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Estudos Culturais e Currículo Multicultural:
validando as vozes dos alunos

Los Estudios Culturales y el Currículo Multicultural: legitimando las voces de los alumnos

 

EMEF Prof. Roberto Plínio Colacioppo

Membro Efetivo do GPEFE - Grupo de Pesquisa em Educação Física Escolar

Mestranda em Educação UNINOVE

Natalia Gonçalves

nataliag_73@yahoo.com.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Os estudos baseados nas teorias pós-críticas sobre currículo afirmam que o currículo nunca é neutro e sempre se presta a formar determinados tipos de pessoas. O presente artigo visa contribuir de forma significativa, através dos Estudos Culturais com a reflexão a respeito do currículo na escola, seus silêncios, sua função social e os diversos fatores que o tornam o elemento determinante na formação da identidade dos sujeitos.

          Unitermos: Educação. Currículo multicultural. Estudos Culturais.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 17 - Nº 170 - Julio de 2012. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Diante do atual debate sobre currículo e educação, a proposta de um currículo onde as vozes dos sujeitos subjugaldos sejam ouvidas e suas práticas culturais validadas, passa a ser central a idéia de que somente um Currículo Multicultural tenha a capacidade de abraçar e valorizar a identidade desses sujeitos.

    Todas as ações que visam à homogeneização dos conhecimentos presentes na escola, como a unificação dos conteúdos a serem ensinados, os métodos de avaliação controladores e a escolha de conhecimentos provenientes da cultura hegemônica só colaboram para que as diferenças éticas e sociais sejam cada vez mais marcadas.

    A presença de grupos historicamente subjulgados e inferiorizados como os negros, as mulheres, indivíduos praticantes de algumas religiões, homossexuais, os pobres, e muitas outras identidades que hoje povoam nossas escolas regulam o currículo e oferecem resistência a ele como uma forma de contestação, o que faz com que as relações de poder sejam desestabilizadas e consequentemente gerando debates e discussões a ponto de legitimar os saberes e as histórias de vida desses e de outros indivíduos que habitam o ambiente escolar.

    O currículo é sempre o resultado de uma seleção, de um universo mais amplo de conhecimentos e saberes. Seleciona-se aquela parte que vai constituir, precisamente, o currículo e a partir dessa escolha se define o tipo de sujeito que queremos formar. Durante muito tempo a preocupação das instituições escolares era o de eleger os conteúdos e saberes a serem ensinados e desenvolver metodologias que se prestassem cumprir bem este papel. As teorias curriculares legitimavam somente os conhecimentos produzidos por uma elite dominante que ditava (ou dita) as regras da sociedade. A “naturalização” da idéia de que existem conhecimentos certos ou errados foi determinante para a inquietação de grupos que defendiam e defendem uma pedagogia crítica para que todos os envolvidos no processo sejam beneficiados.

    Entendendo a o conhecimento como uma construção social, o currículo multicultural se presta a defender e entender os movimentos populares de forma a legitimá-los enquanto campo de estudos para incorporá-los no currículo escolar. Uma analise sociológica, política, filosófica e sócio-histórica dos conteúdos de ensino por parte dos professores devem garantir uma aprendizagem mais significativa desses conteúdos por nossos alunos.

    Os Estudos Culturais se prestam a nos auxiliar a identificar os diversos marcadores sociais que permeiam as praticas na escola e que faz com que ela se configure em um campo de lutas por significação.

    O objetivo deste trabalho é o de ampliar o debate sobre o Currículo Multicultural entendendo-o como um importante objeto de luta por significação dos saberes produzidos historicamente pela sociedade como um todo, validando seus conhecimentos a fim de ressignificar a idéia de que somente aquilo que é produzido por uma elite dominante tem valor dentro da sociedade e da escola.

    O método utilizado para a realização desta pesquisa foi o levantamento bibliográfico com consulta a diversas obras de autores que operam dentro de uma lógica crítica e pós-crítica para dialogar com a perspectiva apresentada no trabalho.

O que é “currículo”?

    A educação e o currículo são territórios de luta e significação por poder, construídos a partir da diversidade e pluralidade de seus atores. O currículo constitui-se de tudo aquilo que compõe a escola e seu entorno: cheiros, vozes, identidades, choros, lutas, conhecimento acadêmico, crenças e outros. Não há como afirmar que o currículo está posto e acabado, assim como não há como afirmar que tudo o que compõe o currículo é apenas aquilo que está presente e visível aos olhos, aquilo que está ausente também interfere na construção da rede de significados.

    De acordo com Silva (2000), currículo é tudo aquilo que forma identidades dos sujeitos envolvidos, e, ao contrario do que os defensores da escola tradicional pregam, currículo não é apenas o conteúdo formal a ser ensinado pelo professor em sala de aula. As fronteiras entre os saberes institucionalizados e os saberes ditos populares, vão sendo borradas a medida que essa rede de conhecimentos, idéias e sensações são tecidas dentro do universo escolar. Não há como fugir ou reprimir essas ações.

