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Representações sociais e aspectos 

nutricionais da alimentação na modernidade

Representaciones sociales y aspectos nutricionales de la alimentación en la modernidad

Social representation and nutritional aspects in feeding and modernity

 

*Docente do Curso de Nutrição e Coordenadora dos Estágios do Centro

de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade Presbiteriana Mackenzie

**Docente e Coordenadora do Curso de Nutrição do Centro de Ciências

Biológicas e da Saúde da Universidade Presbiteriana Mackenzie

***Professora Associada – Livre Docente do Depto. de Nutrição da Faculdade

de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, São Paulo

Edeli Simioni de Abreu*

Daniela Maria Alves Chaud**

Elizabeth Aparecida Ferraz da Silva Torres***

edelisabreu@gmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Atualmente, é rara a família que pode almoçar em casa, seja por falta de tempo ou pela distância entre o local de trabalho e as residências. Para suprir essa necessidade tão básica dos indivíduos, os restaurantes proliferaram nos últimos anos, sendo vários os seus tipos. Os restaurantes que comercializam alimentos e preparações por peso, popularmente denominados "por quilo", são aqueles onde existe um preço fixo e uma variedade de alimentos, as pessoas servem-se e pagam pelo peso (g) dessa refeição. Este trabalho considerou as representações sociais e aspectos nutricionais da alimentação na modernidade, por meio de revisão bibliográfica nas bases de dados Medline e Lilacs. Foram sugeridas alterações nos cardápios e na forma de venda, bem como implementação de políticas de educação nutricional que visem melhoria na qualidade de vida.

          Unitermos: Alimentação e modernidade. Mudança de hábitos alimentares. Fast-food. Restaurantes "Por Quilo".

 

Abstract

          Nowadays, it is very difficult to find a family that is able to have lunch at home for several reasons; for example, because there is not enough time for this or due the distance between works and home. So, a lot of restaurants were created trying to attend the individuals on this so essential necessity. The restaurants that sell food "por quilo" establish a fixed price and offer several kinds of food, the people choose what they want to eat and pay for the weight of the meal. This study considered the social representation and nutritional aspects in feeding and modernity, by bibliography revision in Lilacs and Medline data bases. Changes at the menu and in selling patterns as well as the adoption of nutritional education programs in order to improve life quality were suggested.

          Keywords: Feeding and modernity. Food habits changes. Fast-food. "Por Quilo" restaurants.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 17, Nº 172, Septiembre de 2012. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Em nossos dias, a alimentação é profundamente diferente daquela praticada por nossos antepassados, que viviam em contato com a natureza, alimentavam-se de tudo quanto ela lhes oferecia.

    Atualmente, os alimentos são produzidos e transformados segundo técnicas modernas, que algumas vezes alteram seu valor nutritivo. E, para fazer sua escolha, já não temos o instinto dos povos primitivos, estamos envolvidos por preferências e hábitos requintados, e ainda somos induzidos pela propaganda em massa.

    Essas tendências podem representar um perigo. A manutenção da saúde do indivíduo, perante erros alimentares repetidos, poderá comprometer a perpetuação da espécie, se nada for feito no sentido de dar ao homem o alimento necessário, em quantidade e qualidade.

    Conhecendo-se, por um lado, a natureza e a quantidade aproximada dos nutrientes necessários ao organismo, e, por outro lado, qual a composição média dos alimentos, concebe-se, ser possível, construir dietas balanceadas.

    Será pelos princípios básicos da alimentação racional e equilibrada, nas famílias e coletividades, que se realizará, com segurança, uma profunda melhora da nutrição em nível de saúde pública.

    Em meio a essa problemática, este trabalho teve por objetivo considerar as representações sociais e aspectos nutricionais da alimentação na modernidade, por meio de uma revisão da literatura.

Métodos

    Pelo método de revisão sistemática, realizou-se busca nas bases bibliográficas Medline e Lilacs (entrada pela biblioteca virtual em saúde), nas referências dos artigos encontrados e contato com autores, quando necessário. Os descritores de busca utilizados foram: Alimentação e Modernidade. Mudança de Hábitos Alimentares. Fast-food. Restaurantes "Por Quilo".

    As referências bibliográficas dos artigos identificados tam­bém foram revistas para captar referências não encontradas na busca. A despeito do reduzido número de trabalhos específicos relacionados ao assunto, optou-se por incluir todos os artigos elegíveis, em virtude da pesqui­sa ainda incipiente sobre o tema, sem delineamento de data.

    Esse material foi lido e analisado para identificar os que atendiam aos objetivos e discorrer sobre o objeto de estudo.

Hábitos alimentares

    Pode-se dizer que a história da alimentação ocorre paralelamente à história da humanidade na face da terra. Desde a pré-história, o homem sempre procurou localizar-se onde havia suplência de alimentos, água e condições climáticas favoráveis à sua sobrevivência (Mezomo, 2002). Estes fatos vêm acontecendo através do tempo e com todos os acertos e erros provenientes da evolução humana na procura da sobrevivência. Até a idade contemporânea o homem já foi caçador e coletor. Ao perceber que esse parasitismo esgotava a terra, passou a semear e pescar, iniciando a vida pastoril e com o desenvolvimento da inteligência começou a guardar e conservar alimentos, além de cozer, moer grãos e fermentar a cevada e a uva (Flandrin e Montanari, 2009).

