Fisiopatologias desencadeadas por helicobacter pylori. Uma revisão Fisiopatologias liberadas por helicobacter pylori. Una revisión |
|||
*Faculdades de Saúde e Desenvolvimento Humano Santo Agostinho **Faculdades Unidas do Norte de Minas (FUNORTE) ***Faculdades Integradas Pitágoras, FIP-Moc (Brasil) |
Tiago Vinícius Silveira Rocha* Welton Gonçalves Silva* Edson Rabelo Cardoso* ** Thales Almeida Pinheiro* *** |
|
|
Resumo O H. pylori é uma bactéria que habita o lúmen estomacal e é prevalente em cerca de 50% da população mundial. Algumas patologias como gastrite, úlceras gástricas e câncer gástrico podem ter correlações com esta bactéria. Acredita-se que a explicação de alguns indivíduos apresentarem tais patologias está no gene que a bactéria irá apresentar (CagA e VacA). A união dos genes da ilha de patogenecidade (PAI) CagA e os subtipos de VacA irá proporcionar cepas de diferentes graus de virulência. Unitermos: Helicobacter pylori. Fisiopatologia. Genes associados. Interleucinas.
|
|||
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 18 - Nº 181 - Junio de 2013. http://www.efdeportes.com/ |
1 / 1
Introdução
A bactéria Helicobacter pylori foi isolada pela primeira vez por dois pesquisadores na Austrália, Warrem e Marshall em 1983, os quais receberam o prêmio Nobel de Medicina. Tal descoberta foi de fundamental importância para o desenvolvimento de pesquisas relacionadas às patologias gastrointestinais antes não estudadas e revolucionou a forma de entender e tratar tais infecções correlacionando-as com várias doenças¹. A H. pylori é uma bactéria gram-negativa, que possui em sua estrutura 4 a 8 flagelos e mede aproximadamente 3µm de comprimento por 0,5µm de largura, possuindo uma forma espiralada que lhe confere motilidade e aderência para sua colonização no epitélio gastrointestinal2, onde é considerado até o presente o principal reservatório deste patógeno3. O gênero Helicobacter não fermenta nem oxida carboidratos, embora possa metabolizar aminoácidos por vias fermentativas. Para o seu crescimento é necessário um meio complexo de cultivo suplementando com sangue, soro, carvão, amido ou gema de ovos em condições microaerofílicas, ou seja, quantidade diminuída de oxigênio e aumento de dióxido de carbono, em uma faixa de temperatura em torno de 30ºc.4
A infecção por H. pylori acomete principalmente o público infantil e tem um predomínio maior em países subdesenvolvidos. A sua transmissão ainda não é bem elucidada, mas já se sabe que a única forma do micro-organismo alcançar a mucosa gástrica é através da transmissão oral-oral ou fecal-oral. Alguns fatores de risco contribuem para esta infecção, tais como: etnia, sexo e idade5.
