Resenha crítica. O corpo educado, pedagogias da sexualidade Una revisión crítica. El cuerpo educado, pedagogías de la sexualidad |
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*Autora correspondente. Mestrando em Atividade Física e saúde pela Universidade Católica de Brasília **Doutor em Sociologia pela Universidade de Brasília. Professor do Programa de Pós Graduação Stricto Sensu da Universidade Católica de Brasília (Brasil) |
Emanuelle Santos Camelo* Luis Otávio Teles Assumpção** |
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O Corpo Educado Pedagogias da sexualidade Guacira Lopes Louro, Jeffrey Weeks, Deborah Britzman, Bell Hooks, Richard Parker, Judith Butler Traduções: Tomaz Tadeu da Silva 2ª Edição Autêntica Belo Horizonte 2000 Créditos/copyrights
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 179, Abril de 2013. http://www.efdeportes.com/ |
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1. Credenciais dos autores
Bell Hooks é teórica feminista, crítica cultural, militante do movimento negro e professora de Estudos Feministas no Oberlin CoUege. Autora de vários livros, entre eles: Teaching for transgress e Outlaw cullture: resisting representations (ambos publicados pela Routledge). Em português: "Intelectuais negras" (Estudos feministas, v.3, na 2, 1995).
Deborah Britzman é professora da Faculdade de Educação de York University, Canadá.
Autora de vários livros, entre eles, Lost subjects, contested subjects. Towards a psychoanalytic inquiry of learning (State University of New York Press, 1998). Em português: "O que é esta coisa chamada amor — identidade homossexual, educação e currículo" (Educação e realidade, v. 21, n. 1, jan/jun. 1996) e "Sexualidade e cidadania democrática" (In Luiz H. Silva (org.), A escola cidadã no contexto da globalização". Vozes, 1998).
Guacira Lopes Louro é historiadora e professora do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Pesquisadora do CNPq, coordena, desde 1990, o GEERGE (Grupo de Estudos de Educação e Relações de Gênero). Entre suas publicações mais recentes, encontram-se: Gênero, sexualidade e educação, livro publicado pela Vozes, em 1997, "Mulheres na sala de aula" (In Maiy dei Priore (org.), História das mulheres no Brasil, Contexto, 1997) e "Segredos e mentiras do currículo. Sexualidade e gênero nas práticas escolares" (In Luiz H. Silva (org.), escola cidadã no contexto da globalização, Vozes, 1998).
Jeffrey Weeks é professor de Sociologia na South Bank University em Londres e um dos fundadores do "Gay Left Collective", tendo destacada atuação na política de identidade homossexual desde os anos 70. Entre seus trabalhos mais conhecidos estão Corning out: on homosexual politics in Britain from the Nineteenth Century to the present (2. ed., 1990), Sexuality and its discontents: meanings, myths and modern sexualities (1985) eleven-ted moralities. Sexual values in an age of uncertainty (1995).
Judith Butler é teórica feminista e professora na Universidade da Califórnia — Berkeley. Entre seus livros mais importantes estão: Gender trouble (1990) e Bodies that matter. On the discursive limits of "sex" (1993), ambos publicados pela Routledge. Richard Parker é professor de Antropologia da Saúde e Sexualidade no Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/UERJ) e professor de Saúde pública na Universidade de Colum-bia, em Nova York. Ele é também diretor e presidente da ABIA (Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS), no Rio de Janeiro e membro da Comissão de Cidadania e Reprodução (CCR) em São Paulo. Entre suas publicações em português, encontra-se o livro Corpos, prazeres e paixões. A cultura sexual no Brasil contemporâneo, publicado pela Best Seller, em 1991.
2. Resumo da obra
O livro é constituído por seis artigos científicos e busca sustentar através de vários autores a dificuldade encontrada para ensinar a sexualidade nas escolas em função das diferentes apropriações de corpo, mente, valores, poder, gênero e estigmas da sociedade contemporânea.
O primeiro artigo (Pedagogias da Sexualidade, segundo Guaciara Lopes Louro) deixa em evidencia a sexualidade, a adolescência, a identidade e o gênero como uma construção social, uma vez que, a própria sociedade impõe, consciente e inconscientemente, regras, valores e condutas que constituem-se como o “padrão de normalidade” aceito pela mesma. Segundo a autora, a primeira menstruação, assim como a iniciação masculina, estão carregadas de significados, que são distintos segundo as culturas e a história, assim, a escola precisa se equilibrar sobre um fio muito tênue: de um lado incentivar a sexualidade “normal” (heterossexual) e, de outro, simultaneamente, contê-la.
