aprendiz de profesor |
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Mestre em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina (Brasil) |
Éliton Clayton Rufino Seára |
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Resumo Escrevo-lhes, para expressar alguns detalhes do trabalho, ou melhor, dos trabalhos que percorram. Juntos, Maristela e eu trabalhamos com a disciplina de Educação Popular na Universidade Federal de Santa Catarina e, realizando estágio docência posso lhe dizer que a experiência foi muito importante para um belo entendimento do que é ser um docente e, ainda mais no que se refere a uma educação não tradicional. Esta disciplina foi um convite feito pela professora, ocorrido durante os meses de março a julho de 2011, ou seja, referente ao primeiro semestre deste mesmo ano. O título só poderá ser entendendo se o leitor deixar-se levar pelas palavras. Unitermos: Educação Popular. Experiência docente. Paulo Freire.
Resumen Les escribo para expresar algunos detalles de la tarea, o más bien las tareas que nos atraviesan. Juntos, Maristela y yo trabajamos con la disciplina Educación Popular en la Universidad Federal de Santa Catarina y, realizando la pasantía docente puedo decir que la experiencia fue muy importante para una buena comprensión de lo que significa ser docente, y más aún en lo que se refiere a una educación no tradicional. Este curso fue una invitación hecha por la profesora, que se produjo durante los meses de marzo a julio de 2011, es decir, para la primera mitad de ese año. El título sólo se puede entender si el lector se deja llevar por las palabras. Palabras clave: Educación Popular. Experiencia docente. Paulo Freire.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 183, Agosto de 2013. http://www.efdeportes.com |
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Diálogos Primeiros, Primeiros Diálogos, Sementes, Raízes, Espinhos e Diálogos nas conversas que antecedem...
Ainda no ano de 2010, mais precisamente no final dele, no mês de Dezembro, a professora Maristela e eu conversávamos em questão do convite por ela feito para realizar estágio docente na disciplina de Educação Popular, após esta ultima conversa, tudo acertado para minha participação, como: Um Aprendiz de Professor.
Fizemos algumas discussões sobre o plano de ensino, a ementa da disciplina e, como poderia ser minha interação com o contexto novo a ser vivido. Assim, fui recomendado a pegar algumas obras de Paulo Freire1, além de pensar em diferentes possibilidades de fazer a relação da Educação Popular dentro do contexto Universitário com os (as) acadêmicos (as).
Os espinhos, as sementes, as raízes, tudo estava lançado como elemento, ou elementos que estariam no caminho, tudo isso seria a preparação e ao mesmo tempo a construção de diferentes contextos dialógicos a serem procurados e realizados.
Então, ao terminar o ano de 2010 com aquela expectativa e, uma vontade ao mesmo tempo de chegar o momento para trabalhar, claramente expressava meu receio no caminho a trilhar.
A primeira vez agente nunca esquece...
Levanto da cama por volta das 7 horas, tomo um banho, tomo um café, já imaginando como se decorreriam os trabalhos do primeiro dia da disciplina, mais precisamente dia 16 de março, uma quarta feira, assim como seriam outras quartas nas semanas que viriam.
Chego à universidade, me encontro com a professora e nos dirigimos para a sala de aula e logo os alunos vão chegando, ao se apresentar a professora e eu falamos como a disciplina se decorrerá e entramos em questões no que diz respeito às relações pessoais, os diálogos, assim refletimos que: compreender as relações sociais nos diversos âmbitos da vida humana, não é uma missão fácil. Cada indivíduo com sua forma de ser, agir e pensar. No entanto sabemos que o ser humano necessita da relação com outras pessoas, relações estas que estabelecidas trazem/fazem o desenvolvimento da totalidade humana.
A elaboração crítica e criativa das relações entre sujeitos diferentes pressupõe assumir a conflitividade deste processo, requer criar condições para compreendê-la e para atuar em contextos complexos, justamente para se conseguir elaborar formas emancipatórias de relação social que favoreçam a superação dos processos de sujeição e exploração que tem marcado nossa história (Fleuri, 1998, p. 47).
Em torno desta visão, onde devemos criar contextos educativos que favoreçam a integração criativa e cooperativa de diferentes sujeitos e entre os seus contextos sociais e culturais (Fleuri, 1998), é que percebemos a importância de investigar as relações entre as culturas.
