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Brincando na escola: aulas de Educação Física 

dirigidas e não dirigidas no ensino fundamental

Jugando en la escuela: las clases de Educación Física dirigidas y no dirigidas en la enseñanza básica

 

*Autora. Pós-graduada em Psicomoticidade da Universidade

Luterana do Brasil, ULBRA, Canoas, RS

**Orientadora. Professora Mestre e docente Universidade

Luterana do Brasil, ULBRA, Canoas, RS

Vanessa Bastos Roncuni

Marines Ramos

vanessa.roncuni.edfisica@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Este estudo objetivou analisar o brincar no contexto escolar nas aulas de Educação Física dirigidas e não dirigidas, caracterizando-se como uma pesquisa descritiva (Thomas e Nelson, 2002). A população foi composta por alunos do 3° ano do Ensino Fundamental de uma escola da rede municipal de Novo Hamburgo (RS) e a amostra por 23 alunos com idades entre 8 e 11 anos, sendo 11 meninos e 12 meninas, todos devidamente matriculados e freqüentando as aulas de Educação Física. Os dados foram obtidos a partir de observações durante as aulas de Educação Física dirigida e não dirigida de acordo com uma matriz de observação adaptada de Arnhold (2005), a qual permitiu atingir os objetivos da pesquisa. Como resultado percebeu-se que as crianças brincam em grandes e pequenos grupos, separados por gênero ou mistos. O pega-pega, os alongamentos e os circuitos motores foram as atividades que mais apareceram nas aulas; e a dança foi tema de grandes impasses. Os materiais foram explorados de diferentes formas, destacando-se a corda que permitiu o envolvimento das crianças em muitas brincadeiras. As atividades das aulas de Educação Física dirigidas que mais se repetiram nas não dirigidas, entre os meninos foram os jogos e exercícios preparatórios, enquanto que entre as meninas foram os circuitos motores, exercícios de relaxamento e ginástica. Pode-se dizer então que a Educação Física é uma disciplina que pode promover aprendizagens nos diferentes domínios do comportamento humano através do brincar, mas para isto é preciso que se construam vínculos, rotinas de aulas e momentos para que os alunos também produzam ou reproduzam. Enfim, o ambiente escolar, a presença do professor e a interação do aluno com o meio fazem-se de grande importância para a boa aprendizagem, desde que haja em cada ação um significado para o aprender.

          Unitermos: Brincar. Educação Física Escolar. Psicomotricidade.

 

Trabalho de conclusão de curso de pós-graduação em Psicomotricidade da Universidade Luterana do Brasil, ULBRA.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 179, Abril de 2013. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Dupré citado por Neto (2002) empregou o termo psicomotricidade a fim de ressaltar a associação estreita entre o desenvolvimento da motricidade, da inteligência e da afetividade. O desenvolvimento de uma criança é o resultado da interação de seu corpo com o meio em que vive. Nesse contexto, insere-se o brincar, pois através da brincadeira a criança descobre e explora vários espaços, materiais e o “outro”. O contexto escolar pode ser um ótimo local para que essas aprendizagens aconteçam, pois neste elas interagem com outras crianças e adultos aprendendo a se relacionar e estabelecendo ligações afetivas, sociais, motoras e emocionais que serão significativas no processo de ensino-aprendizagem. A escola também poderá disponibilizar-se de diferentes espaços e materiais para as explorações psicomotoras das crianças, seja na hora da Educação Física, na hora do recreio ou de outras atividades propostas neste ambiente. Segundo Neto (2007) a atividade motora é de suma importância no desenvolvimento global da criança pois, é através da exploração motriz, que ela desenvolve a consciência de si mesma e do mundo exterior. São, então, as habilidades motrizes auxiliares na conquista da independência do aluno. Negrine (1994) defende que o jogo é a atividade por excelência da criança, que possibilita que ela conheça a si mesma e a formar conceitos sobre o mundo. Em se tratando de Educação Física escolar, mais especificamente nas séries do ensino fundamental, existe toda uma preocupação com o bom desenvolvimento psicomotor, pois este irá influenciar em outras fases e aprendizagens escolares. Le Boulch (1987) explica que a disponibilidade corporal precisa não apenas de uma forma de inteligência psicomotora como também de um nível elevado de inteligência operatória que deve ser desenvolvida durante o período da escola primária. Portanto, o corpo é a maneira de ser da criança e, através dele ela estabelece contato, se engaja no mundo e compreende os outros e tudo que está a sua volta.

