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Processo de ensino-aprendizagem e 

treinamento nas categorias de base do futsal

El proceso de enseñanza-aprendizaje y entrenamiento en las categorías de base del futsal

 

*Aluno do Curso de Pós-Graduação em Ciência do Treinamento Desportivo

da UFJF. Professor de Educação Física

**Mestre em Educação Física (UFMG). Doutorando em Ciência do Desporto

da Universidade do Porto (FADEUP). Professor adjunto

do Departamento de Desportos da Faculdade de Educação Física da UFJF

Augusto Luís da Silva Araújo*

Marcelo de Oliveira Matta**

augusto_jfa@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Este estudo teve como objetivo identificar os métodos de ensino-aprendizagem e treinamento em três escolas especializadas em Futsal. Participaram do estudo 36 atletas da categoria pré-mirim (9-10 anos) de três clubes situados na cidade de Juiz de Fora - MG. O instrumento para a coleta de dados foi a observação sistemática e direta dos treinamentos com o emprego de filmadora e em seguida, a análise desses treinos conforme o protocolo de categorização de treinos, desenvolvido por Stefanello (19) e adaptado para o Futsal por Saad (16). Foram observadas e analisadas 5 sessões de treinamento de cada equipe durante 8 semanas. Os resultados obtidos indicam que maior parte do tempo gasto nas sessões de treinamento das escolinhas é com treinamento técnico e atividade de jogo formal. As tarefas de combinação de fundamentos, fundamentos individuais e jogo propriamente dito, apresentaram maior frequência nas sessões analisadas. Além disso, foram observados poucos conteúdos que trabalham o desenvolvimento da capacidade do jogo. Portanto, podemos concluir que o processo de ensino-aprendizagem e treinamento nas três escolinhas analisadas ocorre dentro de uma corrente tradicionalista com utilização dos métodos misto e global.

          Unitermos: Treinamento desportivo. Metodologia. Futsal.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 17 - Nº 170 - Julio de 2012. http://www.efdeportes.com/

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1.     Introdução

    De acordo com Saad (15), a participação das crianças em atividades esportivas nas escolas, no lazer ou até mesmo no rendimento tem aumentado nas últimas décadas. Podemos citar o Futsal como o esporte que desenvolveu-se substancialmente nesse período (13) sendo considerado um dos três esportes mais praticados em nosso país (21) e também o terceiro em número de praticantes em clubes na iniciação desportiva da cidade de Juiz de Fora – MG (12).

    No ensino dos Jogos Esportivos Coletivos, tanto nas escolas quanto nas escolinhas e nos clubes, há uma prevalência de duas correntes. Uma das correntes, a Tradicionalista, é baseada nas teorias psicológicas associacionista e Gestalt, que se utilizam dos métodos analítico, global e misto. O método analítico evidencia que as técnicas de movimentos são aprendidas de forma segmentada, repetitiva e isolada para, gradativamente, constituir um todo. O método global apoia-se na idéia dos componentes do jogo como um conjunto organizado e indissociável com características do jogo na sua “forma completa, como a do adulto”. O método misto caracteriza-se pela utilização do método analítico precedendo o método global. Já a outra corrente, a Inovadora, com base nas teorias psicológicas cognitivas, surge com a aplicação de métodos situacionais destacando-se os modelos do “Teaching Games for Understanding” – aprendizagem dos jogos por meio de sua compreensão (9,20), Iniciação Esportiva Universal (8) e Escola da Bola (1). Esses modelos coincidem-se na forma de utilizar o jogo e a aprendizagem do conhecimento tático em primeiro lugar para posteriormente utilizar o ensino da técnica. Os modelos se diferenciam quanto à abordagem didática onde o primeiro, caracterizado pelo processo intencional, fica direcionado e formalizado pelo professor que expõe situações-problemas nas quais os alunos devem encontrar soluções de forma consciente para alcançar um nível de compreensão tática e, em contra partida, os outros dois modelos baseados pelo processo incidental, idealizam a “aprendizagem implícita ao processo explícito” influenciando diretamente no pensamento criativo (9).

    Para Greco e Silva (5), os métodos de ensino-aprendizagem têm uma estreita ligação com o desenvolvimento humano onde este é um sistema adaptativo do sujeito com o ambiente e as tarefas, por meio de constantes modificações. Com isso, o sucesso nas ações de aprendizagem esportiva não depende apenas da execução correta do gesto motor, mas sim da adaptação às exigências do meio necessitando uma aplicação de “métodos harmônicos” nas ações táticas (o que fazer?) e técnicas (como fazer?) (14).