    Até o século XX, muitas descobertas científicas como o aparecimento de novos produtos; a renovação de técnicas agrícolas e industriais; descobertas sobre fermentação, fabricação do vinho, cerveja, queijo e beneficiamento do leite; avanços na genética que permitiram sua aplicação em plantas e animais; maquinaria agrícola; e, processos técnicos para conservação de alimentos levaram ao progresso e também à modificação dos costumes alimentares (Newbye e Utting, 1984; p. 261).

    Esse panorama se deu pela mudança dos hábitos alimentares - disposição duradoura adquirida pela repetição freqüente de um ato, uso ou costume (Bourguers, 1998).

    A análise das mudanças nas práticas de alimentação é matéria complexa devido às muitas funções e aspectos das mesmas. Tanto a persistência, como a alteração nos comportamentos alimentares, podem ser facilmente exagerados, portanto há considerável controvérsia sobre a direção das mudanças no presente período (Beardsworth e Keil, 1997).

    Segundo Chaves (1985), os fatores que determinam esses hábitos são variáveis e complexos e suas principais influências são:

  • Fatores Culturais: A cultura pode ser definida como a forma de vida de um grupo de pessoas que, em geral, são da mesma comunidade. Os hábitos alimentares constituem um aspecto muito dependente das várias culturas. A cultura é transmitida de geração em geração por meio de instituições como a família, a escola e a igreja. Através dos tempos, uma determinada cultura sofre vários graus de mudança.

  • Fatores Econômicos: O aumento do custo dos alimentos e a sua escassez representaram um impacto nos padrões alimentares. À medida que a superprodução agrícola desapareceu e a crise mundial dos alimentos tornou-se aparente, os consumidores começaram a reexaminar suas reais necessidades e a procurar alternativas para substituírem alimentos raros e dispendiosos. Embora ainda exista uma enorme variedade de alimentos vendidos nos supermercados, os preços elevados tornam a seleção dos mesmos um verdadeiro desafio.

  • Fatores Sociais: Em função dos grupos sociais distintos, devemos considerar o efeito do comportamento dos mesmos sobre os fatores que influenciam os hábitos alimentares. A organização da sociedade, com suas diversas estruturas e sistemas de valores, desempenha uma parte importante na aceitação ou rejeição dos padrões alimentares. As refeições realizadas em grupos, podem demonstrar as preferências de uma comunidade e, mais além, criar modelos a serem seguidos.

  • Fatores Psicológicos: Os hábitos alimentares constituem uma parte importante do comportamento humano. As pessoas são motivadas a agir em termos daquilo que crêem ser relevante para suprir suas necessidades. Considerando que o indivíduo foi motivado, sua capacidade de mudar de comportamento será afetada pelo conhecimento e informação.

    Esses hábitos fazem parte da cultura e do poder econômico de um povo (Mezomo, 2002), além de serem de primordial importância para a compreensão da conduta alimentar (Piovesan, 1970; Philippi, 1992; Diez-Garcia, 1995 e Diez-Garcia, 2011).

    Há, ainda, outros fatores importantes que influenciam de modo geral. O grande número de pessoas de diferentes nacionalidades, raças e religiões, vivendo juntas em áreas urbanas. Cada grupo, dessas pessoas, trouxe seus próprios hábitos alimentares e os adaptou aos já existentes.

    Entretanto, nenhuma história sobre hábitos alimentares está completa se não mencionarmos a tecnologia altamente desenvolvida que torna os alimentos, numa variedade de formas, capazes de serem adquiridos em todas as partes do mundo durante todas as estações do ano. Assim, a oferta de alimentos proporciona uma variedade enorme de produtos que serão selecionados de acordo com o hábito alimentar de cada indivíduo ou população (Beardsworth e Keil, 1997).

    Uma grande variedade de novos produtos é colocada no mercado por produtores de alimentos. Produtos frescos do mundo inteiro encontram-se à disposição rotineiramente. O mercado dominando as distâncias geográficas e até mesmo a sazonalidade dos produtos. As mudanças de hábitos alimentares são direcionadas tanto pelos apelos e preocupação com a saúde e boa nutrição ditados pelas pesquisas como pelos produtores. As rotinas domésticas têm sofrido muitas alterações (Beardsworth e Keil, 1997).

Situação alimentar no Brasil

    Existem poucos estudos bem controlados sobre as dietas de populações tanto em nível mundial como nacional (Tramonte, 1994 e Mondini e Monteiro, 2000). Os primeiros estudos brasileiros sobre a situação alimentar e nutricional datam da década de 30, destacando-se entre eles os estudos de Castro (1983) e Davis (1983) sobre amostras de famílias operárias em Recife e São Paulo, respectivamente.

    Existe uma grande dificuldade em se definir a dieta consumida por uma dada população, especialmente devido às diferenças de hábitos alimentares, decorrentes da diversidade cultural e econômica existentes nos países (Cozzolino et al., 1980), no Brasil essa dificuldade é aumentada pela sua extensão e variedades sócio-econômico-culturais.

    A partir da II Guerra Mundial, o problema alimentar dos países do chamado Terceiro Mundo passou a receber atenção especial por parte dos países da Europa central. Com a criação da Food and Agriculture Organization (FAO em 1945) e da Organização Mundial da Saúde (OMS em 1948) surgiram os primeiros comitês para a elaboração de normas sobre execução e análise de inquéritos alimentares. Posteriormente, em meados da década de 50, nos Estados Unidos, o Interdepartamental Committee for National Defense (ICND) passou a realizar inquéritos nutricionais nos países periféricos e, paralelamente, o próprio Ministério da Agricultura americano financiou estudos sobre o consumo de alimentos em vários destes países (Viacava et al., 1983).

