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Planeamento ambiental no desporto de natureza: 

proposta teórica de uma Matriz de Planeamento Ambiental 

em Atividades de Desporto de Natureza (MPA-ADN)

Planeamiento ambiental en el deporte en la naturaleza: propuesta teórica de una Matriz 

de Planeamiento Ambiental en las Actividades Deportivas en la Naturaleza (MPA-ADN)

 

*Licenciado em Desporto de Natureza e Turismo Ativo pela Escola Superior

de Desporto de Rio Maior (ESDRM, 2008). Mestre em Desporto, especialização

em Desporto de Natureza (ESDRM, 2011). Doutorando em Ciências do Desporto

pela Universidade da Madeira (em desenvolvimento). Docente na ESDRM

Subcoordenador da Licenciatura em Desporto de Natureza e Turismo Ativo (ESDRM)

Membro da Unidade de Investigação do Instituto Politécnico de Santarém (UIIPS)

**Doutor em Ciências do Desporto pela Universidade de Trás-os-Montes

e Alto Douro (UTAD, 2006). Coordenador da Área de Especialização Técnica

de Desporto de Natureza e Turismo Ativo (ESDRM)

Coordenador da Subárea científica de Pedagogia do Desporto (ESDRM)

Coordenador da Licenciatura em Desporto de Natureza e Turismo Ativo (ESDRM)

MsC. Paulo Filipe Rosa*

PhD. Luís Alberto Dias Carvalhinho**

prosa@esdrm.ipsantarem.pt

(Portugal)

 

 

 

 

Resumo

          As preocupações com as questões ambientais caracterizam fortemente as sociedades do século XXI, sendo um dos principais motivos de reflexão dos vários setores sociais. O desporto, como fenómeno mundial, movimenta milhões de pessoas, recursos financeiros, humanos e infraestruturas. É esta movimentação que permite a existência do fenómeno, nas suas mais variadas formas, desde os grandes espetáculos desportivos, até, em menor escala, às atuais práticas de aventura, em contato estreito com a natureza. É sobre este setor, a prática desportiva em contato com a natureza, denominada no território português como Desporto de Natureza, que se desenvolve o presente trabalho, cujo objetivo geral, reside na proposta teórica de uma Matriz de Planeamento Ambiental para Atividades de Desporto de Natureza (MPA-ADN), realizadas no âmbito da recreação e do turismo. Foi utilizada uma metodologia qualitativa, baseada na revisão de trabalhos científicos e técnicos, através de processos de análise documental. A análise dos dados e sua discussão foi realizada segundo diferentes perspetivas da gestão, contemplando a visão da (i) Gestão Ambiental; (ii) Gestão do Desporto; (iii) Gestão do Turismo e da (iv) Gestão da Recreação e do Turismo em Áreas Protegidas. Tivemos como objetivo principal, encontrar pontos comuns entre as várias perspetivas, evidenciado referências em dois fatores essenciais para a construção da MPA-ADN, consistindo ao mesmo tempo, objetos específicos deste trabalho: 1) Fases do planeamento ambiental, essenciais para a estruturação da matriz; 2) Variáveis ou componentes mais comuns, consideradas nas diferentes fases do planeamento ambiental. A discussão dos resultados permitiu contextualizar a temática, encontrando cruzamentos e adaptações das várias perspetivas analisadas. Permitiu também, a construção da proposta teórica da MPA-ADN. Através da análise e discussão efetuadas, concluímos que o modelo proposto, se aparenta objetivo, concreto e adaptado à realidade das instituições que promovem o desporto e a animação turística. Verificamos ainda que uma aplicação/teste desta metodologia é essencial para que se possa validar a sua eficácia e contributo efetivo para o futuro.

          Unitermos: Atividades de Desporto de Natureza. Turismo. Planeamento e gestão ambiental. Gestão do desporto. Gestão de Áreas Protegidas.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 17, Nº 175, Diciembre de 2012. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Os espaços naturais oferecem, por oposição aos espaços urbanos, um envolvimento e uma ordem diferente relativamente às suas características. Quando um praticante desportivo realiza a sua atividade em meio natural, tem acesso a um conjunto de elementos que lhe faltariam se o realizasse numa instalação desportiva de tipo fechado ou coberto. Os elementos “ar”, “terra” e “água” conseguem ser suporte de muitas atividades que se baseiam num ou em vários desses elementos para poderem ser realizadas (Cunha, 2007).