O segundo artigo (O Corpo e a Sexualidade, segundo Jeffrey Weeks) inicia falando sobre a monopolização das doenças sexualmente transmissíveis como uma “terrível advertência sobre os efeitos da revolução sexual”. No entanto, segundo ele, a sexualidade não é um fenômeno biológico somente (o corpo imperando como instinto), ela é social e histórica. Assim, “nossas definições, convenções, crenças, identidade e comportamentos sexuais não são resultados de uma simples evolução: eles têm sido modelados no interior de relações definidas de poder”, ou seja, sempre ditando as formas apropriadas para regular nossas atividades sexuais. Adiante ele faz uma diferenciação entre sexo, gênero e sexualidade, analisando posteriormente os conceitos de normalidade e anormalidade, segundo os padrões de aceitabilidade da sociedade, sempre referindo-se a Freud e sua psicanálise dos desejos reprimidos e Michel Foucault e suas teorias de poder. Por fim, após um panorama histórico ele defende o ponto de vista de que a sexualidade favorece os homens, enquanto regula e controla as mulheres e repreende o “terceiro gênero” ou homossexualismo, porém, acredita ele que, o futuro da sexualidade parece ser menos autoritário, enquanto alguns valores como a construção da família permanecem.
O terceiro artigo (Curiosidade, Sexualidade e Currículo, segundo Deborah Britzman) sustenta sua teoria em cima de duas perguntas iniciais: Será que a sexualidade muda a maneira como professor e professora devem ensinar? Ou será que a sexualidade deveria ser ensinada exatamente da mesma forma que qualquer outra matéria? De acordo com a autora, os estudantes, ao discutirem a sexualidade, dão a resposta esperada, ao invés de se envolverem num diálogo franco, por que o ensino está, em geral, sendo avaliado. O currículo em si (podado e planejado) impediria a denominada conversa franca. Adiante, ela cita Freud (que chamou as crianças de “pequenos investigadores do sexo”) para explicar a repressão e intolerância dos educadores para com as crianças que buscam também nas perguntas uma forma de compreender a sexualidade. Por último ela propõe a postura ideal do professor frente às novas tendências sociais.
No quarto artigo (Eros, erotismo e o processo pedagógico, segundo Bell Hooks) fala-se, inicialmente, da dicotomia entre o corpo e a mente, e da opção dos professores por entrarem na sala para ensinar (ênfase na mente), “anulando o corpo”, deixando os sentimentos e paixões para serem vividos num lugar privado, depois da aula, como se os “sentimentos e paixões” fossem, apenas, uma extensão da sexualidade e do erotismo (entramos na sala como espíritos descorporificados). Seguindo a linha de pensamento, o autor defende o Eros na sala de aula como uma força motivadora, dando um significado maior para o ato de ensinar: “Para restaurar a paixão na sala de aula ou para estimulá-la na sala de aula, onde ela nunca esteve, nós professores e professoras, devemos descobrir novamente o lugar do Eros dentro de nós próprios e juntos permitir que a mente e o corpo sintam e conheçam o desejo”.
No quinto artigo (Cultura, Economia política e Construção social da sexualidade, segundo Richard Parker) o autor evidencia as mudanças ocorridas nas últimas décadas como uma incentivadora das mudanças nas formas de se pensar a sexualidade, sob diferentes pontos de vista. As abordagens e pesquisas tradicionais dão, agora, lugar para uma abordagem mais abrangente do indivíduo e do contexto no qual ele se insere.
O último artigo (Corpos que pensam: sobre os limites discursivos do sexo, segundo Judith Butler) inicia-se sob a seguinte indagação: “Por que nossos corpos deveriam terminar na pele?” Assim, a autora questiona as formas de poder e a materialização imposta ao corpo, envolta de um simbólico heterossexual, o que acaba produzindo um domínio de corpos/objetos, um campo de deformação, deixando de lado o sentido plenamente humano.
3. Críticas dos resenhistas
A obra fornece subsídios à compreensão e ensino da sexualidade, à medida que trata dos principais paradigmas que compõem a visão de corpo na atualidade e sua “evolução” histórica, assim, a sexualidade em si, é fruto de fatores sócio-culturais historicamente abrangentes.
Com sólidos conhecimentos acerca do desenrolar histórico, os autores empenham-se em compreender o ser como biopsicossocial, afastando-se da dicotomia estabilizada pelas relações de poder que acabam reprimindo as condutas sexuais, através de valores, crenças e regras julgadas socialmente como dentro dos padrões de “normalidade”.
A abrangência das ciências não mais consegue dar conta dos problemas do sujeito limitando-o ao espaço físico e a monopolização da doença (AIDS, por exemplo), assim, surge uma série de correntes que defendem o sujeito como ser integral.
Desta forma, a sexualidade não pode ser compreendida como natural ou como um instinto, sob um ponto de vista biológico, uma vez que, a identidade, a adolescência, o corpo, o gênero, a raça e demais fatores de influência agem sobre a mesma e sobre a forma como apropriamos o corpo através do sexo.
