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Contínuo de níveis de interferência contextual na
aprendizagem da habilidade motora putt do golfe

Niveles continuos de interferencia contextual en el aprendizaje de la habilidad motora putt del golf

 

*Escola Superior de Educação – Instituto Politécnico de Coimbra, RoboCorp

Centro Integrado de Investigação e Performance Humana (CIPER), FMH

**Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física

da Universidade de Coimbra (FCDEF.UC/CIDAF), RoboCorp

(Portugal)

Rui Mendes, PhD*

rmendes@esec.pt

Gonçalo Dias, PhD**

goncalodias@fcdef.uc.pt

 

 

 

 

Resumo

          Tendo como base o trabalho desenvolvido por Dias e Mendes (2010), o objectivo deste estudo foi verificar se o grupo com prática num contínuo de níveis interferência contextual (IC) alcançava melhores resultados na aprendizagem do putt (Golfe), comparativamente com os grupos de prática por blocos, em séries e aleatória. A amostra foi constituída por 40 estudantes (20 de cada género) do ensino secundário, voluntários, todos destros e inexperientes. Na fase de aquisição, foram realizados 90 ensaios de putt às distâncias de 1, 2 e 4 metros do centro do buraco. Os testes de retenção e transfer efectuaram-se 30 minutos depois. Foram realizados 9 ensaios na fase de retenção e 9 ensaios no teste de transfer, i.e., de forma aleatória, a 1.5 metros do buraco. Os dados obtidos confirmam a hipótese formulada quanto à tendência do efeito de IC ocorrer na execução do putt, sendo que este pressuposto foi mais evidente no erro absoluto. Deste modo, tal como Porter e Magill (2004, 2005) já tinham observado em estudos similares no desempenho da mesma habilidade motora, a combinação entre vários tipos de prática, i.e., num incremento ou contínuo de níveis de IC, resultou em efeitos positivos na aprendizagem deste movimento.

          Unitermos: Interferência contextual. Putt. Golfe. Contínuo. Desempenho.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 17, Nº 174, Noviembre de 2012. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    O efeito de interferência contextual (EIC) está relacionado com o nível de interferência funcional que ocorre na aquisição de habilidades motoras (cf. Tani, 2005; Barreiros, Figueiredo, & Godinho, 2007; Brady, 2008). Neste sentido, Dias e Mendes (2010), ao analisarem o putt do golfe através do desempenho motor de jogadores inexperientes, defendem que pode ser benéfico promover um contínuo de níveis de Interferência Contextual (IC), i.e., de forma a alcançar efeitos positivos na fase de transfer.

    Este tipo de estruturação de prática motora tem subjacente que no início da sessão sejam efectuados ensaios organizados em blocos, seguidos da realização de tentativas organizadas em séries e, por fim, os últimos ensaios são produzidos em contexto de prática aleatória (cf. Porter & Magill, 2004, 2005; Dias & Mendes, 2010).

    Face ao exposto, no seguimento do estudo publicando por Dias e Mendes (2010), este trabalho tem como objectivo principal contribuir para o aprofundamento deste fenómeno, abordando o efeito de interferência contextual na aprendizagem do putt. Para tal, foram manipuladas as distâncias de batimento de bola e, por conseguinte, os parâmetros associados à utilização do mesmo programa motor genérico.

Metodologia

Amostra

    A amostra foi constituída por 40 estudantes do ensino secundário, dos quais 20 participantes eram do género feminino e 20 do género masculino, com 17 ± 1.2 anos anos de idade, todos destros, sem experiência prévia relacionada com a prática de golfe.

    Os executantes foram divididos equitativamente por quatro grupos experimentais, i.e., em termos de repartição dos dois géneros: Blocos (GPB), Séries (GPS), Aleatória (GPA) e Contínuo de níveis de IC (GPC).

    Todos os executantes participaram como voluntários, assinando um termo de consentimento livre e esclarecido.

    O estudo foi realizado em conformidade com o código de ética da Universidade de Coimbra e as recomendações da Declaração de Helsínque em pesquisa com seres humanos. Os participantes não sofriam de qualquer tipo de incapacidade física ou mental (cf. Dias & Mendes, 2010).

Tarefa

    A tarefa adoptada foi o putt, consistindo no batimento de uma bola com um taco de golfe (tamanho 35) para um buraco, i.e., numa carpete que se encontrava colocada no solo.

Dispositivo experimental

    O dispositivo experimental contemplou uma carpete artificial plana, utilizada por profissionais de Minigolfe, rectangular, de cor verde, sem emendas, que se assemelha à textura da superfície da relva (i.e., green), com 10 metros de comprimento, 2 metros de largura e 4 milímetros de espessura (cf. Dias & Mendes, 2010).

    A carpete continha um buraco que estava colocado a 150 cm do limite da carpete e a 100 cm de cada extremidade lateral (Figura 1).

