Educação Física ou rola bola? A percepção da comunidade escolar sobre as aulas de Educação Física ¿Educación Física o tirar la pelota? La percepción de la comunidad escolar sobre las clases de Educación Física Physical Education or “ball rolls”. The perception of the school community about the Physical Education classes |
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*Acadêmica do Curso de Educação Física da UNICRUZ – Universidade de Cruz Alta **Profª Adjunta II do Centro de Ciências da Saúde da Universidade de Cruz Alta, UNICRUZ Licenciada em Educação Física pela UNICRUZ; Especialista em Educação pela UFSM Mestre em Ciências do Movimento Humano pela UDESC Doutora em Ciências Sociais pela UNISINOS Orientadora da Pesquisa |
Bianca Bueno do Nascimento* Solange Beatriz Billig Garces** (Brasil) |
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Resumo Este estudo teve como objetivo avaliar a percepção da comunidade escolar de uma escola estadual de Cruz Alta-RS sobre as aulas de Educação Física. Saber o que pensam as pessoas que fazem parte do contexto do profissional de educação física é fundamental para que este possa repensar sua prática e reavaliar seus objetivos enquanto docente. Foram participantes vinte e sete sujeitos pertencentes à comunidade escolar (alunos, pais, professores e coordenação pedagógica). Os alunos foram entrevistados individualmente e os demais sujeitos responderam a um questionário com questões mistas. Também foram observadas in loco as aulas de Educação Física na escola participante do estudo para fins de comparação entre a fala da comunidade escolar e a prática dos professores. Os dados foram analisados através da categorização de dados de maneira quantitativa e qualitativa. Nesta pesquisa ficou claro que a comunidade escolar compreende o papel da disciplina de Educação Física para o desenvolvimento integral dos alunos e que é tida como muito importante, ainda que disciplinas de “sala de aula” como Português e Matemática sejam ainda percebidas por todos como melhores. Porém, em relação às aulas de Educação Física que ocorriam em sua escola, os alunos pedem por novidades e objetivos mais claros, os demais professores enxergam a Educação Física como uma disciplina importante, porém na sua escola não avaliam o trabalho dos professores desta disciplina como sério e útil para os alunos. A coordenação pedagógica apresenta uma ótima percepção sobre as aulas e o trabalho do professor de Educação Física na sua escola, mesmo que por meio de observações não apresentaram conteúdo pedagógico. Os professores de Educação Física desta escola não sabem justificar sua importância pedagógica e nem descrever a tendência pedagógica que utilizam em suas aulas. A conclusão deste estudo é a de que a disciplina de Educação Física é muito bem avaliada na percepção da comunidade escolar, porém o trabalho dos profissionais de Educação Física é o alvo de críticas quando esse não apresenta um método pedagógico durante as aulas. Cabe ao professor de Educação Física repensar seus objetivos a fim com que sejam percebidos por todos, contribuindo para que a Educação Física seja realmente valorizada e deixe de lado esse caráter de marginalização que ainda assume nos dias de hoje. Unitermos: Educação Física Escolar. Formação docente. Contexto profissional.
Abstract This study aimed to evaluate the perception of the school community in a public state school in Cruz Alta-RS about the physical education classes. To know what people that are part of the context of physical education professional think is essential to the physical educator rethink his practice and reassess their goals while teacher. Participants were twenty-seven subjects of the school community (students, parents, teachers and pedagogical coordination). Students were interviewed individually and the other subjects completed a questionnaire with mixed questions. Were also did observations of the physical education classes in situ, at school, for comparisons between the speech of the school community and practice of the teachers. Data were analyzed by data categorizing, quantitatively and qualitatively. In this research became clear that the school community understands the role of Physical Education for the overall development of students and that it is considered as very important course, although "classroom" courses, like Portuguese and Mathematics are still perceived as best for all. However, regarding the Physical Education classes taking place in their school, students call for new and clearer goals, the others teachers see the Physical Education as an important course, but at your school do not value the work of teachers in this course as serious and useful for students. The pedagogical coordination has a great insight about the working in the classes of physical education’s teachers at the school, even when we take a look they do not present pedagogical content. The Physical Education’s teachers of this school do not know justify their pedagogical importance and do not know to describe the pedagogical trend which use in their classes. The conclusion of this study is that the Physical Education course is very well assessed in the perception of the school community, but the work of physical education professionals is criticized when it does not present a pedagogical method during classes. It is up to teacher of Physical Education rethink their goals, so that they can be perceived by all, contributing to that Physical Education can be truly valued and set aside this character of marginalization that still takes today. Keywords: Physical Education. Teacher training. Professional Context.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 17, Nº 178, Marzo de 2013. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
Ninguém vive sozinho, vivemos em sociedade, precisamos uns dos outros para nos significar. O homem é um ser tão incompleto que para viver ele precisa de um elemento que por si só não possui, o oxigênio. Sendo assim, fazemos uso das palavras de Medina (2001 p. 46), quando explicita que:
O homem é um ser incompleto e inacabado, e são suas relações com os outros e o mundo que o tornam possível. O homem isolado é uma abstração. O homem concreto é aquele entendido no seu contexto, inseparável de suas circunstâncias, onde suas relações se fazem dinâmica e reciprocamente.
Portanto a opinião e percepção da comunidade escolar (professores, coordenação pedagógica, alunos e pais) sobre o trabalho desenvolvido pelo professor de Educação Física torna-se importante para dar a este o suporte necessário para entender melhor o contexto em que vive, como é percebido dentro deste e como pode ser realmente um agente transformador para a sociedade através de seu trabalho.
O modo de se fazer Educação Física vem se modificando através dos tempos. Em cada época temos tendências de ensino impregnadas na Educação Física, ditando seus objetivos. Soares (2001) salienta que por um longo período a Educação Física serviu de instrumento de manipulação social, assim como as demais disciplinas escolares.
Desde sua implantação no currículo escolar brasileiro as funções da Educação Física eram basicamente desenvolver e fortalecer os indivíduos física e moralmente. Apresentava um caráter científico rígido por ser oriunda das Ciências Biológicas e isso foi um fator determinante para que ganhasse cada vez mais espaço dentro do sistema educacional. Os médicos eram a “autoridade” perante as aulas de Educação Física, pois estavam embasados em um maior conhecimento biológico, e sendo assim os professores de Educação Física eram submissos a eles desenvolvendo suas tendências higienistas e eugênicas dentro da escola (COLETIVO DE AUTORES, 1994). Guimarães et al. (2001, p.18) confirmam isso quando escrevem “Visando a educação de corpo e tendo em vista um físico saudável e equilibrado organicamente, a educação física esteve ligada aos médicos higienistas que buscavam modificar os métodos de higiene da população.”
