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Considerações sobre a aprendizagem do crawl 

e costas para as crianças da primeira infância

Consideraciones sobre el aprendizaje de crol y espalda en los niños en la primera infancia

 

*Escola de Educação Física e Esporte da USP

**Centro Universitário UniÍtalo

(Brasil)

Virgínia Ferreira Furtado*

Prof. Dr. Antonio Carlos Mansoldo* **

mansoldo@usp.br

 

 

 

 

Resumo

          Com a popularização de aulas de Natação para a primeira infância, como objetivo diminuir o risco de afogamentos em crianças, torna-se necessária a atenção do processo de ensino e aprendizagem adequado a faixa etária para o ensino da Natação. Para tanto, deve ser levado em consideração os aspectos que caracterizam a modalidade, os aspectos técnicos, além das características físicas, motoras, cognitivas e sócio-afetivas da faixa etária. Outro fator que também deve orientar o ensino na Natação deve ser o desenvolvimento motor aquático e os processos pedagógicos que se aplicam a este. A partir desta revisão de literatura, pôde-se concluir que nesta faixa etária, deve-se utilizar atividades que privilegiam a inteligência intuitiva e priorizar o maior repertório motor. Dentro da primeira infância deve-se dividir em duas faixas, dois a quatro anos e cinco a sete anos. Na primeira, deverá ser feito o trabalho de perna e braçadas apenas a fase submersa. Na segunda faixa, é quando a criança atinge o padrão maduro de pernada e está apta a realizar habilidades mais complexas como a fase aérea de braçadas.

          Unitermos: Natação. Primeira infância. Ensino-aprendizagem. Desenvolvimento motor aquático.

 

Abstract

          With the popularization of swimming lessons for the early childhood, as objective decrease the risk of drowning in children, it becomes necessary to attention of teaching and learning process appropriate to the age group for the teaching of swimming. For both, it should be taken into consideration the aspects that characterize the modality, the technical aspects, in addition to the physical characteristics, motor, cognitive and social-affective of age group. Another factor that should guide the teaching of swimming should be the development engine aquatic and the pedagogical processes that apply to this. From this review of the literature, it can be concluded that in this age group, you must use activities which emphasize intuitive intelligence and prioritize the largest motor repertoire. Within the first childhood should be divided into two tracks, two to four years and five to seven years. At first, it should be done the work of leg and strokes only the stage submerged. In the second track, and when the child reaches the standard of mature involving pruning and is able to perform more complex skills, such as the air phase of strokes.

          Keywords: Swimming. Early childhood. Teaching for. Motor development aquatic.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 17, Nº 178, Marzo de 2013. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Um dos principais motivos de pais aprenderem a nadar ou mesmo colocarem seus filhos para aprender a nadar, seria a segurança em evitar afogamentos (MOISÉS, 2006). Estudos mostram que o afogamento é considerado uma das maiores causas de morte em acidentes com crianças (BACARAT et al., 2009) e aulas de Natação podem reduzir em até 88% este risco (BRENNNER et al., 2009).

    Neste contexto, aulas formais de Natação tem se popularizado entre crianças da primeira infância, o que pode-se perceber pela crescente inserção da modalidade em escolas e academias (ZULIETTI & SOUSA, s.d). Em virtude disto, muitos clubes o processo de ensino-aprendizagem focam-se somente na técnica sem levar em consideração os aspectos básicos da aprendizagem e da faixa etária a ser trabalhada, mesmo quando a criança já está adaptada ao meio líquido (MOISÉS, 2006).

    Mas antes mesmo de observar os aspectos da aprendizagem motora, deve-se levar em consideração as necessidades individuais do aluno, como as características físicas, motoras, cognitivas e sócio-afetivas. Saber se a criança está apta a realizar os movimentos é essencial para tornar a aprendizagem mais eficiente, caso contrário será inútil todo o esforço (MANSOLDO, 1986).

    Segundo MANSOLDO (2009), o primeiro nado a ser ensinado deve ser o Crawl, por sua similaridade com o caminhar e o correr, devido os movimentos alternados. Isso deve ocorrer com maior ênfase a partir dos 5 anos, em que a criança consegue assimilar movimentos mais complexos como os da braçada do Crawl. Ainda segundo o mesmo autor, o segundo nado deve ser o Costas, por sua similaridade com o Crawl, que permite maior transferência de aprendizagem. Apesar disto, é deixado bem claro que trabalhar os padrões de movimento dos outros nados, além de adiantá-los, propicia um maior desenvolvimento neuromotor da criança (MANSOLDO, 2009).

