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Correlação entre os anos de experiência desportiva e
os níveis de ansiedade em jovens atletas de futebol 11

La correlación entre los años de experiencia deportiva y los niveles de ansiedad en jugadores juveniles de fútbol 11

 

*Lic. em Desporto e Lazer

**PhD. em Ciências do Desporto

Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física

da Universidade de Coimbra (FCDEF.UC/CIDAF)

José Miguel Gama*

Gonçalo Dias**

goncalodias@fcdef.uc.pt

(Portugal)

 

 

 

 

Resumo

          O presente estudo teve como objectivo principal verificar se existia uma correlação estatisticamente significativa entre os anos de experiência desportiva e os níveis de ansiedade em jovens atletas de futebol 11. A amostra foi constituída por 11 jogadores da equipa de futebol do escalão de iniciados da Associação Atlética de Arganil. Os participantes apresentavam (13,2±1,4) anos de idade, bem como 1 a 8 anos de prática na modalidade, estando inseridos no campeonato distrital da Associação de Futebol de Coimbra – época desportiva 2011/2012. Para medir as variáveis em estudo, foram aplicados os Questionários de Ansiedade-Estado Competitiva (CSAI-2R), os Questionários de Orientação para a Tarefa e para o Ego no Desporto (TEOSQp). A análise estatística dos dados foi efectuada através do programa IBM SPSS Statistics – versão 20.0. Recorreu-se ao Coeficiente de Correlação de Pearson, utilizando-se, para o efeito, um nível de significância de 0,05. Os resultados obtidos mostram que não existe uma correlação estatisticamente significativa entre as variáveis analisadas.

          Unitermos: Futebol. Experiência desportiva. Ansiedade.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 17, Nº 173, Octubre de 2012. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    A alta competição desportiva pode gerar níveis elevados de stress e ansiedade (cf. Cruz, 1997). Assim, face à constante pressão psicológica que a actividade desportiva de alto rendimento coloca, muitos atletas apresentam grandes dificuldades quando são colocados à prova em vários contextos (Gould, Horn, & Spreeman, 1983). Para estes praticantes, a competição chega a ser encarada como uma situação ameaçadora e até mesmo constrangedora (Smith, Smoll, & Wiechman, 1998).

    Com efeito, a preparação psicológica e mental tem vindo paulatinamente a ganhar destaque e importância no processo de treino desportivo (Weinberg & Gould, 1999). Deste modo, a literatura da especialidade reporta-nos para a necessidade de aprofundar esta dimensão na componente psicológica dos atletas (cf. Ferreira, Gaspar, & Peres, 2006). Nesta base, sabendo que a técnica, a táctica e os aspectos físicos são factores passíveis de ser treinados ao mais alto nível, urge também trabalhar os aspectos cognitivos no âmbito da optimização do rendimento desportivo (Gomes & Cruz, 2001).

    Vários investigadores têm vindo a demonstrar que existem diversos factores que podem influenciar a ansiedade estado competitiva, tais como: o tipo de desporto praticado, as diferenças individuais resultantes de diferentes níveis de execução de skills e ainda as diferenças entre géneros (e.g., Burton, 1998; Hanin, 2000; Woodman & Hardy, 2003; Ferreira, Gaspar, & Peres, 2006). Nesta linha de pensamento, Woodman e Hardy (2001) defendem também que os anos de experiência desportiva dos atletas podem ter grande influência no desempenho do atleta.

    Posto isto, sabendo que o jogo de futebol exige um grande envolvimento psicológico por parte dos jogadores que se reflecte no resultado final da acção, este estudo pretende verificar se existe uma correlação estatisticamente significativa entre os anos de experiência desportiva e os níveis de ansiedade em jovens atletas de futebol 11.

Revisão da literatura

    O desporto de alta competição é actualmente caracterizado por uma intensa pressão, passível de gerar níveis elevados de ansiedade nos atletas (Eysenck, 1992; Cruz, 1996, 1997; Jones & Hardy, 1990). Neste sentido, Smith et al. (1998); Weinberg e Gould (1999, 2003); Ferreira et al. (2006) demonstram que a ansiedade pode ser considerada como um estado emocional caracterizado pelo nervosismo, preocupação e apreensão que integra uma componente cognitiva caracterizada pelos pensamentos percebidos. Os mesmos autores (1999, 2003, 2006) defendem ainda que a ansiedade cognitiva está relacionada com as modificações resultantes das preocupações e pensamentos “negativos” dos atletas.

    A literatura indica ainda que o estado de ansiedade e traço de ansiedade são dois fenómenos distintos que necessitam de ser diferenciados e clarificados. Assim, Spielberger (1966); Weinberg e Gould (1999); Ferreira, Gaspar, e Peres (2006) mencionam que o estado de ansiedade está relacionado com uma disposição emocional transitória em constante alteração, a qual pode ser caracterizada pela percepção subjectiva e consciente de sentimentos de apreensão.

    Por sua vez, o traço de ansiedade é uma característica intrínseca da personalidade do atleta, na qual o indivíduo encara como ameaçadoras um conjunto de circunstâncias que objectivamente não o são, entenda-se, quer seja em termos físicos ou psicológicos (Cruz, 1996, 1997; Weinberg & Gould, 1999; Ferreira, Gaspar, & Peres, 2006).

    Perante o exposto, sabendo que Woodman e Hardy (2001) defendem que os anos de experiência desportiva, i.e., em concomitância com níveis de ansiedade elevados dos atletas, podem ter grande influência no desempenho desportivo (Barbosa, 1996), urge investigar se existe uma correlação estatisticamente significativa entre os anos de experiência desportiva e os níveis de ansiedade em jovens atletas de futebol 11.