O exército também teve participação nesse processo, pois segundo Soares et al. (1992) as aulas de Educação Física nas escolas eram ministradas por instrutores físicos do exército, que traziam para estas instituições os rígidos métodos militares da disciplina e da hierarquia. Estava, portanto, formado o cenário para a formação de homens obedientes, submissos e profundos respeitadores da hierarquia social. Segundo Darido (2010, p.13) essas tendências, de algum modo, ainda hoje influenciam a formação do profissional e suas práticas pedagógicas.
Com o passar do tempo a Educação Física foi ganhando novos contornos e novas tendências começaram a surgir no Brasil e no mundo. Aos poucos, especialmente a partir da década de 1980 o consenso vai se transformando em conflito, ou seja, surge uma fase da Educação Física questionadora e crítica, que deixa de lado a neutralidade e a naturalização dos fatos sociais (MARINHO, 2005). Ou seja, a Educação Física começa a ser vista de uma maneira mais crítica e como alternativa surgem novas formas de pensar sobre Educação Física na escola (DARIDO, 2010, p. 13). A reflexão a cerca da função da Educação Física na escola começou a ser diferente, deixando de ser sexista, eugênica e higienista para ser pensada de forma mais progressista e com foco para a psicomotricidade e o desenvolvimento motor.
A Educação e a Educação Física escolar se modificam, criando sua identidade e desconstruindo a mesma constantemente, de acordo com as diferentes situações impostas pela sociedade. Esse processo nunca acabará, pois de acordo com o contexto histórico da sociedade é que se decidem os rumos da Educação e, consequentemente da Educação Física, pois são processos em constante metamorfose. Seguindo esses pressupostos, portanto, a partir da década de 1990 as escolas passam a elaborar seus Projetos Político Pedagógicos, traduzindo as mudanças conjunturais, políticas e ideológicas vigentes no país e revelando os desejos e interesses de quem os construiu. Se o professor de Educação Física participa dessa construção (e deveria participar, pois a construção era para ser coletiva pela comunidade escolar) irá imprimir a sua concepção de Educação e Educação Física que acredita ser a mais adequada. Caso ele não conheça as diferentes concepções, tendências ou abordagens filosóficas que permeiam a Educação Física poderá usar como base a tendência dos Parâmetros Curriculares Nacionais que é a concepção oficial que norteiam os currículos escolares.
Atualmente a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBEN 9.394/96 e os Parâmetros Curriculares - PCNs indicam o projeto de educação desejado pela sociedade. Neira (2006, p.6) faz um resumo dos objetivos da LDBEN e dos PCNs: “desenvolver cidadãos com participação política e social, conhecedores de seus direitos e deveres políticos, civis e sociais, e que adotem no dia a dia atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio as injustiças.” Portanto, ainda de acordo com Neira (2006, p. 5) “cabe aos educadores traduzi-las em ações concretas na sala de aula e em práticas pedagógicas coerentes com esses pressupostos.”
Na Educação Física especialmente, o problema acontece quando temos professores despreparados para entender sua importância pedagógica dentro da escola. Quando a formação inicial ou continuada que lhes foi oportunizada não tenha sido crítica o suficiente para revelar essa reflexividade necessária aos professores que atuam na escola. O ideal é um ambiente escolar onde todas as ações se embasem em conteúdos pedagógicos adequados para os alunos.
Atualmente a Educação Física vive tempos onde se acredita que o esporte de rendimento tem seu lugar, porém este não deve ser trabalhado dentro da escola. Todavia, de acordo com Darido (2010, p.14) a crítica ao esporte de rendimento hoje se voltou para outro extremo, onde o professor de Educação Física praticamente não intervém e seu papel na escola se restringe a oferecer uma bola para que os alunos a manejem da maneira como desejarem.
É esta prática de dar a bola, ou comumente chamada de “rola bola” que fomenta a marginalização da Educação Física perante outras disciplinas. E essa prática tem sido bastante observada nas aulas de Educação Física, afinal quem nunca teve um professor de Educação Física que simplesmente largava a bola para os alunos? Segundo Darido (2010, p.14) a prática do “rola bola” é bastante condenável, pois se desconsidera a importância dos procedimentos pedagógicos dos professores. Ainda sobre o “rola bola”, Darido (2010 p.14) diz que:
É preciso deixar claro que esse modelo não foi defendido por professores, estudiosos ou acadêmicos. Infelizmente ele é bastante representativo no contexto escolar, mas provavelmente tenha nascido de interpretações inadequadas e das condições de formação e trabalho do professor.
Não basta largar uma bola para os alunos e esperar que a comunidade escolar valorize nosso trabalho. De acordo com Neira (2006, p.9) por trás de toda prática educativa há, implícita uma concepção de aprendizagem.
Sendo assim, ser professor de Educação Física vai muito além do cômodo “rola bola”. A Educação Física é uma disciplina curricular como qualquer outra e o dever dos professores é viabilizar uma prática pedagógica que apresente coerência com os objetivos do ensino elencados pelos documentos oficiais (LDBEN, PCNs e PPPs das escolas). De acordo com Betti (1994) os objetivos da Educação Física são:
A educação física é entendida como uma disciplina curricular que introduz e integra o aluno na cultura corporal, formando o cidadão que vai produzi-la, reproduzi-la e transformá-la, instrumentalizando-o para usufruir jogos, esportes, danças, lutas e ginásticas em benefício do exercício crítico da cidadania e da melhoria da qualidade de vida.
Atualmente, há uma luta para que a Educação Física atenda a esses objetivos e oportunize aos alunos uma vasta experiência com movimentos. No entanto hipotetiza-se haver um movimento contrário do professor, que vê seu espaço se tornar cada vez menor nas escolas (com redução de carga horária e número de aulas na semana) e, ao mesmo tempo, não modifica seu fazer pedagógico para torná-lo qualificado e reconhecido. O que se observa já nos primeiros estágios da graduação são pessoas desmotivadas, cumprindo obrigações e repetindo conceitos e ações, muitas vezes, ultrapassadas, sem nem ao menos questionar os porquês de suas ações, sem refletir sobre o contexto. Ou simplesmente não cumprindo seu papel de professor, sem planejamento, sem objetivos e, portanto sem conteúdo e sem a mínima qualidade pedagógica. Quando alunos se tornam egressos dos cursos de formação, acabam por repetir esses conceitos na maior parte das vezes, tornando-se apenas um professor que “rola bola”.