O epitélio gastrointestinal possui um mecanismo de autoproteção que é formado por um complexo glicolipoprotéico que impede a infiltração de muitos corpos estranhos, porém a H. pylori em contato com esta barreira sintetiza proteases e fosfolipases que irá decompô-lo deixando o indivíduo mais susceptível6, liberando também a enzima urease que proporciona um ambiente adequado para sua proliferação no lúmen estomacal, convertendo a uréia em amônia e CO2 por ação da enzima urease, basificando assim o meio, deixando-o favorável ao seu crescimento7. Existem diferentes cepas de H. pylori que são classificadas devido aos vários genótipos que foram associados aos fatores de virulência, riscos a doenças gástricas e demais desfechos da infecção8. Entre vários genes que pode compor uma cepa, está o VacA, que foi encontrado em todas os tipos de H. pylori. Este gene é responsável por codificar uma citocina vacuolizante que está associada a altos níveis de inflamação e danos epiteliais à mucosa gástrica. Já o gene CagA é um marcador de presença da ilha de patogenicidade Cag (PAI). Muitos genes do Cag PAI codificam uma proteína que aumentam a produção de interleucinas pró-inflamatórias como IL-1β e IL-8 que estão associadas ao câncer gástrico9. Após a colonização destas cepas, o organismo desencadeia uma resposta inflamatória e imune local, que é caracterizada pela infiltração de neutrófilos, monócitos, linfócitos e plasmócitos que estimulam o aumento da liberação desarcebada de citocinas pró-inflamatórias9, como as interleucinas (IL1, IL2, IL6 e IL8), Interferon-γ e Fator de Necrose Tumoral-α (TNF)1. Com um aumento na produção de interleucina-1β e de TNF, que é um potente inibidor da secreção gástrica, é desencadeada uma inflamação no epitélio gástrico, embora as respostas inflamatória e imune possam agravar as lesões degenerativas do epitélio causado pela bactéria, estas não serão capazes de eliminá-la1,9. Através de estudos, é possível concluir que a patogenia da gastrite, da úlcera crônica, da duodenite e da ulcera duodenal não é mais considerada somente um desequilíbrio do sistema imunológico do hospedeiro e das secreções gástricas, mas há muitos fatores envolvidos5. Com as lesões provocadas pela colonização no epitélio gástrico, há predisposição a um aumento na liberação do ácido gástrico mediado pela gastrina, onde o indivíduo irá conviver toda a vida com uma gastrite crônica superficial ou chegar a uma forma mais grave como Ulcera gástrica, ulcera duodenal, adenocarcinoma gástrico ou linfoma gástrico9. O excesso de acidez provocado pela liberação de ácido clorídrico no estômago faz com que esse ácido seja carreado para o duodeno, o que contribui para a fisiopatologia da ulcera duodenal. No duodeno, a H. pylori inibe a ação do bicarbonato secretado no suco pancreático, favorecendo uma acentuada diminuição da resistência da mucosa duodenal, o que predispõe ao desenvolvimento de metaplasia gástrica que pode evoluir para uma duodenite erosiva com úlcera duodenal6.
Revisão de literatura
Epidemiologia
Aproximadamente metade da população mundial está infectada pela H. pylori, que tem uma prevalência maior em países em desenvolvimento, sendo frequentemente adquirida na infância9, pois está intimamente relacionada ao estilo de vida das diferentes áreas geográficas. Nestes países, cerca de 80% dos indivíduos na faixa etária de 20 anos estão infectados, já nos países desenvolvidos a media é de 20 a 30% em indivíduos nesta mesma idade, o que comprova uma irregularidade de infecção por H. pylori em nível mundial2.
Alguns estudos demonstram a incidência de infecção por H. pylori por ano em países de diferentes etnias, sendo que em crianças nos Estados Unidos é de 1,9%, no Japão 1.1%, na Inglaterra 2.7% e na Finlândia de 0,3%5. No Brasil também foram realizados estudos com crianças em várias cidades e os seguintes resultados foram obtidos: Rio de Janeiro (RJ) 59,5%, São Paulo (SP) 73,6%, Santa Maria (RS) 83%, Nossa Senhora do Livramento (MT) 84,7%, Botucatu (SP) 85,18, Araçuai (MG) 87%, Campinas (SP) 89%, São Luiz (MA) 96%7.
Mecanismo de infecção bacteriana
Através de sua motilidade, a H. pylori adere às células epiteliais e muitas vezes colonizando entre elas, assim facilitando que seus produtos tóxicos sejam liberados, estimulando a produção de citocinas10. Tais citocinas atuam como mediadores celulares por meio da proliferação, maturação, diferenciação, ativação ou inibição de diferentes células do sistema imunológico.
