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Novas modalidades competitivas, dificuldades e
conquistas: um estudo sobre a ginástica acrobática no Brasil

Nuevas modalidades competitivas, dificultades y conquistas: un estudio sobre la gimnasia acrobática en Brasil

New competitive arrangements, difficulties and achievements: a study on the acrobatic gymnastics in Brazil

 

* Professor Doutor da Universidade de São Paulo

**Graduandos do curso de Ciências da Atividade Física da Universidade de São Paulo

Pesquisas Interdisciplinares em Sociologia do Esporte (PISE)

Universidade de São Paulo, USP

(Brasil)

Luis Carlos dos Santos**

Rafael Hsu** | Renato Ken**

Renata Ferreira**

Marco Antonio Bettine de Almeida*

marcobettine@gmail.com

 

 

 

 

Resumo

          O artigo faz uma reflexão sobre as dificuldades de implantação e popularização da Ginástica Acrobática no Brasil, modalidade esportiva recém-chegada ao país no final do século XX. Para isso, buscou-se compreender como a consolidação do Esporte Contemporâneo influenciou a realização do Primeiro Campeonato de Ginástica Acrobática no Brasil.

          Unitermos: Esporte contemporâneo. Ginástica Acrobática. Brasil.

 

Abstract

          The article reflects on the difficulties of implementation and popularization of Acrobatic Gymnastics in Brazil, sport newcomer to the country in the late twentieth century. For this, we sought to understand how the consolidation of Contemporary Sport influenced the organization of the First Acrobatic Gymnastics Championships in Brazil.

          Keywords: Contemporary sport. Acrobatic Gymnastics. Brazil.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 17, Nº 172, Septiembre de 2012. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Este artigo busca fazer uma reflexão sobre a história da Ginástica Acrobática no Brasil, pontuando as dificuldades que foram encontradas na implantação e popularização desta modalidade esportiva recém-chegada ao país no final do século XX. Buscar-se-á enfatizar principalmente os acontecimentos relacionados à realização do Primeiro Campeonato de Ginástica Acrobática no Brasil, analisando como ocorre o processo de formalização de uma prática livre em um esporte competitivo, partindo do pressuposto de que este se desenvolve influenciado pela consolidação do Esporte Contemporâneo.

    Marques (2007) afirma que o final do século XX foi um período marcado pela consolidação do consumismo e pelo aumento de espaço nos meios de comunicação, cenário que levou o esporte a se configurar na sociedade contemporânea como um fenômeno pautado na busca por lucros e no seu caráter heterogêneo, devido à questões sócio-históricas que motivaram, principalmente após o fim da Guerra Fria, a sua divulgação e espetacularização.

    Para a elaboração deste artigo, foi realizada uma pesquisa bibliográfica em artigos, dissertações e teses. Na análise bibliográfica foram priorizados os contornos históricos referentes à Ginástica Acrobática no Brasil. Com o objetivo de coletar dados sobre o Primeiro Campeonato de Ginástica Acrobática no Brasil, além da análise bibliográfica, foi feita uma entrevista semi-estruturada com o Professor Ricieri Pastori em seu Centro de Artes e Esportes Juliu's (visto que ele contribuiu para a realização deste Campeonato), subdividida em três categorias: a) Trajetória pessoal; b) O contato com a Ginástica Acrobática Competitiva e; c) A realização do primeiro Campeonato.

1.     A Ginástica Acrobática

    A Ginástica Acrobática é conhecida desde 2300 a.C. no Egito. Exercícios acrobáticos foram descritos em pinturas em ânforas, jarras e cerâmicas na Grécia Antiga, o que mostra que este é um dos esportes mais primitivos do mundo. No Egito, as cenas da vida da época foram gravadas em baixo relevo, representando exercícios indiscutivelmente acrobáticos (CARBINATTO; WINTERSTEIN, s/d).

    Um fato marcante da história da humanidade foi o momento em que o homem decidiu buscar o domínio da sua própria natureza e corpo, uma vez que isto lhe possibilitaria executar as suas tarefas tradicionais e de sobrevivência, como caçar, escalar, construir, entre outros. Partindo-se deste princípio, fica claro que a história da acrobacia é muito semelhante à história da humanidade (BORTOLETO, 2011).

