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Processo formativo da escola técnica de saúde:
um olhar sobre o processo de trabalho docente

El proceso formativo de la escuela técnica de salud: una mirada sobre el proceso del trabajo docente

 

*Enfermeira, Especialista em Saúde Pública, Administração Hospitalar, Gerenciamento

de Unidades Básicas de Saúde. Msc. em Saúde e Gestão do Trabalho

**Enfermeira, Dra. em Enfermagem pela USP/Ribeirão Preto

Professora da UNIVALI/ Itajai – SC. Orientadora

***Enfermeiro, Professor Assistente da Universidade Federal do Mato Grosso, UFMT

Doutorando em Enfermagem pela Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC

Nanci Aparecida da Silva*

Maria Tereza Leopardi**

Gelson Aguiar da Silva***

gelson.aguiar.ufmt@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Trata-se de pesquisa qualitativa exploratória, com entrevistas semi-estruturadas junto a egressos de um Curso Técnico em Vigilância Sanitária da Escola Técnica de Saúde e os respectivos gestores dos serviços de Vigilância Sanitária, além de um informante professor. Identifica também fatores facilitadores ou dificultadores do processo. Os resultados sugerem a necessidade de ênfase na capacitação pedagógica, com aumento da carga horária e instrumentalização para a docência, além da inclusão de temas referentes ao processo de trabalho, promoção da saúde e sua articulação com a prática. A proposta deve avançar para novas práticas de Vigilância em Saúde, além do desenvolvimento de ações intersetoriais e interdisciplinar.

          Unitermos: Educação. Educação profissionalizante. Vigilância sanitária.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 17, Nº 173, Octubre de 2012. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Estudar aspectos do universo da atuação e do papel da Escola Técnica de Saúde foi o foco, para compreender o processo de formação e sua articulação à prática, tendo como questão: ‘Qual a estrutura do processo formativo no curso Técnico em Vigilância Sanitária e Saúde Ambiental, de uma Escola Técnica de Saúde’?

    Tivemos o seguinte objetivo: compreender e interpretar o processo ensino-aprendizagem no Curso Técnico em Vigilância Sanitária e Saúde Ambiental, da ETS- Blumenau, a partir da análise de conceitos do processo de trabalho na perspectiva do materialismo histórico.

Metodologia

    O local escolhido para o estudo foi a Meso-região do Vale do Itajaí, composta por municípios da AMMVI (Associação dos Municípios do Médio Vale do Rio Itajaí) e AMFRI (Associação dos Municípios da Foz do Rio Itajaí), por serem os locais de origem dos participantes dos cursos da ETS. Os sujeitos escolhidos para o estudo foram um docente do curso Técnico em Vigilância Sanitária e Saúde Ambiental, egressos destas turmas e os gestores dos serviços de Vigilância Sanitária.

    Inicialmente, foi realizada uma entrevista com cinco egressos e respectivos gestores, seguindo um roteiro composto de questões abertas e dados de identificação, diferentes para o egresso e gestor. Com o professor, porém, foram realizadas quatro entrevistas com duração média de cinquenta minutos.. Assim, tivemos um total de nove (09) sujeitos.

    O docente selecionado foi aquele que havia atuado nas quatro turmas de Técnico em Vigilância Sanitária e Saúde Ambiental oferecidas pela Escola Técnica de Saúde, constituindo o ‘caso’ em estudo. O estudo de caso foi escolhido por permitir aprofundar a investigação necessária a esta pesquisa, pois contribui de forma inigualável para a compreensão que temos dos fenômenos individuais, organizacionais, sociais e políticos (Yin, 2001).

    A validação dos dados foi feita durante a própria entrevista, por meio de perguntas ao entrevistado, no sentido de confirmar ou não o entendimento sobre a sua fala. Além disto, buscando aprofundar a validade e fidedignidade do estudo, realizamos a triangulação de dados, comparando os dados dos três grupos de informantes.

    Os dados foram organizados por fonte (docente, egresso e gestor) e todas as entrevistas gravadas foram transcritas. O processo de análise de conteúdo foi adequado para estabelecer, nas falas das pessoas, alguma forma de sistematização, sob a forma de categorias, dependendo do interesse para a pesquisa ou quanto aquele dado foi significativo para responder as questões formuladas.