    A história da recreação outdoor poderia ser revista há muitos séculos atrás, desde o tempo em que era exclusiva das grandes elites sociais, em atividades de caça por exemplo, passando pelo desenvolvimento da classe média urbana que visitava as zonas costeiras e montanhosas usando uma rede já desenvolvida de transportes públicos, até à recreação massiva e ao desenvolvimento de serviços turísticos que caracterizam muitos destinos atuais (Bell, Tyrväinen, Sievänen, Pröbstl & Simpson, 2007).

    A gestão ambiental, por sua vez, tem um caráter mais recente e é um processo bastante abrangente, podendo ser efetuado aos mais variados níveis e setores empresariais. Ao desenvolver acerca desta temática, diferentes setores foram tidos em conta, nomeadamente o desporto, o turismo e as áreas protegidas. Cada um destes contextos foi brevemente caracterizado e pudemos observar, em todos eles, um potencial de aplicação de processos de gestão ambiental. Aparentemente, o desporto, é um dos setores alvo de menor desenvolvimento, sobretudo ao nível dos eventos/atividades em contato com a natureza, sendo atualmente apenas os grandes eventos portadores de alguma atenção. Por outro lado, o turismo, pela grande atividade comercial que o rodeia, tem sido alvo de cada vez maiores adesões a Sistemas de Gestão Ambientais (SGA’s) (e.g. EN ISO 14001; EMAS), por parte de médias e grandes empresas. As áreas protegidas, num contexto diferenciado, e que se afasta do evento/atividade pontual, acumulam uma grande experiência ao nível da investigação nas áreas da gestão da recreação e do turismo, focada essencialmente, na satisfação do visitante e na manutenção dos recursos naturais que tanto as caracterizam (Cole & Daniel, 2003; Manning & Krymkowski, 2010).

    No entanto, continuamos a sentir uma necessidade efetiva de se criarem instrumentos que possam corresponder às necessidades das instituições, nos ramos do desporto e da animação turística, que desenvolvem sobretudo atividades desportivas em contato com a natureza, ou seja, uma ferramenta simplificada, adaptada à realidade empresarial (e.g. poucos recursos humanos, atividades pontuais, recursos financeiros diminuídos) e que possa servir como apoio ao trabalho, cada vez mais sustentável nas dimensões ambiental, social e económica.

    A justificação para a elaboração desta metodologia torna-se ainda mais relevante se considerarmos alguns fatores, como o crescimento acentuado da indústria da animação turística em Portugal (Almeida & Silva, 2009), a pressão que as diferentes atividades humanas podem acarretar sobre os recursos naturais (Leung & Marion, 2000) e até, de forma mais indireta, o efeito que a adoção destas preocupações ambientais podem provocar sobre a consciência ecológica daqueles que promovem e fazem desporto em contato com a natureza (Rosa & Carvalhinho, 2012). Assim, considerou-se relevante, desenvolver uma pesquisa que contribua para um melhor conhecimento e planeamento destas atividades, tendo como foco principal, uma das principais ofertas deste setor: o desporto de natureza. Esta pesquisa centra-se essencialmente naquela que deverá ser uma das condições básicas para a existência deste tipo de prática desportiva, o desporto de natureza, garantindo um desenvolvimento sustentável, que permita a salvaguarda dos recursos naturais onde é desenvolvida.

Métodos

    A metodologia utilizada para o desenvolvimento do presente trabalho baseou-se na análise documental específica das várias áreas de intervenção, relacionadas com a prática de Desporto de Natureza (DN) e do ponto de vista da sua gestão, entre os quais, livros, artigos científicos, documentos institucionais e sítios da internet. Este processo metodológico foi dividido em duas fases distintas:

    A primeira fase consistiu na revisão de documentos científicos e técnicos, provenientes de diversas áreas de intervenção associadas à prática de DN com o objetivo de se extrapolarem as fases tidas em consideração no planeamento de atividades. No final desta análise, pretendeu-se encontrar as principais fases do planeamento, tendo em conta a componente ambiental como fator determinante do faseamento. Nesta situação considerámos a recolha documental segundo os vários pontos de vista mencionados anteriormente. A documentação escolhida (campo de estudo) para esta fase de análise no que concerne às áreas de conhecimento foram as seguintes: i) Gestão Ambiental; ii) Gestão do Desporto; iii) Gestão do Turismo; iv) Gestão da recreação e do turismo em áreas protegidas.