    Com base em alguns estudos (5,14,17,18), percebe-se que os métodos situacionais com ênfase no desenvolvimento técnico-tático melhoram nas crianças e nos jovens a construção da criatividade, evitando um desgastante ensino técnico como também uma especialização precoce visando assim, conforme Matta e Greco (11), a formação do “jogador inteligente”.

    Levando em consideração a participação de crianças no futsal e as correntes no ensino dos jogos esportivos coletivos, este estudo buscou identificar os métodos de ensino-aprendizagem e treinamento em três escolas especializadas em futsal na categoria pré-mirim (9 e 10 anos) na cidade de Juiz de Fora – MG.

2.     Material e métodos

2.1.     Sujeitos

    Fizeram parte deste estudo três escolinhas de futsal da categoria pré-mirim (9 e 10 anos) pertencentes à cidade de Juiz de Fora – MG, chamadas de escolinhas A, B e C. Cada equipe era composta por 12 atletas, totalizando 36 atletas. Os critérios de inclusão foram: os jogadores fazerem parte dos clubes e da categoria analisada. O critério de exclusão foi os clubes e os responsáveis pelos menores não aceitarem a participação na referida pesquisa.

    A escolha das equipes foi intencional como também da categoria pelo fato de enquadrar-se, segundo Greco e Benda (8), em uma fase “ampla e rica” nos escalões de formação esportiva.

2.2.     Cuidados éticos

    Para o início das coletas, os representantes de cada equipe e os responsáveis pelos jogadores foram previamente esclarecidos sobre os propósitos e procedimentos deste estudo aos quais seriam submetidos. Ao final, receberam o termo de consentimento livre e esclarecido do estudo e o assinaram. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa com seres humanos da Universidade Federal de Juiz de Fora (parecer 299/2011).

2.3.     Instrumento

    O instrumento para a coleta de dados foi a observação sistemática e direta das sessões de treino, com emprego de filmadora e posteriormente a análise desses treinos através do protocolo de categorização de treinos desenvolvido por Stefanello (19) adaptado para o Futsal por Saad (16). A análise ocorreu com base em dois parâmetros: segmentos de treino (em minutos) e condições de tarefas (em frequência).

    Inicialmente, as atividades foram identificadas de acordo com os segmentos de treino, que representam momentos distintos observados durante as sessões, tais como: conversa com o treinador, aquecimento, treino técnico, treino tático, treino técnico-tático, intervalo de descanso, transição, jogo propriamente dito, entre outros.

    Na seqüência, a preocupação foi classificar as condições da tarefa como fundamento individual (exercício muito rápido com prática em tempo veloz, envolvendo muitos contatos e não necessariamente relacionado ao jogo), combinação de fundamentos (dois ou mais fundamentos em condições relacionadas ao jogo), complexo de jogo 1 (situações de jogo com utilização das estruturas funcionais: 1x1; 1x1+1, 2x1, 2x2 e etc.), complexo de jogo 2 (jogos para desenvolver a inteligência tática ou tarefas com situações próprias do jogo com enfoque tático) e jogo (atividade de competição governada por regras pré-estabelecidas, onde resultados são decididos pelas habilidades, estratégias ou oportunidades).

    Cabe ressaltar que a ênfase dada por cada treinador a determinados segmentos de treino e condições de tarefas está diretamente relacionada com o método de ensino-aprendizagem e treinamento empregado por eles (16,19).

2.4.     Coleta de dados

    Foram filmadas e analisadas 5 sessões de treino (aulas) de cada escolinha, sendo categorizadas um total de 15 sessões, contabilizando 856,87 minutos onde cada sessão teve duração média de 57 minutos.

3.     Resultado e discussão

Tabela 1. Distribuição de tempo e percentagem dos diferentes segmentos de treino das escolinhas

    Com base nos resultados da análise das atividades de acordo com os segmentos de treino (Tabela 1), percebe-se que nas escolinhas A e B priorizaram-se, tomando como base o tempo gasto, os treinamentos técnicos seguidos do jogo propriamente dito. Para Costa e Nascimento (4), durante os estágios de formação esportiva os alunos, por diversas vezes, apresentam gestos motores bastante imprecisos e de aparência rígida podendo justificar assim, a utilização de métodos analíticos por alguns treinadores no ensino da técnica com o intuito de transformar os movimentos em uma ação motora eficiente comparada a movimentos perfeitos em uma análise biomecânica. Porém este método, conforme Greco (7), além de apresentar um baixo índice de motivação por parte dos alunos, nenhum desenvolvimento tático e a aproximação do objetivo do jogo ser praticamente nula, deveria ser aplicado a partir dos 12-14 anos, quando objetiva-se a correção da técnica. Na escolinha C, como o segmento jogo ocupou maior parte do tempo percebe-se que o treinador utiliza situações mais próximas do jogo formal, no entanto esse processo, de acordo com Costa (2), mesmo oportunizando o aprendiz desde cedo praticar o jogo, impossibilita ao treinador uma avaliação eficaz e um atendimento às limitações individuais do aluno.

