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Pressupostos teóricos do brincar na educação infantil

Los presupuestos teóricos del juego en la educación inicial

Theoretical assumptions of play in early childhood education

 

Educador Físico pela Pontifícia Universidade

Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS)

Pós-Graduando em Motricidade Infantil pela Universidade

Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

Guilherme Ferreira de Ferreira

guilhermefdf@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O brincar na educação infantil aparece como uma importante forma de engajamento social, através da qual decorrem aprendizagens significativas. Na primeira infância, a criança é muito centrada nela mesma, construindo sua realidade trabalhosamente, adquirindo noções espaciais, temporais e do próprio corpo e, assim, diferenciando-se dos objetos ao seu redor. Por isso, durante algum tempo, com o pouco conhecimento de si mesma e das coisas, as crianças não estabelecem relações de grupo e centram o seu brinquedo exclusivamente em seus interesses. Teorias psicológicas abordam o brincar, em estudos, de diferentes formas. Por essa razão, o presente estudo visa abordar o brincar, e caracterizá-lo a partir de três teorias psicológicas, a saber: a sociohistórica, a cognitiva e a psicanalítica. Para tanto, foi realizada uma revisão teórica acerca do brincar, apresentando as suas principais abordagens, bem como destacando as suas relações com a educação infantil. Com este estudo, evidenciaram-se diferentes perspectivas para a compreensão do brincar, que focalizam o desenvolvimento social, cognitivo ou psíquico das crianças. Embora apresentem olhares distintos, entende-se que é fundamental trabalhar com o brincar em contexto de Educação Infantil, independentemente da abordagem teórica do professor.

          Unitermos: Brincar. Educação Infantil. Teorias psicológicas.

 

Abstract

          The play appears in early childhood education as an important form of social engagement, through which derive significant learning. In early childhood, the child is very focused on herself, painstakingly constructing their reality, acquiring spatial concepts, temporal, and your body and thus distinct from the objects around it. So for some time, with little knowledge of itself and of things, children do not establish relations group and focus their interests solely on their toy. Psychological theories approach the play in studies of different forms. Therefore, this study aims to address the play, and characterize it from three psychological theories, namely the socio-historical, cognitive and psychoanalytic. To this end, we performed a literature review about the play, presenting its main approaches, as well as highlighting its relationships with early childhood education. This study proves that different perspectives for understanding the play, that focus on social, cognitive, or mental children. While presenting different looks, it is understood that it is essential to work with the play in the context of early childhood education, regardless of the theoretical approach of the teacher.

          Keywords: Playing. Early Childhood Education. Psychological theories.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 18 - Nº 182 - Julio de 2013. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    O presente estudo refere-se ao Estágio de Educação Física na Educação Infantil realizado no Colégio Marista Champagnat, uma escola privada de Porto Alegre, localizada no Campus da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Trata-se de uma instituição alicerçada em uma abordagem educativa que prioriza a formação integral de seus alunos e acredita que todo sujeito tem potencial para aprender.

    Na escola, a prática do estágio foi realizada com uma turma de crianças de 4 a 5 anos de idade, matriculadas na educação infantil. Vale dizer que a maioria dos alunos cursou a pré-escola na mesma instituição, fato que facilitou o relacionamento e a interação da professora com a turma, e também a adesão dos alunos a rotina escolar. O contato direto do estagiário com as crianças desde o início das atividades durante a tarde, e a forma como a professora da turma o inseriu em suas atividades contribuíram como pontos positivos na sua atuação. Isso porque, previamente a aula de educação física propriamente dita, o estagiário pode conhecer e se vincular as crianças, bem como elas se familiarizarem com a sua presença na turma.

    De acordo com a proposta pedagógica da escola para a educação infantil e com o planejamento da professora responsável pela turma, o plano de estágio em Educação Física baseou-se em atividades que contemplassem o conhecimento do corpo humano, a psicomotricidade, as expressões criadoras, além de brincadeiras que estimulassem as relações socioafetivas entre os alunos. Nas atividades propostas, estiveram jogos de desafio, tarefas em círculos, brincadeiras com bolas, exercícios de habilidades motoras, etc.

    Nos primeiros contatos com a turma, devido ao horário designado às atividades, a saber, o horário do recreio, evidenciou-se que o principal interesse dos alunos foi o brincar livre. Outro aspecto observado refere-se à qualidade das interações existentes. Percebeu-se que em um primeiro momento, a maioria das crianças não se integrou em brincadeiras durante o intervalo. Este aspecto foi reforçado em situações observadas em sala, e no horário das aulas especializadas, como por exemplo, na aula de inglês, quando se pôde perceber a falta de cooperação entre os alunos durante as atividades.