    Os documentos foram determinados para análise, mediante os seguintes parâmetros: i) Procura de literatura científica e técnica no âmbito das áreas protegidas, gestão do desporto, planeamento de projetos em desporto, planeamento do turismo responsável/sustentável, gestão ambiental; ii) Procura de documentação na internet, utilizando terminologia específica, nomeadamente, gestão ambiental em desporto, planeamento ambiental em turismo, gestão ambiental e gestão ambiental em áreas protegidas nas línguas portuguesa e inglesa; iii) Análise de artigos científicos, relatórios de empresas, legislação sobre normas de gestão e capítulos de livros, para aferir a sua pertinência e enquadramento com os objetivos da investigação; iv) Seleção final da documentação.

    Foram utilizadas técnicas de análise de conteúdo, com a definição de uma categoria (“Planeamento”) a priori, de acordo com os objetivos de análise para esta fase, e duas categorias a posteriori (“Declaração Ambiental” e “Formação”) no decorrer das leituras. Para a codificação dos dados, foram utilizadas unidades de contexto (UC) uma vez que, correspondendo à perspetiva de Bardin (2009), o objetivo da análise foi compreender o significado exato das citações e opiniões dos autores.

    A segunda fase partiu do modelo de planeamento obtido. Nesta consideramos uma nova leitura e seleção de documentos com vista à evidenciação de variáveis ambientais tidas em conta em cada uma das fases. Para além da documentação selecionada na fase anterior, considerámos ainda, alguns casos práticos de aplicação de medidas de gestão ambiental em eventos/atividades desportivas.

    A esquematização e organização lógica destas componentes após triagem e reflexão (com painel de especialistas) acerca das mais pertinentes e adaptadas ao tema do presente trabalho, deu assim origem à MPA-ADN.

Discussão dos resultados

    A apresentação é realizada em dois momentos distintos que correspondem a cada fase metodológica.

Fase I. Proposta do Modelo de Planeamento Ambiental para Atividades de Desporto de Natureza (MPA-ADN)

A perspetiva da gestão ambiental

    Nesta perspetiva, consultaram-se dois documentos distintos: O regulamento de participação voluntário no Sistema Comunitário de Ecogestão e Auditoria (EMAS) e a tradução portuguesa da EN ISO 14001.

    O Regulamento nº761/2001 do Parlamento europeu e do conselho de 19 de março de 2011, que permite a participação voluntária de organizações num Sistema Comunitário de Ecogestão e Auditoria (doravante designado apenas por EMAS), apresenta os requisitos que as instituições deverão cumprir para aderirem a este sistema de gestão. Neste documento está também expressa, em alguns anexos, a explicação do próprio sistema, as obrigações inerentes e alguns conceitos. Das leituras, podemos averiguar, embora de forma não direta, possíveis associações às fases de construção da MPA-ADN.

    Em primeiro lugar e em ambos os documentos considerados deparamo-nos com a necessidade para que as instituições estabeleçam uma “Política ambiental”. Esta política ambiental é expressa na “Declaração Ambiental” e implica que a organização, efetue uma descrição sumária do seu sistema de gestão. Consideramos este facto bastante relevante, já que, fazendo a transposição para o tema deste trabalho, esta declaração de intenções ambientais poderá posicionar a empresa/instituição de animação turística/desporto no quadro ambiental. A própria comunicação das suas intenções para o público poderá servir como uma fonte de marketing e reconhecimento, levando a possíveis benefícios económicos (Bansal & Roth, 2000).