Devemos evidenciar que aprendemos desde cedo “o que é ser um menino” e “o que é ser uma menina”. O garoto aprende a ser macho, viril e, a mulher, a ser sensível e educada. Ambos compreendem que somente a heterossexualidade enquadra-se aos padrões de “normalidade”, enquanto que, o homossexualismo foge aos padrões e é reprimido, silenciado, estigmatizado e, freqüentemente, maltratado. A escola e a família têm grande influência sobre esses processos de socialização, assim como demais manifestações de poder (grupos dominantes) dentro da sociedade e da cultura. Tudo isso acaba produzindo formas muitos distintas de viver a sexualidade, que vão do tradicionalismo ao liberalismo.
Diante de tanta subjetividade, consciente e inconsciente, o papel da escola seria fixar a sexualidade normal (heterossexual) e, ao mesmo tempo, contê-la, podá-la, fazer com que ela se desenvolva o mais tarde possível. Isso implica em seguir o currículo, os valores da escola e evitar respostas que conduzam a descoberta prematura do sexo (a sexualidade como um tipo de controle, uma matéria suscetível a avaliação).
No entanto, segundo Sigmund Freud, a sexualidade seria a personificação da curiosidade através da “original perversidade polimorfa”, ou seja, a mesma apareceria desde o início da vida e seria buscada, mesmo inconscientemente, a partir de qualquer coisa. Freud chamou as crianças de “pequenas investigadoras do sexo” e, diante disso, podemos nos perguntar: Seria a educação –como extensão da sociedade- capaz de reprimir os desejos de busca e compreensão da sexualidade? A reposta é unânime: Não. O que ela pode fazer é produzir uma conduta de aparência, um desejo reprimido e uma vontade de “to get out of the closet”.
O que falar às crianças quando perguntam sobre sexo, masturbação e o primeiro beijo? A maioria dos adultos prefere não compreender a sexualidade infantil em construção e restringem-se ao silêncio ou, a explicar tudo através do “não pode”, “é feio”, “quando você crescer, entenderá”... Ela compreenderá sim, com o outro, penetrando ou sendo penetrada, sem que ninguém lhe explicasse ao certo o significado de todo aquele ritual corpólatra e enraizado de sentimentos (Veja bem, estamos falando de sentimento e não de amor). Talvez, fosse melhor explicar antes. O silêncio instiga a curiosidade.
O professor deveria entender toda esta contextualização, uma vez que, ensinar a compreender e vivenciar a sexualidade é uma troca e não uma doação de saberes. É deixar de lado a objetividade da matéria e usar da subjetividade para ter uma conversa franca com os alunos, de modo que eles possam gritar seus medos, suas dúvidas e seus problemas e, tudo isto, muito além da própria conduta sexual.
O Eros, o erotismo, também podem estar dentro das salas de aula e, o ponto inicial, é quebrar com as repressões e a negação sexual nos professores. “Falar de sexo” pode ser mais motivador desta forma, assim, ele pode ser aprendido com contornos menos reprimidos, mais humanos e com significações consistentes.
“Por que nossos corpos deveriam terminar na pele?” Por que acreditamos que nossa sexualidade reprimida é bem ensinada? O senso diz que não. Ele mostra um índice de gravidez crescente entre as jovens, um número excessivo de pessoas com o vírus do HIV, adolescentes experimentando cada vez mais cedo à conduta sexual...
Usar o poder, calar-se, reprimir, negar, chicotear a mente, não estão sendo suficientes para informatizar os seres humanos sobre a busca de si mesmo através da sexualidade.
Nós, professores, estamos fazendo tudo errado, por que aprendemos de forma errada. Tudo isto não passa de um ciclo vicioso onde só existem dois campos de possibilidade: o campo de deformação do ser humano (onde nos encontramos) ou a re-construção da sexualidade.
Pela corporeidade, o homem faz do mundo a extensão de sua experiência!
4. Indicações da resenhista
A obra tem por objetivo discutir diferentes concepções de corpo e sexualidade (através das distintas relações de poder, repressão e autoritarismo), oferecendo fundamentação teórica e prática para as ciências humanas e exatas, a fim de que possam compreender o sujeito por sua totalidade e não fragmentando-o, fazendo alusão a tempos mais arcaicos da sociedade. É de grande auxilio, principalmente, àqueles que buscam desenvolver trabalhos mais abrangentes, como o ensino da sexualidade, quebrando com estigmas biológicos e, buscando assim, uma conversa mais franca e acessível aos alunos “questionadores do sexo”.
Não se trata de um manual de boas etiquetas, com passos a serem seguidos, mas um livro que apresenta fundamentação básica à compreensão da natureza humana e de sua relação direta com o meio através da sexualidade, uma vez que, o fisiológico está subordinado ao simbólico social e, a corporeidade, é socialmente construída.
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