Então, entende-se por “rola bola”, uma aula de Educação Física que não apresenta um método pedagógico. Quando os alunos decidem o que vão, como e quando fazer e o professor acaba se tornando um mero espectador, sem maiores interferências. Sobre isso Darido (2010, p.14) ressalta que “Num paralelo poderíamos questionar se os alunos são capazes de aprender o conhecimento histórico, geográfico ou matemático sem a intervenção ativa dos professores.” Ou seja, o professor de Educação Física que se acomoda e age desta forma acaba por não saber justificar seu papel na escola e sua importância para a formação dos alunos. Mas será que esse método de ministrar aulas é observado pela comunidade escolar? Direção, equipe pedagógica, pais, alunos e demais professores percebem quando isso acontece?
Sem os alunos a escola seria somente um amontoado de tijolos sem sentido, porque estes são os protagonistas do cenário escolar. Shigunov (1994, p.18) coloca que o aluno deveria ser sempre o elemento central dos conteúdos a serem desenvolvidos. Portanto, conhecer as necessidades dos alunos, o que eles pensam é fundamental para elaborar um plano de trabalho adequado às necessidades e possibilidades dos alunos, de acordo com sua realidade e com o contexto escolar.
Os professores são uma equipe, e há muito tempo se fala em trabalho interdisciplinar. No entanto, isso acaba sendo uma utopia, pois o que se vê nas escolas são professores preocupados em desenvolver os conteúdos de sua disciplina e atarefados demais para colocar em prática ações interdisciplinares. Para que tal processo ocorra é preciso que os professores entendam a importância das demais disciplinas, e uma delas é a Educação Física. É importante saber a percepção dos demais professores, pois, quando se luta por valorização, é preciso saber se o trabalho é visto de maneira positiva dentro do ambiente escolar, caso contrário, se deve tomar ações para que os demais enxerguem a importância do professor de Educação Física, para que esse lugar seja assegurado e valorizado no espaço escolar.
A coordenação pedagógica é responsável por gerenciar a escola e implementar os currículos de acordo com as exigências do processo de ensino. Atualmente foram implementados ao currículo de formação de professores de Educação Física disciplinas como a Filosofia e a Sociologia, que definem aspectos importantes do pensar crítico para a construção de alunos cidadãos. Todavia, essas disciplinas não substituem outras, como a Educação Física, que aliada às demais contribui da mesma forma para a construção cidadã, desde que planejada adequadamente. Portanto, a percepção da coordenação escolar sobre a importância e objetivos da Educação Física é de extrema importância para que a presença da Educação Física possa ser justificada no currículo.
Portanto, coube realizar este estudo para identificar a opinião daqueles que convivem com o professor de Educação Física na comunidade escolar, visando conhecer sua percepção sobre a disciplina e a importância e valorização que a mesma possui no contexto escolar. Assim, a partir dessas reflexões iniciais esse artigo traz como objetivo geral analisar a percepção da comunidade escolar sobre as aulas de Educação Física nos anos finais do ensino fundamental em uma escola da rede estadual de ensino da cidade de Cruz Alta, RS, Brasil.
Metodologia
Realizou-se uma pesquisa descritiva interpretativa, do tipo estudo de caso, com abordagem quali quantitativa. O estudo contou com a participação total de vinte e sete sujeitos pertencentes a comunidade escolar de uma escola estadual da cidade de Cruz Alta – RS/Brasil, sendo estes 15 alunos matriculados nos anos finais do ensino fundamental, um professor de cada disciplina (exceto português e língua estrangeira) totalizando a participação de cinco professores, dois professores de Educação Física, a diretora e vice-diretora, e três secretárias. As perguntas foram realizadas através de questionário com questões mistas para os professores e coordenação escolar. Com os alunos realizou-se entrevista individual. Foram também observadas três aulas de cada professor de educação física na escola, totalizando seis aulas. Os instrumentos de pesquisa foram construídos para esse fim e validados por especialistas na área.
A análise dos dados realizou-se através de análise de conteúdo, a partir de sua categorização, conforme prevê Bardin (1970) e quando possível de forma quantitativa a partir de estatística descritiva.
Todos os participantes assinaram termos de consentimento livre e esclarecido e os pais ou responsáveis assinaram para os alunos, autorizando a pesquisa, conforme previsto nos preceitos éticos. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade de Cruz Alta sob CAAE nº 05539212.1.0000.5322.
Resultados e discussões
Percepção da comunidade escolar sobre as aulas de Educação Física
Todos os alunos participantes da pesquisa responderam que praticar educação física é importante. Porém, percebe-se que essa importância atribuída pelos alunos nem sempre é pela aula em si, pois de acordo com Beggiato (2009, p.3):
O professor de EF é sempre esperado pelos alunos, mas, acreditamos que isso não ocorre devido ao interesse nas aulas propriamente ditas. O que temos notado é que a satisfação que as crianças sentem e demonstram para com as aulas de EF é referente à sensação de liberdade e a saída da sala de aula, ou seja: o distanciamento do ficar “imóvel” nas carteiras durante horas.
Quando questionados sobre os motivos de considerarem a disciplina importante, as respostas fizeram menção aos objetivos da Educação Física, na visão dos alunos.
Tabela 1. Objetivos da Educação Física na visão dos alunos
Verifica-se então que a opinião dos alunos sobre a importância e objetivos da Educação Física basicamente se resume a prática de atividades físicas (exercícios) e esportes (66%). Em estudo realizado por Beggiato (2009) com 87 escolares da rede estadual de São Paulo, os resultados encontrados foram os mesmos, deixando evidente que os alunos têm a mesma visão da Educação Física, independente da região do país a que pertença.
Quanto aos professores de outras disciplinas a percepção destes sobre os objetivos e importância da Educação Física para os anos finais do ensino fundamental é de que esta não tem muita importância pedagógica na escola e pode ser considerada como uma espécie de “recreio”, ou então, preparação para “olimpíadas”, como relataram respectivamente o professor de matemática e o de artes.
“Deveria ser a formação do individuo como um todo. Não é dando uma bola aos alunos para eles jogarem o que quiserem. Sem aquecimento, sem uma finalidade. Para a maioria dos alunos a educação física é uma espécie de recreio”. (prof. Matemática)
“Desenvolvendo o esporte existe a possibilidade do aluno futuramente participar das olimpíadas”. (Prof. Artes)
Essa percepção da Educação Física, com a função de lapidar talentos esportivos também se observou na fala da coordenação escolar: “que às vezes estão ali e só precisam ser trabalhados”.