    Outra referência que consideramos interessante diz respeito às necessidades de formação dos indivíduos que trabalham diretamente nas instituições ou em nome delas. Percebe-se que, no caso destes documentos, existe uma clara possibilidade de se utilizarem equipamentos específicos, para medir a magnitude ou até a monitorização dos impactos ambientais causados pelas suas atividades. Transpondo esta posição para a realidade da animação turística e do desporto, consideramos que os responsáveis pelas empresas deverão ser capazes de sensibilizar e eventualmente promover ou incentivar os seus colaboradores para as questões ambientais. Preocupações associadas à formação de técnicos de DN, foram já referenciadas por Carvalhinho, Sequeira, Serôdio-Fernandes, and Rodrigues (2010), evidenciando também a componente ecológica.

    Na análise ao segundo documento, a EN ISO 14001, verificamos que esta é baseada na metodologia conhecida por “Planear – Executar -Verificar - Atuar (“PDCA: Plan-Do-Check-Act”). Neste caso, é feita uma alusão a cada uma das fases:

“1) Planear: Estabelecer os objetivos e os processos necessários para atingir resultados, de acordo com a política ambiental da organização.

2) Executar: Implementar os processos.

3) Verificar: monitorizar e medir os processos face à política ambiental, objetivos, metas, requisitos legais e outros requisitos e relatar resultados.

4) Atuar: empreender ações para melhorar continuamente o desempenho do sistema de gestão ambiental.”

    O modelo de gestão apresentado é cíclico, sendo que a fase de “Melhoria contínua” é inserida e indispensável em todo o processo.

    No desenvolvimento de ambos os documentos, é dado ênfase sobretudo à fase do planeamento, sendo um dos momentos mais importantes a identificação dos potenciais “aspetos ambientais” que podem interagir de forma negativa com o ambiente causando impacto. Assim, entendemos os aspetos ambientais, como as ações/elementos das atividades da instituição que poderão causar impactos sobre o meio ambiente, tendo sempre em conta que os poderá controlar ou influenciar (e.g. transportes; alimentação).

    Finalmente é efetuada em ambos os documentos, uma referência às necessidades de monitorização e de controlo das ações que decorrem no terreno.

    Com base nas leituras, podemos verificar um certo nível de importância atribuída à fase de “Planeamento”. Os objetivos desta fase nos documentos analisados parecem-nos claros e bastante adequados àquilo que poderá ser a realidade da promoção de serviços na animação desportiva/turística. Esta fase deverá incluir sobretudo a identificação dos aspetos ambientais da atividade que são passíveis de causar impactos no meio ambiente. É importante que os técnicos responsáveis sejam capazes de antever as necessidades de organização da atividade, e perceber o potencial impacto de cada uma delas, estabelecendo assim, e numa fase posterior, as ações que possam evitar esses mesmos danos.

    É importante também realçar, e num momento que antecede o planeamento, a importância de questões associadas à formação e o estabelecimento de uma política ambiental.

A perspetiva da gestão do desporto

    O objetivo desta análise foi descortinar as fases de planeamento em desporto e tentar encontrar referências a questões de foro ambiental, tentando sempre associar as posições dos autores à criação da MPA-ADN.

    Pires (1995), desenvolve o seu trabalho na temática do planeamento e gestão de projetos em desporto. Este identifica três fases de desenvolvimento do projeto: 1) Planeamento do projeto; 2) Gestão da evolução do projeto e das mudanças; 3) Comunicação da informação.

    Foi sobre a 1ª fase de desenvolvimento que centramos a nossa atenção. Aqui, identificámos desde logo, a necessidade de nesta fase, se esclarecerem todas as operações necessárias à execução do projeto e à forma como vai ser desenvolvido. Esta posição leva-nos a pensar sobre a necessidade prévia, de os técnicos responsáveis pelo planeamento de atividades, terem a noção clara dos recursos que vão utilizar e das necessidades que vão ter de colmatar para que o projeto/atividade tenha sucesso (e.g. poderíamos considerar a necessidade de transportes, equipamento desportivo, alojamento, entre outros). O autor dá ainda ênfase à questão dos “problemas” como se pode verificar em “Fases para a identificação de situações e problemas: definir o problema; obter os dados necessários; determinar as possíveis soluções alternativas; analisar e avaliar as alternativas; selecionar a melhor alternativa; implementar a decisão; controlar.”