Tabela 2. Distribuição da freqüência e percentagem das diferentes condições de tarefas das escolinhas

    A análise pormenorizada das condições de tarefas (Tabela 2) confirma que os treinadores das escolinhas A e B utilizam com maior ênfase exercícios que trabalham as combinações de fundamentos e tarefas de jogo. Na escolinha A, o treinador proporcionou vários exercícios de chute de voleio com o dorso do pé nos exercícios de fundamentos individuais, sendo que para Machado e Gomes (10), tal atividade poderá acarretar uma sobrecarga no aparelho locomotor das crianças gerando uma grande aplicação de força nas articulações do joelho e tornozelo. O treinador da escolinha B utilizou muitos exercícios de passe seguidos do fundamento chute em forma de fileiras (fila única), em meia quadra e utilizando uma só meta. Para Saad (16), esta utilização de forma irracional do espaço de jogo poderia ser corrigida realizando o mesmo exercício nas duas metas, dobrando o número de execuções de cada jogador em cada meta, diminuindo o tempo de espera na participação das atividades. Já na escolinha C, a tarefa de jogo foi utilizada em grande parte das sessões de treino. Desta forma, segundo Greco (7), serão mantidos os elementos comuns dos jogos esportivos coletivos como: a bola, o campo de jogo com suas demarcações específicas, o colega, o adversário, o mediador e um objetivo comum a todos. No entanto, o mesmo autor destaca que tanto na execução da técnica quanto o comportamento tático por meio deste método, poderão ser realizados de forma inadequada.

    Nas escolinhas analisadas foi identificada pouca utilização de conteúdos para o desenvolvimento da capacidade do jogo, através dos Jogos para o Desenvolvimento da Inteligência Tática e Estruturas Funcionais. Silva e Greco (18) destacam que nas práticas esportivas tanto nas escolas formais quanto nas escolinhas especializadas, as capacidades de percepção, antecipação e tomada de decisão, requisitos imprescindíveis para o desenvolvimento tático, têm sido colocadas em segundo plano (7). É importante criar para quem joga situações de oposição, aumentar gradativamente os participantes, variar as técnicas utilizadas e diversificar as decisões para gerar exigências cognitivas (6). Destacamos que no estudo de Costa et. al. (3), percebe-se que os comportamentos táticos de jogadores em uma escolinha de futebol na categoria sub-15 sofreram influências positivas por meio das alterações das dimensões do campo de jogo, podendo assim, justificar a importância de reduzir os espaços de jogo nas sessões de treinamento nos escalões de formação.

    De acordo com os métodos identificados, a estruturação das sessões de treinamento das escolinhas analisadas necessita ser revista a fim de favorecer a integração com as práticas do jogo por meio de conteúdos diversificados visando ao aumento do nível de tomada de decisão em cada situação oferecida, fazendo com que os alunos escolham as possibilidades técnicas e as variações táticas de forma independente, inteligente e criativa.

    Ressaltamos que as limitações deste estudo foram o pequeno número de escolinhas e sessões analisadas, bem como a ausência de mais artigos que analisam o comportamento tático em iniciantes no futsal, julgando serem requisitos primordiais para uma melhor discussão dos resultados. Destaco que os dados obtidos se restringiram às escolinhas estudadas não podendo ser generalizados a demais equipes como também a outras faixas etárias.

    Sugerimos para futuras pesquisas estudos a fim de analisar os métodos de ensino-aprendizagem e treinamento em escolinhas relacionando-os com a redução do espaço de jogo. Os resultados são de suma importância para que os profissionais de Educação Física estruturem suas aulas com qualidade e objetividade nos escalões de formação esportiva.

4 .     Conclusões

Podemos concluir que as escolinhas A e B apresentam uma metodologia mista, com ênfase em exercícios repetitivos (desenvolvimento técnico) precedendo o jogo formal (automatização de ações táticas), enquanto a escolinha C apresenta uma metodologia global, com ampla utilização do jogo propriamente dito, caracterizando nestas escolinhas, um processo de ensino-aprendizagem e treinamento dentro de uma corrente tradicional.

Referências

  1. BUNKER, D. J. THORPE, R. D. A model for the teaching of games in secondary schools. Bulletin of Physical Education. 18: 5-8; 1982.