    Os efeitos deste movimento internacional começaram a ser sentidos no Brasil no início da década de 60 quando foi realizado um inquérito sobre o consumo de alimentos conduzido pela Fundação Getúlio Vargas e financiado pelo Ministério da Agricultura dos Estados Unidos (Viacava et al., 1983). Essa investigação, considerada o primeiro estudo sistemático em nível nacional, analisou o consumo alimentar de 9.125 famílias de áreas rurais e urbanas a partir dos gastos familiares com diversos alimentos e das quantidades consumidas no último mês antes da entrevista (Viacava et al., 1983).

    Duas pesquisas de orçamento familiar - POFs - foram realizadas no início da década de 60 e no final da década de 80. Tratam-se de pesquisas domiciliares de orçamento familiar, uma executada pela Fundação Getúlio Vargas entre 1961 e 1963, supra citada; outra pelo IBGE de março de 1987 a fevereiro de 1988 com uma amostra probabilística de 13.311 domicílios. Especificamente para a cidade de São Paulo, dispõe-se de duas outras POFs realizadas no início das décadas de 70 e 80 (Mondini e Monteiro, 2000).

    Em nível nacional, foi somente em 1974 que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) iniciou o Estudo Nacional de Despesa Familiar (ENDEF). Este estudo foi realizado de agosto de 1974 a agosto de 1975 e abrangeu a maioria das regiões brasileiras. O trabalho incluiu 55.000 famílias com amostra representativa para cada uma das áreas metropolitanas, para a área urbana não-metropolitana e a área rural não-metropolitana. Utilizou-se o método da pesagem durante um período de 7 dias sucessivos em cada domicílio para estimar o consumo médio, per capita, diário das famílias (Fundação IBGE, 1977).

    A comparação dos três inquéritos domiciliares, ao longo de um período de 26 anos, aponta mudanças significativas na composição da dieta da população urbana do país. As mudanças no padrão alimentar, detectadas ao longo dos três inquéritos, mostram-se semelhantes para as populações urbanas do Sudeste e Nordeste do País e incluem: 1) redução no consumo de cereais e derivados, feijão, raízes e tubérculos; 2) o aumento contínuo no consumo de ovos, leite e derivados; 3) a substituição da banha, toucinho e manteiga por óleos vegetais e margarinas; 4) o aumento no consumo de carnes, principalmente a partir da segunda metade da década de 70. As modificações observadas determinam tendência generalizada de menor contribuição dos carboidratos no consumo calórico total e sua substituição por gorduras, principalmente da década de 70 para a década de 80. A participação das proteínas na dieta pouco se altera ao longo de todo o período de estudo. As maiores mudanças, no entanto, são observadas quanto ao consumo de gorduras. Evidencia-se, nesse caso, substancial progressão do consumo de gorduras vegetais em detrimento ao de gorduras de origem animal (Mondini e Monteiro, 1994 e Monteiro et al., 2001).

    Mondini e Monteiro (2000) apontam três grandes preocupações com as mudanças na dieta: a primeira é que o consumo relativo de gorduras na Região Sudeste já ultrapassa o limite máximo recomendado pela Organização Mundial da Saúde, segundo inquérito de 1988; a segunda se refere ao consumo excessivo de açúcar presente nos três inquéritos e em todas as áreas estudadas; a terceira diz respeito ao consumo insuficiente de carboidratos complexos, evidenciado desde o inquérito de 1962 na Região Sudeste e revelado na Região Nordeste pelo último inquérito.

    Os aspectos positivos das mudanças referem-se ao aumento generalizado no consumo de ácidos graxos poliinsaturados, de tal forma, que se verifica a inversão de sua relação com os ácidos graxos saturados. Observa-se ainda, para a Região Sudeste, uma tendência decrescente no consumo de colesterol dietético (Mondini e Monteiro, 2000).

    O ponto negativo desta tendência seria a possível diminuição dos teores de vegetais de um modo geral, e conseqüentemente, fibras e alguns antioxidantes naturais. Estas substâncias são apontadas como possíveis protetores da dieta, cujos povos consomem vegetais em quantidades adequadas como as dietas japonesa (Cardoso et al., 1997) e mediterrânea (Nacif et al., 1998). A longevidade, além da qualidade de vida, são aspectos não apenas desejáveis, mas também possíveis no mundo moderno.

Mudanças de hábitos alimentares no meio urbano

    A aquisição de alimentos, paralela a essa evolução, também passou por várias fases até chegar aos padrões atuais. Dos pequenos empresários em armazéns, bares, lanchonetes e outros tipos de comércio, chegou-se às grandes redes de supermercados e fast-food (Sorima Neto, 1998).

    Somadas, essas mudanças aparecem, nos últimos anos, trazendo modificações nos padrões culturais de diversos segmentos sociais e conseqüentemente, no padrão alimentar. Desjejuns mais elaborados e almoços estão em declínio, por outro lado as cozinhas domésticas apresentam uma grande variedade de equipamentos (Beardsworth e Keil, 1997).

    No ano 2015, São Paulo terá nada menos que 20,8 milhões de habitantes. Esta foi a conclusão obtida na Conferência da ONU sobre Assentamentos Urbanos, a Habitat 2, realizada em Istambul, em junho de 1996 (Almeida, 1996). Com o acelerado e desordenado processo de crescimento das grandes cidades, o homem contemporâneo passou a se alimentar em outro ritmo e a criar interrogações quanto ao que comer (Sorima Neto, 1998).