    A partir do que foi exposto o presente estudo pretende responder ao seguinte questionamento: As brincadeiras e as formas de brincar das aulas de Educação Física dirigidas e não dirigidas se repetem ou existe exploração e criação de outras atividades? Este estudo tem como Objetivo Geral analisar o brincar no contexto escolar nas aulas de Educação Física dirigidas e não dirigidas de uma turma de 3º ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal da cidade de Novo Hamburgo – RS. Para responder ao objetivo maior foram elaborados os seguintes Objetivos Específicos: Observar as formas de brincar das crianças; Identificar o uso dos materiais por elas; e Verificar a organização do brincar das mesmas.

Metodologia

    Esta pesquisa caracterizou-se como um estudo do tipo descritivo (Thomas e Nelson, 2002) com o objetivo de analisar o brincar de crianças do 3° ano em aulas de Educação Física dirigidas e não dirigidas. Constituiu-se a população deste estudo por alunos do 3° ano do Ensino Fundamental de uma escola da rede municipal de Novo Hamburgo, RS. Compôs a amostra 23 alunos com idades de 08 a 11 anos, sendo 11 meninos e 12 meninas. Para analisar o brincar das crianças nas aulas de Educação Física dirigidas e não dirigidas foi utilizada uma Matriz de Observação adaptada de Arnhold (2005), contendo itens volvendo sobre os objetivos específicos deste estudo. Foram observados 9 itens na pesquisa: Tipo de brincadeiras; As brincadeiras das aulas dirigidas se repetem nas aulas não dirigidas; Quais objetos usados; Os objetos das aulas dirigidas se repetem nas aulas não dirigidas; Formas de brincar; Criatividade, exploração e criação de brincadeiras; Atividades dos meninos e das meninas; O brincar é ordenado com diversos temas. Os itens 2 e 4 são respondidos só em dias das aulas não dirigidas. Ao final das observações foi aberto um espaço para anotações de outros aspectos observados.

    O processo de coleta de dados ocorreu durante as aulas de Educação Física dirigida e não dirigidas, onde a professora atuou como Participante Observadora na primeira, e como Observadora na segunda. As aulas dirigidas consistiam de ritual de entrada com alongamentos e ginástica articular, aula propriamente dita com jogos e brincadeiras programadas pela professora, e ritual de saída com diálogos e/ou trabalho de relaxamento/respiração. Já as aulas não dirigidas seguiam um ritual de entrada com um breve diálogo com os alunos, a aula propriamente dita onde os alunos escolhiam o que seria realizado e o ritual de saída com atividades escolhidas também pelos alunos.

    O plano de coleta de dados ocorreu da seguinte forma: foram realizadas 07 aulas dirigidas e 07 não dirigidas. Os materiais utilizados tanto numa quanto noutra foram arcos, bolas (diversas), CD's, colchonetes, cordas, giz, rádio e tacos. Ora somente um tipo de material ora dois ou mais no mesmo encontro. Foi proporcionado a cada aula não dirigida os mesmos materiais da penúltima aula dirigida permitindo assim, observar como se organizavam os alunos e as atividades utilizando-se do mesmo contexto das aulas dirigidas. No ritual de entrada das aulas dirigidas, era realizado um breve diálogo sobre as regras da aula, também alongamentos, exercícios de mobilidade articular e brincadeiras de aquecimento como pega-pega (paralítico, cabrito, morcego, corrente, quebra elo, etc.). Na sessão propriamente dita, foram realizados circuitos de habilidades motoras, jogos recreativos e cooperativos (handebol de 10 passes, basquetinho, caçador, ovo podre, reloginho, alturinha, entrar e sair da trilha com corda, etc.). O ritual de saída era o momento para relaxar, trabalhar a respiração e falar sobre a aula. Nas aulas não dirigidas o ritual de entrada iniciava com um breve diálogo sobre as combinações da aula. A pedido das crianças realizava-se alongamentos conduzidos por elas mesmas, repetindo os realizados nas aulas de Educação Física dirigida e/ou os aprendidos nas escolinhas de futsal que alguns alunos freqüentam. Na sessão propriamente dita e ritual de saída as atividades também foram escolhidas pelos próprios alunos. Naquele último geralmente com algum momento para um breve “bate-papo” ou com brincadeiras de relaxamento. Organizou-se os resultados a partir da análise descritiva dos mesmos, considerando os itens observados em cada momento das aulas.