Essa percepção de que a Educação Física serve para moldar talentos esportivos é derivada da época de 1960, quando os grupos políticos dominantes viam no esporte um instrumento complementar de ação. Para Darido (2010, p.13), nesse período, a Educação Física passou a ter a função de selecionar os mais aptos para representarem o país em diferentes competições. Talvez essas respostas façam referência às experiências dos entrevistados, haja vista que, de acordo com suas idades, é coerente acreditar que estes vivenciaram uma Educação Física com estes objetivos nos seus tempos como alunos. Já, os demais professores pesquisados, ainda citando os objetivos da Educação Física, falaram sobre o desenvolvimento do trabalho em equipe, a melhora da coordenação motora e a integração dos alunos através dos esportes e jogos.
A escola fora do horário das aulas de educação física pode desenvolver talentos olímpicos para atuar em esportes de competição, mas é preciso deixar claro que esse não é o objetivo e a finalidade da Educação Física Escolar, pois a sua função é desenvolver um esporte de inclusão, o esporte educação, onde todos participem e não sejam excluídos das aulas em função de não apresentar aptidões e/ ou habilidades. Sendo assim, esta percepção que os professores e coordenação entrevistados apresentam é devido ao histórico da Educação Física, porém desatualizada de acordo com os novos rumos que a Educação Física passou a seguir depois da década de 1980.
Ao perguntar sobre o que pensam das aulas de Educação Física e se têm conhecimentos dos conteúdos desenvolvidos nos anos finais do ensino fundamental, o professor de matemática relata:
“Penso que deveria haver um roteiro: aquecimento, aula propriamente dita e um período (tempo) de relaxamento, pois quando os alunos voltam para a sala, estão muito excitados, suados e cansados. O uso de roupa apropriada também não é exigido. Já vi aluno jogando vôlei de bombacha e de bota. No outro dia ele estava na sala de aula de tênis”. (Prof. Matemática)
Realmente, através das observações das aulas foi possível constatar a veracidade da fala do professor. Embora exista um roteiro para as aulas (planejamento) nem todos os professores desenvolvem o seu trabalho como de fato deve acontecer.
O professor de Artes relata que: “as aulas de educação física são ótimas, os alunos adoram e nossos professores são muito capacitados”. Isso demonstra uma visão superficial sobre as aulas, pois o fato dos alunos gostarem das aulas não significa que as mesmas apresentem um conteúdo pedagógico apropriado. Se fosse assim bastaria que todos os professores de outras disciplinas deixassem os alunos fazendo o que quisessem e também teriam garantido a aprovação destes.
Quando os professores foram questionados sobre a importância das aulas de Educação Física para os alunos, as principais categorias elencadas foram:
desenvolvimento de relações interpessoais;
noções de espaço e de consciência corporal;
a Educação Física é responsável pelo desenvolvimento motor;
ajuda a combater diversas doenças, ao ensinar o aluno a praticar atividades físicas, que é essencial para a saúde;
desenvolve habilidades como o equilíbrio;
desenvolve a rapidez no raciocínio ;
desenvolve o trabalho em equipe, ensinando a trabalhar com o outro;
colabora no desenvolvimento físico e intelectual dos educandos;
cria hábitos de limites e regras.
Portanto, as respostas evidenciam as características de desenvolvimento de habilidades motoras, cognitivas e afetivo sociais, corroborando ainda uma percepção de educação física como “aptidão física para a saúde”.
Sendo assim, embora contraditórios em suas respostas quanto aos objetivos das aulas de Educação Física, ao explicitar a importância desta, os professores de outras disciplinas parecem entender o amplo papel que a Educação Física pode assumir no desenvolvimento dos alunos.
A direção e as funcionárias foram questionadas sobre qual a disciplina mais importante da grade curricular justificando sua escolha. Responderam esta pergunta a diretora, a vice-diretora e três secretárias. Dentre estes, todos responderam que o Português é a disciplina mais importante para os alunos, com exceção de uma secretária. Aqui se percebe que, para os responsáveis por gerenciar a escola, existem disciplinas mais importantes do que outras e isso é um equívoco pois concorda-se com a outra secretária que respondeu: “todas as disciplinas são importantes, cada qual com seu contexto, todas formam o cidadão”. É uma verdade afirmar que todas as disciplinas são importantes, sendo assim a comunidade escolar deve estar pronta para entender que não se pode caracterizar essa ou aquela disciplina como mais importante. Percebe-se que faltam maiores discussões e reflexões sobre o papel da Educação Física na escola e os professores de Educação Física precisam ficar alertas para isso, sob pena de perderem sua importância no currículo escolar. Camara (2004, p.14) coloca que cabe ao professor explicitar e discutir os objetivos da disciplina com todo o grupo da sua unidade escolar.
Quando se questionou à coordenação escolar sobre a importância e os objetivos da Educação Física para os alunos, as respostas demonstraram que esta é de extrema importância para os educandos. Todos afirmaram que praticar Educação Física faz parte do desenvolvimento, contribuindo para tal. Citaram, dentre os objetivos da Educação Física, a promoção da disciplina, das regras, da socialização, dos valores, da integração, da cooperação, da atividade física e dos jogos, sendo todos estes elementos de muita importância para disciplinar e ao mesmo tempo distrair os alunos.
Percebe-se que a visão da direção e funcionários sobre a Educação Física é de que é uma disciplina abrangente, porém disciplinadora, como acontece no esporte de competição e ao mesmo tempo socializadora, como forma de lazer, distração e divertimento. No estudo realizado por Camara (2004) a maioria dos professores (94%) também considera a prática da Educação Física muito importante para a formação da criança e, apontam a socialização, promovida pelas atividades em grupo, como o fator mais importante desenvolvido pela disciplina.
Porém a dúvida que fica é: se a comunidade acadêmica reconhece o valor e importância da Educação Física para os alunos, por que ela ainda é vista como uma disciplina inferior às demais? Hipotetiza-se que a resposta seja: a Educação Física que todos desejam ainda está longe de ser uma realidade nas escolas.
Questionou-se ainda sobre a função do professor desta disciplina nesse contexto e os objetivos de trabalho do mesmo. A diretora afirmou que a Educação Física é “um componente curricular responsável para ajudar a manter o corpo e a mente sadia. Para a criança, é coadjuvante no desenvolvimento motor.” A Educação Física trabalha com o movimento e tem sua especialidade no desenvolvimento motor. Nesse processo é uma das responsáveis por tal função, entretanto não é a principal responsável pelo desenvolvimento motor dos alunos. Quem corrobora com essa ideia é Moreira (2004, p.1) ao afirmar que:
Será que poderia dizer que o seu objetivo é desenvolver habilidades motoras? Mas como poderia sustentar esse objetivo, se as aulas de Educação Física duram em média 45 ou 50 minutos duas vezes por semana, e as crianças, mesmo ironicamente contra a vontade da escola, se movimentam em outros ambientes por meio de estímulos e necessidades? As crianças necessitam das aulas de Educação Física para completar o seu desenvolvimento motor? Se pesquisas mostrarem que sim, seriam apenas 100 minutos por semana suficientes?