    Se por um lado estão as grandes distâncias entre locais de trabalho e moradia e a falta de tempo característica do estilo de vida da população, especialmente dos grandes centros urbanos, por outro, estão as facilidades para a aquisição de alimentos já prontos e a necessidade que o consumidor brasileiro tem em economizar tempo e dinheiro.

    Tal fato levou o mercado a agir rapidamente e a criar verdadeiras estratégias de opções nas quais o consumidor é muito disputado. Desde os restaurantes mais tradicionais até o mirabolante mundo dos fast-food, os carrinhos de cachorro-quentes e outros tipos de sanduíches e a histórica marmita, que até hoje tem sobrevivido a toda essa mudança de hábitos (Almeida, 1996).

    Assim, nos últimos anos, houve um aumento do número de refeições feitas fora de casa e a preferência pelo supermercado como principal local para a compra de gêneros alimentícios, fato que favorece a diversificação dos alimentos e o consumo de produtos industrializados. Essas tendências devem ser relacionadas com a mudança no estilo de vida da população que passou a procurar economia no tempo gasto com compra, preparação e consumo dos alimentos (Oliveira, 1997). O mercado tem se expandido pela distribuição comercial de refeições ou lanches em restaurantes, fast-food e locais públicos para a entrega em domicílio ou refeições para viagem e refeições refrigeradas ou congeladas adquiridas em supermercados para serem reaquecidas em casa (Beardsworth e Keil, 1997).

    Alguns fatores têm modificado o ambiente social onde se consome o alimento. No Brasil, herdado dos portugueses e reforçado pelos italianos, o hábito de reunir a família na hora das refeições foi mudado com o passar do tempo. Nos primeiros anos de Brasil, brancos e índios comiam no chão, sentados em esteira. No século XVII, o chefe da família, e só ele, passou a ser servido à mesa. Com o tempo, a mulher ganhou um lugar, enquanto as crianças comiam em um canto da sala. Só no final do século XIX os filhos pequenos acabaram incorporados, mesmo assim, quando não havia visitas por perto. Toda a família reunida em torno da mesa é um fenômeno do século XX, é o que analisa a especialista em gastronomia Nina Horta citada por Veiga (Veiga, 1998).

    Nos últimos anos, o centro de reuniões está se deslocando. O advento da modernidade trouxe muitas mudanças no cotidiano das pessoas. O desenvolvimento de novos sistemas de vida nas zonas urbanas (Gross e Monteiro, 1989), a incorporação da mulher como força de trabalho, as distâncias dos locais de trabalho, a relativa facilidade para a aquisição de alimentos processados, o efeito da mídia sobre a alimentação com a popularização das informações (Veiga, 1998), foram determinantes conjunturais da oferta e do consumo alimentar, disponibilidade de alimentos, influências socio-econômicas, demográficas e epidemiológicas.

    Atualmente, são raras as famílias que desfrutam do prazer de fazer refeições em casa (Garcia, 1997). A alternativa é procurar lanchonetes, restaurantes e bares para efetuar a segunda grande refeição do dia, o almoço.

    Esta nova experiência se contrasta com a forma de alimentação tradicional, retratando um processo global de homogeneização em que as pessoas formam filas, lêem o cardápio, fazem o pedido e comem em tempo recorde, mas dentro do contexto de um restaurante (Warde, 1997).

    As tendências da alimentação são reflexos dessas mudanças, levando as pessoas a recorrer aos fast-food em busca de rapidez e facilidade.

Conceito de fast-food

    O conceito de fast-food (comida rápida) nasceu nos Estados Unidos em 1955, mas suas origens remontam aos séculos XVII e XIX, se espalhando pelo mundo todo, ocidental e oriental. Encontram-se estabelecimentos de fast-food desde a Rússia, até o Japão, América, Europa e etc. Essa disseminação se deve muito à importação do modo de vida norte-americano, fazendo com que grande parte dos seus hábitos seja copiada, inclusive parte dos hábitos alimentares. Hoje cerca de 10 bilhões de hambúrgueres são consumidos por ano pelo mundo (McDonald’s Corporation, 2003). O conceito de fast-food não se restringe obviamente somente a hambúrgueres, mas também a outros tipos de comida rápida, tais como pizza, comida chinesa, mexicana e outros, cuja influência cultural de outros povos está implícita.

    O país Estados Unidos, entre os anos 20 e 40, conheceu grandes transformações nos hábitos alimentares ligadas à emergência de grandes companhias processadoras de alimentos e à vida na cidade, a falta de tempo para comer em casa criou a necessidade de se conseguir uma boa refeição a preços acessíveis. A modernidade impôs seu ritmo aos costumes, os drive-in realizaram a adequação da refeição ao ritmo dos automóveis, acelerado pelo fast-food, através da aplicação do modelo Taylorista das fábricas à produção de sanduíches e no atendimento ao cliente (Corr, 1996).

    Essa transformação expressa não apenas uma mudança de comportamento, mas o fim da refeição enquanto "instituição social". O que significa para alguns autores a congregação dos membros dispersos de uma família, ou um momento ritualístico da reunião e da comunhão alimentar de seus membros, que é substituído no mundo moderno por uma modificação na ordem das coisas: da refeição estruturada com entrada, prato principal e sobremesa, passa-se para uma alimentação fragmentada; a alimentação anteriormente realizada em horários fixos passa a se realizar em horas variadas; o tempo e o local onde os alimentos são ingeridos passam por uma dessincronização; o ato de comer se deslocaliza, realiza-se um movimento de aceleração da vida (Giddens, 1991).