    Desafiando os limites do corpo em busca do surpreendente para atingir um grau elevado de controle dos movimentos que proporcione um espetáculo da capacidade motora humana, a acrobacia esteve presente em muitas culturas ao longo da história, tendo sido praticada por muitos povos. Entretanto, quando observamos a acrobacia no contexto atual, baseada em fins competitivos, percebemos que a sua definição, antes pautada na busca pelo domínio, ou até mesmo, como prática lúdica, foi transformada radicalmente.

    A origem da acrobacia esportiva ocorreu na Grécia e na China antiga, onde a ginástica e a acrobacia foram agrupadas pela primeira vez. Na China a modalidade existe a mais de dois mil anos, possuindo uma forte conotação regional. Os acrobatas chineses foram desenvolvendo vários estilos, baseando-se em movimentos que se relacionassem ao modo de vida das pessoas e ao trabalho produtivo. Mesmo com a tamanha popularidade da prática no país, as apresentações em teatros eram proibidas, por causa da determinação da classe feudal. Somente em 1949 com o desenvolvimento das artes nacionais é que a Ginástica pode ser inclusa e divulgada. Nos últimos 40 anos diversos grupos foram formados, sendo o maior deles o chamado Circo Nacional da China (CARBINATTO; WINTERSTEIN, s/d).

    Atualmente, a Ginástica Acrobática apresenta-se como uma modalidade de pouca expressão no cenário competitivo, fato que talvez se deva à sua não inserção no programa dos Jogos Olímpicos (MERIDA, 2008). Ademais, ela pode ser considerada uma modalidade jovem, visto que comemora 39 anos de existência como modalidade esportiva reconhecida internacionalmente em 2012.

    As competições da Ginástica Acrobática são estruturadas pela apresentação de pares ou grupos, classificados como: Duplas Masculinas, Duplas Femininas, Duplas Mistas, Trios Femininos e Quartetos Masculinos. Nestas apresentações, os atletas (acrobatas), precisam demonstram a execução de três séries: uma de equilíbrio, uma dinâmica (geralmente com elementos de lançamento com vôos do parceiro) e outra combinada (BORELLA, 2005).

    Por ser um esporte que prioriza a apresentação em grupo, a Ginástica Acrobática requer de seus praticantes muita cooperação e confiança uns nos outros. Tendo a música como suporte, sua abordagem exige a realização de uma seqüência de figuras acrobáticas coletivas, estáticas ou dinâmicas, combinadas por exercícios vigorosos de habilidade e destreza, na qual o risco é muito valorizado (BORELLA, 2005).

    De acordo com a Confederação Brasileira de Ginástica (CBG), as primeiras competições mundiais datam de 1973, ano em que foi fundada a Federação Internacional de Esportes Acrobáticos (IFSA).

    A IFSA organizou as primeiras regras, regulamentos, competições e a estrutura de arbitragem, e em 1978, a IFSA já contava com 54 países filiados a ela.

    Em 1984, para que a Ginástica Acrobática tivesse a oportunidade de participar dos jogos olímpicos, foi necessária a dissolução da IFSA, o que possibilitou que a modalidade se tornasse integrante da Federação Internacional de Ginástica (FIG).

    É interessante observar que quando a modalidade tornou-se um esporte competitivo, os países ocidentais começaram a reconhecer seus benefícios. Este reconhecimento contribuiu para que ela fosse utilizada como forma de recreação, e também como uma alternativa para pessoas que não possuíam o biótipo ideal para a ginástica artística (CARBINATTO; WINTERSTEIN, s/d).

    No Brasil, a prática de acrobacias em grupo existe desde o começo do século XX, sendo vinculada e difundida principalmente pelos circos, e incorporada ao exército como exercício físico.