A função principal, ou seja, o objetivo maior da Educação Física vai muito além do desenvolvimento motor. Se fosse só isso, se estaria longe de conseguir alcançá-lo por começar pela precariedade dos materiais ofertados na maior parte das escolas e das condições de instalações.
Ainda seguindo as respostas da direção e dos funcionários sobre os objetivos do professor de Educação Física escolar, a vice-diretora cita que: “Além de ministrar suas aulas, auxiliar na organização de atividades esportivas e recreativas na escola como torneios, gincanas, etc.”. Percebe-se que esse pensamento é uma questão cultural instalada de que o professor de Educação Física deve ser um representante da escola na comunidade, responsável pela banda da escola e pela organização dos eventos. Concorda-se que o professor de Educação Física assuma essa função, mas não deveria ser função somente dele. Todos os professores têm que trabalhar juntos e o que se percebe é que essa função é sempre delegada aos profissionais de Educação Física, que muitas vezes para organizar tais momentos tem de deixar suas turmas sozinhas durante as aulas e isso evidencia o caráter de marginalização da disciplina pela comunidade escolar, pois o professor é visto como dispensável durante as aulas já que os alunos podem ficar sozinhos realizando as atividades. Esse fato é observável nesta escola, pois os professores de Educação Física assumem a coordenação da maioria dos eventos escolares.
Ainda na visão da coordenação escolar, mais uma vez as questões de integração dos alunos foram citadas, de disciplina, de aprender a trabalhar juntos e também desenvolver talentos esportivos como já citado anteriormente.
As opiniões sobre os objetivos da Educação Física são bem diversificadas, o que já se hipotetizava, pois nem os próprios profissionais da área apresentam uma opinião comum quando citam os objetivos da profissão. A Educação Física ainda precisa reformular seus objetivos, muitos estudos estão sendo realizados na área e cada vez mais ressaltam as questões de trabalhar o homem como um todo, levando em conta seus aspectos pessoais e os contextos. Entretanto, essas ideias aparecem mais no discurso dos pesquisadores do que na prática dos professores. Portanto, levantar os objetivos da Educação Física escolar hoje é um desafio e a resposta vai depender sempre da conjuntura do interlocutor.
Todos os alunos participantes da pesquisa disseram gostar das aulas de Educação Física. A maioria (57%) disse que gosta de Educação Física por causa dos esportes e das atividades físicas que têm oportunidade de praticar nas aulas. Graniel et al. (2006) alertam que os alunos muitas vezes por desconhecerem muitas atividades acabam por gostar apenas dos esportes, que é a modalidade mais trabalhada nas escolas de ensino fundamental e médio.
De acordo com os dados levantados os alunos gostam daquilo que já sabem fazer, ou seja, como é comum o futebol em suas vidas, a maioria (66%) diz preferir esta modalidade esportiva. Os demais citaram basquete ou vôlei, e dois alunos citaram que o que mais gostam na Educação Física é quando todos participam juntos, realizando a mesma atividade. Quando questionados sobre o que não gostam nas aulas responderam que não gostam daquilo que não sabem ou têm dificuldade em executar, citando esportes como vôlei e basquete como “ruins”.
Nesse sentido, Shigunov (1994, p.18) acredita que todo aluno tenha tendências para gostar de atividades que ele possa executar com êxito, obter satisfação e realizar-se na sua prática, portanto:
[...] as opiniões, as atitudes, os comportamentos, os valores e os interesses podem tomar, em um amplo contínuo, conotações positivas ou negativas, concernentes aos comportamentos dos intervenientes. Neste caso, isto envolve pessoas que estão ao seu redor, como professores, pais e colegas e também as variáveis perceptivas que intervêm com diferentes disposições afetivas.
Um dos alunos pesquisados fez uma análise verídica do que são as aulas de Educação Física nessa escola: “gosto das aulas por que são aulas livres, não fazemos a mesma coisa todos os dias” (A13). Observa-se que esse mesmo aluno, quando questionado se as aulas de Educação Física apresentam novidades, refere que “é sempre a mesma coisa. Só jogamos. Um aluno escolhe o esporte e todos jogam a mesma coisa”. Essa é a chamada aula livre. As chamadas aulas livres de Educação Física são aulas onde os alunos podem fazer o que querem, desde que pratiquem um esporte. A aula livre é considerada aqui, como “rola bola”, pois não há nela um objetivo didático e sim somente o de manter os alunos ocupados .
Durante as observações destas “aulas livres” o que se percebe na prática é que os alunos iniciam as atividades sozinhos e ao sentirem dificuldades perdem o interesse e então sentam e conversam até o final da aula, quando não optam por perturbar as demais aulas nesse período. Também é possível verificar que são sempre os mesmos alunos que jogam, tendo estes a oportunidade de excluir os demais sem a intervenção do professor. Fica evidente então que o professor é necessário até mesmo para motivar a turma a praticar as atividades até o término da aula e unir os alunos fazendo com que todos participem juntos. Os alunos precisam enxergar um objetivo palpável na Educação Física. Precisam entender o porquê ela é importante nas suas vidas realmente. Sobre isso Graniel et al.(2006, p.2) complementa quando coloca que “O bom trabalho de um professor também é um fator para a motivação do aluno, se não existe seriedade por parte do profissional o aluno é desestimulado, sendo prejudicado na aprendizagem dos conteúdos.”
Questionou-se os alunos para saber como os professores de Educação Física da escola os motivam para participar das aulas. Eles responderam que os professores motivam chamando-os para participar, lembrando que a participação de todos é importante e fazendo isso de modo alegre e divertido. Os alunos também disseram que a professora joga junto o que gera um atrativo a mais para que todos participem. Um dos alunos lembrou que é importante participar por causa da nota e outro ressaltou que a professora sempre chama todos lembrando a importância de se mexerem.
Deve-se saber estimular e motivar os alunos para a aprendizagem das habilidades que não adquirem fora da escola, portanto só largar a bola para que joguem por si não traz novidade alguma, uma vez que isso os alunos fazem em qualquer lugar. Segundo Brun (2006) para isso, as aulas devem ser prazerosas, informativas e contextualizadas, abordando conteúdos em forma de jogos, exercícios, atividades rítmicas, danças, lutas, ginásticas e brincadeiras.