    Em contrapartida, há uma grande publicidade para alimentos e preparo dos mesmos, com uma série de revistas tratando desse assunto, programas de televisão, vendas de livros de receitas, colunas de restaurantes em jornais.

    O caráter de produção e distribuição de alimentos está mudando, pressionando uma reestruturação na indústria, o que acaba afetando outros segmentos industriais. A competição gera mais propaganda e promoção (Beardsworth e Keil, 1997).

    As pessoas se acostumam a toda essa mudança e vão se adaptando de acordo com suas necessidades, principalmente no que se refere ao poder aquisitivo, que na maioria das vezes determina qual será o cardápio do dia, o qual muitas vezes não é saudável, mas é o que vai saciar a fome por algumas horas.

    O conceito de fast-food tem mudado significativamente. Mais recentemente, tem se desenvolvido num espectro de comida preparada, em que se oferece de tudo, desde sanduíches e saladas, até pizzas, pastéis, comidas étnicas, donuts e lojas de conveniência. Inclui, ainda, restaurantes tipo self-service e "por quilo", cafés, produtos de padaria e serviço de entrega domiciliar (McDonald’s do Brasil, 2003).

    Em média, o brasileiro faz uma em cada quatro refeições fora de casa - 25%, e nos Estados Unidos, 46%. Assim, o número de restaurantes aumentou de 400.000 em 1991 para 756.000 em 2000, sendo que existem 1.036.180 pontos de vendas de refeições fora do lar, com 41 milhões de refeições servidas por dia (ABIA 2001). Estima-se que somente na cidade de São Paulo estejam localizados 5.000 restaurantes (Magnée, 1996). O consultor Magnée citado por Maricato (1996), acredita que mais de 50% sejam "por quilo".

Aspectos econômicos

    Parte da contribuição para esse aumento foi dada com a explosão de consumo que se seguiu ao plano real, não por sobra de caixa no orçamento do consumidor, mas porque os preços caíram e a competição se acirrou. Esse enfoque se alicerça na premissa de que os desejos dos indivíduos por bens é extremamente maior que o poder de compra que possuem. Os mecanismos de decisão ocorrem em nível individual. Assim, pela análise microeconômica, pode-se, em alguma medida, predizer o comportamento do consumidor, baseando-se nas seguintes considerações: a limitação da renda conduz à necessidade de se fazer escolhas; essas são realizadas propositada e racionalmente; um bem pode ser substituído por outro; o sistema de informações disponível é imperfeito, mas conta-se normalmente com experiência passada; há, subjacentemente, uma utilidade marginal decrescente, ou seja, a satisfação diminui após cada nova unidade adquirida de um produto (Riddell et al., 1997).

    É preciso ressaltar que, além da citada restrição orçamentária, outros componentes afetam, de forma secundária, os mecanismos de decisão sobre o que consumir. Engel et al. (1999) detectam esses fatores complementares como sendo: diferenças individuais, as quais englobariam o acesso pessoal à informação, memória, atitudes consolidadas, motivação, personalidade, valores e estilo de vida; as influências ambientais, cultura, classe social, pressões de terceiros, família e situação; e os processos psicológicos, comunicação da mídia, aprendizado e mudanças comportamentais.

    Dessa maneira, conclui-se que a demanda está engendrada em um processo dinâmico, decorrente fundamentalmente das transformações observadas nas duas variáveis, preços e renda, mas sujeito, paralelamente, às características adjacentes e inerentes ao mesmo processo.

    Dessa forma, com o advento "Plano Real" e a estabilização da economia obtida em 1994, abriu-se a possibilidade de retomar o crescimento sustentado da economia, o que permitiu expeditar a recuperação do terreno perdido durante a longa crise de uma década e meia, desde o início dos anos 80 (Coutinho, 1998). Nesse período o Brasil começava a mudar. Com o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) que cresceu à taxa média anual de 3,3% entre 1994 e 1998, realizações econômicas e conquistas sociais ocorreram nesse período (Presidência da República, 1999).

    Durante o Plano Real, o Salário Mínimo Nominal aumentou acima da inflação. No primeiro dia do plano, um Salário Mínimo correspondia a 60% da cesta básica, em maio de 1999 passou a 106% (Presidência da República, 1999) e nos dias de hoje sabe-se que já sofreu uma queda não atingindo 100%. Mas é inegável que houve um aumento no poder de compra. Produtos que antes eram consumidos somente pela classe média e alta passaram a ser acessíveis às camadas de menor renda, como por exemplo biscoitos, iogurtes e queijo (Presidência da República, 1999).

    Com a elevação da renda e a manutenção do poder de compra, o trabalhador chega a substituir produtos populares, como carne de segunda, por outros tipos de carne. O próprio consumo de carne bovina cresceu 29% entre anos de 1994 e 2000, ou seja, um crescimento médio acima de 6% ao ano (ABIA 1998).

    E esse poder de compra, bem como o aumento do consumo se refletiu em todos os segmentos sociais.

    O Quadro 1 demonstra a variação de consumo de alimentos industrializados durante o Plano Real.