    A Ginástica Acrobática foi introduzida no Rio de Janeiro pela Escola de Aeronáutica que publicou em 1945 um opúsculo baseado no livro americano Laport Renner “The Trumbler’s Manual”, com o título “Normas para Instrução de Saltos Acrobáticos Elementares”. O seu aparecimento teve influência do circo, e ela era ensinada juntamente com a Ginástica Olímpica nas escolas públicas (BORELLA, 2005).

    No Brasil, existem poucos lugares para treinamento, sendo poucos os que se apresentam como seguros e adequados para a prática. Ainda nos deparamos com uma escassez de planos que ajudem a divulgar este esporte, de forma com que ele seja parte de programas de iniciação em clubes e escolas (CARBINATTO; WINTERSTEIN, s/d).

    Em 1993, o primeiro Campeonato de Ginástica Acrobático realizado no Brasil foi promovido pelo Professor Ricieri Pastori, na cidade de Cambuí, Minas Gerais. Atualmente, a Ginástica Acrobática no Brasil está burocratizada, representada pela Confederação Brasileira de Ginástica (CBG) e filiada à Federação Internacional de Ginástica (FIG) conforme o artigo 13 da lei nº 9.615, de 24 de março de 1998. Porém, a modalidade ainda encontra muitas dificuldades de popularização.

    Destacaremos no próximo item, a explosão da concepção do Esporte Contemporâneo com o final da Guerra Fria como problemática impressa na falta de apoio financeiro, midiático e produção acadêmica para o desenvolvimento da modalidade.

2.     As dificuldades: o esporte contemporâneo x a ginástica acrobática no Brasil

    As transformações sofridas pelo esporte moderno, no sentido de conformação do fenômeno contemporâneo foram graduais, tanto por meio de mudanças de paradigmas, seguindo tendências da sociedade, quanto por marcos históricos. Estas mudanças mostraram-se mais significativas após a Segunda Guerra Mundial, no qual o uso político, a popularização, a mundialização e a espetacularização desse fenômeno tomaram maiores proporções e tiveram seu ápice no final da Guerra Fria (MARQUES; GUTIERREZ; ALMEIDA, 2008a). Foi neste contexto histórico-social do esporte que a Ginástica Acrobática Competitiva foi introduzida no Brasil, totalmente influenciada pelo Esporte Contemporâneo, que é caracterizado como um fenômeno heterogêneo ligado ao mercado, no qual suas práticas, voltadas ao lazer, à educação formal e ao alto rendimento, associam-se ao giro de capital, ou acabam sofrendo uma influência cultural de um modelo hegemônico, no qual os meios de comunicação exercem o papel de divulgar e expandir os conceitos, costumes, símbolos, valores e produtos do esporte (MARQUES; GUTIERREZ; ALMEIDA, 2008b).

    Desta maneira, uma nova modalidade competitiva que não tem apelo comercial nem personalidades representativas do esporte à sua frente, encontra grandes dificuldades em destacar-se no cenário esportivo nacional, principalmente pela falta de apoio privado (patrocínio e mídia) e apoio político (verba pública e espaços adaptados). A própria escassez de produção acadêmica sobre a modalidade, pode ser entendida como uma conseqüência da problemática em questão.

    Observando o panorama da Ginástica Acrobática, parece que os vastos conhecimentos relacionados a ela têm sido transmitidos informalmente, de técnico para técnico no decorrer de anos, em geral, sem a preocupação em registrá-los e publicá-los. Dificuldade identificada, inclusive no cenário mundial da Ginástica Acrobática, [...] (MERIDA, 2008).

3.     Superando as dificuldades: Ricieri Pastori e o Primeiro Campeonato de Ginástica Acrobática no Brasil

    O professor e atleta Ricieri Pastori, também conhecido como Julius, foi o pioneiro a desenvolver a modalidade como esporte pré-competitivo no Brasil, promovendo os primeiros campeonatos de Ginástica Acrobática. Tendo sido Integrante de grupos militares e de clubes, teve a oportunidade de trabalhar em circos nacionais e internacionais, trazendo da Europa técnicas iniciais da Ginástica Acrobática competitiva.

