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A ludicidade e a educação infantil: algumas reflexões

La ludicidad y la educación inicial: algunas reflexiones

 

*Licenciado em Educação Física pela Faculdade Bandeirantes de Educação Superior, UNISUZ

Licenciado em Pedagogia pela Universidade Nove de Julho, UNINOVE

**Licenciada em Educação Física pela UNESP Bauru

Mestre e Doutora em Ciências da Motricidade pela UNESP Rio Claro

Leandro Andrade Sanches*

Fernanda Rossi**

leandroasanches@yahoo.com.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O presente artigo objetiva refletir sobre as relações entre o brincar e a educação infantil com o foco na relevância da ludicidade, presente nos jogos e brincadeiras, para o desenvolvimento integral da criança. Verifica-se que o brincar e o movimento podem ser instrumentos de aprendizagens diversas, pois na atividade lúdica a criança aprende e se desenvolve com prazer. Entretanto, não podem se reduzir a funções secundárias, pois brincar traz em si diversos significados e enriquece o desenvolvimento infantil.

          Unitermos: Educação Infantil. Brincar. Ludicidade.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 18 - Nº 181 - Junio de 2013. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Ao refletir sobre o desenvolvimento integral da criança na educação infantil remete (re)pensar uma das ações infantis cotidianas e prioritárias do ponto de vista da criança: o brincar.

    Apesar de valorizado na sociedade e na escola, o brincar muitas vezes é deixado de lado em função de outras atividades escolares, como a aprendizagem da leitura e da escrita e da matemática. No entanto, a criança se desenvolve de modo integral, ou seja, na sala de aula não está apenas desenvolvendo o cognitivo, enquanto no pátio ou na quadra desenvolveria o aspecto motor. As aprendizagens para a criança ocorrem de modo integral nas suas variadas dimensões, como a cognitiva, a motora, a social e a afetiva.

    O objetivo desta pesquisa consistiu em refletir sobre as relações entre o brincar e a educação infantil com o foco na relevância da ludicidade, presente nos jogos e brincadeiras, para o desenvolvimento integral da criança.

    Entende-se que no decorrer dos anos letivos o tempo para as atividades motoras e a ludicidade são cada vez mais escassos, pois em muitas escolas persiste ainda o entendimento de que o tempo destinado às atividades lúdicas e motoras deve ser apenas o do “recreio”, nos demais momentos apenas o aspecto cognitivo deve ser desenvolvido em sala de aula. É preciso, portanto, refletir sobre o brincar na infância na tentativa de superar essa concepção.

    A Educação Infantil é a fase em que a criança encontra-se em pleno desenvolvimento e formação de sua personalidade, necessitando assim da interação e socialização com o próximo, pois na interação com o outro, por meio da brincadeira, desenvolve-se em diversos aspectos.

    Propôs-se nesse artigo um estudo de abordagem qualitativa na qual, de acordo com André (1995), é essencial considerar as interações e as influências existentes entre os componentes de uma situação, além de buscar a interpretação e compreender que fatos e valores estão relacionados. Foi realizada pesquisa bibliográfica da produção acadêmico-científica brasileira (SEVERINO, 2007), abordando os temas da ludicidade, dos jogos, brinquedos e brincadeiras, da infância e da educação infantil, bem como as interações entre esses elementos. Na sequência seguem as reflexões proporcionadas pela literatura pesquisada.

O brincar, a ludicidade e a educação infantil

    O brincar oferece à criança diversas capacidades fundamentais para o seu desenvolvimento, pois brincando a criança se movimenta, cria situações e interage com o outro, trocando experiências e informações.

    No universo dos jogos e das brincadeiras a ludicidade se faz presente. Segundo Barbanti (2003, p. 375) lúdico é o “que tem caráter de jogos, brinquedos e divertimento”. Existem vários tipos de atividades que são comumente denominadas de jogos ou brincadeiras, mas cada um com sua especificidade: jogos de adultos, jogos de tabuleiros, jogos de adivinhações, contar histórias, quebra-cabeça, o brincar de casinha, entre muitos outros. Uma grande variedade de jogos, e as diferentes intencionalidades ao exercer sua prática caracterizam a complexidade para uma definição concreta de “jogo”. Cada contexto social constrói sua imagem de jogo, conforme seus valores e estilos de vida, expressos por meio da linguagem (KISHIMOTO, 2002).

    Barbanti (2003, p. 75) assim define “brincadeira”:

    Atividade lúdica livre, separada, incerta, improdutiva, governada por regras e caracterizada pelo “faz de conta”. É uma atividade bastante consciente mas fora da vida rotineira, não séria e que absorve a pessoa intensamente. Ela se processa dentro de seus próprios limites de tempo e espaço de acordo com regras fixas e de um modo ordenado.