    Portanto é necessária a atenção ao processo de ensino-aprendizagem dos primeiros nados a serem abordados, Crawl e Costas, num processo evolutivo de complexidade e especificidade adequados a primeira infância na Natação para crianças já adaptadas a água levando em consideração as características desta faixa etária.

Crescimento e desenvolvimento na primeira infância

    Segundo GALLAHUE & OZMUN (2005), os indivíduos de 2 a 6 anos, encontram-se na fase inicial da infância (aqui considerada como 1ª infância), e seu crescimento é lento com uma velocidade média constante, apresentando apenas micro-estirões durante a fase da primeira e segunda infância (4, 7 e 9 anos). Assim, ainda de acordo com GALLAHUE & OZMUN (2005), o período do início da infância representa um período ideal para desenvolver e refinar habilidades motoras até mesmo esportivas.

    Ainda segundo GALLAHUE & OZMUN (1995), nesta faixa etária as crianças encontram-se na fase dos movimentos fundamentais. Nesta fase, devem ser trabalhados os movimentos básicos sem combinação ou estilo.

    Conforme McClenaghan e Gallahue (1978), neste período as crianças aprendem um movimento simples até atingir um padrão de movimento adequado. Assim, deve-ser trabalhar para que em cada padrão seja atingido o estágio maduro, principalmente quando se pensa em uma iniciação esportiva e um processo a longo prazo. Apesar disto, combinações e movimentos complexos serão adquiridos com dificuldade, devendo por tanto serem trabalhados na próxima fase.

    Já os processos mentais envolvidos na aquisição de conhecimentos devem possuir grande atenção, pois irão influenciar diretamente na abordagem que o profissional deverá ter. Na fase da primeira infância, segundo Piaget, a criança encontra-se no estágio Pré-Operacional, ou estágio de inteligência prática (PIAGET,1964 apud RIPPLE & ROCKCASTLE, 1964).

    Neste estágio a criança ainda preserva o caráter egocêntrico do estágio Sensório-Motor, entretanto já diferencia o eu do meio ambiente. Assim, a criança consegue representar objetos e acontecimentos e lembrar seus significados, mesmo que não estejam presentes, adquirindo uma função simbólica. Desta forma, as sensações e experiências anteriores são evocadas sobre objetos de maneira animista (vida às coisas) e também através do faz de conta.

    Assim o pensamento simbólico acontece não por dedução, mas através de jogos simbólicos. Como não possui pensamento lógico, não consegue colocar-se na situação do outro e aceitar o acaso, e portanto, tudo deve ter uma explicação para causa e finalidade, identificada pela época do “por quê?”. Além disto, há a distorção da realidade em função de seus desejos, tornando este egocentrismo responsável pelos pensamentos artificialistas (tudo para o homem).

    Segundo Zulietti & Sousa (s.d) nesta faixa etária deve-se explorar as brincadeiras e o lúdico para atingir os objetivos, como por exemplo utilizar nomes para caracterizar as fantasias (ex: foguete para a posição hidrodinâmica).

    Desta forma, percebe-se que para esta faixa etária, explicações tecnicistas e lógicas não serão eficientes para a aquisição de conhecimentos que a Natação envolve. E por tanto, a abordagem deverá privilegiar a inteligência intuitiva, fornecendo à criança a maior vivência motora possível, de modo que através da percepção ela consiga identificar como deverá ser realizada a atividade.

    Já nos aspectos sociais, ainda segundo Piaget (1964 apud RIPPLE & ROCKCASTLE, 1964), as crianças desta faixa etária realizam monólogos e jogos paralelos. Assim, mesmo que as crianças pareçam estar juntas, cada uma está brincando individualmente. Por isto, nesta faixa etária, prioriza-se atividades em grupo, mas que não necessitam de ações em conjunto, como por exemplo estafetas, que permitem a ação individual.

    Na Natação, como uma modalidade individual, podemos abordar o revezamento, como uma forma de permitir ações em grupo. Mesmo que para a determinada faixa etária não seja exigida técnica dos nados, e sim a vivência do próprio revezamento como parte integrante dos conteúdos da Natação.