Depois de colonizar o aparelho digestório, a H. pylori pode danificá-lo através da produção de enzimas como a urease que interfere no ciclo da amônia e também apresenta efeitos tóxicos sobre as células gástricas, induzindo-as a produzir citocinas11. A grande quantidade de uréia produzida pelo micro-organismo permite a detecção do subproduto alcalino em menos de duas horas4. Fosfolipases e mucinases provocam ruptura da membrana gástrica. Outros fatores patogênicos da bactéria, principalmente o VacA e CagA também estão envolvidos nesse mecanismo de patogenicidade, visto que estes genes vão determinar a cepa bacteriana e o grau de virulência da mesma11.
O gene CagA foi o primeiro identificado na H. pylori e é considerado altamente virulento pela associação da alta expressão de citocinas, tais como IL1β e IL8. Este gene é considerado marcador da ilha de patogenicidade cag (cag-PAI) encontrado em cerca de 60% das cepas ocidentais. O Cag-PAI faz parte da ilha de patogenicidade da H. pylori e contem genes homólogos ao de outras bactérias que codificam proteínas de secreção que ajudam estas bactérias a injetar suas moléculas efetoras na célula hospedeira, permitindo que ela modifique vias de metabolismo celular do hospedeiro como, por exemplo, a expressão de proto-oncogenes.7 A citoxina vacuolizante é codificada pelo gene VacA, está presente em todos os microorganismos, porém somente 65% destas esta na sua forma ativa, sendo responsável pela formação de vacúolos nas células epiteliais. O gene VacA se divide em duas seqüências sinalizadoras, S1 e S2. S1 se divide em subtipos S1a, S1b e S1c, e duas seqüencias moduladoras, M1 e M2. Serão as combinações destas seqüências que indicarão a patogenecidade da cepa12. Estudos comprovaram que a combinação dos alelos CagA+ S1M1 foram isolados em maior número de casos de câncer gástrico, concluindo que esta combinação é mais virulenta. Bactérias com genoma M1 estão relacionadas a maior liberação de toxinas, sendo isto a principal causa de lesão e, consequentemente, inflamação da mucosa gástrica, o que contribui para a gênese do câncer gástrico13.
Patologias associadas
A gastrite aguda quando causada por infecção por H. pylori tem um período de incubação que varia de três a sete dias, podendo provocar vários sintomas no indivíduo como pirólise, mal estar epigástrico, vômitos, flatulência, cefaleia e náuseas, podendo variar suas manifestações num período de uma a duas semanas. Na quase totalidade dos casos, a infecção não tratada permanece indefinidamente como de quadros de gastrite crônica. O diagnóstico poderá ser baseado em histologia, teste respiratório com carbono 13 ou 14, cultura do micro-organismo isolado e teste da uréase. Pode-se também utilizar a sorologia, apesar de que em muitos pacientes recentemente infectados possa ocorrer resultados falso-negativos14.
Já a gastrite crônica é a mais frequente patologia causada pela H. pylori, não é acompanhada por alterações significativas na secreção de ácidos gástricos e não leva a complicações graves2. Mesmo esta bactéria sendo o principal fator causador da gastrite crônica, alguns estudos não encontraram correlação entre sintomas gastrointestinais e extensão ou intensidade da gastrite por H. pylori14. A gastrite crônica é considerada um fator de risco para o carcinoma gástrico, onde a H. pylori tem íntima relação com essas neoplasias4.
O câncer gástrico e o linfoma MALT (linfoma da mucosa associada ao tecido linfóide) foram associados à H. pylori, e a bactéria foi categorizada como um carcinógeno grupo I pela Agência Internacional para Pesquisa em Câncer (IARC). Embora esta associação seja razoavelmente forte, não esta completamente claro se há uma relação causal envolvida14.
Existem dois mecanismos relacionados pelos quais a H. pylori poderia promover câncer. Um mecanismo envolve o aumento da produção de radicais livres, aumentando a taxa de mutação nas células do hospedeiro. O outro mecanismo proposto foi chamado "via perigenética" e envolve o aumento da transformação do fenótipo das células do hospedeiro por meio de alterações nas proteínas celulares, como as proteínas de adesão14. Foi proposto que a H. pylori induz inflamação e altos níveis locais de TNF-alfa e/ou interleucina6. De acordo com o mecanismo da via perigenética proposto, moléculas de sinalização associadas à inflamação como TNF-alfa podem alterar a adesão entre as células epiteliais gástricas e levar à dispersão e migração destas células transformadas, sem a necessidade de mutações adicionais nos genes supressores de tumor como genes que codificam proteínas para adesão celular13.