    Comparando com a análise anterior (perspetiva da gestão ambiental) pode-se considerar que estas “operações” ou “problemas” podem ir de encontro daquilo que denominamos de “Aspetos Ambientais”, ou seja, determinadas ações ou necessidades que poderão causar impacto sobre o meio ambiente. Também nesta perspetiva, referenciam-se as “soluções”, como forma de resolver ou mitigar esses problemas. Encontramos assim possível correspondência entre as diferentes perspetivas. Associando a visão de Pires (1995) sobre os conceitos de “problema”/”necessidade”/”operação” e o conceito de “aspeto ambiental” presente na EN ISO 14001, conectados à questão ambiental, podemos assumir que os aspetos ambientais podem ser problemas/necessidades/operações da organização e de planeamento da atividade. Julgamos também, que a fase de “Implementação e Operação” (EN ISO 14001) pode ter uma correspondência direta com a procura de “soluções” e “ações” que resolvam os “problemas”, ou neste caso, os “aspetos ambientais”.

    Cunha (2007) desenvolve no seu trabalho, uma temática ligeiramente diferente. Não incide sobre os aspetos do planeamento de projetos ou atividades, mas sim, na qualificação de espaços naturais para o desporto, o que, logicamente implica também questões de planeamento. O autor faz referência aos procedimentos para apetrechar um espaço natural para o desporto, nomeadamente, “i) Levantamento e caracterização dos espaços naturais; ii) Identificação da sua inclusão ou não na rede nacional, regional ou local de espaços e áreas protegidas; iii) Identificação de sítios elegíveis para a prática de atividades desportivas; iv) Identificação das características naturais (locais) com significado ambiental ou a serem elegíveis com significado desportivo; v) Identificação das condicionantes ou restrições ambientais e desportivas, características das modalidades a praticar, períodos de defeso ou nidificação, acessibilidades/inacessibilidades geográficas e temporais, serviços, regime de propriedade”.

    A importância de um estudo de caracterização prévia sobre determinado local para o seu posterior apetrechamento, pode, no nosso entender, também ser visto como uma necessidade no planeamento de atividades. Tomando como exemplo uma atividade de Canyoning, revela-se importante e responsável, que antes de definir o local de prática, tenhamos a clara noção se o mesmo possui ou não estatuto de proteção, se existem regulações/restrições à prática em determinadas épocas do ano ou se existem aspetos naturais (flora ou fauna) de especial interesse. Um exemplo de aplicação prática destes princípios é apresentado por Carvalhinho e Rosa (2012), num trabalho desenvolvido em áreas protegidas, no âmbito da avaliação e qualificação de espaços de prática desportiva.

    Neste momento da discussão dos resultados, destacamos sobretudo três contributos essenciais para a definição da MPA-ADN: i) Necessidade de identificarmos todas as necessidades da organização tendo em conta que estas poderão ser consideradas “problemas” e consequentemente “aspetos ambientais”; ii) Devem ser determinadas ações para evitar ou resolver esses problemas; iii) É importante realizar um estudo prévio do local onde se realiza a atividade, sobretudo ao nível da legislação de cariz ambiental presente na área selecionada, assim como as regulações e restrições existentes no local afetas à prática desportiva.

A perspetiva da gestão do turismo

    Ferreira (2005) apresenta, no seu trabalho, uma alusão à macro envolvente do destino turístico. Neste campo, denotamos um importante interesse e necessidade de planeamento da atividade turística e do próprio território. A posição remete-nos para a necessidade prévia (no decorrer do processo de planeamento) que existe em conhecer as variáveis inerentes a um determinado destino turístico, considerando, desde os impactos ambientais que podem ser causados, até a uma vertente económica e social. Este mesmo planeamento deverá antecipar e regulamentar as alterações que advêm da atividade turística.

    Esta visão mais abrangente, que considera o campo social e económico para além do ambiental, demonstra-se essencial. A consideração de aspetos especiais de consumo (e.g. alimentação, estadia e recordações junto do comércio local) que favoreçam as populações locais deve também ser considerada no planeamento ambiental.