    As teorias curriculares baseadas nas teorias pós-criticas vem nos mostrando que as vozes dos sujeitos subjulgados devem ser validadas para que se forme uma sociedade mais justa e igualitária.

    O currículo entendido sob esta perspectiva, se torna um projeto de espaços e tempos subjetivos, onde os atores principais são todos aqueles que compõe esse cenário, ou seja: pais, moradores, comerciantes, alunos, professores, membro da equipe pedagógica, membros da equipe de manutenção da escola como merendeiras, faxineiros (as), ou seja, todos aqueles que interferem direta ou indiretamente no cotidiano daquele local, colaborando para a formação dos sujeitos envolvidos no processo.

O que propõe o Currículo Multicultural

    Antes de nos rendermos ao “modismo” da questão do Currículo Multicultural, devemos ter claro que os objetivos daqueles que o propõe é a construção de um currículo que desconstrua idéias previamente estabelecidas que colaboram com as injustiças sociais, assim seu objetivo é o de desestabilizar as relações de poder através da valorização da cultura dos alunos. Criticar e reconhecer os discursos que subjulgam suas práticas é fundamental para que os alunos entendam como se formam esses processos.

    Algumas escolas possuem a tendência de homogeneizar e normalizar as relações através de seus padrões de funcionamento. A preocupação com a forma de acolher as minorias e a diversidade está presente no texto de SACRISTAN (1995) que defende um currículo multicultural onde a escolha do que se é ensinado dentro das instituições de ensino passem pela aprovação de toda a comunidade envolvida no processo. Esses conhecimentos devem privilegiar os conhecimentos de todos, inclusive das minorias para que seus interesses sejam representados. A escola, entendida aqui como “projeto aberto” deverá privilegiar o dialogo e a comunicação entre vários grupos sociais, promovendo a valorização de seus conhecimentos no interior do currículo.

    Para entender como se formam as relações de poder que habitam o currículo escolar, nos remetemos a ESCOSTEGUY (2006, p. 146) que argumenta que os produtos culturais são agentes da reprodução social, acentuando sua natureza complexa, dinâmica e ativa na construção da hegemonia”. portanto, não existe um confronto entre as diferentes culturas e sim um intercambio entre elas. Esse intrincado de informações e conhecimentos caracteriza o pensamento pós-moderno que acredita em uma rede de significados em contraposição a um pensamento mais estruturalista que defende a idéia linear, onde o conhecimento adquirido complementa e substitui outro já existente ou mesmo o invalida.

    De acordo com SILVA (2004, p.22), “o currículo é um lugar, um espaço, um território fértil para as lutas ideológicas”, e partindo desta afirmação, inferimos que se há estagnação do currículo, conseqüentemente não existe essa luta, ou seja, perpetuamos as práticas hegemônicas e abrimos mão de validar as vozes dos subjulgados. O autor continua sua reflexão afirmando que o currículo é um “documento de identidade”, sendo assim, se compactuarmos com a concepção de um Currículo Multicultural, onde os diversos sujeitos do processo são respeitados e valorizados, compactuaremos com uma concepção onde tudo o que compõe esse currículo deveria estar repleto dos saberes daqueles atores que compõe a escola.

As contribuições dos Estudos Culturais para a construção do Currículo Multicultural

    De acordo com os Estudos Culturais, que se configura como um campo teórico que visa validar e dar voz aos subjulgados historicamente através do reconhecimento de sua cultura, o currículo é um artefato que expressa significados e é construído social e culturalmente a partir de relações de poder. SILVA (2004) evidencia que o currículo está relacionado diretamente com o conhecimento que se “pretende” ensinar a um grupo, e sendo assim, é parte integrante de uma estrutura simbólica que contribui para a construção de significados, atendendo aos interesses de determinado grupo.

    Há quem afirme que o currículo é “neutro”, porém, como nos alerta SOUZA (2008), essa afirmativa deixou de ser validada a partir de estudos e discussões densas e críticas a respeito deste tema. Estudos comprovam que toda ação pedagógica tem uma intenção, e sendo assim, a escolha dos conteúdos que dele farão parte não deixa de ser uma escolha política e está marcada pela luta de interesses, o que contribui para a formação das representações que os alunos tem a respeito da escola e da sociedade.

    Para tanto, entender como se constroem essas diferenças através dos mecanismos históricos, sociais e políticos se torna essencial para o entendimento e para a transformação da sociedade em um local mais justo para se viver, contrariando o que os currículos homogeneizantes e monoculturais pregaram e ainda pregam, calando identidades étnicas, de raça, de classe e de gênero.

    Através dos Estudos Culturais, compreendemos que o processo de colonização e as relações de poder são as causas do monoculturalismo do currículo, assim um currículo aberto a novas culturas e novos saberes deve criar condições para que a escola discuta a história, a epistemologia e as relações de poder que envolvem diferentes tipos de conhecimento (PERRELI, 2008).