Figura 1. Representação gráfica do dispositivo experimental: rampa, buraco e distâncias de batimento (vista superior)

    Foram desenhados 4 círculos do tamanho de bolas de golfe, que assinalavam os locais donde se batia a bola (D1, D2, D3 e D4). Tal como no estudo de Dias e Mendes (2010), os círculos estavam colocados de frente para o centro do buraco a 100 cm de cada extremidade lateral da carpete (D1, D2, D3 e D4).

    Por seu lado, o círculo que se situava a 1.5 metros de distância (D4) do buraco, foi utilizado na fase de retenção e no teste de transfer. As siglas D1, D2, D3 e D4 referem-se às distâncias entre os círculos desenhados na carpete e o centro do buraco (cf. Figura 1).

    O dispositivo experimental continha seis réguas, i.e., duas de 150 centímetros, duas de 100 centímetros e duas de 50 centímetros de comprimento. As réguas estavam posicionadas lateralmente, de modo a verificar os valores positivos e negativos em centímetros, do posicionamento da bola em relação ao buraco.

Procedimentos

    No seguimento dos procedimentos experimentais adoptados por Dias e Mendes (2010):

  1. A tarefa realizou-se num espaço interior (i.e., pavilhão desportivo), sendo considerada uma sessão de prática;

  2. Na fase de aquisição, o executante efectuava 90 ensaios de putt às distâncias de 1, 2 e 4 metros. Após esta fase, i.e., 30 minutos depois, eram realizados 10 ensaios à distância de 1.5 metros para os testes de retenção e transfer de aprendizagem;

  3. Os participantes visionaram previamente um filme que apresentava os principais aspectos técnicos do putt. De seguida, assistiram à demonstração da tarefa por parte do experimentador e beneficiaram dum período de adaptação que consistia em 3 ensaios de prática motora às distâncias de 1.2 metros;

  4. No período de adaptação ao movimento, todos os executantes receberam a mesma informação de retorno sobre as principais componentes críticas do putt, sendo que, no período de prática, não obtiveram qualquer feedback dos resultados obtidos;

  5. Para melhor identificar o momento em que ocorreu mudança no contínuo de IC, os primeiros 27 ensaios do GPC foram organizados através da prática em blocos, seguindo-se 27 ensaios de prática em séries e, a terceira e última sequência de ensaios (i.e., ensaio 55.º ao ensaio 81.º), foi realizada com recurso à prática aleatória;

  6. A recolha de dados foi efectuada através da medição das distâncias de erro do comprimento e do erro lateral da bola face ao centro do buraco;

  7. Os valores obtidos para o erro em comprimento (C) e erro lateral (L), permitiram calcular o erro radial (R), através da seguinte fórmula = √ (c x c + l x l). Assim, quando o executante acertava no buraco, o seu erro era zero (0), nos erros em comprimento e lateral e, por conseguinte, no erro radial (cf. Dias & Mendes, 2010);

  8. A medida da variável independente correspondeu à estruturação da prática motora utilizada: prática em Blocos (GPB), prática em Séries (GPS), prática Aleatória (GPA) e prática organizada num Contínuo de níveis de IC (GPC). As medidas das variáveis dependentes foram o Erro Absoluto (EA) e Erro Variável (EV), calculadas em função do Erro Radial (ER).

Análise estatística

    Para efeitos de cálculo, foram considerados nove blocos de ensaios na fase aquisição (A1, A2, A3, A4, A5, A6, A7, A8 e A9), cada um com 9 ensaios.

    Na fase de retenção e no teste de transfer, foi calculado um bloco de ensaios representativo dos 9 ensaios, realizados em cada uma destas fases experimentais.

    Através da Análise da Variância com medidas repetidas no último factor, 4 grupos (GPB, GPA, GPS e GPC) x 9 blocos (A1, A2, A3, A4, A5, A6, A7, A8 e A9) foram analisados os resultados da aquisição.

    O teste de Tukey HSD foi aplicado para a análise de dados Post Hoc, no sentido de determinar a existência de diferenças estatisticamente significativas entre grupos.

    Os dados da retenção e transfer foram analisados usando a Anova One-Way. O nível de significância usado foi de 0.05. A análise estatística foi realizada no programa IBM SPSS Statistics (versão 19).

Resultados

Erro Absoluto

    No que concerne à evolução do Erro Absoluto (EA) dos quatro grupos na fase de aquisição (Figura 2), foi observada uma tendência de melhor desempenho do GPS face aos grupos GPB, GPC e GPA. Neste sentido, foram igualmente detectadas diferenças estatisticamente significativas nas quatro condições de prática (F(3,57)=4.23, p≤0.05).