    Os participantes foram orientados sobre objetivos e metodologia do trabalho, e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, para que expressassem o interesse na pesquisa, conforme Fontinele Júnior (2003), seguindo a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), comprometendo-nos com o seu anonimato, bem como da instituição e o compromisso de remeter os resultados deste estudo à instituição que participou do estudo.

    A coleta de dados ocorreu e após a aprovação da pesquisa pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos da UNIVALI,sob o número do Parecer 20/09, de 27/02/2009.

Referencial teórico

Processo de trabalho

    “O trabalho é um processo de que participa o homem e a natureza, processo em que o ser humano com sua própria ação, impulsiona, regula e controla seu intercâmbio material com a natureza” (MARX e ENGELS, 1984, p. 202). No final do processo de trabalho, continuam, produz-se alguma coisa que já estava em sua consciência na forma de projeto.

    Segundo os autores, que o processo de trabalho contém como seus elementos constitutivos:

    A atividade adequada a um fim, isto é o próprio trabalho, a matéria a que se aplica o trabalho, o objeto de trabalho e os meios de trabalho, o instrumental. O ser humano, ao executar um trabalho, põe em movimento suas forças, suas energias psíquicas e físicas, sua força de trabalho.

    Veiga (1994, apud CASAGRANDE, 2001) considera o ensino como uma prática social orientada por objetivos, finalidades e conhecimentos, inserida na realidade concreta da escola e determinantes sociais que a circundam, de modo que podemos afirmar que o processo ensino-aprendizagem é um processo de trabalho, podendo ter inúmeras características, dentre as quais a utilização de uma metodologia determinada e um programa curricular que precisa ser adequado às necessidades dos serviços que são prestados socialmente.

    A necessidade é o que move o próprio processo de trabalho, ou seja, “a ação é dirigida para satisfazer a necessidade presente” (MARX; ENGELS, 1984, p. 202-208). Instrumento de trabalho é segundo Marx e Engels (idem, p.203), “uma coisa ou um complexo de coisas que o trabalhador insere entre si mesmo e o objeto de trabalho e lhe serve para dirigir sua atividade sobre o objeto”. Neste sentido, ferramentas, métodos e o local de trabalho são instrumentos para executar a ação de acordo com a sua finalidade.

    Um dos instrumentos de trabalho da educação é o método de ensino, e, em nosso caso é a Metodologia problematizadora, como proposta adequada a esta finalidade.

    Porém, há certas peculiaridades do trabalho em saúde, que podemos assumir também para a educação, ou seja, segundo Pires (1999), o fato de que:

    é majoritariamente um trabalho coletivo, por sua complexidade e pela complexidade dos problemas a serem trabalhados, exigindo um conjunto de ações por parte dos trabalhadores de saúde que atendam suas especificidades e ao mesmo tempo suas totalidades.

    Da mesma maneira, portanto, sua finalidade será alcançada se os participantes estabelecerem objetivos comuns. O aprendiz pode ser tomado como objeto de Trabalho no ensino, ainda que suas características sejam muito diferentes daquelas encontradas em objetos materiais. “O objeto de trabalho é aquilo sobre o que se realiza um trabalho, para transformá-lo em algo diferente, para que se torne o produto” (MARX e ENGELS, 1984, p. 202).

    Tendo o ser humano como objeto de trabalho, o trabalho pedagógico será sobre sua consciência e suas habilidades, de modo que é consumido no mesmo momento de sua produção, ou seja, é um serviço.

    Quando se faz educação, por exemplo, há mobilização de recursos para mudança de sua consciência, tornando-se objeto extremamente sensível à manipulação, à sujeição, à dominação.

Vigilância sanitária e a formação de recursos humanos

    O desenvolvimento de ações de Vigilância Sanitária no Brasil data do início do século XVI, embora não com esta terminologia, mas para propiciar ambientes adequados à vida humana e, principalmente, para assegurar manuseio de produtos sem contaminação, “normas estas que seguiam as leis e costumes portugueses, que regulamentavam as profissões, aplicavam medidas saneadoras e também faziam a cobrança de impostos” (CUNHA, 2007, p.8).

    Houve reflexos até os dias atuais, principalmente influenciando as concepções de vigilância, ora elitista e autoritária, ora democrática e dialógica, o que gera conflitos, quando se busca entender saúde de forma ampliada e, também, a atuação dos sujeitos envolvidos, sejam trabalhadores, gestores ou usuários, para que aconteça de forma reflexiva, cidadã e transformadora da realidade.