O balaio do saber, foi uma atividade em que enfeitei a sala com a pele da Bernunça e, trouxe um balaio e várias tiras de papel. Pedi para os/as acadêmicos (as) colocassem palavras sobre Educação Popular neste balaio, no entanto isso após refletir sobre a seguinte poesia:
Após a leitura e reflexão desta poesia, conseguimos realizar um diálogo construtivo e compreender não um conceito ou definição de educação popular, mas sim que a educação popular não é uma forma linear, sistemática e vertical de aprender, mas como dizem os próprios acadêmicos (as).
Outra riqueza que levo comigo é a simplicidade e importância da ação coletiva, simplicidade de elaborar e produzir, e importância que ela tem sobre os envolvidos, principalmente aqueles que promovem. (Iara Campos)
Neste sentido, sobre a ação coletiva e a educação popular propriamente dita NETO nos diz que:
Educação popular não comporta a investigação por meio de cálculos lógicos, estando desprovido de interpretação. Não se está propondo o exame de um discurso que expresse símbolos primitivos determinadores de combinações simbólicas, construindo regras geradoras de novas regras de inferência que contenham expressões definidoras para outras novas regras. E, muito menos, que o seu percurso de chegada, por meio de formulações axiomáticas, seja a expressão da verdade última. (Neto 2005, p. 3 e 4)
Os diálogos decorreram das falas das acadêmicas para discussões sobre a posição das pessoas na sociedade, a agitação com que leva-se a vida, o não olhar para o outro e, principalmente os modos de aprender e ensinar, que por muitos e muitos anos foram e continuam sendo padronizados e priorizando uns (o da elite) em detrimento a outros (o conhecimento popular).
Ainda nesta questão entramos também no que diz respeito à conflitividade entre o saber popular e o cientifico, e neste caso observamos também que além dos conflitos pouco se fazem correlatos, ou seja, pouca interação entre ambos. Todas essas falas partiram das discussões e das experiências de cada um.
A praça XV, o Mercado Público, o Palácio Cruz e Souza: a 1ª aula fora das quatro paredes
Nesta parte de nossa disciplina, começou-se a trilhar e, literalmente trilhar novos caminhos no que diz respeito a novas formas de saber. A construção coletiva do que é ser um educador popular e, principalmente que este deve ser um observador aguçado e, que ensinar exige pesquisa como nos fiz Paulo Freire nos subsidiou:
Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que-fazeres se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino continuo buscando, procurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago, e me indago. Pesquiso para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade (Freire 1996, p. 29)
Observando o que (Freire 1996) nos diz sobre a pesquisa. e o aprender com o outro, algo que foi muito refletido nesta disciplina foi o que o Grande mestre também nos ensinava, que: ensinar exige respeito aos saberes dos educandos (FREIRE 1996, p. 30).
Sobre as saídas da Universidade para o ‘’mundo’’ uma das acadêmicas nos disse em relatório avaliativo que:
Com as aulas , as saídas de campo eu percebi que o conhecimento vai muito além das 4 paredes e das páginas dos livros. A verdadeira aprendizagem é aquela que podemos concretamente vivenciar, aquela que pode nos aproximar do outro através de um diálogo verdadeiro. (Daiana do Amaral)
A ida a praça revelou-se como um apanhado de cores, pessoas, cheiros, culturas, gestos, sons, entre outras manifestações, já o Palácio Cruz e Souza fez-nos refletir de como a cultura popular foi representada de forma elitizada, ou seja, o grande poeta recebeu uma homenagem que barra as pessoas de visitá-lo, cobrando taxas para conhecer a casa que foi do governo. Já o mercado Publico, mostrou a cultura portuguesa, os feirantes e tudo que ali pode-se encontrar de diversidade. Isto tudo foi conversado e ficou para ser e foi desvendando-se nos diálogos das próximas intervenções.