Resultados e discussão

    Segundo Negrine (1994) a palavra jogo se origina do vocábulo latino “iocus”, o mesmo que diversão, brincadeira. E, em alguns dicionários aparece como sendo a atividade lúdica com um fim em si mesma, embora ocasionalmente possa se realizar por motivo extrínseco. Beckemkamp et al. (2011) diz que as aulas de Educação Física devem proporcionar aos alunos atividades que permitam o seu desenvolvimento de forma integral, promovendo o enriquecimento motor da criança, seu desenvolvimento cognitivo e a socialização entre os alunos. Para os profissionais que trabalham com as crianças uma grande preocupação é, ou deveria ser, ajudá-las a usar seu corpo para aprender os elementos do mundo que as envolve e estabelecer relações entre eles, auxiliando, desta forma, a desenvolver sua inteligência.

    Abaixo segue a discussão dos resultados que estão relacionados aos Objetivos Específicos deste estudo. Os mesmos foram organizados de acordo com a Matriz de Observação utilizada.

Tipos de brincadeiras

    De acordo com Betti e Zuliani (2002) do 1º ao 4º ano do Ensino Fundamental é preciso levar em conta que a atividade corporal é um elemento fundamental da vida infantil, e que uma adequada e diversificada estimulação psicomotora guarda estreitas relações com o desenvolvimento cognitivo, afetivo e social da criança. A partir dos resultados deste estudo foi possível observar que o diálogo, os alongamentos e brincadeiras de pega-pega fizeram parte do início das aulas de Educação Física dirigidas, assim como dos encontros não dirigidos. Beckemkamp et al. (2011) em sua pesquisa verificou que a brincadeira de pega-pega no recreio destacou-se em 24,16% entre as preferidas dos alunos. Também encontrou resultados parecidos quanto a escolha dos grupos (em discussão no item formas de brincar).

    Para os sujeitos aqui analisados, verificou-se também que os circuitos motores com arcos, bolas e/ou colchonetes também apareceram na grande maioria das aulas não dirigidas. Os jogos esportivos foram evidentes nos dias em que se disponibilizavam bolas às crianças, assim como os exercícios calistênicos quando os colchonetes, e a dança quando o rádio e CD's. Para Conselho Federal de Educação Física (CONFEF, 2002) a dança é um fenômeno cultural e histórico e faz parte da cultura corporal do movimento. Moreira et al. (2011) diz que a dança tem papel fundamental enquanto atividade pedagógica. Pode ser considerada de grande importância para o desenvolvimento do aluno, quando realizado um trabalho que estimule ao máximo a criatividade, capacidade de raciocínio, autoconfiança, melhora da relação com os outros e consigo mesmo, além de ampliar o repertório motor.

    Ao final de cada sessão dirigida os resultados revelaram um momento de relaxamento com alguma brincadeira de “volta a calma” ou somente o trabalho de respiração com descanso do corpo; logo após um espaço para o diálogo sobre os acontecimentos da aula. Nos encontros não dirigidos também acontecia um momento para o relaxamento, geralmente com o jogo do silêncio, muito apreciado pelos alunos, combinado com as técnicas de respiração realizadas nas aulas dirigidas. Atividades essas, escolhidas e comandadas pelos próprios alunos. Para Le Boulch (1984) a interiorização é um fator muito importante para que a criança possa tomar consciência de seu esquema corporal. Também explica que a criança que não consegue interiorizar seu corpo pode ter problemas tanto no plano gnosiológico, como no práxico. Completa seu pensamento afirmando que esta interiorização torna possível uma dissociação de movimentos que permite um maior controle das praxias.