    Nascido em 01 de Dezembro de 1935 na cidade de Bocaína no estado de São Paulo, esta figura chave na difusão da modalidade no Brasil, relata em entrevista que seu primeiro contato com a Ginástica Acrobática ocorreu entre os anos de 1958 e 1959, no Clube Ginástico Paulista, no bairro da Luz em São Paulo. Nesta época, Ricieri praticava Handebol e os preparadores físicos do time eram dois irmãos da Lituânia, refugiados da Ex-União Soviética.

    “E quando terminava o treino, eu ficava assistindo lá... Então eu fiquei encantado pela acrobacia que eles faziam, de pirâmides humanas. E toda aula, eu ficava ali num canto, porque eu sempre fui muito acanhado, muito tímido, ficava lá... Um dia eles me chamaram: - Você gosta de acrobacia? Eu falei: - Gosto, gosto! - Então vem treinar! Vem treinar comigo!? Aí pra mim foi uma surpresa muito grande, aquela noite não dormi de alegria.”

    Como apontado anteriormente, os primeiros campeonatos de Ginástica Acrobática datam da década de 1970, portanto, ainda que esses primeiros treinamentos não tivessem caráter competitivo, esse contato emblemático despertou no jovem Ricieri a paixão pela prática.

    Posteriormente, Ricieri foi convidado a treinar Ginástica Olímpica no mesmo clube, onde teve uma carreira regular e obteve muito destaque nas Argolas.

    Paralelamente treinava com um parceiro da Ginástica Olímpica, Valter Silveira Lima, com o qual formou uma dupla de destaque internacional no Circo Tihany de 1967 a 1971, conhecida como: Les Spartas.

    “E tinha um rapaz da ginástica olímpica que um dia falou pra mim: - Oh Ricieri, vamos treinar um pouquinho de parada de mão... - Porque ele me via treinar. Então começamos a treinar, formamos a dupla que foi famosa depois, viajamos praticamente o mundo inteiro”.

    Após anos viajando com o circo, ao retornar ao Brasil em 1972, Ricieri abriu uma academia de ginástica geral e ginástica localizada no bairro do Tucuruvi, e trabalhou como Diretor e Técnico da equipe de Ginástica Olímpica do Clube de Regatas Tietê até 1985.

    Em 1991, depois de retornar da Hungria trazendo vídeos dos treinamentos e livros com as técnicas e regras básicas da Ginástica Acrobática, adaptou o regulamento internacional e aplicou pequenos cursos em universidades (como a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e a Universidade Federal de Viçosa (UFV) e em sua academia particular. Com esses cursos, a modalidade antes praticamente desconhecida, começou a agregar os primeiros praticantes ao mesmo tempo que se tornava conhecida no mundo acadêmico.

    Em 1993, Ricieri conseguiu o apoio da prefeitura da cidade de Cambuí-MG após uma apresentação de seu grupo em um evento local, e então organizou a primeira competição de Ginástica Acrobática, envolvendo os seus grupos (Julius - SP e Julius - MG) e as instituições visitadas por ele (UNICAMP, UFV, e o Colégio Juvenal de Campos - Guarulhos/ SP).

Considerações finais

    Ao analisarmos a história da Ginástica Acrobática podemos traçar um paralelo entre o contexto do Esporte Contemporâneo formado no início da década de 1990 com o período em que as primeiras competições de Ginástica Acrobática foram realizadas.

    Esta aproximação justifica a dificuldade que uma nova modalidade tem para se enquadrar nesse modelo de esporte. A falta de apoio e o pouco espaço disponível na mídia, ainda são dificuldades freqüentes encontradas por modalidades nascidas no período de consolidação da massificação e espetacularização do esporte, vinculadas a lógica do capitalismo hegemônico, a partir do final da Guerra Fria. Os aspectos da modalidade geralmente acabam sendo difundidos de forma empírica por alguns técnicos e ginastas, fazendo com que a modalidade possua um número reduzido de praticantes, como é observado nas competições nacionais (MERIDA, 2008).

    Fica claro que as ações do sujeito que objetiva difundir a prática (no caso, Ricieri Pastori), apresentam-se expressivas e relevantes na difusão de uma nova modalidade, contribuindo para o seu desenvolvimento.

Referências bibliográficas

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