Quadro 1. Porcentagem de variação de consumo de alimentos industrializados de 1994 a 2000

O sistema self-service e o restaurante "por quilo"

    As mudanças ocorridas nos últimos anos no segmento de restaurantes comerciais mostram uma nova face desse ramo de atividade.

    Durante a Revolução Francesa, em 1582, surgiu um albergue/taverna que costumava servir seus fregueses nas mesas, principalmente soldados que aguardavam o chamado do dever, considerado por muitos como o primeiro restaurante do mundo. Porém, o primeiro estabelecimento público a usar a palavra restaurante foi aberto em Paris dois séculos depois, em 1765, iniciando a prestação de serviços, que se ampliou na capital francesa até 1795, saindo então pelo mundo afora, universalizando a França como a capital da gastronomia. O mundo foi tomado por uma série de inovações que jamais cessaram de acontecer, e que em nossos dias chegaram ao requinte na elaboração de pratos sugestivos e processos de atendimentos surpreendentes (Lobo, 1999).

    Dentro desse novo cenário, surgiu o conhecido restaurante "por quilo", um fenômeno nacional com custo atrativo, mas que, nem sempre, atende às necessidades nutricionais (Veiga, 1998). Esses restaurantes oferecem ao consumidor inúmeras combinações diferentes, muitas delas nem sempre equilibradas do ponto de vista nutricional. Em alguns casos eles são especializados em: Comida Italiana, Comida Brasileira, Comida Japonesa, Comida Chinesa, vegetariana, churrasco, e outras especialidades.

    O segmento de restaurantes do tipo self-service, tem se apresentado como um dos mais promissores e deverá continuar crescendo nos próximos anos de forma contínua e definitiva, pois esse tipo de serviço tem recebido a simpatia do público de forma consagradora. Essa tendência também tem se notado em outros países e segundo os especialistas deverá ser confirmada como a forma ideal de comercialização de alimentos para o futuro (Magnée, 1996).

    A história do self-service data de muitos anos, quiçá décadas ou séculos. O self-service ou sistema americano como é chamado, tem suas raízes na família. Em casa, os americanos já se serviam há tempos. No Brasil, foram os sulistas os precursores, há aproximadamente vinte anos. Após o sucesso no sul do País, esse modelo foi instalado em São Paulo (Maricato 1996).

    Com o surgimento das novas gerações de balanças, e principalmente das eletrônicas, nasceu este novo tipo de mercado chamado "por quilo" que, na realidade, deveria ser chamado "por peso", porque raramente o consumidor atravessa a marca de um quilo. A média de consumo "per capita" gira em torno de 420g (Magnée,1996), além de que kg é a unidade de medida e não a medida propriamente dita, ou seja, o produto da massa pela aceleração da gravidade é chamado de peso.

    Esse tipo de restaurante "por quilo" passa a ser mais interessante que o self-service simples, pois o cliente escolhe apenas aquilo que pretende consumir, ciente de que os restos sairão de seu próprio orçamento. Por outro lado, a possibilidade de escolher por peso, faz com que se gaste na medida da disposição financeira (Maricato, 1996).

    Em meados da década de 80, os restaurantes "por quilo" na cidade de São Paulo eram uma raridade. Casas como Massadoro e Família Mancini despontavam como os pioneiros no setor, apenas para entradas e saladas (Maricato, 1996).

    É difícil saber quem foi o precursor desse modismo. Aberto em janeiro de 1986, o "Meio Quilo", de São Paulo, cujo nome surgiu da média de consumo que existiu nos anos 80 (Maricato, 1996), reivindica o papel. O proprietário Carlos Frank garante ter trazido a idéia de Berlin (Veiga, 1998).

    Porém, não há dúvidas, que os restaurantes "por quilo", surgidos no final da década de 80, são uma invenção brasileira que deu certo. Verdadeiro fenômeno, esse tipo de restaurante se multiplicou por todo o país, há duas décadas, ocupando principalmente os bairros comerciais mais movimentados das grandes cidades. Para alguns profissionais eles vieram para ficar e continuam a se expandir. Outros acham que o espaço que tinham a ocupar no mercado já se esgotou (Maricato, 1996). Eles oferecem comida variada e farta, na maioria das vezes a preços acessíveis, além de praticidade e rapidez no atendimento.

    Esse tipo de serviço simplificou tudo: a cozinha, que só prepara certo número de pratos; o serviço, que aboliu a figura do garçon; o tempo, já que o cliente se serve imediatamente do que quer, com a visualização nos balcões da composição dos pratos; o preço que elimina couvert, gorjetas e restos, ficando mais convidativo, já que funciona como um fast-food relativamente mais barato, considerando-se o custo-benefício; o giro rápido de clientes/cadeiras/hora, que evita filas de espera; e, os pratos variam diariamente, eliminando, portanto, a monotonia dos cardápios (Magnée, 1996; Maricato, 1996, Veiga, 1998).

    Assim, a comida "por quilo" deixou de ser um modismo e se tornou hábito de consumo. No entanto, a concorrência força o aperfeiçoamento da qualidade, produtividade, criatividade e redução de preços, uma vez que a clientela está mudando, tornando-se mais exigente (Maricato, 1996) e eclética, de executivos a donas de casa, passando por estudantes, trabalhadores em geral e idosos que vivem sozinhos.

    O cliente do restaurante "por quilo" tem a seguinte opinião: "gosto porque escolho o que vou comer", mas na realidade, ele escolhe o que o restaurante lhe oferece (Magnée, 1996).

