efdeportes.com

A influência da cultura familiar na prática do aleitamento materno

La influencia de la cultura familiar en la práctica de la lactancia materna

The influence of culture in family practice of breastfeeding

 

*Enfermeira, Especialista em Enfermagem do Trabalho

pela Faculdade São Francisco da Paraíba. Universidade Regional do Cariri

**Enfermeira, Especialista em Saúde Coletiva. Docente da Universidade Regional do Cariri

***Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Cajazeiras – FAFIC

****Mestre. Docente da Faculdade Vale do Salgado. Liga de Saúde Coletiva

*****Enfermeira, Doutoranda do Programa de Pós- Graduação em Ciências Médicas

da Universidade Federal do Ceará. Docente da Faculdade Vale do Salgado. Liga de Saúde Coletiva

******Enfermeiro, Doutorando do Programa de Pós- Graduação em Enfermagem

da Universidade Federal da Paraíba
(Brasil)

Myrella Klesy Silva Martins*

Ilara Parente Pinheiro Teodoro**

Ana Márcia Alves Sampaio***

Ananda Kilwya Silva Martins***

Gilberto Santos Cerqueira****

Ana Paula Fragoso de Freitas*****

Luiz William Barreto Wanderley******

giufarmacia@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          Buscamos nesse estudo analisar a influência da cultura familiar na prática do aleitamento materno em mães com crianças até seis meses de idade. O estudo foi realizado por meio de visitas domiciliares em uma unidade básica de saúde da família no município de Icó, contando com a participação de 16 mães, após o seu consentimento esclarecido, por meio de uma entrevista semi-estruturada, seguindo uma relação de perguntas abertas. Os dados foram analisados mediante a técnica de análise de conteúdo e em seguida organizados em categorias com base nos objetivos do estudo, que foram trabalhados em uma abordagem qualitativa do tipo descritivo, exploratório. A prática do aleitamento materno apresentou-se sensivelmente fragilizada em decorrência de aspectos resultantes da influência da cultura familiar. Os modelos de amamentar arraigados pela cultura familiar produziram na grande maioria das mães deste estudo, resultados negativos na prática do aleitamento materno, precipitando a introdução de outros alimentos na dieta dos bebês.

          Unitermos: Aleitamento materno. Influência. Cultura familiar.

 

Abstract

          We seek in this study to analyze the influence of family culture in the practice of breastfeeding in mothers with children under six months old. The study was conducted through home visits in a primary family health in the municipality of Ico, with the participation of 16 mothers after informed consent, through a semi-structured interview, following a list of questions open. Data were analyzed using the technique of content analysis and then organized into categories based on study objectives, which were worked in a qualitative descriptive and exploratory. The practice of breastfeeding presented significantly weakened due to issues resulting from the influence of family culture. Models of nursing culture rooted in family produced vast majority of mothers in this study, negative results in the practice of breastfeeding, precipitating the introduction of other foods in the diet of infants.

          Keywords: Breastfeeding. Influence. Family culture.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 17 - Nº 169 - Junio de 2012. http://www.efdeportes.com/

1 / 1

Introdução

    Nos últimos anos, questões referentes à promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno tem sido enfatizado em diversos documentos, por diferentes autores, devido aos benefícios que a amamentação trás, não apenas para o bebê, mas também para a mãe, a família e o Estado. Assim, face à crescente conscientização da sua importância, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Ministério da Saúde (MS) recomendam e valorizam a amamentação exclusiva nos primeiros seis meses de vida da criança, indicando sua complementação somente após esse período e permanecendo associado a outros alimentos até os dois anos de idade ou mais.

    Quando amamentado, todo recém-nascido recebe grande quantidade de substâncias imunológicas que os protegem contra microrganismos invasores. Além do fator proteção, o aleitamento materno apresenta outras vantagens, como os de ordem nutricional, psicológico, social, econômico e ambiental. Nesse sentido, a criança quando amamentada é beneficiada por seus efeitos variados, únicos e completos que só o leite materno possui (NOVAES et al., 2009).

    O aleitamento materno pode proporcionar uma melhoria na qualidade de vida das famílias, pois crianças amamentadas adoecem menos, necessita de menos atendimento médico, hospitalizações e medicamentos, significando assim, menos gastos e situações estressantes. Com uma visão mais ampla, nenhuma outra estratégia isolada é capaz de alcançar o impacto que a amamentação comporta na redução das mortes de crianças menores de cinco anos (BRASIL, 2009).