    Acredita-se que a ludicidade pode estar presente em todos os tipos de jogos ou brincadeiras, pois a intencionalidade do praticante é quem vai determinar o caráter lúdico da atividade.

    O jogo infantil é caracterizado normalmente pelos sinais de prazer ou da alegria da criança participante, pois ao brincar ela sorri e se diverte, processo esse que traz diversos efeitos positivos para o desenvolvimento corporal, moral e social da criança (KISHIMOTO, 2002). Assim sendo, o brincar está relacionado ao prazer, e aprender brincando torna-se mais prazeroso para criança. O lúdico é uma atividade natural da criança, sem qualquer tipo de compromisso secundário, envolvendo a espontaneidade e o prazer, pois a atividade lúdica é antes de qualquer coisa, um estado de espírito e um saber que aos poucos o ser vai se apropriando e impondo em seu cotidiano (SENA; AYRES DA SILVA, 2010).

    Entende-se que a ludicidade deve ser mais explorada e valorizada pela escola, pelo(a) professor(a), pelos adultos, pois ela proporciona momentos de prazer e alegria à criança, fornecendo uma aprendizagem prazerosa, envolvendo todos os aspectos necessários no processo educativo.

    A finalidade da educação infantil consta no artigo 29 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96):

    A educação infantil, primeira etapa da Educação Básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade. (BRASIL, 1996).

    E as diretrizes atuais para a educação infantil enfatiza no artigo 4º da Resolução nº 5/2009 que “as propostas pedagógicas da Educação Infantil deverão considerar que a criança, centro do planejamento curricular, é sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia”. Desse modo, é preciso compreender que a criança “constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura” (BRASIL, 2009).

    Vale também ressaltar que o brincar está presente entre os conteúdos e objetivos do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (BRASIL, 1998), enaltecendo o valor das brincadeiras como um componente curricular para a educação e o desenvolvimento pleno da criança.

    Ao brincar a criança pode ser o que quiser, imagina o futuro, refaz o passado, criando e recriando diversas situações. Quando a criança está brincando o tempo na sua percepção é sempre curto, pois a atividade que desenvolve lhe dá prazer e a criança brinca sem querer parar, já que lhe é agradável, diferente de atividades desagradáveis em que não vê a hora de acabar (VELASCO, 1996).

    Pode-se observar até aqui que os jogos e as brincadeiras podem ser considerados ferramentas pedagógicas de extrema importância e contribuição para o desenvolvimento pleno da criança. Mas, também é possível notar que no decorrer dos anos escolares as atividades motoras e a ludicidade são cada vez mais escassas, demonstrando a supervalorização nas chamadas “habilidades acadêmicas”, deixando de lado o brincar e “engessando” crianças em pleno desenvolvimento. Lordelo e Carvalho (2003, p. 16) descrevem uma vivência desse modelo de aprendizagem na Educação Infantil:

    Um caso exemplar pode ilustrar a obsessão da educação infantil com as habilidades acadêmicas: em uma visita a creche [...] pudemos presenciar uma cena representativa da concepção de creche como escola. [...] No berçário, além das pessoas que cuidavam das necessidades corriqueiras das crianças, havia uma professora com a função específica de estimulação, chamada, apropriadamente, “a estimuladora”. Quando entramos na sala, vimos duas crianças (de um ano e um mês e um ano e três meses) sentadas a uma pequena mesa, segurando pincel atômico e riscando um papel. Uma das crianças parou o “trabalho” e olhou para nós. A estimuladora se abaixou, pegou a mão da criança e guiou-a para riscar o papel.

    Por vezes, a expectativa das instituições de educação infantil e, também, da família, para que a criança ingresse nos anos iniciais do Ensino Fundamental sabendo ler e escrever, acarretam, em muitos casos, a desconsideração das etapas da vida da criança, negligenciando a importância do brincar para o desenvolvimento infantil. Acredita-se que em situações como no exemplo acima a ludicidade dificilmente estará presente, podendo a criança não sentir prazer em aprender dessa forma.

    É na Educação Infantil que a criança encontra-se na fase denominada pré-operatória, fase esta em que a criança desenvolve a linguagem, a coordenação motora fina, passa por modificações nos aspectos intelectual, motor, afetivo e social. Encontra-se no ápice de seu processo de desenvolvimento e formação de sua personalidade, não pode ficar limitada a atividades que a mantém três ou quatro horas sentada em um mesmo espaço, com um mínimo de interação com o colega. A criança como um ser histórico, social em busca da construção de seu conhecimento, necessita da interação estabelecida desde cedo com pessoas que lhe são próximas.