    A Vigilância Sanitária têm importante papel na estruturação do Sistema Único de Saúde, em razão de suas ações normativas e fiscalizadoras sobre os serviços oferecidos à comunidade, produtos, materiais e equipamentos, para a área de saúde e de alimentos, além de análise e prevenção de risco (LUCHESE, 2008).

Processo formativo

    Para Mitre et al (2008), historicamente, a formação dos profissionais de saúde tem sido pautada no uso de metodologias conservadoras (ou tradicionais), sob forte influência do mecanicismo de inspiração cartesiana newtoniana, fragmentado e reducionista. Continua reafirmando as desigualdades do modelo social, com sua lógica tecnicista, ênfase no saber e no saber-fazer, em detrimento do saber ser (SORDI e BAGNATO, 1998), não garantindo a dimensão crítica.

    Considerando que há relações entre educação, qualificação profissional e tecnologia, o processo formativo deverá estabelecer claramente para qual contexto estamos produzindo educação técnica, em termos de mercado de trabalho, sim, mas também em termos das necessidades apresentadas na comunidade na qual será implantada. Deluiz (2001, p. 40) diz que a adoção do modelo de competências no mundo do trabalho traz, no entanto, implicações contraditórias para o trabalhador, mas também a adoção de um caráter mais intelectualizado, menos prescritivo, valorizando os saberes em ação.

    Por isto, a formação docente é um aspecto essencial para a qualidade da educação. Para Hernandez (1998, p. 1), os problemas surgem quando se avalia se houve transposição didática (ou não) [...] Ou em que medida a formação docente produz com segurança, uma mudança nas práticas de ensino.

    Outro aspecto a ser discutido é a questão da avaliação, que, para Vasconcellos (1998, p. 17) assume um caráter transformador e não mera constatação e classificação, antes de tudo deve estar comprometida com a promoção da aprendizagem e desenvolvimento por parte dos alunos. Este é o seu sentido mais radical, é o que justifica sua existência no processo educativo.

Análise de dados

Algumas considerações sobre o método de investigação

    A abordagem diversificada objetivava uma compreensão a partir das categorias do processo de trabalho de ensino-aprendizagem no curso técnico em Vigilância Sanitária e Saúde Ambiental, porém, mesmo com os cuidados relativos à busca de informações, houve dificuldade na obtenção de dados que favorecessem uma análise mais profunda.

    Além disto, a comparação com dados fornecidos pelos outros informantes permitiu uma triangulação com inferências interessantes a partir das entrevistas realizadas com egressos e gestores participantes deste estudo. O objetivo principal era justamente buscar a confirmação ou não dos aspectos preponderantes observados e/ou levantados no estudo de caso.

O processo de trabalho docente em vigilância sanitária e saúde ambiental como caso estudado

    Um dos temas iniciais na discussão foi o papel da Vigilância Sanitária no Sistema Único de Saúde, buscando fazer um contraponto com o tipo de profissional que a Vigilância requer para efetivamente fazer acontecer o processo ensino-serviço.

    Enfatiza, ainda, a complexidade da ação no campo da Vigilância Sanitária (VS), e da necessidade de atuação de uma equipe multiprofissional de nível superior para dar conta da formação do profissional de nível médio. Abordou, ainda, a discussão sobre a Vigilância em Saúde, um conceito relativamente novo na discussão de Saúde Pública, mas que reorienta as ações tanto dos serviços de Vigilância Sanitária quanto de Vigilância Epidemiológica.

    Foi perceptível a grande preocupação do informante com o preparo técnico do profissional de VS, como um campo de trabalho condicionado às políticas dos governos municipais, que podem mudar a cada nova gestão. Também se preocupou com as dificuldades do aluno durante o curso e com o processo de trabalho do aluno, e acredita que muitas lacunas ainda precisam ser preenchidas. Apesar de não verbalizar, parece ter havido preocupação com a questão didática, negando-a inicialmente, talvez por se perceber como um técnico mais do que como docente.

    Ele apresenta as necessidades e finalidades de seu trabalho, mas tem extrema dificuldade em lançar mão de instrumentos adequados no processo ensino-aprendizagem, talvez por não aceitar o papel de professor, no sentido estrito da palavra, que parece remeter ao professor tradicional, autoritário, centralizador.

    Estas preocupações preencheram grande parte das entrevistas, sendo difícil aprofundar as temáticas propostas durante os quatro encontros, o que denota a desinformação presente, assim como a ausência de adesão à metodologia proposta na Escola, o que se torna importante informação para o resultado geral do estudo.