    Como podemos perceber, o aleitamento materno é um fato relativamente importante para a saúde infantil, mas, ainda que a evidência científica acumulada o avalie como o ideal para a alimentação de recém-nascidos e lactentes, provando sua importância e superioridade sobre outras formas de alimentar a criança, além das políticas de ação incentivando à prática, não é difícil presenciar no dia-a-dia relato de mães que deixaram de amamentar seus filhos antes do tempo preconizado pelo MS, passando a oferecer outros líquidos como água e chás, assim como, alimentos semi-sólidos antes dos seis meses de vida do bebê.

    Frente esta realidade, é possível compreender em parte as constatações elucidadas, a partir da reflexão do paradigma que envolve o processo de amamentar. Alguns autores comentam que a prática da amamentação está determinada pelos hábitos sociais e manifestações da cultura. As concepções e valores assimilados pelo processo de socialização influem na prática da amamentação, havendo, no entanto, um comportamento mutável através da história (BOSI; MACHADO, 2005).

    A herança cultural é responsável pelas modificações dos padrões de comportamento, havendo influências de acordo com o contexto vivenciado, em que a atitude das mulheres em amamentar ou não é culturalmente herdada, sofrendo influência do passado ou do presente, advindo do meio familiar ou social em que estão inseridas (ICHISATO; SHIMO, 2006)

    Para Saneto (2011), O termo cultura tem sido utilizado sem qualquer economia por pesquisadores, uma vez que, aparece em diversos artigos, estejam eles publicados em livros, revistas entre outros e sendo definido como um conjunto de mecanismos simbólicos que implicam na intencionalidade existente no ato comportamental

    Na busca de explicações para essa tendência surgiu à reflexão: Como a cultura familiar tem influenciado a prática do aleitamento materno? Poderíamos encontrar alguma contribuição dessa influência para a prática? Questiona-se, portanto, qual o nível de conhecimento da mãe sobre a importância do aleitamento materno? Como estariam às mães vivenciando essa prática? Como se processa o aleitamento materno em seu cotidiano? Haveria crenças, mitos e tabus permeando na realidade dessas mães? E os familiares, como têm influenciado, na prática do aleitamento materno?

    Nesse aspecto nos propomos a analisar a influência da cultura familiar na prática do aleitamento materno em mães com crianças até seis meses de idade, e com intenção de responder aos questionamentos, tais objetivos foram elaborados: Identificar o nível de conhecimento da mãe sobre a importância do aleitamento materno; conhecer como se processa o aleitamento materno no cotidiano das mães; investigar a influência dos familiares na prática do aleitamento materno. Pois embora caiba às mulheres efetivamente a decisão de amamentar seus filhos, torna-se necessário a compreensão dos diversos determinantes envolvidos nessa vivência, seus desafios e possibilidades. Compreender a influência do universo cultural na tomada de decisão do ser humano é de extrema sabedoria, para o profissional de saúde que pretende alcançar sucesso na amamentação.

    O desvelamento dos questionamentos aqui enfatizados, muito contribuirá, pois a partir deles poderemos construir observações e assumir outras estratégias para o incentivo à prática da amamentação, garantindo como consequência, a redução da mortalidade infantil e do desmame precoce.

Trajeto metodológico

    Trata-se de um estudo de caráter descritivo, exploratório com abordagem qualitativa, realizado na Estratégia Saúde da Família (ESF) São Geraldo, localizada no Município de Icó – CE.

    Segundo Minayo e Sanches (1993), a investigação qualitativa trabalha com valores, crenças, representações, hábitos, atitudes, opiniões, procurando aprofundar-se na complexidade dos fenômenos. De modo geral, se preocupa em esclarecer como o homem compreende, interpreta e se relaciona com o mundo vegetal. O objeto da abordagem qualitativa é o nível das percepções e dos sentimentos, em constante interação com os elementos ecológicos, dos significados, motivos, aspirações, atitudes, crenças e valores, que se expressam pela linguagem comum e na vida cotidiana.