Objetos das aulas dirigidas e não dirigidas

    Os materiais utilizados tanto numa quanto noutra aula foram arcos, bolas (diversas), CD's, colchonetes, cordas, giz, rádio e tacos. Ora somente um tipo de material ora dois ou mais no mesmo encontro, de acordo sempre com a proposta da professora para aquela aula, lembrando que os mesmos deveriam ser usados nas aulas não dirigidas. Sobre a diversificação de materiais Freire (2002) defende que qualquer material pedagógico será mais rico se for variado.

    O autor supracitado ressalta que a motricidade é a interação de diversas funções motoras, como por exemplo, perceptivo motora, neuromotora, psicomotora, neuropsicomotora, etc. E justifica que nesse sentido os materiais explorados nas atividades podem contribuir para essa interação. De todos os materiais utilizados, a corda foi talvez, o que mais atividades proporcionou, sendo explorada ainda mais nas aulas não dirigidas. As crianças brincaram de cabo de guerra, cavalinho, laçar os colegas, trilhar individual ou coletivamente, desafios com diferentes alturas da corda, entre tantas outras experimentadas por eles, sendo algumas as mesmas realizadas nas aulas de Educação Física dirigidas. Freire (2002) conta que a corda é um dos brinquedos que mais povoam as lembranças da infância. E segundo Neto (2002) são os movimentos dinâmicos corporais que desempenham um importante papel na melhora dos comandos nervosos e no afinamento das sensações e das percepções. A partir desta colocação é possível compreender o porquê das crianças gostarem tanto das brincadeiras com tal material. Quanto a utilização da bola como material de aula, apesar da professora, nas aulas dirigidas não ressaltar os jogos esportivos (de competição) foi quase que inevitável que os alunos os realizassem nas aulas não dirigidas quando tal material era oferecido. Nesse sentido Freire (2002) destaca que vários esportes possuem na bola seu principal objeto de jogo. E, o mesmo autor conclui que a competição exige a presença do outro, e que nenhuma criança poderá sair-se vencedora no jogo se não houver outra competindo com ela. Portanto, a competição ganha características de cooperação. Assim, torna-se necessário, diálogos sobre esses conceitos, no contexto escolar para que se utilize de maneira benéfica tais jogos.

Formas de brincar

    De acordo com Kishimoto (1998) citado por Beckemkamp et al. (2011) as escolas necessitam cultivar a espontaneidade, diálogo, convivência em grupo, pois as crianças geralmente não brincam sozinhas, sendo que o jogo proporciona oportunidades para ela pensar e falar, ser ela autenticamente, saber combinar momentos de brincadeiras livres (lazer) e atividades orientadas (escola). Tanto nas aulas dirigidas quanto nas não dirigidas a forma de brincar caracterizou-se por grupos divididos por gênero, mas ao longo do trabalho foi possível observar que pouco a pouco os alunos passaram a brincar mais em grupos mistos, criando estratégias juntos para que fosse possível todos participarem da mesma atividade. Freire (2002) diz que o homem é um ser social, mas que para chegar a isso, é preciso um tempo de maturação biológica, as coordenações espaço-temporais, a formação da imagem corporal, o desenvolvimento do pensamento e dos sentimentos. O mesmo explica que qualquer que seja a atividade proposta pelo professor ou escolhida pelas crianças, num espaço de autonomia, haverá sempre motivo para que as regras sejam construídas e praticadas; estabelecendo normas que regulem as relações do grupo.

    É possível pensar que esta decisão tenha acontecido devido aos diálogos que ocorriam no início e no final dos encontros onde as crianças expressavam seus desejos de quererem brincar com um ou outro colega, formarem essa ou aquela equipe de forma a não dividirem só os “fortes” para um lado e só “fracos” para o outro, pois isso acabava desestimulando a atividade entre eles. Também pelo pedido das meninas que queriam participar dos jogos com os meninos (no espaço total da quadra), e não somente ficarem com as brincadeiras “de meninas” em um canto separadamente deles. Le Boulch (1987) explica que a reintrodução de uma verdadeira educação do corpo, ligada a educação da função simbólica, fará com que concepções educativas evoluam e se tornem mais eficazes no plano prático. Cabe destacar que apesar da acessibilidade dos meninos para encontrar um espaço de interação com as meninas, a maioria dos atritos, principalmente necessitando da intervenção da professora, ocorria no grupo dos meninos, tanto com o mesmo sexo quanto com o sexo oposto. Lapierre e Aucouturier (1984) explicam que ao se penetrar voluntariamente no espaço do outro, produz-se necessariamente alguma coisa; estabelece-se uma relação: uma reação de aceitação (dominação, submissão ou acordo), ou de rejeição (afastamento, fuga ou agressão), ou uma reação ambivalente feita ao mesmo tempo de um desejo de fuga e de aproximação.