Desenvolvimento motor aquático aplicado ao ensino da natação

    Para compreender melhor o processo de aprendizagem, é necessário entender como acontece o desenvolvimento motor aplicado a natação, que compreende em 6 níveis de desenvolvimento (Xavier Filho & Manoel, 2002):

  1. Reflexo de nadar;

  2. Controle postural voluntário;

  3. Nado Humano elementar;

  4. Crawl rudimentar;

  5. Nados Especializados;

  6. Competência aquática;

    Estes níveis de desenvolvimento são tratados pelo autor como padrões e não como erros de performance, visto que a criança irá passar por estes estágios até chegar aos padrões técnicos dos nados competitivos. O autor ainda refere o modelo como base para aprender os nados formais, de forma que ao longo do processo de aprendizagem a criança, ganhe consistência motora e os comportamentos variáveis sejam minimizados.

    O primeiro nível acontece até os 4 meses de idade, quando bebês colocados em posição ventral apresentam movimentos coordenados de braços e pernas e controle respiratório (McGraw, 1939). O segundo nível, controle postural voluntário, a criança perde os reflexos de movimento e controle respiratório, passando por uma fase de movimentos desorganizados e começa a aprendê-los de maneira voluntária. A criança nesta fase tem a tendência a se manter em pé, e deve reaprender a manter-se na posição pronada. É a partir do segundo ano de vida que a criança passa a restabelecer o controle postural na posição ventral, realizando movimentos propositais e bem coordenados, apesar de ineficientes para realizar deslocamento. (McGraw, 1939). Por este motivo dentre este modelo iremos considerar apenas aqueles que envolvem a primeira infância já adaptada ao ambiente aquático, ou seja, a partir do terceiro nível, em que é possível aprender aspectos dos nados competitivos.

    O estudo de Erbaugh (1986) avaliou 126 crianças entre 2 e 5 anos com e sem experiências prévias, que receberam duas aulas semanais, totalizando 20 aulas no semestre. Ambos os grupos mostraram uma melhora significativa em 2.5 semestres quando comparados ao grupo controle, entretanto o grupo com experiências prévias mostrou performance mais avançada nas avaliações, indicando que a adaptação da criança ao meio aquático é fundamental para a execução das tarefas e conseqüentemente a aprendizagem dos nados. Este estudo também indica que ao entrar na fase de movimentos voluntários, a partir dos dois anos, a criança já está apta a realizar aulas regulares.

    Em outro estudo sobre a eficiência da aprendizagem da Natação em crianças de 3 a 8 anos de idade, Mansoldo (1986) indica que é após os 5 anos que a aprendizagem dos movimentos técnicos dos nados terão resultados eficientes, entretanto a técnica adquirida ainda é rudimentar. Dos 3 aos 4 anos a flutuação e o batimento de pernas são adquiridos com facilidade, e quando inclusos os movimentos de braçadas são executados com dificuldade, mesmo com o apoio da prancha. Ainda segundo Mansoldo (1986) a prática da natação antes dos 6 anos é limitada, pois estes não conseguem realizar movimentos complexos como a coordenação global do nado Crawl e portanto, durante este período não se deve ensinar técnicas apuradas.

    Zulietti & Sousa (s.d.) da mesma forma, descreve as diferenças das técnicas dos nados Crawl e Costas para crianças de 3 a 6 anos. Assim, para crianças dos 3 aos 4 anos deve ser feito o trabalho de pernas e braçadas somente fase submersa, pois a fase aérea ainda é realizada com dificuldade. Ainda segundo Zulietti & Sousa (s.d.), é a partir dos 5 anos que observamos a pernada e respiração específica do Crawl e a fase aérea das braçadas são realizadas com maior facilidade. É a partir desta idade também, que pode a criança começa a realizar movimentos mais elaborados até conseguir realizar o nado completo.

    Assim, podemos perceber certa congruência com as etapas de GALLAHUE & OZMUN (1995), em que devem ser trabalhadas as habilidades básicas sem combinação e técnica, sendo o objetivo principal obter o padrão maduro de todos os padrões básicos de movimento. Apesar de ser a partir dos dois anos de idade que a criança possa começar a realizar aulas regulares é a partir dos 5 anos é que as habilidades complexas e movimentos combinados serão adquiridos com maior facilidade. Desta forma poderemos ajustar duas etapas do ensino dos nados Crawl e Costas aos níveis de desenvolvimento motor. Em uma primeira, para crianças de 3 e 4 anos que já alcançaram a etapa do “nado humano elementar” , na qual deverá ser desenvolvidas habilidades simples, adiantando as habilidades básicas da natação e também proporcionando a criança um maior repertório de movimentos (MANSOLDO, 2009). Dentre as habilidades do nado Crawl e Costas que podem ser desenvolvidas durante esta etapa estão às pernadas alternadas e a fase submersa das braçadas (Zulietti & Sousa, s.d.).