    A população constituiu-se por mães com crianças até seis meses de idade, cadastradas na ESF e a amostragem ficou representada por 16 mães. Todas as mulheres consultadas que aceitaram participar deste estudo, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e lhes foram asseguradas a garantia do sigilo de identificação, a privacidade quanto aos dados envolvidos, assim como o direito de desligar-se da pesquisa a qualquer momento, sem lhes trazer qualquer prejuízo e/ou despesa a sua pessoa e ou a de seu bebê.

    Os dados foram coletados no mês de outubro de 2010, utilizando-se como instrumento, um roteiro de entrevista semi-estruturada seguindo uma relação de perguntas contendo questões abertas.

    Na entrevista semi-estruturada, o investigador necessariamente deve ter uma lista de questões ou tópicos para serem preenchidos ou respondidos, no estilo de um guia. Esse tipo de entrevista tem relativa flexibilidade dispensando que as questões sigam uma ordem prevista no guia e ainda dando a possibilidade de formular novas questões no decorrer da entrevista (MATTOS, 2005).

    A entrevista foi realizada individualmente por meio de visitas domiciliares por intermédio e auxílio do Enfermeiro e dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS) da ESF São Geraldo. Para tanto, as falas das participantes foram transcritas para o papel simultaneamente ao discurso das mesmas, isto é, arquivada manualmente, sendo conservado seu caráter espontâneo.

    Para manter o anonimato das entrevistadas e respeitando os aspectos éticos da pesquisa, estas foram nomeadas com nomes de pedras preciosas. A razão que nos levou a caracterizá-las dessa maneira foi justamente de serem elas a peça principal do conteúdo, pois sua participação foi indispensável para que este se concretizasse. Assim, por serem as pedras preciosas algo de valor, aqui se farão presente valorizando os discursos dos sujeitos, peças fundamentais deste tesouro.

    O estudo adequou à análise de conteúdo, que é um dos métodos mais comumente adotado para representar o tratamento de dados de pesquisa qualitativa (MINAYO, 2004) Nessa proporção, os dados obtidos foram submetidos a uma estruturação criteriosa por meio da técnica de análise de conteúdo, e em seguida organizada em categorias com base nos objetivos do estudo, estabelecendo relações entre os resultados obtidos, com a literatura.

    Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade Católica Rainha do Sertão, tendo sido aprovado pelo protocolo nº 20100121. Essa pesquisa não possui nenhum conflito de interesses e segue os preceitos da Resolução 501/10 do Conselho Nacional de Saúde, norma que regulamenta a pesquisa envolvendo seres humanos e Declaração de Helsinque (BRASIL, 1996).

Resultados e discussão

Caracterização dos sujeitos da pesquisa

    Dentro do instrumento que subsidiou a entrevista, utilizamos para caracterizar as 16 mulheres, dados referentes à idade, escolaridade, estado civil, ocupação/trabalho, renda familiar e número de filhos.

    A idade das mães variou de 16 – 37 anos, no entanto a maioria, isto é, 9 delas tinha entre 22 – 30 anos, seguida de 4 entre 16 – 21 anos e em menor frequência, 3 mulheres entre 31 – 37 anos.

    Para os dados revelados a respeito do grau de escolaridade, estabelecemos um agrupamento conforme o número de anos de estudo. Os resultados apontaram que a maioria das mulheres, ou seja, 9 apresentam escolaridade entre 1 a 9 anos, o que corresponde ao ensino fundamental completo ou incompleto, 5 estudaram de 10 a 12 anos, significando o ensino médio completo ou incompleto. Uma pequena minoria da amostra, apenas 1, tinha mais de 12 anos de estudo, ou seja, ensino superior completo ou incompleto, igualmente a representatividade de não alfabetizadas.

Categoria 1. Conhecimento das mães sobre a importância do aleitamento materno

    A importância do aleitamento materno e em especial o exclusivo até o sexto mês, tem sido mais do que comprovada. Nesse aspecto a presente categoria está direcionada a identificar o nível de conhecimento das mães sobre a importância do aleitamento materno, por entendermos que este seja um quesito indispensável para que as mulheres possam desempenhar a prática com responsabilidade.

    A pluralidade de vantagens/benefícios que o aleitamento materno apresenta é inquestionável, e no presente estudo essa diversidade recebeu papel de destaque pela sua importância por alguns motivos. A maioria das mães, (14) apresentam conhecimento básico da importância do aleitamento materno, enquanto 2 demonstraram não conhecer.