    Ao eleger o saber a ser ensinado na escola, abrimos mão de outros saberes Um currículo multicultural deve ter claro o motivo pelo qual um conhecimento é privilegiado em detrimento de outro. Essa escolha nunca é neutra e desprovida de significados, pois devemos nos atentar aos “silêncios”, as lacunas e as razões desses silenciamentos. Essas ausências significam que aquilo que não foi eleito não é legitimado por aquela instituição, assim, formam-se as identidades: sujeitos legitimam aquilo que conhecem e negam o que não habita seu universo.

    Segundo SACRISTÁN (2000, p.16), “as funções que o currículo cumpre como expressão do projeto de cultura e socialização são realizadas através de seus conteúdos, de seu formato e das práticas que cria em torno de si”. Se pensarmos o currículo desta forma, entenderemos que não podemos ficar restritos ao produto final e sem interligar todos os objetivos que fazem parte de sua construção. Podemos fazer uma relação com a afirmação de que o saber é cultural, e se constitui pela interação com outras pessoas pertencentes a nossa cultura, assim, ele se transforma a partir da troca de experiências e da reflexão coletiva.

Considerações finais

    Não podemos negar que esse processo é relativamente árido e depende de vários fatores. A ruptura da hegemonia que afirma que alguns conhecimentos produzidos pela humanidade são mais valiosos que outros não ocorrem do dia para a noite. A inserção de manifestações culturais próprias das camadas mais populares no currículo depende de vários fatores e podem levar a uma validação dos conhecimentos das pessoas subjulgadas historicamente. Como afirmam MOREIRA e CANDAU (2003), diante dessa nova configuração de “escola”, podemos constatar vários tipos de desconforto e conflitos gerados tanto pelos educadores quanto pelos alunos.

    No mesmo texto a autora cita o “arco-íris cultural” como contradição ao “daltonismo cultural”, ressaltando que hoje se faz necessário “uma perspectiva que leve em conta a riqueza decorrente da existência de diferentes culturas no espaço escolar.” (p.161)

    Defendendo uma pedagogia critica como forma de luta cultural, GIROUX & McLAREN (1995), apontam seus argumentos para uma direção na qual essa forma cultural onde os principais atores não são apenas aqueles que trabalham nas escolas, mas sim, todos aqueles trabalhadores que atuam na esfera cultural. Sendo assim, os autores defendem que é responsabilidade de todos esses trabalhadores, contribuir para a multiplicação dos locais de luta democrática onde o principal objetivo seja a melhora da vida no planeta, através de práticas pedagógicas que visem uma política democrática e transformativa.

    Assim, se torna importante a construção de um espaço pedagógico híbrido onde os estudantes tenham oportunidade de validar seus conhecimentos e suas produções, suas identidades individuais para que encontrem significado na expressão coletiva e na solidariedade com outros trabalhadores culturais.

    O currículo multicultural defende que todas as vozes e todas as culturas sejam contempladas no currículo. De acordo com esta perspectiva, questiona-se a validação de certos saberes em detrimento de outros e ainda defende-se que deve haver espaço para a criticidade e o questionamento a respeito de como esses saberes foram escolhidos para compor o currículo, de onde surgiram e quais interesses se encontram por trás dessas ações. Ao analisar como essas verdades são estabelecidas, quais são as relações de poder que estão em jogo, o educando tende a se tornar auto-crítico e a atuar como cidadão solidário.

    As relações de poder são permeadas por lutas onde o foco central é a afirmação e validação dos discursos produzidos dentro das escolas através do currículo. Assim, a escola deveria ser o local onde a abertura do currículo a outras expressões culturais, além dos conhecimentos hegemônicos fosse um canal de expressão de vozes e culturas silenciadas historicamente. A partir desta concepção, deixamos de ensinar nossas crianças a apenas respeitar as pessoas de culturas diferentes para uma relação onde ambas as culturas se influenciam e se modificam. (PERRELI, 2008).

Referências bibliográficas

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  • MENDES, C. L. Currículo cultural e as ressignificações do público e do privado. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 23. Programa e resumos. Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação, 2000. p. 149-150.

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  • RUBIO, K. NUNES, M. L. F. Os currículos da Educação Física e a constituição da identidade de seus sujeitos. Currículo sem Fronteiras, v.8, n.2, pp.55-77, Jul/Dez 2008 .

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  • _______________. O currículo: uma reflexão sobre a prática. 3ªed. Porto Alegre: ArtMed, 2000.

  • ________________. O significado e a função da educação na sociedade e na cultura globalizadas. In GARCIA, Regina, L. MOREIRA, Antonio, F, B. (orgs.). Currículo na contemporaneidade: incertezas e desafios. São Paulo: Cortez, 2003.

  • SILVA, T. T. Os novos mapas culturais e o lugar do currículo numa paisagem pós-moderna. In: SILVA, T. T e MOREIRA, A. F. B. (Orgs.) Territórios contestados: o currículo e os novos mapas políticos e culturais. Petrópolis: Vozes, 1995.

  • __________________. Teorias do currículo: uma introdução critica. Porto: Porto Editora, 2000.

  • _____________________. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.

  • _____________________. Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Thomaz Tadeu da Silva (org.). Stuart Hall, Kathryn Woodward. 8 ed.- Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.

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