Necessidades dos sujeitos

    Não há modo de definir a finalidade de uma ação sem conhecer a necessidade que a determina, porque são elementos inseparáveis do processo de trabalho, conforme Leopardi (1995).

    Necessidades do trabalho são, neste caso, demandas de aprendizagem dos alunos para a sua profissionalização.

    Em relação à categoria Necessidades de trabalho mencionadas pelos informantes egressos e gestores apareceram as subcategorias que informam necessidades do aluno, do docente e também a necessidade da sociedade em relação à própria vigilância em saúde e a necessidade de mais profissionais nesta área. Um egresso informou a necessidade de aprender a executar a VS e um gestor percebe a necessidade do Serviço de VS estabelecer parceira com a comunidade.

    Podemos perceber que, o docente mencionou diversas vezes aspectos sobre necessidades, talvez pelo fato dele ser também gestor de serviço, pois foram poucas as falas do egresso e do gestor neste sentido. Além disto, o egresso manifestou o significado operacional de sua necessidade e o gestor indicou a parceria com a comunidade como significativa.

Finalidade do trabalho docente

    Não é possível evitar o enfrentamento de questões tais como para quê e como se pode preparar uma pessoa para o exercício de uma profissão. As necessidades de aprendizagem das competências necessárias são comuns a todos os alunos, mas se projetam individualmente na sala de aula ou campo de estágio e, portanto, para serem reais e objetivadas, faz-se necessário serem vistas individualmente, o que torna o trabalho do docente extremamente complexo, quase impossível.

    No entanto, a lógica institucional quase sempre se volta para atender questões ou necessidades de um grupo de alunos, para uma atividade cujas competências já estão pré-definidas. E, ao fazer essa ‘generalização’ das necessidades, a finalidade do trabalho do docente passa a ser construída de forma artificial, abstrata, levando os trabalhadores em educação a orientar seu trabalho pelas circunstâncias objetivas do dia-a-dia da escola, dos alunos e de si mesmo.

    Assim, assumimos que a Finalidade do trabalho docente só pode ser alcançada se os participantes – alunos e docentes - puderem estabelecer objetivos comuns, a partir de problemas encontrados na própria realidade, traduzido pela expressão de competências a serem desenvolvidas.

    Finalidade do trabalho no ensino técnico, então, é o resultado que atende necessidades de formação teórica-prática para o trabalho e formação pessoal, levando em conta as competências estabelecidas na legislação. Em relação às Finalidades de trabalho mencionadas pelos informantes egressos e gestores apareceram subcategorias.

    Podemos perceber dois aspectos abordados na categoria Finalidade do trabalho, um relacionado às finalidades do trabalho docente, ou seja, a transformação do objeto de trabalho, o aluno, e outro ligado ao processo de trabalho da Vigilância.

    O docente pontua algumas questões sobre a formação do aluno, a complexidade da Vigilância e que isso influencia diretamente o processo ensino-aprendizagem. Já o egresso, ao pensar sobre a Finalidade, traz a discussão para o seu processo de trabalho na Vigilância Sanitária, ou seja, a instrumentalização que teve para atingir a necessidade do serviço. O gestor parece não ter compreendido a questão, apontando a ‘necessidade’ de mudança na conduta profissional, sem especificar que mudança.

Objeto de trabalho docente

    Sendo finalidade do trabalho docente a transformação do sujeito, em um profissional capaz de realizar as atividades que lhe competem por lei, o que orienta todo o processo de trabalho, é possível definir pelo menos, um objeto de trabalho - a consciência destes alunos, transformada pelo conhecimento e práticas.

    Para alguém ou alguma coisa tornar-se objeto de trabalho é porque contém em si o projeto de transformação necessário para a satisfação da necessidade apresentada. Além disto, supondo-se, que o objeto de trabalho docente seja o aluno, com sua consciência e experiências, há que se ter em mente que ambos os envolvidos na relação pedagógica são sujeitos, com a sua história, sua mente, seu espírito, enfim, a sua existência, um sujeito concreto. Assim, o direcionamento do planejamento deve-se dar a partir deste objeto de trabalho, um objeto-sujeito, não podendo ser moldado, seja nesta relação, seja pelas normas institucionais, ainda mais por ser a metodologia adotada a Problematização, aos moldes de Paulo Freire.