    A partir das falas, observamos que 8 mulheres relataram informações direcionada ao favorecimento da criança, como promoção da saúde, com destaque para a proteção das doenças, favorecimento do nascimento dos dentes e ou ainda para o seu adequado crescimento e desenvolvimento. Uma menor proporção, 5 relatou ser importante para a saúde de ambos, mãe e bebê.

    É importante! O alimento ideal para uma criança crescer saudável é o leite materno, evita tanta doença! (Esmeralda).

    Tanto é bom pra mulher como pro bebê né? Por que ele vai adquirindo peso, fica uma criança sadia, saudável. Pra mulher também é saudável né, evita muitas doenças (Jade).

    É bom para a criança, para o nascimento dos dentes, para ficar sadia, engordar! (Ágata).

    O aleitamento materno possui papel de destaque pelo consequente resultado ofertado na qualidade de vida das pessoas que dele se beneficia, tanto os lactentes assim como as lactantes. Nesse aspecto, devemos sempre incentivar e motivar a prática.

    Uma das qualidades mais relevantes do leite materno é a prevenção das doenças. Grande maioria das crianças amamentadas exclusivamente nos primeiros meses de vida cresce saudável, contribuindo significativamente para a redução da taxa de morbimortalidade infantil(10).

    Amamentar também é importante sobre outros âmbitos. Algumas unidades de relatos permitem destacar a importância do aleitamento materno pela vantagem quanto à sua praticidade, aumento do período de amenorréia, contribuição para perda de peso e involução uterina. Essas questões constaram em apenas 3 falas.

    Por não ter tanto trabalho, evita de ta menstruando, assim diminui minhas cólicas! (Pirita).

    Mulher!... assim, por que dizem que depois que a mulher ganha nenê ajuda até a voltar o útero ao normal... agente emagrece né? E muito mais! (Obsidiana).

    Ajuda em muitas coisas, a menstruação para (Ametista).

    Contudo, amamentar também é sinônimo de intenso afeto, uma relação mútua entre mãe e filho. Algumas mulheres vivenciam essa prática como sendo um momento de prazer, transmitindo a seus filhos o amor e carinho materno. Alguns relatos (4), focalizam que amamentar é importante também, por ser esta uma prática que oferece afeto e proteção à criança.

    É um ato de amor e carinho! (Turmalina).

    É muito importante por que a criança se sente mais segura, protegida e sabe que ta sendo amada (Rubi).

    Não apenas o conteúdo do leite materno é importante. A mulher que amamenta está vivenciando um momento muito especial, que normalmente faz aflorar sensações prazerosas, proporcionando uma construção de laços emocionais, e que irão influenciar na afetividade do binômio mãe-filho.

    Dado a representatividade que a vida de um filho significa sobre a mulher, a cada encontro positivo, o vínculo entre ambos tendem a aumentar, tornando um relacionamento cada vez mais estreitado e dando ao bebê o sentimento de ser aceito, um sentimento de segurança. A cumplicidade deste momento demonstra que amamentar é também um ato de amor.

    A amamentação fortalece a união entre mãe e filho. Este é um momento de troca de olhares, contato e intimidade. O contato intenso e contínuo entre ambos faz com que o bebê var conhecendo a sua mãe e se comunicando com ela através do toque em sua pele, em sua roupa. Mais que o ato de amamentar o filho, esses momentos constitui-se como espaço para compartilhar afeto (GONÇALVES; BONILHA, 2005).

Categoria 2. O aleitamento materno no cotidiano das mães

    Das 16 mães estudadas, 15 amamentavam seus filhos, contudo, apenas 3 delas ofertavam o leite materno de forma exclusiva. Em relação à mãe que não amamentava e àquelas que não praticavam a amamentação exclusiva, vários foram os alimentos ofertados por esse grupo. Mais da metade (9), ofertaram além da água e ou água e chá, outros alimentos como os leites industrializados, mingau, frutas e sucos. Uma parcela menor (4), tomou a iniciativa de oferecer apenas a água e ou água e chá.

    Apesar da recomendação de que o leite materno deve ser o único alimento a ser oferecido às crianças nos primeiros seis meses de vida, a interrupção precoce ainda prevalece, ocorrendo de forma significativa, tornando baixo o percentual de crianças que se beneficia da prática exclusiva.