Procurou-se saber quais os conteúdos são desenvolvidos nas aulas de Educação Física. 80% dos alunos citaram estar aprendendo esportes como futebol, basquete e vôlei. Os demais responderam coisas diferentes como é o caso dos alunos que disseram “não estamos aprendendo nada, só jogamos” (A4 e A13).
Outro aluno evidenciou que “está aprendendo sobre convivência em grupo, pois a professora cobra que não sejam egoístas e joguem juntos, participem respeitando os colegas” (A11) o que é algo bastante positivo. Já esse aluno evidencia os aspectos atitudinais, através dos valores que são trabalhados nas aulas de Educação Física.
A maioria (73%) dos alunos respondeu que as aulas são variadas, alegando que fazem o esporte que querem e quando querem. Já os 27% restantes entendem que variar entre três esportes não representa novidade e alegaram que “a educação física é sempre a mesma coisa, jogamos o que queremos”.
Solicitou-se que os alunos relembrassem a melhor aula de Educação Física que já tiveram a oportunidade de participar. De modo geral os alunos disseram gostar de todas as aulas. Um dos alunos lembrou de atividades de futebol americano que teve em outra escola. Outro aluno descreveu quando a escola realizou uma gincana para arrecadar materiais de higiene para doação aos idosos do asilo e considerou esta como umas das melhores aulas que já teve na escola. É interessante que 25% dos alunos disseram que as melhores aulas acontecem quando todos participam juntos e ocorre integração entre os alunos, fato esse que é percebido na fala do aluno diz “Quando fazemos atividades em grupos pois conhecemos mais os colegas” (A13).
Já, em relação a pior aula de Educação Física que os alunos participaram as respostas foram diversas. Alguns disseram gostar de todas as aulas e não ter nada para reclamar, outros quando o professor falta e ficam sem nada para fazer sendo obrigados a ficar na sala. Porém as causas principais para os alunos não gostarem das aulas é quando a turma briga ou quando o professor pede que os alunos pratiquem esportes que não estão acostumados. Essa realidade se apresenta como um paradoxo, pois se por um lado trabalham sempre a mesma coisa com os alunos, estes não evoluem, se tentam algo diferente tem-se que ultrapassar o obstáculo do preconceito e falta de vontade que os alunos apresentam com a novidade. Acredita-se que isso tem muito a ver com o modo como o professor apresenta as novas modalidades. Se os alunos sentirem-se frustrados, obviamente não irão querer aprender o novo esporte ou exercício.
A pergunta “O que você aprendeu até hoje na disciplina de educação física?” teve 90% das respostas os esportes coletivos, basquete, futebol e vôlei. Dois alunos citaram as atividades físicas como exercícios e um dos alunos disse que aprendeu com a educação física que “não somos melhores que os outros, que não devemos rir dos colegas por que eu também posso errar e não vou querer que riam de mim” (A4).
Dentre as várias tendências pedagógicas de Educação Física, a esportivista é uma das mais observadas nos dias de hoje, e nesta escola não é diferente. Porém cabe ressaltar aqui que os alunos dizem não ter aprendido as regras muito bem, e que durante as aulas somente praticam os esportes. Darido (2010) ressalta que é importante que o professor vá além do costumeiro jogar e salienta que para garantir um ensino de qualidade é preciso aprofundar os conhecimentos. Ou seja, se os alunos querem futebol então que saibam mais sobre ele do que técnicas e táticas e passem a entender as implicações desse esporte na nossa sociedade, podendo assim tornar-se capacitados para agir e transformar o seu contexto futuramente. Ainda sobre os esportes Shigunov (1994, p.89) completa:
A partir da entrada na escola, os desportos poderão desempenhar um papel fundamental no desenvolvimento corporal e social da criança, desde que se relacionem com os fatores gerais da educação, numa exploração organizada e lúdica, direcionada para os objetivos multidisciplinares, característicos do processo ensino-aprendizagem atualmente proposto e visando ao desenvolvimento das potencialidades, bem como á integração na vida em sociedade.
Deu-se aos alunos a oportunidade de falar o que gostariam de aprender nas aulas de Educação Física se pudessem escolher. As respostas foram variadas, mas de modo geral os alunos almejam aprender outros esportes, e querem sim, aprender as regras dos mesmos como fica evidente na fala de um aluno “queria que o professor botasse nós sentados e explicasse as regras” (A15). Outro aluno diz que “gostaria de mais atividades variadas, como por exemplo, na outra escola tínhamos circuitos, regras. Aqui só jogamos” (A13). A Educação Física é uma disciplina rica demais para ficar envolvida somente com os esportes e quem corrobora com essa ideia é Darido (2010, p.19) quando diz que:
Em virtude da ênfase esportivista, a educação física tem deixado de lado importantes expressões da cultura corporal produzidas ao longo da história do homem, bem como o conhecimento sobre o próprio corpo. Tais expressões – as danças, as lutas, os esportes ligados à natureza, os jogos – e conhecimentos podem e devem constituir-se em objeto de ensino e de aprendizagem.
A opinião dos pais foi obtida de forma indireta, através dos alunos entrevistados. Em relação a atitude dos pais incentivando que os filhos participem das aulas de Educação Física e se consideram a disciplina tão importante quanto as demais, as respostas demonstraram que os pais valorizam a disciplina e consideram importante. Porém, de acordo com o relato de 90% dos alunos, a Educação Física não é uma disciplina tão importante quanto as demais na opinião de seus pais. Quando questionados sobre qual a disciplina mais importante na opinião de seus pais os alunos respondiam, matemática e português. Ou ainda citavam “as disciplinas de sala de aula”. Todavia é preciso lembrar que a Educação Física também pode ser uma disciplina que acontece na sala de aula, que teoria e prática precisam andar juntas, e as explicações teóricas, na Educação Física não acontecem só dentro de quatro paredes. Assim sendo ela é uma disciplina tão importante quanto todas as outras para o desenvolvimento integral dos alunos.
Alguns alunos referem que matemática é mais importante para sua formação segundo seus pais, pois os prepara para o mercado de trabalho. Um aluno retrata uma situação que aconteceu e que deixa a par o cenário que a disciplina tem para os pais “na opinião dos meus pais a educação física é menos importante que as demais disciplinas pois, já me mandaram estudar para o teste da aula posterior durante a aula de educação física” (A15). Com essa atitude a Educação Física aumenta sua visão de desmerecimento, ou seja, os pais julgam a Educação Física importante, mas de forma geral julgam as disciplinas “teóricas” mais importantes para seus filhos do que a Educação Física, que segundo a maior parte dos alunos é um momento de descontração e lazer.