    Apesar de existir gosto para todos os tipos de comida, o mundo da alimentação exige cuidados especiais. O hábito de comer fora de casa precisa de muita atenção. As necessidades nutricionais variam de acordo com a idade, sexo, peso, altura e atividade física.

    A elaboração de cardápios serve como instrumento gerencial dos diversos setores do restaurante, como: recursos humanos, controle de custos, planejamento de compras, fixação dos níveis de estoque, determinação dos padrões a serem utilizados na confecção das receitas, servindo como pesquisa e análise dos hábitos alimentares dos clientes (Abreu et al., 2011).

    O cardápio é também um instrumento de venda, é normalmente apresentado antes do consumo, sua divulgação poderá agir positivamente ou não sobre a vontade do cliente em dar preferência pela casa. O cardápio é ferramenta que inicia o processo produtivo, por isso deve ser planejado desde a inauguração do restaurante. A partir dele é que se determinará o que deve ser produzido, quando, em que quantidade, com que matérias primas, com que equipamentos, quais procedimentos e por quem (Abreu et al., 2011).

    Este instrumento irá influenciar diretamente sobre a rentabilidade da empresa, pois através de seu planejamento pode-se prever antecipadamente o seu custo (Mezzomo, 1994).

    As preparações que compõem os cardápios dependem de muitos fatores, tais como: hábitos alimentares da clientela; situação geográfica do restaurante; apresentação e aspecto dos produtos; componentes e produtos utilizados; desconhecimento, por parte do usuário, de produtos específicos; clima; produtos concorrentes; e, tipo de trabalho realizado pela clientela (Magnée, 1996).

    O consultor Magnée (Magnée, 1996) recomenda a seguinte estratégia para melhorar o desempenho do balcão de pratos oferecidos nos restaurante "por quilo" e conseqüentemente a rentabilidade para os proprietários, cujo lucro bruto por quilo vendido gira em torno de 12%:

  • "A seqüência de montagem e abastecimento do balcão quente deverá iniciar-se a partir da chegada do cliente na seguinte ordem: 1) arroz; 2) feijão; 3) pratos de salgadinhos; 4) pratos com legumes; 5) pratos com batatas; 6) pratos com massas; 7) pratos com carne de frango ou peixe; e, 8) pratos com carne bovina. De modo geral, essa montagem segue a seguinte regra: quanto mais caro for o prato, por último ele deverá ser consumido.

  • Os dois únicos pratos que deverão ser repetidos diariamente são o arroz e o feijão, por uma questão de hábito alimentar.

  • Quanto mais diversificação tiver o cardápio apresentado, mais sucesso haverá nas vendas.

  • No sistema self-service é bastante recomendado o uso de molhos, pois o próprio sistema requer. As carnes ficam em cubas e em banho-maria, o que tende a ressecar e reduzir sensivelmente a sua suculência. O molho além de reidratar a carne, confere-lhe um sabor agradável, o que, é claro, depende da qualidade do molho. Os molhos desidratam com muita rapidez, por isso devem ser corrigidos freqüentemente com um líquido que seja a base de sua receita.

  • Um dos grande segredos da venda "por quilo" é produzir pratos "pesados", ou seja, pratos que absorvem molhos, como: bife à parmegiana, massas do tipo lasanha, produtos recheados e empanados ou produtos à doré, como, por exemplo, couve flor à doré.

  • Não deixar de colocar à venda os salgadinhos, pois além de serem produtos de custos relativamente baixo, pesam bastante e a maioria dos clientes os apreciam muito.

  • Os cremes são também uma boa opção, os mais preferidos são os de milho verde e espinafre.

  • Os legumes não são muito apreciados, mas alguns nunca sobram como, por exemplo, brócolos, couve flor, mandioca frita, jardineiras de legumes, etc... essa característica varia em função da região, tipo de preparação e hábitos alimentares dos clientes.

  • Pratos à base de queijo e molho de tomate são sempre os mais cotados, portando deve-se abusar deles".

    Essa estratégia acaba influenciando a escolha de alimentos, além de aumentar a lucratividade, mas termina desbalanceando a composição nutricional da dieta (Abreu e Torres, 2003).

    O que normalmente se observa é uma tendência das pessoas escolherem uma quantidade exagerada de proteínas e gorduras, provenientes principalmente de carnes, ainda que sejam oferecidas várias saladas, legumes e frutas. Sendo portanto, negligenciada a quantidade de vitaminas, fibras, minerais, outros nutrientes e até "protetores" que ocorrem naturalmente e são componentes tão importantes para uma dieta equilibrada, uma vez que o próprio sistema direciona para tanto (Abreu e Torres, 2003).

    Os pratos mais requisitados são sempre massas e carnes, e, entre os frios, estão as maioneses, salada de cenoura e preparações que levam creme de leite. Mesmo notando-se a tendência entre alguns clientes, em fazer pratos mais leves, com menor participação no orçamento (Maricato, 1996).

A inversão epidemiológica

    Não obstante, as mudanças na composição da dieta dos brasileiros citadas anteriormente, vêm rapidamente substituindo o problema da escassez pelo problema do excesso dietético. No Brasil, o aumento da prevalência da obesidade, entre adultos, ocorre em todos os estratos sócio-econômicos, com aumento significativo nas famílias de baixa renda (Monteiro et al., 2000 e Dutra de Oliveira, 1996), uma transição no estado nutricional da população pouco encontrada em países em desenvolvimento (Popkin, 1994).