    Na intenção de depreendermos sobre as relações conflituosas envolvidas na situação de aleitar, dessas mulheres, enriquecemos a discussão procurando na data da entrevista analisar as particularidades das 16 mães, estimulando-as a comentarem sobre as razões pelas quais despertaram para o aleitamento exclusivo, assim como os motivos que as distanciaram da prática exclusiva ou de forma geral. Ao analisarmos a razão de tal comportamento, levamos em conta as principais dimensões culturais envolvidas, sempre atentando para as crenças que poderiam emergi no decorrer do discurso.

    Através dos postulados constatamos que problemas com a amamentação, retorno às atividades profissionais e falta de tempo, surgiram como razões para não está amamentando e para a complementação com outros alimentos antes dos seis meses. Porém, a análise isolada de outras falas permitiu também, constatar que a possibilidade de dar continuidade com a amamentação exclusiva esteve esbarrada pela grande maioria (12), à incorporação de algumas crendices relacionadas ao aleitamento materno como evidenciado nos relatos verbais que seguem:

    Percebi que só meu leite não ia dá pra sustentar ela não... no início, dava, mais depois, em que ela foi crescendo... já não tava mais sustentando ela não... ela mamava e mesmo assim ela chorava (Safira).

    Eu acho importante da água por conta do calor (Rubi).

    Meu leite é pouco, ele mamava, mamava e ainda chorava!... eu nunca do só de mamar aos meus meninos até seis meses... eu vejo que não sustenta mesmo! (Morganite).

    Como se observa, as crenças e os mitos relacionados à lactação fazem parte do cotidiano de muitas mulheres. Mesmo com as determinações de órgãos de saúde e a amplificação da divulgação e conhecimento nos últimos anos a respeito do período que a criança deve permanecer em amamentação exclusiva, o que se percebeu, é que dúvidas e incertezas a respeito da produção e qualidade do leite materno ainda rodeiam muitas mulheres. Em consequência, a mulher acaba desqualificando o leite materno ao procurarem alternativas para essas questões, vistas por elas como problemas. Na tentativa para tais soluções, realizam práticas errôneas, ao introduzir outros alimentos na dieta do bebê.

    A interpretação do tipo leite fraco ou pouco leite, são crenças advindas da dificuldade de reconhecerem a normalidade das manifestações da criança. O choro, que comumente é interpretado como sinal de fome é uma dessas questões. Ao interpretar as manifestações do bebê de forma equivocada, poderá acarretar no comprometimento da sua saúde, caso seja introduzido outros alimentos à sua dieta (GONÇALVES; BONILHA, 2005).

    Outra prática desnecessária, constatada nesse grupo, foi à oferta de chá, como sendo uma alternativa viável para o momento, por consequência de o bebê apresentar-se segundo elas, com um comportamento notadamente diferente.

    Eu só dei ontem, foi a primeira vez que eu dei por que mãe disse que ele tava com espremedeira, tava com dor, só chorando, mãe disse que era bom, ela fez e foi até ela que deu! (Quartzo Rosa).

    Algumas vezes essas práticas são costumes construídos dentro do ambiente familiar e tendem a ser conservadas e praticadas pelos seus membros, estando vinculado às gerações mais antigas, vindo em certos casos a tornar-se rotineiramente usado e ou indicado dentro da família.

    Credita-se a tais infusões propriedades calmante e laxativa. Essa atitude representa uma prática arraigada em nossa cultura, mesmo em populações orientadas a não utilizar. Tal fato evidencia a potencialidade da cultura construída nas pessoas (MASCARENHAS, 2006).

Subcategoria 1. Orientações quanto ao aleitamento materno, no pré-natal e após o nascimento do bebê

    Por entendemos que a intervenção educativa é um quesito com forte potencial, a presente subcategoria se estabeleceu diante da necessidade de conhecer se essas mulheres receberam algum tipo de orientação dos profissionais de saúde e se sim, de que maneira lhes foram conduzidos, seja na unidade de saúde, seja na rede hospitalar, ou em qualquer outro ambiente que tenha servido de acolhimento para seu atendimento, desde a gestação até o presente momento da entrevista e a parti de então constatar se o comportamento das mães frente ao aleitamento têm alguma interferência com a conduta profissional. Pelos relatos das entrevistadas, apenas 1 mulher afirmou não ter recebido qualquer tipo de orientação.