  2. COSTA, C. F. Futsal aprenda a ensinar. Florianópolis: Visual Books, 2003.

  3. COSTA, I. T.; GARGANTA, J.; GRECO, P. J.; MESQUITA, I.; MULLER, E. Relação entre a dimensão do campo de jogo e os comportamentos táticos do jogador de futebol. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte. 25: 79-96; 2011.

  4. COSTA, L. C.; NASCIMENTO, J. V. O ensino da técnica e da tática: novas abordagens metodológicas. Revista da Educação Física/UEM. 15: 49-56; 2004.

  5. GRECO, P. J.; SILVA, S. A. A metodologia de ensino dos esportes um marco no programa segundo tempo. In: OLIVEIRA, A. A. B.; PERIM, G. L. Fundamentos pedagógicos para o programa segundo tempo. Porto Alegre, UFRGS, 81-111, 2008.

  6. GRECO, P. J. Iniciação Esportiva Universal e Escola da Bola: uma integração de duas propostas. In: GARCIA, E. S.; LEMOS, K. L. M. Temas Atuais X em Educação Física e Esportes. Belo Horizonte, Healthy, 33-62, 2005.

  7. GRECO, P. J. Métodos de ensino-aprendizagem-treinamento nos jogos esportivos coletivos.. In: GARCIA, E. S.; LEMOS, K. L. M. Temas Atuais VI em Educação Física e Esportes. Belo Horizonte, Healthy, 48-72, 2001.

  8. GRECO, P. J.; BENDA, R. N. Iniciação Esportiva Universal: da aprendizagem motora ao treinamento técnico. Belo Horizonte: UFMG, 1998.

  9. KRÖGER, C.; ROTH, K. Escola da Bola: um ABC para iniciantes nos jogos esportivos. São Paulo: Phorte, 2005.

  10. MACHADO, J. A.; GOMES, A. C. Preparação desportiva no futsal - organização do treinamento na infância e adolescência. Treinamento Desportivo. 4: 55-66, 1999.

  11. MATTA, M. O.; GRECO, P. J. O processo de ensino-aprendizagem e treinamento da técnica aplicada ao futebol. Revista Mineira de Educação Física. 4: 34-50, 1996.

  12. NERY, L. C. P.; CAPINUSSÚ, J. M. A realidade da estrutura física e recursos humanos no esporte de uma cidade brasileira. In: XII Congresso Ciências do Desporto e Educação Física dos Países de Língua Portuguesa - Paz, Direitos Humanos e Inclusão Social. Porto Alegre, 2008.

  13. PINTO, F. S.; SANTANA, W. C. Iniciação ao Futsal: as crianças jogam para aprender ou aprendem para jogar? Lecturas Educación Física y Deportes, Revista Digital. Buenos Aires, 85: 1-6, 2005. http://www.efdeportes.com/efd85/futsal.htm

  14. ROSSETO JUNIOR, A. J. Os jogos como instrumento de aprendizagem e formação esportiva de crianças e adolescentes. In: SILVA, L. R. R. Treinamento Esportivo: diferença entre adultos e crianças adolescentes. São Paulo, Phorte, 331-372, 2010.

  15. SAAD, M. A. Iniciação nos jogos esportivos coletivos. Lecturas Educación Física y Deportes, Revista Digital. Buenos Aires, 95: 1-5, 2006. http://www.efdeportes.com/efd95/inici.htm

  16. SAAD, M. A. Estruturação das sessões de treinamento técnico-tático nos escalões de formação de Futsal. 101 f. Dissertação (Mestrado em Educação Física), Centro de Educação Física e Desporto, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2002.

  17. SANTANA, W. C. Futsal: apontamentos pedagógicos na iniciação e na especialização. Campinas: Autores Associados, 2008.

  18. SILVA, M. V.; GRECO, P. J. A influência dos métodos de ensino-aprendizagem-treinamento no desenvolvimento da inteligência e criatividade tática em atletas de futsal. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte. 23: 297-307, 2009.

  19. STEFANELLO, J. M. F. A participação da criança no deporto competitivo: uma tentativa de operacionalização e verificação empírica da proposta teórica de Urie Bronfenbrenner. 202 f. Tese (Doutorado em Educação Física), Faculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física, Universidade de Coimbra, Coimbra, 1999.

  20. THORPE, R.; BUNKER, D.; ALMOND, L. Rethinking games teaching. Loughborough. UK. University of Technology. Department of Physical Education and Sport Science, 1986.

  21. VOSER, R. C. Futsal: princípios técnicos e táticos. Canoas: Ulbra, 2003.

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