    O Objeto de trabalho, então, é o discente, cuja demanda por aprendizagem foi satisfeita, parcial ou totalmente, assinalado por uma transformação em suas competências, de modo a tornar-se um profissional de VS.

    Nesta categoria, podemos observar que aparece a principal preocupação do docente, já apresentada anteriormente, em três subcategorias, ou seja, uma primeira relacionada às dificuldades do aluno, outra ao seu conhecimento prévio e, ainda, suas características subjetivas, o que implica que o docente percebe a necessidade de mudança do discente como seu fazer diário.

    O egresso manifesta questões relativas às suas operações, e aponta, inadequadamente, dificuldade de acesso e possibilidades profissionais como seus objetivos, sem compreender que seu objeto seria a realidade da VS. Já o gestor afirma novamente a questão da mudança de conduta, também como finalidade e não como objeto de trabalho na VS.

Força de trabalho

    Em uma instituição educacional profissionalizante, podemos considerar este conceito sob duas perspectivas – da força de trabalho atuante no próprio processo de trabalho pedagógico – o docente – e a força de trabalho a ser preparada por este mesmo trabalho. Nesta investigação, foi considerada a força de trabalho docente, que deverá adequar-se à finalidade de seu trabalho.

    Por isto, é preciso apontar que uma das condições para este trabalho é a formação e atribuições dos docentes e dos futuros profissionais em Vigilância em saúde. Sendo a formação e as atribuições diferenciadas, as relações entre docente, discente e mercado de trabalho precisam ser, no mínimo, consideradas como aspectos do processo pedagógico.

    Se a finalidade para o trabalho docente é o preparo do futuro profissional, é importante reconhecê-la, para que seja possível um planejamento adequado a cada nova turma de alunos. Este é, então, um processo que estará em constante movimento e exige relações reflexivas, conhecendo os limites e possibilidades de cada um. A reconstrução dessas relações exige mudanças de atitudes de todos os participantes do processo, numa reflexão madura, com vistas à transformação, daí a importância da formação pedagógica do docente.

    Força de trabalho é aqui entendida como as competências, conhecimentos, habilidades que o professor necessita para desempenhar adequadamente sua atividade docente.

    Aparecem questões de competências e questões motivacionais, e se observarmos as respostas dos egressos, fica aberta a questão do conhecimento como fator preponderante enquanto capacidade para o trabalho, inclusive dos docentes que os preparam. Os gestores também introduzem o conhecimento como importante.

    Contudo, a menção a limites parece justificar, de certa forma, a falta de capacitação apontada.

Instrumentos de trabalho

    Cada trabalho tem especificidades que determinam quais são os instrumentos ou meios necessários e a força de trabalho requerida para sua realização. Como já mencionado anteriormente, instrumento de trabalho é uma coisa ou complexo de coisas que o trabalhador insere, põe entre si mesmo e o objeto de trabalho, e que lhe serve para dirigir sua atividade sobre esse objeto.

    Entre os instrumentos de trabalho da educação, o método de ensino é um deles e, em nosso caso, é a ‘Metodologia problematizadora’, além de material didático-pedagógico.

    Outro instrumento importante é o plano das atividades a serem desenvolvidas durante o processo ensino-aprendizagem, que deve conter oferta de conhecimentos, meios e experiências para o desenvolvimento de habilidades e também para a realização do saber-ser.

    Instrumentos de trabalho no ensino, então, são ferramentas tais como a metodologia, materiais, equipamentos e conhecimento disponibilizado para o processo ensino-aprendizagem.

    Surpreendentemente, os que mais abordaram os instrumentos de trabalho foram os egressos. O informante docente abordou somente a Metodologia, e suas reflexões apontam para aspectos como a possibilidade de participação, embora diga que não a aplica de todo.

    Sobre o Processo pedagógico, também se deve lembrar que o objeto ao qual se aplica este trabalho, o aluno-sujeito, precisa ser conhecido em suas dimensões humanas, da maneira mais próxima possível do que ele é. A organização do trabalho apareceu entre os informantes como aspecto a ser considerado para o desenvolvimento do processo pedagógico de modo a resultar em transformações concretas no objeto de trabalho – o discente.