    Por último, e de acordo com o mesmo autor, e com trabalhos analisados (ISO 14001 e EMAS) surge a importância de se envolverem os habitantes locais (no sentido do seu benefício) e ao mesmo tempo de divulgar a atitude ambientalista/ecológica da empresa que fornece um determinado serviço.

    Esta análise do ponto de vista da gestão do turismo revela-se mais vasta e abrangente, se for realizada a um nível macro e bastante focada na região de destino. No entanto, a nova alusão à necessidade de estabelecer o quadro atual (legislação; regulações) do destino/local, onde se vão desenvolver as atividades, demonstra-se mais uma vez, um aspeto essencial. Também a monitorização das decisões, vai de encontro àquilo que já foi referenciado anteriormente. Outro aspeto que consideramos bastante relevante são as dimensões de variáveis com influência sobre as estruturas sociais (as pessoas) e económicas (os produtos e serviços), numa perspetiva de contributo local e regional.

A perspetiva das áreas protegidas

    Nesta área, os trabalhos analisados, apesar de se focarem essencialmente na gestão dos espaços de recreação/desporto e na gestão da visitação, podem facultar variáveis interessantes a incluir na MPA-ADN, já que esta pode concorrer para que as ações dos praticantes no ambiente (que são o alvo principal da gestão das áreas protegidas) possam ser antecipadas pelas próprias organizações que fornecem os serviços desportivo-turísticos, contribuindo assim para o ideal de sustentabilidade que caracteriza fortemente estes espaços (IUCN, 2002).

    Os autores Font, Flynn, Tribe, e Yale (2001), desenvolveram um importante trabalho junto de uma empresa inglesa, que promove atividades de recreação e turismo numa área protegida. O objetivo consistiu em compreender, até que ponto, apesar de não estar associada a qualquer Sistema de Gestão Ambiental (SGA), a empresa estaria comprometida com aspetos ambientais. Neste sentido, a importância atribuída a um conhecimento prévio dos locais onde se desenvolvem atividades, assim como dos potenciais problemas que possam resultar da prática desportiva também são aqui reconhecidos e já se revelam comuns a alguns dos trabalhos analisados. Estes autores consideraram ainda numa fase seguinte, a formulação de estratégias para que se atingisse o sucesso ambiental, assim como a monitorização das atividades operacionais (estas podem ser consideradas as ações que são determinadas para mitigar os potenciais impactos das atividades). É interessante realçar, que mesmo não estando associada a nenhum SGA, verificou-se um forte compromisso ambiental. Esta evidência está de acordo com a nossa opinião, acerca da importância de um instrumento de planeamento ambiental.

    Por sua vez, os autores Haider e Payne (2009) focaram o seu trabalho ao nível da gestão e planeamento da visitação em áreas protegidas. Tal como o trabalho anterior, consideramo-lo pertinente, visto que se focou também na gestão das ações dos visitantes em áreas protegidas, sobre os recursos ambientais dos locais destinados à recreação. Estes fazem sobretudo referência aos denominados Visitor Management Frameworks (VMF). Algumas das fases de implementação destes VMF, podem no nosso entender, ser transpostas para o planeamento de atividades, indo até de encontro a algumas posições já discutidas, nomeadamente:

  • Fase 1) Identificação dos propósitos da área: neste caso, podemos mais uma vez considerar o conhecimento prévio (em termos de legislação e regulações) dos locais onde se vão desenvolver as atividades;

  • Fase 3 e 4) Seleção e inventariação de indicadores ou recursos e as condições sociais: poderemos transpor estes momentos para a identificação dos aspetos ambientais potencialmente causadores de impactos;

  • Fase 7) Identificação de ações de gestão para cada alternativa: pode estar associada às medidas de redução dos impactos provocados pelos aspetos ambientais.

    O VMF analisado (Limits of Acceptable Change, LAC) faz apenas parte de um vasto conjunto de metodologias de gestão da visitação em áreas protegidas (entre outras como Visitor Impact Management, VIM ou Recreation Oportunity Spectrum, ROS). Embora com algumas diferenças, todos eles são constituídos por fases semelhantes.