    Os companheiros de brincadeira também são muito importantes. Diferentes companheiros geram diferentes tipos de brincadeiras e estabelecem diferentes relações com a criança. Portanto, é interessante que a criança brinque com amigos da mesma idade, amigos mais velhos e mais novos, pais, familiares, vizinhos, etc. Cada uma dessas pessoas pode estimular coisas diferentes numa criança, diversificando sua relação com o mundo em que vive. É interessante, também, que a criança seja capaz de brincar sozinha, usando sua imaginação para criar e organizar situações novas. (SENA; AYRES DA SILVA, 2010, p. 112-113).

    Ao movimentar-se a criança expressa seus sentimentos, suas emoções, seus pensamentos (BRASIL, 1998). Galvão (2008) fundamentada na teoria de Wallon ressalta que a escola ainda insiste em imobilizar a criança numa carteira, o que limita o desenvolvimento das emoções e do pensamento, fundamentais para o desenvolvimento integral da pessoa. O tempo hábil para atividades motoras são cada vez mais curtos, e a junção teoria e prática pouco utilizada no âmbito escolar.

    Persiste até hoje em muitas escolas o entendimento de que o tempo destinado ao corpo deve ser apenas o do “recreio”; nos demais momentos, apenas a “cabeça” e as “mãos” participam da educação. [...] A discussão sobre o movimento enquanto preocupação pedagógica abre a possibilidade de mediação entre teoria e prática no contexto educacional, evidenciando a importância de entender a ideia de cultura corporal. (MARINHO et al. 2007, p. 35).

    Nesse sentido, Kishimoto (2001, p. 7) enfatiza a existência de uma “fragmentação e compartimentalização de aspectos do desenvolvimento infantil (físico, intelectual, psicológico, social)”. Esse fato reflete nas concepções dos profissionais da educação, na organização do espaço físico, dos materiais utilizados e das práticas pedagógicas eleitas para trabalhar com as crianças. É corrente notar que na sala de aula ocorrem práticas que objetivam o desenvolvimento intelectual e psicológico, enquanto que no pátio, o desenvolvimento físico e social.

    Ainda, a autora também chama a atenção para a supremacia das práticas pedagógicas voltadas para a aquisição das letras e dos números e que as brincadeiras e os brinquedos aparecem no discurso escolar, mas na prática acabam se restringindo ao recreio e momentos de transgressão das normas (KISHIMOTO, 2001).

    Desse modo, compreende-se como a autora que

    É preciso respeitar as características do desenvolvimento infantil. O letramento e a aquisição da linguagem requerem a construção de representações mentais, de significações para os códigos escritos. Não é pelo ensino mecânico de símbolos escritos que se chega à linguagem. É preciso que a atividade simbólica, responsável pelas representações construídas nas brincadeiras e atividades, seja experimentada para que a criança possa construir sua linguagem. (KISHIMOTO, 2001, p. 9).

    Assim sendo, pode-se afirmar que o universo lúdico tem muito a oferecer, necessitando ser mais explorado principalmente nas instituições de Educação Infantil, valorizando o brincar como uma atividade curricular rica, capaz de propiciar à criança diversos aspectos que favoreçam o seu desenvolvimento biopsicossocial. Respeitar sua fase de desenvolvimento sem negligenciar nenhuma etapa, pois é na ludicidade que a criança aprende e se desenvolve de forma prazerosa, despertando um maior interesse por sua vida escolar.

Considerações finais

    Após as reflexões aqui empreendidas é possível verificar que embora o brincar faça parte do cotidiano da criança, no decorrer dos anos no âmbito escolar o tempo disponível para os jogos e brincadeiras são cada vez mais escassos, limitando-se, por vezes, ao momento do “recreio”. Fato este que requer uma atenção do educador(a), pois é na brincadeira que a ludicidade se evidencia, propiciando às crianças momentos de prazer, e assim sendo, uma aprendizagem agradável capaz de envolver todos os aspectos necessários para ao processo educativo.

    O brincar e o movimento podem ser instrumentos de aprendizagens diversas, pois na atividade lúdica a criança aprende e se desenvolve com prazer. Entretanto, não podem se reduzir a funções secundárias, pois brincar traz em si diversos significados e enriquece o desenvolvimento infantil.

    Deve-se valorizar e respeitar o tempo da criança, não pular etapas deixando de lado a fase em que a criança deveria brincar livremente para assumir responsabilidades e uma carga excessiva de tarefas, assim como é preciso descontruir a ideia de que a criança que brinca “perde” tempo.

    Conclui-se que é fundamental que a criança na Educação Infantil disponha de tempo, espaço e estímulo do(a) professor(a) para vivenciar o prazer que a ludicidade lhe proporciona, desenvolvendo a criatividade e a imaginação. Desse modo, associando esse aspecto pedagógico a outras linguagens a criança poderá desenvolver-se plenamente nos aspectos motor, cognitivo, social e afetivo.

Referências

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