Solicitou-se que os demais professores elencassem uma nota para avaliar o trabalho dos professores de Educação Física na sua escola, com a escolha entre 5 a 10 para que fosse possível quantificar a percepção destes. A nota mais baixa ficou a cargo da professora de matemática, esta que criticou bastante o modo de se fazer Educação Física na sua escola, deu uma nota 07 para o trabalho dos seus colegas professores de Educação Física. As demais notas ficaram entre 9 e 10, tendo como média final a nota de 8,8, na avaliação dos demais professores.
Também foi solicitado que a direção e funcionários concedessem uma nota avaliando o trabalho dos professores de Educação Física na sua escola entre 5 a 10. Na média final a nota que prevaleceu foi 9,5.
Em relação ao que poderia melhorar nas aulas de Educação Física que ocorrem na sua escola, todos tinham algo para acrescentar, desde a escola adquirir uma quadra coberta ou ginásio, que realmente faz falta para o bom trabalho do professor, até sugestões para que o professor trabalhe as questões de obesidade infantil com os alunos. Também falou-se sobre os professores de Educação Física trabalharem com modalidades esportivas variadas, como atletismo e ginástica. Porém, fica difícil do professor de Educação Física realizar uma aula ideal, pois a realidade da própria escola já é difícil não tendo nem bolas suficientes para as aulas. Por exemplo, não é possível realizar os movimentos da ginástica, devido a falta de colchões para execução de tal atividade. Assim, faltou a direção e funcionárias da escola o conhecimento de que na ausência de materiais adequados para o professor realizar seu trabalho, este torna-se inviável. É de conhecimento de todos que as escolas públicas têm um poder aquisitivo baixo, sofrem com a falta de recursos em todas as áreas, porém dar aulas de Educação Física sem material torna-se complicado em algumas situações, mesmo sendo criativo. Em um estudo realizado por Nascimento et al. (2012) na cidade de Cruz Alta-RS/Brasil, ficou evidenciado que uma das maiores dificuldades apontadas pelos próprios professores de Educação Física ao lecionar aulas é a falta de disponibilidade de materiais adequados.
A escola conta com professores assíduos nas reuniões pedagógicas, porém estar presente não é o mesmo que estar participando e defendendo a profissão com seriedade. É preciso que os professores saiam da zona de conforto e passividade em aceitar as condições impostas sem lutar, pois como explicita Medina (2001, p.13) sobre a disciplina de Educação Física o que mais assusta não é o desprezo e a discriminação em si, mas sim a passividade com que se aceita todos os seus condicionamentos. O autor alerta para a omissão dos profissionais que às vezes aceitam condições péssimas por não saber defender seu ponto de vista com argumentos válidos.
Relação entre a formação do professor de Educação Física, seu entendimento sobre objetivos e importância da Educação Física e a percepção da comunidade escolar a cerca do seu trabalho
Durante a pesquisa foram entrevistados dois professores de Educação Física. Um do sexo feminino (prof. 2) e um do sexo masculino (prof. 1). Em relação a formação continuada estes não possuem cursos de pós-graduação e são formados em média a mais de 15 anos. Um deles tem curso de atualização sobre Educação Física e qualidade de vida (prof. 1), o outro respondeu que seu último curso de extensão foi no ano passado sobre as Lições do Rio Grande1, curso esse que foi realizado por iniciativa própria (prof. 2). A professora alegou que gostaria de fazer mais cursos, porém não tem tempo nem recursos para tal (prof. 2). Realmente isso remete a uma realidade da maioria dos profissionais da educação. Em relação ao último livro pedagógico que teve contato, um dos professores não respondeu nada (prof. 1) e o outro (prof. 2) não especificou mas garantiu estar sempre a procura de atualizações, seja por livros ou Internet.
No que se refere aos objetivos e importância da Educação Física para os professores de Educação Física, o primeiro professor usa da fala de estudos publicados para buscar os objetivos da Educação Física.
“É proporcionar atividades físicas, estabelecendo relações equilibradas e construtivas com os outros, reconhecendo e respeitando características físicas e o de desempenho de si próprio e dos outros, sem discriminar por características pessoais, físicas, sexuais ou sociais” (prof. 1).
“É contribuir significativamente no processo de desenvolvimento da criança (intelectual, emocional, social e física” (prof. 2).
Quando questionados sobre a importância da Educação Física na escola as respostas foram:
“Desenvolver o corpo e a mente de forma equilibrada, fazendo com que os alunos respeitem as diferenças, e sejam inseridos no grupo” (prof. 1).
“Desenvolver a psicomotricidade, habilidades físicas, integração social. Proporciona nos alunos a autonomia de tomar suas decisões, trabalhar em equipe, respeito (valores humanos), atividade física e saúde” (prof. 2).
Parece que a visão destes professores vai além dos esportes tradicionais, porém o que foi observado nas aulas do professor 1 é que este, na prática, não ultrapassa esta barreira esportivista. Já a fala do professor 2 é bastante coerente com sua prática, pois é observado que este mantém uma tendência forte por trabalhar as questões atitudinais, tanto que nas suas aulas os alunos apresentam um comportamento muito bom, as brigas são quase inexistentes, o professor cobra respeito entre todos, não permite que falem palavrão e joga junto com a turma, motivando-os, interagindo com os alunos o tempo todo.
Existe uma grande diferença entre saber o que fazer e realmente fazer, ou seja, não basta que o professor saiba exatamente o que deve ser feito, se este não coloca seus conhecimentos em prática durante suas aulas. Medina (2001, p. 60) corrobora com essa ideia ao colocar que:
[...] há uma distância quilométrica que separa os objetivos estabelecidos para a Educação Física daquilo que é realmente assimilado pela maioria dos professores e, na seqüência, pela quase totalidade dos estudantes. Por outro lado, não resta a menor dúvida de que existe uma enorme defasagem entre o discurso e a ação.
Quando questionados se consideram o professor de Educação Física um profissional indispensável na escola, ambos concordaram que sim, conforme suas falas:
“Sim, a Educação Física na escola é indispensável, pois ela é uma disciplina que faz o contrapeso entre a aulas teóricas e práticas.” (prof. 2).
“É essencial para o desenvolvimento da criança” (prof. 1).
Sobre a fala do Prof. 2, é preciso lembrar que a Educação Física também trabalha conteúdos teóricos, embora na maior parte das vezes as aulas são baseadas em movimento, ensinar teoria é explicar aos alunos as razões do que se está fazendo, o porquê é importante, o contexto das atividades. Entender que Educação Física é uma disciplina que não envolve teoria e conhecimentos aprofundados é contribuir para a marginalização da mesma perante as demais disciplinas. Medina (2001, p.13) corrobora com essa ideia ao explicitar que:
É justamente essa hipertrofia das manifestações intelectuais uma das fortes razões pela qual a cultura do corpo – em especial a educação física – vem sendo colocada em planos inferiores na escala de valores que foi se formando em nossa nação.