Criatividade, exploração e criação de brincadeiras

    Segundo Macarini e Vieira (2006) as crianças possuem diversas razões para brincar, sendo uma delas o próprio prazer que podem usufruir enquanto brincam. Baségio (2007) explica que através do brincar a aprendizagem e o desenvolvimento são potencializados. Acrescenta que brincando a criança pode expressar sentimentos através do seu corpo, ampliando e diversificando seu vocabulário psicomotor. E Medeiros citado por Negrine (1994) expõe que os jogos trazem a grande vantagem de oferecer aos que dele participam excelentes oportunidades para o desenvolvimento físico, mental, emocional e social. Foi observado nos resultados deste estudo que nas aulas dirigidas às brincadeiras e jogos acontecem, por escolha da professora, daí a necessidade de permitir que em um segundo momento os alunos tenham a oportunidade de realizar uma prática mais “livre”. Para Neto (2007) é através da brincadeira espontânea que a criança descobre os ajustes diversos, complexos e progressivos da atividade motriz, resultando em um conjunto de movimentos coordenados em função de um fim a ser alcançado. Quanto à exploração e criatividade das crianças, percebeu-se repetição tanto de atividades realizadas nas aulas de Educação Física dirigidas (principalmente os circuitos motores), quanto de outras vivenciadas com a professora de currículo, e também reprodução de cenas de filmes, esportes vistos na TV, coreografias apresentadas na escola por outras turmas, adaptação de regras de alguns jogos, e também adaptação de algumas modalidades esportivas devido ao material disponibilizado. Sobre estes últimos itens citados, Maschio e Ribas (2011) argumentam que o jogo permite comportamentos plásticos tanto da criança, do adolescente e do professor sobre sua estrutura e nas inúmeras possibilidades de criar e agir a partir dele, por não ser marcado pela mão da regulação internacional e, ter suas origens ou práticas, próprias de um grupo social. Betti e Zuliani (2002) ao referirem-se ao Ensino Fundamental acordam que se deve privilegiar o desenvolvimento das habilidades motoras básicas, jogos e brincadeiras de variados tipos e atividades de autotestagem. Ao analisar as atividades desenvolvidas pelas crianças no item criatividade e exploração pode-se pensar que elas souberam “planejar” suas atividades de forma a atingir todos os objetivos expostos por esses autores, e porque não, também pela professora.

Atividades dos meninos e das meninas

    Para Negrine (1994) é jogando, experimentando e comprovando que a criança descobre as propriedades das coisas e dos objetos. Para Baségio (2007) brincando a criança potencializa a interrelação sujeito/meio, sujeito/próprio sujeito. Verificou-se nas observações dos sujeitos deste estudo que nas aulas não dirigidas os jogos esportivos e cenas de filmes (Tropa de elite) ficaram evidenciados no grupo dos meninos. Enquanto as meninas detiveram-se aos circuitos motores, alongamentos, ginásticas e brincadeiras recreativas. Diferentemente das aulas dirigidas onde todos participavam tanto de uma quanto de outra prática de acordo com o planejamento da professora. Macarini e Vieira (2006) explicam que por volta dos seis e sete anos de idade, as crianças já apresentam um conhecimento sobre as atividades, papéis sexuais e objetos sexualmente tipificados e brincam de maneira segregada, ou seja, em grupos separados de meninos e meninas. Ainda nas aulas não dirigidas a brincadeira de pega-pega e dança foi destaque nos dois grupos, mas com uma observação, a primeira atividade poderiam todos brincarem juntos porém na hora de dançar havia atritos para que não dançassem o grupo de meninos com o de meninas e, de preferência, que não utilizassem o mesmo palco simultaneamente. Lapierre e Aucouturier (1984) explicam que os contatos corpo a corpo são inicialmente muito mais fáceis quando recobertos por um pretexto de luta agressiva. Sua aceitação num contexto diferente marca uma etapa na aceitação do corpo do outro. Nesse aspecto os autores Macarini e Vieira (2006) explicam que através da brincadeira a criança é capaz de resgatar valores e sentimentos que são importantes para a vida adulta, além de aprender a importância da negociação, da conquista, de conviver com regras e a resolver conflitos.