    Enquanto isso, sinais de resistência popular são claras, como movimentos de proteção ao ambiente, direitos dos animais e o vegetarianismo se tornam proeminentes. Preocupação com a comida, distúrbios da alimentação e obsessão com a forma física igualmente sugerem aumento da preocupação, e freqüente ansiedade sobre a alimentação. Todos esses processos são amplamente conhecidos e discutidos. Eles constituem evidência de mudança rápida e fundamental. Entretanto, a análise sociológica deve ser séptica ao senso comum. Algumas dessas mudanças podem ser tão intensas quanto aparentam (Beardsworth e Keil, 1997).

    Em países industrializados, o controle de peso é parte integrante das principais prioridades de saúde identificadas para o futuro. O projeto Healthy People 2000 dos Estados Unidos, por exemplo, é direcionado, principalmente, para a melhoria dos riscos de saúde que apresentam um componente comportamental proeminente: nutrição, atividades físicas e condicionamento físico estão no topo da lista (McGinnis e Lee, 1995). Dentro da Comunidade Européia, a manutenção de um peso corpóreo saudável é parte da companha internacional de promoção à saúde "Europa Contra o Câncer". Além disso, há programas nacionais na maioria dos países europeus que enfocam especialmente os riscos cardiovasculares na obesidade (Pi-Sunyer, 1993). No Brasil, é certo que esse problema determina importantes implicações para a definição de prioridades e de estratégias de ação de Saúde Pública. Entre outros aspectos, impõe-se que a agenda de Saúde Pública do País incorpore a prevenção e o controle das doenças crônico-degenarativas, reservando lugar de destaque a ações de educação em alimentação e nutrição que alcancem de modo eficaz todos os estratos econômicos da população (Monteiro e Mondini, 1995).

    Nos países ocidentais encontram-se, mais do que nunca, disponíveis, uma culinária variada, assim como uma enorme variedade de alimentos. Se os interesse comerciais tornam o paladar das pessoas mais standartizado do que quase o concebido, eles impõem muito menos limites rígidos que a limitação física para a qual a maioria da dieta da população esteve sujeita pela maior parte do período. Apesar da aparente contradição de diminuir os contrastes e aumentar a variedade, eles são ambos facetas de um mesmo problema (Beardsworth e Keil, 1997).

    Mennell citado por Beardsworth e Keil (1997) identifica várias formas pelas quais os contrastes tem diminuído. As desigualdades sociais nas quantidades de alimentos consumidos têm diminuído; o apetite está sendo civilizado; estoques de alimentos mais seguros e uma preocupação de auto controle sobre o organismo; diminuição da diferença entre alimentos de campo e cidade, ou seja, o alimento manufaturado tem feito parte da dieta de todas as classes sociais.

    Atendo-se à variável renda, Alves (1978) aponta as Leis de Engel como um marco de referência a corroborar o fato de que aumentos reais no poder de compra conduzem a diminuição na porcentagem gasta com bens alimentares, substiuição de produtos ricos em carboidratos pelos protéicos, principalmente de origem animal, e ampliação da procura pelos industrializados.

    Quanto às demais variáveis atuantes sobre a demanda, aquelas consideradas adjacentes, verifica-se de modo similar, sua presença no processo de escolha sobre o que ingerir. Popkin (1988) relata que as transformações nas preferências, ao longo do tempo podem ser facilmente visualizadas nos países em desenvolvimento. A redução da fertilidade, o envelhecimento da população, e o surgimento de um novo cenário epidemiológico, conduzem a uma acelerada transição nos padrões dietéticos. Passam a coexistir, simultaneamente, quadros endêmicos de subnutrição e de obesidade. Num momento posterior, a difusão e o acesso ao conhecimento levam a uma reavaliação dos hábitos adotados, motivada essencialmente por razões vinculadas ao prolongamento da vida e da saúde.

Conclusão

    Acredita-se que pela magnitude dessa problemática, faz-se necessária uma avaliação das dietas praticadas em estabelecimentos comercias de alimentação.

    Portanto, a grande expansão ocorrida na área de alimentação comercial a partir da implantação dos restaurantes self-service e "por quilo" nos últimos anos, chamou a atenção sobre a necessidade de desenvolver uma avaliação da composição das preparações oferecidas nesses restaurantes para, se necessário, estabelecer programas de orientação nutricional, propondo uma dieta mais equilibrada; suplementação ou fortificação de alimentos; bem como a formulação de políticas de saúde e nutrição.

    O presente estudo permitiu destacar alguns aspectos da alimentação, sugerindo medidas que venham melhorar a sua adequação.

  • Formulação de políticas de saúde e nutrição que possuam programas de educação e orientação nutricional que busquem novas formas e novos sentidos para o ato de comer, e que visem à melhoria da qualidade de vida.

  • Reformulação dos cardápios oferecidos nos restaurantes "por quilo", pela efetiva inserção do nutricionista como responsável técnico em estabelecimentos comerciais.

  • Alteração na forma da comercialização atualmente praticada e permitida, de maneira que alimentos de baixo custo e fontes de carboidratos, tais como: arroz, feijão, sopas e pão, possam ser vendidos separadamente, com preço fixo e compatível, incentivando o seu consumo.

  • Dessa forma, somente ações conjuntas, multidisciplinares e que envolvam todos os seguimentos de uma sociedade, bem como as autoridades, podem dar conta de melhorar a alimentação de uma população.

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