Considerações finais
Apesar de ser um microrganismo que pode levar o indivíduo a várias complicações e até a morte pela carência de um tratamento precoce ou não específico, a H. pylori é considerada um agente causador de infecção crônica, em que muitos indivíduos são hospedeiros e não apresentam nenhum sinal e/ou sintomas. Assim, esse patógeno poderá sobreviver no organismo humano, não prejudicando de maneira substancial a sua fisiologia.
Referências
Siqueira J. S; lima P. S. S; Barreto A. S; Quintans-Júnior L. J. Aspecto Gerais nas Infecções por Helicobacter Pylori: Revisão. RBAC, vol. 39(1): 9-13; 2007.
Cunha. A. R. B; Areias J. A. A. P. Cancro Gástrico e Helicobacter Pylori. Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar/ Universidade do Porto Porto; 2010.
Silva L. D. L, Gonçalves T. M; Alencar J. S; Nunes O. S; Vasconcelos A. C. A; Santana DP. Atenção Farmacêutica a Pacientes com Gastrite Helicobacter pylori Positivo. Infarma. Vol.16(7/8): 72-74; 2004.
Murray P R. et al. Microbiologia Médica; Ed. Guanabara Koogan; 4ª edição. p. 276-279. 2004.
Kodaira M. S; Escobar A. M. U; Grisi S. Aspecto Epidemiológico do Helicobacter Pylori na Infância e na Adolescência. Revista saúde Publica; 2002; 36(3);356-69.
Ferreira P. M. N. M. Helicobacter Pylori. Universidade da Beira Interior. Faculdade Ciências da Saúde; 2008.
Ladeira M. S. P; D. M. F; Salvadori D M F; Rodrigues M. A. M.. Biopatologias do Helicobacter Pylori. Jornal Brasileiro de Patologia e Medicina Laboratorial. Rio de Janeiro, v. 39, n. 4, p. 335-342, 2003.
Presidente.R. H. H; ET AL. Helicobacter Pylori nos Países em Desenvolvimento. Word Gastroenteroloy organisation; 2010.
Souza M. C. Atividade Anti-Helicobacter pylori In Vitro de Plantas Medicinais do Cerrado Mato-Grossense e Atividade Anti-Helicobacter pylori In Vivo do Extrato Hidroetanólico e Fração Diclorometãnica (DCM2) de Calophyllum brasiliense CAMB. (Clusiaceae). Cuiaba, MT; 2008.
Silva M.R; Sampaio A; Almeida A; Balseiro S; Santos P; Carvalho L. Identificação dos polimorfismos dos genes IL1β, IL1RN na gastrite crônica associada à infecções por Helicobacter pylori e no carcinoma gástrico. GE-J Porte gastrenterol; 15:8-14; 2008.
Meine G. C. Relação pela infecção pelo Helicobacter Pylori linhagem cagA-Positiva e riscos de câncer gástrico. Porto Alegre;2006.
Roveran V. Expressão local do fator de necrose tumoral alfa (TNF α) na ruptura prematura de membranas. São Paulo:2008.
Thomazini C. M: Et al. Infecção por Helicobacter pylori e câncer gástrico: freqüência de cepas patogênicas cagA e vacA em pacientes com câncer gástrico. J Bras Patol Med Lab v. 42. Nº 1. p. 25-30. Fevereiro 2006.
Lopes A. C. Tratado de Clinica Medica. Editora Roca ltda. Vol.1; p.978-993; 2006.
Outros artigos em Portugués
Búsqueda personalizada
|
|
EFDeportes.com, Revista Digital · Año 18 · N° 181 | Buenos Aires,
Junio de 2013 |