Outra atividade muito interessante foi a que chamei de ciclo de palavras geradoras. Coloquei um circulo no quadro e pedi para que cada um (a) coloca-se uma palavra que achasse pertinente na questão da ida a campo, bem como na reflexão de seus conceitos/ideias. Veja as palavras2 que apareceram e tiveram uma relação enorme com o trabalho de PF e ainda geraram discussões interessantíssimas em torno da Educação Popular, tais como: Por que a educação do povo não é respeitada na universidade? Por que aprendemos na academia pouco da realidade do mundo? Por que a escola tem murros que cobrem o mundo lá fora?
Nesta intervenção, podemos relatar que não foi possível manter contato antes da realização da mesma. Dessa forma a professora Maristela trouxe uma atividade que muito agradou, pelo menos era possível notar que os acadêmicos demonstraram bastante entusiasmo nos trabalhos realizados.
Como estagiário docente, ou aprendiz de professor como relata sua ex-aluna, resolvi participar da atividade proposta pela professora de uma maneira bem livre, aproveitando o momento para um grande aprendizado a partir das palavras e reflexões da professora. O modo com que foi realizado todo o momento foi digno de observação e anotação neste registro. Maristela recebeu-os com um Bom Dia e, logo pediu para que entrassem na sala/espaço do corpo. Mostrando a todos que era para ficar a vontade, passou um sentimento de liberdade, leveza naquele momento. Descalço, podendo sentir a madeira, colchões foram espalhados para todos se sentissem mais tranquilos. A entrada de uma amiga de Maristela que, parecia estar com pressa foi engraçada, quando todos pensavam que a moça não iria entrar Maristela insistiu para que viesse dar um bom dia e feliz páscoa para todos e, assim o fez com a moça na frente de todos. E com isso nos mostrou algo que é constante em nosso dia a dia, as pessoas estão com tanta pressa que não conseguem dar bom dia, mas o bom dia pode ser dado, se pararmos pra pensar em sua imensa importância como seres humanos.
A atividade era de encontramos em letras de música elementos da educação popular. Foram colocadas musicas de diferentes gêneros: caipira, outra que falava da juventude, outra das coisas do campo. Cada música que nos era colocada chamava atenção de alguma forma para cada um dos acadêmicos. Uns fechavam seus olhos, outros deitavam, outros sentavam.
Nas palavras da professora a cada reflexão notávamos que as músicas tinham muito mais do que melodias, ou refrões, ou até mesmo a beleza dos sons dos instrumentos. Podíamos perceber similitudes com a vida cotidiana do homem/mulher do campo, do jovem que vive com suas apreensões, do caipira que cria seus animais pra sobreviver. Ainda mais notar que nessas semelhanças com a vida estão formas esplendorosas de saberes, que podem parecer tão simples como os são, mas que revelão visões do que é a educação popular, de como aprendemos, de como levamos saberes de nossas histórias. Nessa oportunidade sinto-me na vontade de colocar uma poesia que utilizei com a turma no segundo encontro para explicitar estas reflexões:
Em uma das atividades, foi proposto que se construísse um livro. Deveriam ser colocados pensamentos, reflexões, palavras, versos, poesias, ou seja, qualquer forma de expressão escrita. Pude perceber que muitos dos acadêmicos utilizaram desenhos, linhas, misturados com palavras, histórias. Notei uma grande sintonia dos trabalhos com nossas discussões sobre educação popular, observando palavras em alguns trabalhos tais como: Educação, Liberdade, Povo, Histórias, entre outras.
Por volta de 10 horas tivemos que sair da sala em questão de conseguir o espaço apenas até aquele horário. Retornando 20 minutos depois em sala, resolvemos fazer um circulo de cultura, todos em volta de uma mesa para debatermos as relações das duas últimas aulas com o pensamento de Paulo Freire e a Educação Popular.
Ao debater sobre este assunto, posso dizer com certeza que em educação popular nada se faz só, e que o coletivo está acima de tudo, PF mostrava com simples expressões estas afirmações dizendo que: Não é de A para B, nem de A sobre B, e vice versa, é de A com B.
Esta experiência de diálogo que o educador tanto prezava, foi podada desde a colonização Européia ao chegar às terras hoje denominadas Brasileiras e sempre expressar-se com o grau de hierarquia que não possibilitavam os habitantes que por aqui vivam a indagar, questionar, dialogar. Assim sendo o Brasil ainda é um país inexperiente no diálogo. Por esta razão dizia o próprio: Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão (FREIRE, 1987, p.78.)