Conclusão

    O corpo é o ponto de referência que o ser humano possui para conhecer e interagir com o mundo. Este ponto de referência serve de base para o desenvolvimento cognitivo, para aprendizagem de conceitos, e porque não para uma boa alfabetização, quando se pensa em Ensino. Nesse âmbito, o brincar no contexto infantil faz-se por atividades que tem objetivos de expressão, construção, criação e de um espaço para o convívio e vínculos sociais, onde a criança ora é sujeito ativo de seus atos, ora sujeito passivo reproduzindo as ordens do professor ou daqueles que com ela brincam. O brincar tem suma importância na formação social, moral, intelectual, física e motora das crianças, de forma que ela brinca quase que inesgotavelmente, variando o jogo conforme seu interesse e identificação, podendo ter seu brincar influenciado e modificado por fatores como a idade, o sexo, a presença de objetos lúdicos e o ambiente físico em que ocorre a brincadeira. Para Negrine (1994) a observação de crianças consegue indicar que o jogo lúdico é uma variável presente no comportamento infantil de forma permanente.

    O presente estudo destaca que as crianças, sujeitos aqui investigados, do 3º ano do Ensino Fundamental brincam em grandes e/ou pequenos grupos, separados por gênero ou mistos, conforme a atividade proposta ou o condutor do jogo. Foi possível identificar também que as brincadeiras de pega-pega, alongamentos, e diálogos estão presentes em praticamente todos os encontros dirigidos e não dirigidos, enquanto que os jogos esportivos e circuitos motores destacam-se nas aulas não dirigidas. A dança foi palco de muitas produções/expressões, mas também de muitas “confusões” onde atritos entre meninos e meninas evidenciavam-se. Enquanto nos jogos era permitida conciliação para interação dos dois gêneros na mesma atividade, na dança tornava-se mais difícil. Os referidos sujeitos brincam e exploram todos os materiais e espaços fornecidos criando, recriando ou repetindo atividades realizadas em aulas de Educação Física com a professora da disciplina ou do currículo. A corda foi um dos materiais que mais diversificação de atividades obteve, enquanto a bola serviu de fonte para adaptações de regras ou invenções de jogos adaptados aos materiais e espaços cedidos. Nas aulas de Educação Física não dirigidas as brincadeiras acontecem como reprodução das atividades realizadas nas aulas dirigidas, ou experenciadas com a professora de currículo, e mesmo imitações de cenas filmes e de apresentações assistidas na escola.

    Os resultados apontam que as brincadeiras nem sempre ocorreram de maneira tranqüila e disciplinada, alguns atritos foram resolvidos a partir da intervenção da professora, na sua maioria com os meninos, enquanto as meninas poucos necessitaram de intermediação de um adulto para resolverem seus desentendimentos. Quando a professora passou a sugerir que resolvessem sozinhos seus “problemas”, uma das estratégias tomadas por um grupo em especial foi sair do jogo e começar um novo de maneira a tornar-se pouco divertido o outro jogo que estava acontecendo por ficarem com poucos participantes e estes tentando competir um com o outro provocando grandes discórdias. A partir do foi estudado e exposto neste trabalho percebe-se que os espaços para as atividades dirigidas e não dirigidas, para crianças do 3º ano do Ensino Fundamental fazem-se de suma importância para que essas possam interagir consigo e com o “mundo”, aprendendo dentro de um contexto lúdico, recreativo e significativo realizando construções cognitivas, afetivas, sociais e motor a partir de intervenções realizadas com a professora e das realizadas por eles mesmos. Negrine (1994) conclui que continuar a estudar o brincar poderá ser uma forma de contribuir para entender cada vez melhor o seu valor como componente curricular.

Referências

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  • THOMAS, J.R.; NELSON, J.K. Métodos de pesquisa em atividade física. Porto Alegre. Artmed, 2002.

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