    Pelo fato de dois dos gestores serem egressos do curso, esta categoria acabou presente na discussão da organização do processo pedagógico, e contraditoriamente ele foi pouco abordado pelo docente, com apenas dois registros. Acredito que tal fato tenha ocorrido pelas dificuldades vivenciadas pelo aluno, pela contradição que aparece quando a Escola apresenta uma estrutura de curso e a utilização de uma metodologia, que na prática não se concretizam. Apesar de se acreditar que a percepção do aluno não atinge tal profundidade, eles têm grande clareza de como o processo pedagógico se processa, talvez não em termos de concepções teóricas, mas de um embasamento prático.

    Chama atenção a ausência quase total da organização do processo pedagógico nas falas do docente, resultado, a meu ver, da ênfase pequena na capacitação e acompanhamento pedagógico. Isto tem reflexos importantes no processo ensino-aprendizagem, fazendo com que o aluno não desenvolva as competências necessárias ao pleno exercício da atividade de um técnico. Conhecimentos são repassados, mas é necessário fazer uso de estratégias adequadas, fazer a articulação da teoria com a prática para, conseqüentemente, favorecer práticas que busquem realizar a mudança necessária na prestação dos serviços.

    Outro aspecto importante e apontado na pesquisa foi a respeito da Metodologia proposta pela escola, com menção marginal de sua importância no processo de trabalho, como instrumento de trabalho, talvez pelo despreparo do docente para tal para uma apreensão adequada dos conceitos de Paulo Freire e outros da mesma linha de pensamento. Há necessidade de organização pedagógica, para seguir os passos necessários. Para isso, é preciso formação qualificada do docente e organização do processo pedagógico.

    Outro ponto bastante enfocado, principalmente pelo docente, foi do atendimento às necessidades dos serviços, pelo fato do docente ser um gestor de serviço também, e que ele pode ter feito sua avaliação mais como gestor do que como docente ou por sua condição docente como atividade temporária, “um bico”, o que interfere preponderantemente no compromisso pedagógico.

    Associado a isto, o objeto de trabalho, ou seja, o aluno tem importância para o docente mais como trabalhador do que como aprendiz, no processo educacional, pensado como mão-de-obra que a Vigilância precisa ter, para desta forma garantir a continuidade de uma atividade regulatória e com profissionais pouco reflexivos.

    A finalidade e a força de trabalho tiveram olhares semelhantes, foram citados como importantes, mas sempre focados no processo de trabalho sanitário e não no processo de trabalho docente. Isto parece ser resultado ideológico, que considera a esfera da educação, assim como a área da saúde, como territórios apenas mantidos para estar de acordo com o mercado de trabalho, que necessita executores bem preparados e não pensadores sobre a realidade.

Considerações finais

    O processo ensino-aprendizagem em qualquer área pressupõe uma organização para a consecução dos objetivos a serem alcançados. É possível compreender, ao final desta pesquisa, apesar dos contratempos ocorridos, que os objetivos propostos foram alcançados, se não plenamente, mas de forma parcial. Ainda assim, acreditamos poder contribuir de maneira decisiva para a reorganização das atividades pedagógicas da Escola Técnica de Saúde, em seus diferentes cursos.

    A capacitação pedagógica necessita de maior carga horária, pois, com o passar do tempo, em virtude da falta de tempo dos profissionais envolvidos na formação, na sua maioria profissionais de saúde sem formação pedagógica foi sendo diminuída.

    Também entendemos ser importante, na capacitação, a inclusão de temas como o processo de trabalho docente, discutindo o papel do docente nessa formação específica, além da necessidade de articular questões mais gerais, como promoção da saúde, com as mais específicas, ou seja, a fiscalização propriamente dita.

    Além disto, precisamos considerar aspectos essenciais na questão profissional, ou seja, a reflexão, a pesquisa e a crítica, articuladas, contribuindo para visão mais ampla do trabalho docente, além da adoção de práticas que levem ao desenvolvimento das competências, tal como o estímulo à pesquisa e estágio no serviço, bem como a supervisão direta.

    A questão teórica deve ser proposta em termos de novas práticas de Vigilância em Saúde, além do desenvolvimento de ações em conjunto com outros serviços, buscando desenvolver no aluno a percepção das possibilidades de atuação intersetorial e interdisciplinar.

    Ensinar, além de arte, é um esforço diário e contínuo para o desenvolvimento humano tanto do professor quanto do aluno. E é nesta busca que me coloco, aprendi muito, mas agora tenho plena certeza que preciso buscar mais, aprofundar meus conhecimentos, propor e conhecer novas formas de aprender e ensinar.

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