Ambos os professores de Educação Física acreditam que seu trabalho é bem visto pela comunidade escolar e dizem planejar suas aulas com antecedência, porém apenas o professor 2 citou pesquisar em livros e na internet.
A seguir questionou-se se o professor segue alguma abordagem, teoria ou concepção de Educação Física para planejar suas aulas. Um dos professores respondeu que “Uso as abordagens, teorias ou concepção como base. O professor de educação física tem autonomia para suas aulas, mas depende muito da proposta político pedagógica da escola onde atuamos” (prof. 2). Sua resposta evidencia que não adianta o professor ter planejado a aula de uma forma, se a escola quiser que ele faça de outra. Porém o professor tem que ter argumentos suficientes para defender seu método de trabalho, ele tem que saber argumentar sobre os benefícios de trabalhar desta ou de outra forma, pois segundo Medina (2001, p. 73):
[...] a educação física não é capaz de justificar a si mesma, ou que não é capaz de encontrar a sua própria identidade, isso na verdade que dizer que os profissionais não são capazes de justificá-la ou de dar uma identidade a ela (e, por conseqüência, não conseguem defini-la satisfatoriamente).
Já o outro professor (1) deixou esta questão em branco, teve outras oportunidades para responder, porém não o fez. Sendo assim, este garantiu que planeja suas aulas, mas não soube dizer baseado em quê. Neira (2006, p.16) reforça sobre a importância do planejamento e da teoria para o professor, ao explicitar que:
Ao entendermos a escola como um espaço de formação da cidadania, permeado por princípios democráticos e cuja relação professor – aluno – conhecimento se dá de forma planejada e fundamentada em bases científicas, não são viáveis em seu interior vivências que se afastem desse ideal.
Assim, as finalidades, os objetivos, os conteúdos, os métodos e o próprio conceito dessa disciplina são condicionados pelo grau de consciência individual e coletiva dos que trabalham nessa área da atividade humana. Portanto, de acordo com as diferentes visões de homem e de mundo que porventura se tem, diferentes serão as concepções a respeito.
Através das observações das aulas do professor 01 o que se percebe é o típico “rola bola”, pois o que se observa são aulas onde o único trabalho do professor é alcançar a bola para os alunos jogarem, mesmo com o professor se utilize de conhecimento teórico para descrever os objetivos da Educação Física, pois de acordo com Medina (2001, p. 73)
É também verdade que determinada concepção, por mais brilhante que possa parecer, não é suficiente para garantir uma atuação igualmente brilhante por parte dos defensores de tal concepção, se faltar autenticidade na concretização do processo.
Quando questionados se têm outro emprego além de ser professor de Educação Física, o professor 01 respondeu ser advogado e o professor 02 não possui outra ocupação além de educador.
Enfim, como educadores a responsabilidade é grande e fazer a Educação Física ser percebida como essencial e não apenas recreio é uma das lutas de professores preocupados com seu trabalho, pois assim ele poderá ser valorizado. Só então, segundo Neira (2006, p. 4) na ótica de modernos posicionamentos pedagógicos que direcionam a função social da escola para a formação cidadã se educa para a transformação de uma sociedade mais justa e humana.
Conclusão
Os alunos gostam de participar das aulas de Educação Física, ainda que por motivos que não sejam o fazer pedagógico em si, mas gostam. Isso é um fator importante, pois para aprender é necessário querer aprender. O movimento está presente nas formas de prazer dos alunos e o professor pode usar desse prazer para modificar sua prática pedagógica e conseguir efetivamente ser útil para a formação integral dos alunos.
Ainda sobre os alunos, estes enxergam a Educação Física como momento de praticar os esportes que desejam ou como “aula livre”. Estes clamam por objetivos mais claros nas aulas, por novidades e parecem realmente querer adquirir conhecimentos aprofundados sobre os esportes, pois a oferta destes é o que tem sido comum durante a vida escolar. Porém, o modo como o professor de Educação Física implementará novos esportes e jogos é fundamental para o sucesso, pois se os alunos sentirem-se frustrados estes não desejarão mais entrar em contato com a modalidade.
Também é importante registrar que os alunos sabem que as aulas deveriam ser melhores, que estes quando tem experiências novas com a Educação Física não esquecem e passam a compreender que esta aula é mais do que simplesmente jogar. As atividades onde todos participam são valorizadas pelos alunos, pois estes gostam de sentirem-se incluídos e através desses momentos sentem-se mais perto dos colegas.
Para os professores de outras disciplinas, estes compreendem o papel amplo que a Educação Física apresenta para os alunos, desde que esta Educação Física seja realizada com seriedade e com objetivos a serem alcançados. O professor de matemática foi o único a se comprometer falando sobre o que enxerga das aulas de Educação Física, porém durante as coletas de dados deste estudo uma professora pediu para não participar da pesquisa pois se falasse o que pensava iriam “brigar com ela”, e ao ser questionada sobre sua percepção sobre Educação Física esta foi taxativa quando afirmou que em sua opinião Educação Física não servia para nada pois os alunos só jogavam por jogar e não aprendiam nem a fazer isso já que não existiam cobranças.
Para a coordenação escolar a Educação Física é importante, porém Português é tido como a disciplina mais importante para a formação do aluno. Gostariam de ver mais variabilidade de atividades nas aulas de Educação Física, mas não ofertam ao professor o mínimo de material para os esportes mais simples.
Os professores de Educação Física desta escola não sabem dizer que concepção de ensino utilizam, mas ficou evidenciado através de sua prática que utilizam métodos esportivistas como metodologia de ensino. Um dos professores é coerente com sua fala, pois trabalha as questões atitudinais e o outro evidencia ainda uma Educação Física bastante esportivista. No discurso, os professores de Educação Física desta escola são conscientes da importância do seu trabalho e dos objetivos amplos que este tem, mas somente um deles põe em prática o que pensa. Os professores de Educação Física são formados há muito tempo, não possuem pós-graduação e realizam poucos cursos de atualização.
Portanto, conclui-se que, os professores de Educação Física entendem que a função da Educação Física vai bem além dos esportes tradicionais, porém não conseguem transpor essas barreiras através de suas aulas. A comunidade escolar aprova seu trabalho, mas pedem mais objetivos e variabilidade. Já, os alunos desejam saber mais dos esportes e ter variabilidade das aulas, mas ao mesmo tempo têm medo e receio da novidade.
Nota
Curso oferecido pela Secretária Estadual de Educação.
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