Metodologia

Amostra

    A amostra foi constituída por 11 jogadores da equipa de futebol do escalão de iniciados da Associação Atlética de Arganil. Os participantes apresentavam (13,2±1,4) anos de idade, bem como 1 a 8 anos de prática na modalidade, estando inseridos no campeonato distrital da Associação de Futebol de Coimbra – época desportiva 2011/2012.

Instrumentos

    Para medir as variáveis em estudo, foram aplicados os Questionários de Ansiedade-Estado Competitiva (CSAI-2R), os Questionários de Orientação para a Tarefa e para o Ego no Desporto (TEOSQp) – (Fonseca & Biddle, 1996; Cox, Martens, & Russel, 2003).

Procedimentos

  1. Os respectivos questionários foram ministrados com o conhecimento e autorização do clube, treinadores e encarregados de educação;

  2. Os Questionários de Ansiedade-Estado Competitiva (CSAI-2R) foram aplicados 60 minutos antes da competição;

  3. Os Questionários de Orientação para a Tarefa e para o Ego no Desporto (TEOSQp) foram ministrados apenas uma vez, i.e., antes do início do treino dos atletas;

  4. Os participantes responderam individualmente aos questionários, i.e., estando afastados de eventuais influências do contexto competitivo (e.g., treinador, colegas de equipa, amigos, familiares e público);

  5. Não era permitido aos atletas que não estavam a realizar o questionário (i.e., colegas de equipa ou outros intervenientes do clube): interferir, assistir, ou pronunciar-se sobre o respectivo estudo;

  6. Não era permitido aos atletas que tinham respondido ao questionário: interferir, assistir, ou pronunciar-se sobre o respectivo estudo com os colegas de equipa;

  7. Não foi imposto nenhum limite de tempo para responder ao questionário. Contudo, os atletas eram informados individualmente (i.e., antes de começarem a responder) que o questionário era de fácil compreensão e que era passível de ser elaborado rapidamente;

  8. Os atletas não podiam corrigir as suas respostas após terem respondido às questões apresentadas no questionário;

  9. Após os jogadores terem respondido aos questionários, estes eram recolhidos e guardados num envelope fechado, onde só os investigadores tinham acesso ao seu conteúdo;

  10. O treinador do atletas só teve acesso ao questionário no dia da recolha de dados, i.e., de forma a não modificar determinados comportamentos e/ou atitudes dos seus jogadores;

  11. Aos atletas participantes foi assegurada a confidencialidade das respostas, bem como a necessidade de serem verdadeiros na apresentação das mesmas.

Análise estatística

    A análise estatística dos dados foi efectuada através do programa IBM SPSS Statistics – versão 20.0. Recorreu-se ao Coeficiente de Correlação de Pearson, utilizando-se, para o efeito, um nível de significância de 0,05.

Resultados

    A Tabela 1 apresenta os resultados obtidos com base na aplicação do Coeficiente de Correlação de Pearson.

Tabela 1. Correlação entre os anos de experiência desportiva e a ansiedade total em jovens atletas de futebol 11

    Os dados mostram que não existem diferenças estatisticamente significativas entre os anos de experiência desportiva e a ansiedade total em jovens atletas de futebol 11.

    Além disso, é ainda possível constatar que esta correlação é negativa e muito fraca – r = -0,171, com p> 0,05 (p=0,616).

Discussão e conclusão

    O presente estudo teve como objectivo principal verificar se existia uma correlação estatisticamente significativa entre os anos de experiência desportiva e os níveis de ansiedade em jovens atletas de futebol 11.

    Os dados obtidos mostram que não existe uma correlação estatisticamente significativa entre os anos de experiência desportiva e os níveis de ansiedade em jovens atletas de futebol 11. Ainda assim, face à revisão da literatura, consideramos que a alta competição desportiva, pela sua natureza e características, é passível de produzir elevados níveis de ansiedade nos desportistas (cf. Barbosa, 1996; Cruz, 1994, 1996 e Lazarus, 2000). Concomitantemente, é ainda possível afirmar que os conceitos de stress, ansiedade e pressão psicológica estão associados à competição desportiva e podem influenciar significativamente o desempenho dos atletas (Cruz, 1996; Burton, 1998; Hanin, 2000; Woodman & Hardy, 2003).

    Vários factores podem ter contribuído para não se verificar uma correlação estatisticamente significativa entre as variáveis em estudo, nomeadamente: as características da amostra (e.g., idade; anos de experiência da modalidade e nível competitivo). Neste sentido, é igualmente importante referir que os níveis de ansiedade de um desporto colectivo não são comparáveis aos dos desportos individuais, uma vez que, nestas modalidades, o atleta tende a avaliar per se o seu desempenho e em desportos colectivos o praticante avalia (i.e., regra geral) a prestação do grupo (Cruz, 1996, 1997; Ferreira, Gaspar, & Peres, 2006).

    Perante o exposto, recomenda-se que este estudo seja replicado com amostras que abranjam um maior número de equipas e jogadores, i.e., de modo a verificar se existe uma correlação significativa entre os anos de experiência desportiva e os níveis de ansiedade dos atletas no desempenho de jogos desportivos colectivos.

Referências

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  • Cruz, J. (1996). Técnicas e estratégias de controlo de stress e de ansiedade na competição desportiva. IN: Cruz, J. (Ed.). Manual de Psicologia do Desporto. Braga: S.H.O. Sistemas Humanos e Organizacionais. Lda: 567-599.

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