    Ao entrar na faixa etária a partir dos 5 anos, a criança já estará mais suscetível a realizar movimentos complexos (Zulietti & Sousa, s.d) pertencendo ao nível “nado Crawl rudimentar” , poderá ser incluída a fase aérea das braçadas do Crawl e Costas. Além disso, poderá aumentar a complexidade dos movimentos por combinar outras habilidades básicas.

Processo pedagógico de Palmer (1990)

    Em 1990, Palmer já havia estabelecido um processo pedagógico da seguinte forma: Nado Natural Humano, Nado Natural Humano de Costas, Crawl e Costas. Ao observarmos este processo, percebemos que está de acordo com o desenvolvimento motor, mas que deve ser aplicado na fase correta deste. Assim, abordaremos cada fase a partir do Nado Natural Humano.

Nado Natural Humano

    O nado Natural Humano deve ser executado com o corpo na horizontal, pernadas alternadas executadas no plano vertical, o movimento de braços se resume a “puxar água para trás” e cabeça fora da água (Palmer, 1990). Assim, esta etapa pode ser aplicada a crianças de até 4 anos, visto que não há fase aérea da braçada e a pernada assemelha-se a do Crawl (Mansoldo, 1986). Deve-se lembrar de que neste período mesmo a pernada será realizada de maneira rudimentar, apesar de ser mais facilmente assimilada (Mansoldo, 1986; Uma et Al., 1983).

    Exercícios sugeridos por Palmer (1990) são: batimento de pernas na borda, no corrimão ou com flutuadores, movimentar-se em pé com ajuda das mãos e o posicionamento do corpo em decúbito ventral.

Nado Natural Humano de Costas

    O Nado Natural Humano de Costas deve ser executado com o corpo na horizontal, com pernadas semelhantes ao do Nado Natural Humano, os movimentos dos braços assemelham-se a sustentação do tipo remada e a cabeça fica apoiada na água (Palmer, 1990). O autor cita o movimento de braços um pouco mais complexo do que o do Nado Natural Humano e assim, deve-se manter uma especial atenção neste movimento.

    Da mesma forma que o Nado Natural Humano, a pernada assemelha-se a do nado Costas e não há fase aérea das braçadas, podendo ser mais facilmente assimilada por crianças até 4 anos (Mansoldo, 1986; Uma et Al., 1983).

    Os exercícios sugeridos por Palmer (1990) são: batimento de pernas na borda ou abraçando o flutuador, remada em pé, remada com os pés fixos no corrimão e corpo estendido na água e então soltando-se do corrimão.

Conclusão

    Para a primeira infância, um trabalho específico deve ser feito. Sobre os aspectos cognitivos, deve-se privilegiar a inteligência intuitiva e a abordagem do professor deve orientar a atividade de modo que a criança consiga identificar a atividade. O trabalho na Natação também deve priorizar o maior repertório motor, trabalhando de modo a atingir um padrão de movimento dentro dos elementos básicos da modalidade.

    Apesar de esta faixa etária de 2 a 6 anos ser abordada como primeira infância, pode-se dividir em duas faixas a serem trabalhadas, dos três e quatro anos que não conseguem realizar movimentos complexos e a habilidade do Crawl é realizada de maneira rudimentar. Nesta faixa, a fase aérea das braçadas são as mais difíceis para as crianças e, portanto, podem ser trabalhadas as fases submersas. As pernadas do Crawl e Costas, que tendem ser o trabalho principal desta fase. A outra faixa a ser trabalhada é a dos cinco e seis anos, em que a criança está apta a aprender habilidades complexas e irá realizar o nado Crawl com mais facilidade.

    Apesar de focar a aprendizagem dos nados Crawl e Costas, devem ser trabalhadas outras habilidades básicas da Natação, privilegiando o desenvolvimento do repertório motor aquático da criança.

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