Considerações finais dos resultados da 1ª fase metodológica

    A análise de conteúdo e de elementos gráficos (análise de esquemas) dos diferentes pontos de vista da gestão revela-se um processo bastante interessante e rico em termos de informação, pois permite o cruzamento dos dados assim como evidência relações que em primeira estância não são revelados apenas pela leitura.

    O objetivo base da primeira fase metodológica foi obter, em traços gerais, as diferentes fases que podem estar incluídas no planeamento da MPA-ADN. Apresentamos assim, na figura 1 que se segue, os principais resultados desta análise e o esboço daquilo que poderá ser a organização (por fases) da MPA-ADN.

Figura 1. Representação esquemática da MPA-ADN

    Podemos neste momento, atribuir a cada uma das fases os seus objetivos gerais:

  • Fase Ia) Tem como objetivo descrever a atividade na sua generalidade e poderá incluir variáveis como, a duração, o nº de participantes, as atividades a realizar, entre outras;

  • Fase Ib) Tem como objetivo descrever e caracterizar o local de destino. É neste momento que se consultam regulamentações e possíveis restrições à prática;

    • As duas primeiras fases são fundamentais para que se possa delinear toda a atividade. É a partir desta primeira caracterização da atividade e do local de prática, que se poderão identificar as restantes variáveis inseridas nas fases seguintes, nomeadamente:

  • Fase II) Com base na caracterização realizada nas fases anteriores, tem como objetivo a identificação de todas as necessidades/recursos para a atividade (e.g. transporte; alojamento; aluguer de equipamentos; refeições; as atividades em si; entre outras);

  • Fase III) Nesta fase, apresentam-se todos os aspetos ambientais, ou seja, os fatores da atividade potenciadores de impacto ambiental. Muitas vezes, poderão estar inerentes às necessidades da organização.

  • Fase IV) A identificação dos impactos por aspeto ambiental diz respeito ao reconhecimento por parte da organização, dos possíveis impactos que cada aspeto ambiental poderá causar (e.g. Se considerarmos a prática de BTT como aspeto ambiental, o impacto causado poderá ser a compactação ou erosão do solo);

  • Fase V) A Identificação das ações/medidas mitigadoras do impacto diz respeito às estratégias, ações ou técnicas utilizadas pela organização da atividade para evitar ou reduzir ao máximo o impacto ambiental (e.g. No caso da prática do BTT, aspeto ambiental identificado, teríamos como impacto causado, a erosão do solo. Esta por sua vez, como impacto do aspeto ambiental, e a solução, como medida mitigadora, poderia ser a escolha de um trilho com piso mais resistente, e.g. do tipo rochoso).

    É importante ter em conta, que no meio comercial (venda de produtos e serviços de desporto e turismo de natureza), as tipologias de atividades a realizar são muitas vezes definidas pelo consumidor final, ou seja, pensamos que serão as atividades na maioria das vezes a determinar as restantes decisões de planeamento e não o inverso. Neste sentido, este modelo pretende ser aberto, procurando na maior parte das vezes, não a solução ideal, mas a melhor solução possível.

    Na fase de discussão seguinte, vamos tentar desenvolver acerca das variáveis que poderão ser incluídas em cada uma das fases, ficando desde já com um maior conhecimento acerca das possibilidades, sobretudo no que diz respeito aos aspetos ambientais, potenciais impactos e medidas mitigadoras.

Fase II.     Definição de variáveis comuns

    Nesta fase da discussão, apresentamos novos resultados referentes a algumas variáveis frequentemente verificadas neste tipo de atividades.

    Consideramos mais fácil a consulta dos resultados obtidos através da apresentação em quadros. Neste sentido, as variáveis obtidas são expostas e organizadas por fase de implementação, estando associados os autores correspondentes.

Quadro 1. Possibilidade de variáveis a incluir na MPA-ADN

    O presente quadro, apresenta algumas das variáveis verificadas em alguns trabalhos analisados. Temos a consciência de que em todos os campos a abrangência pode ser muito maior, no entanto, ficam espelhadas as variáveis mais consideradas.