Figura 2. Erro Absoluto médio por Blocos de Ensaios dos 4 grupos na Aquisição (A), Retenção (R) e Transfer (T)

    A análise do desempenho na fase de aquisição indica a existência de diferenças estatisticamente significativas entre diferentes blocos (F(8,456)=6.52, p≤0.05). Nesta base, para o GPB, as diferenças entre blocos de ensaios são evidentes.

    No quarto (A4) e sétimo (A7) blocos de ensaios, observou-se que a tendência de melhoria de desempenho nos blocos de ensaios anteriores (A2 e A3 para o bloco de ensaio A4, A5 e A6 para o bloco de ensaios A7) foi quebrada. Este fenómeno está relacionado com o facto dos jogadores deste grupo mudarem de distâncias de batimento nestes instantes (A4 e A7), sendo, por conseguinte, previsível uma “degradação” do nível de desempenho motor nestes blocos de ensaios. Além disso, a análise da interacção blocos com grupos não apresentou diferenças com significado estatístico.

    Na fase de retenção, detectaram-se diferenças estatisticamente entre os quatro grupos experimentais (F(3,57)=4.68, p≤0.05), sendo que, a análise post hoc, indica que o GPC apresentou melhores resultados face aos restantes grupos.

    No teste de transfer, foi notória a melhor prestação do GPC em relação aos restantes grupos experimentais. Contudo, não foram identificadas diferenças significativas entre as quatro condições de prática motora.

    Finalmente, quer na fase de retenção quer no teste de transfer, a interacção blocos com condições de prática, não apresentou diferenças estatisticamente significativas.

Erro Variável

    Os dados do Erro Variável (EV) dos quatro grupos na fase de aquisição (Figura 3 - blocos A1 a A9) evidenciaram que o GPB apresentou melhores performances que os grupos GPS, GPA e GPC, alcançando o GPS os melhores resultados nos últimos blocos de ensaios. Neste sentido, não foram detectadas diferenças estatisticamente significativas entre grupos, i.e., entre blocos e na interacção entre ambos.

Figura 3. Erro Variável médio por Blocos de Ensaios dos 4 grupos na Aquisição (A), Retenção (R) e Transfer (T)

    Na fase de retenção, verificou-se que o GPA obteve melhor desempenho do que os restantes grupos, sendo que o grupo GPS revelou a pior prestação. Contudo, não se registaram diferenças significativas entre grupos. O mesmo resultado foi constatado no teste de transfer, onde o grupo GPB obteve a melhor performance, seguindo-se o grupo GPC.

Discussão e conclusão

    Este estudo pretendia verificar se o efeito do incremento de IC se manifestava no putt do golfe. Esperava-se que grupo organizado num Contínuo de níveis de IC obtivesse melhores resultados comparativamente com os grupos que praticaram sob a forma de Blocos, Séries e Aleatória.

    Os resultados obtidos no Erro Absoluto na fase de retenção demonstram uma tendência de superioridade do GPC em relação aos restantes grupos, sendo estes traduzidos em diferenças estatisticamente significativas. Ou seja, o incremento gradual de IC, aplicado através de um contínuo de variação da prática motora (GPC), i.e., de forma a conduzir a melhores performances ao nível do putt, resultou em melhores resultados na aprendizagem em relação às clássicas formas de organização da prática motora no âmbito do estudo do efeito de interferência contextual.

    Posto isto, confirmou-se a hipótese anteriormente formulada quanto à tendência do efeito de IC ocorrer na execução do putt (cf. Dias & Mendes, 2010), sendo que este pressuposto é mais evidente no erro absoluto. Deste modo, tal como Porter e Magill (2004, 2005) já tinham observado em estudos similares, a combinação entre vários tipos de prática, i.e., num incremento ou contínuo de níveis de IC, resultou em efeitos positivos na aprendizagem desta habilidade motora.

Referências

  • BARREIROS, J.; FIGUEIREDO, T.; GODINHO, M. The contextual interference effect in applied settings. European Physical Education Review, Manchester, v.81, p.195-208, 2007.

  • BRADY, F. The contextual interference effect and sport skills. Perceptual and Motor Skills, v.106, p.461-72, 2008.

  • DIAS, G.; MENDES, R. Efeitos do contínuo de níveis de interferência contextual na aprendizagem do "putt" do golfe. Revista Brasileira de Educação Física Esporte, v.24, p. 545-553, 2010.

  • PORTER, J.M.; MAGILL, R.A. The effects of practicing a golf putting task moving along the contextual interference continuum. Journal of Sport & Exercise Psychology, Champaign, v.26, p.S-151, 2004.

  • PORTER, J.M.; MAGILL, R.A. Practicing along the contextual interference continuum increases performance of a golf putting task. Journal of Sport & Exercise Psychology, Champaign, v.27, p.S-124, 2005. Supplement.

  • TANI, G. Comportamento motor: aprendizagem e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005.

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