    Para entender as interações das crianças em idade pré-escolar, considera-se importante, primeiramente, abordar aspectos relacionados ao desenvolvimento na primeira infância. Vale dizer que tal conhecimento é fundamental para todos os profissionais que trabalham como essa população, incluído professores de Educação Física. Neste sentido, Freire (1997) afirma que a criança em sua primeira infância é muito centrada nela mesma, construindo sua realidade trabalhosamente, adquirindo noções espaciais, temporais e do próprio corpo e, assim, diferenciando-se dos objetos ao seu redor. Segundo esse autor, é normal que tal característica permaneça por algum tempo, pois o pouco conhecimento de si mesma e das coisas, faz com que elas não estabeleçam relações de grupo e centrem o seu brinquedo exclusivamente em seus interesses. Entretanto, essa “autocentração” é preocupante quando se estende por um longo tempo, atravessando a segunda infância, adolescência e idade adulta, por exemplo.

    Para tanto, ressalta-se o papel da educação infantil, incluindo o da disciplina de Educação Física, para o desenvolvimento das crianças, que neste espaço têm a oportunidade de brincar e conviver com pares e professores. Freire (1997) afirma que, nesta fase inicial da vida, deve-se valorizar a ação corporal a fim de que as aprendizagens se tornem significativas às crianças. Nesse sentido, a brincadeira na educação infantil aparece como uma importante forma de engajamento social, através da qual decorrem aprendizagens significativas. Por tal motivo, a seguir será realizada uma revisão teórica acerca do brincar, apresentando as suas principais abordagens teóricas, bem como destacando as suas relações com a educação infantil.

Pressupostos teóricos do brincar

    O brincar, segundo o Referencial Curricular Nacional (MEC/SEC, 1998) é umas das principais atividades para o desenvolvimento da identidade e da autonomia de crianças na educação infantil. Neste ato, a criança, além de interagir e se comunicar com um parceiro, desenvolve capacidades importantes como a atenção, a imitação, a imaginação e a memória. Na brincadeira, a criança amadurece a capacidade de socialização, na medida em que interage com os pares, compartilha regras e atua em papéis diferentes. É também através da brincadeira que a criança satisfaz grande parte de seus interesses e necessidades. Diante disso, a melhor maneira de envolver as crianças (alunos) em atividades no contexto escolar, é através do lúdico (DALLABONA & MENDES, 2004).

    Segundo Poletto (2005) três grandes teorias psicológicas oferecem subsídios para o estudo do brincar, são elas: sociohistórica (Vygotsky), cognitiva (Piaget), e psicanalítica (Winnicott). A seguir serão apresentadas brevemente alguns pressupostos das teorias mencionadas e suas relações com o brincar na primeira infância.

Teoria sociohistórica

    Na literatura a perspectiva interacionista (que fundamenta a teoria sociohistórica) norteia grande parte das investigações que abordam o brincar. Um dos pressupostos básicos de Vygotsky, principal autor desta corrente, refere-se ao fato de que “as origens das formas superiores de comportamento consciente – pensamento, memória, atenção, etc. – devem ser achadas nas relações sociais que o homem mantém” (BOCK, FURTADO & TEIXEIRA, 2002). Tal fato ressalta o papel ativo das crianças durante as relações sociais, o que também acontece em contexto de brincadeira, quando elas agem sobre o mundo e transformam essas ações, constituindo o funcionamento de um plano interno (BOCK, FURTADO & TEIXEIRA, 2002).

    O brincar não pode ser definido como uma atividade exclusivamente prazerosa à criança, uma vez que outras experiências podem oferecer um prazer ainda mais intenso, dependendo do resultado desta tarefa. O brinquedo, por sua vez, faz com que a criança crie um mundo de desejos realizáveis através da imaginação dela. Com isto, o brinquedo possibilita uma situação imaginária. Ele desempenha várias funções no desenvolvimento da criança, como: o preenchimento de suas necessidades, o envolvimento num mundo ilusório, o desenvolvimento de sua esfera cognitiva e o fornecimento de um estágio de transição entre o pensamento e o objeto real. (VYGOTSKY, 1998)

    Ademais, Vygotsky (1998) entende que a brincadeira cria as zonas de desenvolvimento proximal, que se refere à distância entre o nível de desenvolvimento real (capacidade da criança de resolver um problema sem ajuda) e o nível de desenvolvimento potencial (capacidade de resolução de um problema sob a orientação de um adulto ou em colaboração com outro companheiro). Para o autor, as zonas de desenvolvimento proximal proporcionam ganhos qualitativos no desenvolvimento infantil e, neste sentido, a brincadeira aparece como um caminho de transição para níveis mais altos de desenvolvimento.

    Nesta mesma perspectiva, o brincar é definido como uma maneira de interpretar e assimilar o mundo. As crianças, neste contexto, estabelecem relações e representações, o que trás vantagens sociais, cognitivas e afetivas na medida em que elas “extrapolam” seu mundo habitual. O brincar também é definido como uma atividade espontânea da criança, a qual se caracteriza pelo prazer, ludicidade e atividade mental (WAJSKOP, 1995). Quando brincam juntas, as crianças criam hipóteses, desenvolvem a imaginação, constroem relações e elaboram regras de convivência. A brincadeira livre, mesmo sendo não estruturada, possui regras que conduzem o comportamento das crianças em dados momentos. E essas regras, criadas entre os alunos, podem, inclusive, caracterizar brincadeiras de meninos e de meninas (CORDAZZO & VIEIRA, 2008). Tal fato pode ser evidenciado em um estudo realizado com 213 crianças em idade escolar, as quais foram entrevistadas em sala de aula e observadas durante o período do recreio. Nas entrevistas foi constatado que os meninos tendem a estereotipar mais brincadeiras do que as meninas (CORDAZZO & VIEIRA, 2008).