Conclusão

    O presente trabalho, teve como objetivo geral, a proposta teórica de uma Matriz de Planeamento Ambiental em Atividades de Desporto de Natureza, designada ao longo do presente trabalho como MPA-ADN. Também teve em consideração, a possibilidade de estas atividades serem realizadas no âmbito do turismo, havendo assim a necessidade de considerar as características dos locais de destino, assim como alguns fatores sociais e económicos a ele associados. Após a realização do trabalho, algumas considerações são formuladas:

  1. Aparentemente, a existência de trabalhos específicos no âmbito do desporto e da sua relação com o ambiente e o turismo são ainda escassos. A consideração de uma componente ambiental no planeamento de atividades desportivas em contato com a natureza aparenta também ser alvo de pouca consideração. Neste caso, associámos diferentes perspetivas da gestão, direta ou indiretamente associadas à prática desportiva e turística. Esta associação, a procura de pontos comuns e de diferentes contributos, revelou-se um trabalho bastante satisfatório, visto que permitiram a aquisição de relações que garantiram a sustentação teórica das fases seguintes do trabalho, assim como, nos esclareceram mais acerca do assunto. Julgamos que mais investigação deve ser realizada neste âmbito, contribuindo assim, para um melhor conhecimento do desporto de natureza/aventura e dos diferentes contextos onde este se insere.

  2. Os métodos de análise de conteúdo utilizados revelaram-se essenciais para a obtenção de evidências que permitissem a construção da nossa matriz de planeamento. Realçamos, em alguns casos, a escassez de informação obtida nas leituras, o que nos obrigou à seleção de mais documentação, novamente com implicações, ao nível da fraca objetividade e foco específico da investigação analisada neste âmbito. A literatura apresentada reflete apenas parte do campo de estudo analisado. No entanto, consideramos que a metodologia tem um suporte teórico considerável, podendo estar adaptada à realidade da promoção de serviços, sendo também objetiva e prática na sua utilização. No entanto, necessita de maior consistência e validação. Neste caso, recomenda-se a aplicação e teste desta metodologia no terreno, com consequente análise dos resultados para determinar a sua eficácia.

    Devemos também salientar, para as constantes evidências, a necessidade de processos de monitorização e avaliação. Nesta situação em concreto, e não descurando a extrema importância que tem a monitorização na melhoria dos processos, julgamos que esta não se adapta à realidade da prestação de serviços, visto que, o serviço em si, é promovido in loco (técnico-cliente) e normalmente tem uma curta duração, não havendo “espaço” para se aferir constantemente a efetividade das ações escolhidas para a mitigação dos impactos. Assim, consideramos pertinente, que uma fase de “Avaliação/controlo” seja considerada no final da atividade. Esta pode resultar de uma conversa informal, entre responsáveis, monitores e até clientes, com vista ao balanço das opções tomadas e a sua eficácia. Com base nesta reflexão final, apresentamos a versão final da MPA-ADN, que inclui, não só o estabelecimento de uma política ambiental e questões associadas à formação dos colaboradores das entidades, como uma fase de avaliação da eficácia das ações efetuadas.

Figura 2. Proposta final da MPA-ADN

  1. Novas leituras deram origem a um conjunto de variáveis (e.g. aspetos do planeamento; impactos; aspetos ambientais; medidas mitigadoras) já verificadas noutros trabalhos, mais uma vez, provenientes de diversas áreas de intervenção. Temos a noção de que estas são muito mais vastas do que aquilo que apresentamos e que, a especificidade de cada atividade levará à especificidade dos aspetos ambientais, impactos e consequentes medidas de ação. Deste modo, é extremamente importante, que os responsáveis pelas organizações promovam e sensibilizem os seus colaboradores à obtenção de conhecimento (que a leitura por si só já fornece) acerca das atividades, dos seus efeitos negativos/positivos e das soluções para a sua diminuição/aumento.

    Julgamos assim ter contribuído para um maior conhecimento nesta área de intervenção, deixando em aberto, a vontade pessoal de efetuar novas pesquisas e se possível, a curiosidade noutros investigadores e profissionais nesta área científica, técnica e profissional.

Referências

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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 17 · N° 175 | Buenos Aires, Diciembre de 2012
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