Um dos educandos nos disse algo que realmente nos deixou feliz, ao ser questionado sobre como estava o andamento da disciplina e falou que: Estava feliz: estou feliz por terem me recebido do jeito que sou, mesmo sabendo que não faço o necessário, que não estou lendo os textos, pois não tenho costume de ler, vocês me aceitaram como sou. Com esta frase podemos ressalvar o que PF nos diz: A humildade exprime uma das raras certezas de que estou certo: A de que ninguém é superior a ninguém. Contudo, o próprio Paulo Freire também nos diz em várias de suas obras que ensinar e aprender exige pesquisa e busca de saberes, dessa forma é valido salientar que a busca de novos olhares e perspectivas, e que esta busca seja instigada no outro é completamente importante na educação.
Em se tratando do diálogo, que é composto pelas palavras e, que as palavras fazem as relações, Jorge Larrosa, faz apontamentos que elucidam para esta comunicação através das palavras, algo que Freire também diria, que eu Larossa descreve da seguinte maneira:
Eu creio no poder das palavras, na força das palavras, creio que fazemos coisas com as palavras e, também, que as palavras fazem coisas conosco. As palavras determinam nosso pensamento porque não pensamos com pensamentos, mas com palavras, não pensamos a partir de uma suposta genialidade ou inteligência, mas a partir de nossas palavras. E pensar não é somente “raciocinar” ou “calcular” ou “argumentar”, como nos tem sido ensinado algumas vezes, mas é sobretudo dar sentido ao que somos e ao que nos acontece. (Bondía, 2002, p. 21)
E nestas palavras, diálogos que a disciplina construiu a partir da experiência de cada um, é que também pode-se tirar muitas lições de um momento vivido, momento este que pode ser visualizada a partir destas imagens:
Outro ponto positivo foi ter participado dos encontros com os índios, a conversa que tivemos com eles foi algo muito interessante. Aproximamos-nos de sua cultura, forma de vida, da fala. Tivemos experiências e informações. (Dyana de Carvalho).
Dessa forma cabe ressaltar a “Salada cultural” realizada no evento com a licenciatura indígena. Os acadêmicos foram convidados a realizar uma grande salada de frutas para os 3 povos indígenas do curso de licenciatura dos povos indígenas3, oportunizando uma experiência que para quase todos os acadêmicos foi nova. Nesta passagem explicitar a importância do diálogo é mais que importante, senão fundamental e através do diálogo e, ainda mais intercultural, novas possibilidade e novos saberes podem começar a concretizar-se. O diálogo é a palavra, pois vivemos da palavra, falamos palavras, ouvimos palavras e pensamos com ela.
Este estágio docência fez-me perceber que o educador é realmente educador, quando se transforma, quando transformar as palavras em ações e consegue sempre se transformar.
Muitas coisas ainda poderiam ser faladas, mas resolvi fazer este diálogo com você para de alguma forma experimentar o que senti e como senti. O que ficou, com certeza ficará, o que não ficou ainda pode se buscar. Educação é arte, cultura, saber é Popular.
Notas
Pedagogia do oprimido, 1969, Pedagogia da autonomia, 1986, Educação como prática de liberdade, entre outras.
Liberdade; Expressão; Comunicação; Diferenças; Cultura; Diversidade; Educação; Humanidade.
O curso de Licenciatura Intercultural Indígena do Sul da Mata Atlântica, contempla alunos de Santa Catarina e de outros estados, como Espírito Santo, Paraná, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo, que não dispõem desse tipo de formação. Seguindo o método da pedagogia da alternância, que prevê o aprendizado teórico em sala e períodos de aplicação prática nas escolas das aldeias. Os povos são os Xokleng, Guarani e Kaingang.
Referências bibliográficas
BONDIÁ, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Revista Brasileira de Educação, 2002.
FLEURI (Org.). Intercultura e movimentos sociais. Florianópolis: Mover/NUP, 1998. Florianópolis: Mover
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 1987.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Saberes Necessários à Prática Educativa. Editora Paz e Terra. Coleção Saberes. 1996, 36ª Edição.
MELO NETO, José Francisco de. Educação Popular. Sistema de teorias intercomunicantes. GT 06. 28ª Reunião da Anped, 2005.
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