Teoria cognitiva

    A teoria cognitiva tem com um dos seus principais autores, o biólogo Piaget. Os estudos do autor estão voltados, sobretudo, ao desenvolvimento cognitivo. Piaget não discute a brincadeira em si, embora esta seja dotada de grande consistência. Em sua teoria, a brincadeira não recebe uma conceituação específica, sendo entendida enquanto ação assimiladora e aparecendo como forma de expressão de conduta, que é dotada tanto de características metafóricas como espontâneas. O autor toma a brincadeira dentro do conteúdo da inteligência, enquanto processo assimilativo, à semelhança da aprendizagem (BOMTEMPO, 2006).

    Para Piaget, quando a criança brinca, ela assimila o mundo da sua maneira, não havendo compromisso com a realidade. A interação com o objeto independe da natureza deste, mas sim da função que a criança lhe atribui (jogo simbólico). Inicialmente, o jogo se apresenta de maneira solitária, evoluindo para o estágio da representação de papéis, como por exemplo, o brincar médico, de casinha, etc. (BOMTEMPO, 2006). O brinquedo e o ato de brincar, nesta perspectiva, constituem-se em vínculos importantes na construção do conhecimento, neste instante, o individuo através da simbolização internaliza sua realidade.

Teoria psicanalítica

    Na teoria psicanalítica, o brincar é remetido a questões de ordem inconsciente, sendo considerado, inclusive, uma técnica de intervenção clínica no trabalho com crianças. De modo geral, para a psicanálise o brincar é entendido como uma forma de expressão, de fala, da criança, que consegue, ao brincar, manifestar questões inconscientes, que ainda não podem ser expressas em palavras. Freud, o pai da psicanálise, já dizia que a criança brinca ativamente com aquilo que ela vive passivamente. Por isso, a interpretação do brincar da criança é importante, o que pode, por exemplo, revelar uma ansiedade de separação, típica da infância, o que irá embasar a intervenção clínica. Por isso, para a psicanálise, o brincar é um facilitador da comunicação, propiciando experiências inéditas de desintegração e integração do paciente (FRANCO, 2003).

    Um dos autores dessa teoria foi Winnicott, que assim como outros psicanalistas importantes como Freud, Lacan, Mannoni e Dolto, era médico, e se interessou, logo no início da carreira, pela pediatria. Para Winnicott o jogo e a brincadeira são atos livres e criativos que emanam do sujeito e não da sociedade, através de regras estabelecidas ou de uma organização. Para o autor, o indivíduo deve encontrar um lugar para operar no mundo, o qual é propiciado pelas primeiras experiências. Esse lugar, que ele chama de espaço potencial, é o espaço do imaginário, do jogo, o qual é preenchido, num primeiro momento, por um objeto transicional (objeto que não é nem a criança nem a mãe, que surge de uma lacuna entre o infans e a mãe, que é escolhido e conservado pela criança). Trata-se de um espaço propriamente criativo, no qual a criança mobiliza todos os recursos disponíveis em sua personalidade, algo que só pode acontecer no ambiente da brincadeira. Para Winnicott, neste contexto é possível a manifestação de todas as partes do eu, não apenas do paciente, mas do analista também (FRANCO, 2003). Nesse sentido, na visão do autor, o brincar na sessão terapêutica promove o encontro do outro e o encontro de si mesmo (self verdadeiro).

Considerações finais

    Com base nas premissas acima expostas, ressalta-se a importância do brincar para os processos de aprendizagem e desenvolvimento das crianças. Independentemente do tipo ou das características da brincadeira, pode-se perceber, com a presente revisão, que o brincar é considerado um recurso importante que pode estimular o desenvolvimento infantil e proporcionar meios facilitadores para a aprendizagem, sobretudo no ambiente escolar.

    Com este estudo, evidenciaram-se diferentes perspectivas para a compreensão do brincar, que focalizam o desenvolvimento social, cognitivo ou psíquico das crianças. Embora apresentem olhares distintos, entende-se que é fundamental que o brincar seja trabalhado em contexto de Educação Infantil, independentemente da abordagem teórica do professor. Por isso, destaca-se a pertinência do conhecimento das diferentes correntes teóricas do brincar por parte dos professores para embasar o trabalho que realizam dentro da escola, os quais podem utilizar a brincadeira como recurso escolar, aproveitando uma motivação própria das crianças para tornar a aprendizagem mais atraente e significativa.

Referências

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