    No tocante as orientações estabelecidas pelos profissionais acerca do aleitamento materno, percebemos que entre as absorvidas, a que mais se destacou foi o aconselhamento para a amamentação exclusiva. Os depoimentos ilustram esses achados:

    Depois que ela nasceu a enfermeira me orientou, e eu lembro também que até a agente de saúde... quando eu levei ela no posto de saúde pra vacinar a enfermeira me disse que o leite era o melhor alimento pro bebê e que eu devia dá só o leite, não precisava nem da água (Obsidiana).

    Sempre a enfermeira me orienta na puericultura... pra manter ela no peito (Esmeralda).

    A enfermeira do posto disse pra eu amamentar sempre, não da suquinho ou outra coisa de jeito nenhum... a médica de lá também me disse a mesma coisa (Jade).

    O fato de as mães ter manifestado, orientações de incentivo ao aleitamento materno, por parte do enfermeiro e outros membros da Estratégia de Saúde da Família, nos satisfaz bastante, porque uma das atribuições desses membros é a promoção da saúde, como é o caso do aleitamento materno.

    Alguns cuidados prestados durante a lactação são bastante relevantes. A posição do recém nascido, por exemplo, contribui para que a amamentação seja adequada, proporcionando melhor conforto e praticidade ao binômio mãe-bebê. A unidade de análise, demonstra a orientação em relação a essa questão.

    Foi numa consulta particular com uma médica que ela me ensinou como amamentar, o jeito certo! (Rubi).

    Por vezes, surgiram também relatos direcionados para prevenir e minimizar fatores negativos. Entre as observadas, destaca-se a identificação das alterações mamárias, como as fissuras, ingurgitamento mamário, mamilos planos ou invertidos e o estabelecimento das condutas necessárias aos devidos casos.

    A enfermeira do postim me ensinou... se o peito rachar pra eu fazer compressas, tomar banho de sol e mais um monte de coisa! (Jade).

    A agente comunitária, a enfermeira e a médica me explicaram algumas coisas... se caso o peito pedrasse como eu deveria fazer (Ametista).

    A enfermeira e a médica lá do posto falou que era pra fazer o bico... me ensinaram como era pra mim fazer (Turquesa).

    O preparo da mama é muito importante para o surgimento de certos problemas, e que quase sempre se apresentam acompanhados de dor. Uma boa orientação pode evitar essas situações desconfortantes, não tão distantes de ocorrer durante o processo, e que muitas vezes são decisivas.

    Todo profissional que presta assistência a mãe/bebê, deve além de conhecer bem as vantagens da amamentação para ambos, também ter conhecimento sobre a prevenção e o manejo dos principais problemas decorrentes da lactação, que além de trazer sofrimento para a mãe que amamenta, pode acarretar o desmame precoce (GUILIANI; LAMOUNIER, 2004).

Categoria 3. Influência dos familiares

    O convívio social é indispensável para a construção do nosso aprendizado, mas, por normalmente ser a família o primeiro e principal núcleo de interação do ser humano, é por meio dela que se constrói e perpetua com o passar do tempo, grande base dos nossos conhecimentos. Por sua vez nos ensinamentos compartilhados entre os familiares, geralmente são repassadas as experiências de vida, assentando-se de acordo com as crenças e valores próprios da cultura embutida no ambiente familiar.

    Na prática do aleitamento materno, por exemplo, podem surgir conselhos diversos, específicos para cada família. Em meio a essas implicações, outro elemento categórico de grande importância para a análise do atual estudo, foi investigar a influência exercida pelos familiares na prática do aleitamento materno.

    A luz da atual investigação, o que se pode perceber é que práticas alimentares de crianças têm sido erroneamente recomendadas pela grande maioria dos familiares (12), como bem mostra alguns dos relatos:

    Minha mãe sempre falava no início que só leite de peito num sustenta menino não, tinha que da mingau... da água também. Ela diz que criança também sente sede, agente sente por que criança não sente! Ela dizia: ela vai secar os pulmões (Ametista).

    Minha sogra, quando eu tava dando só de mamar, quando ela chegava aqui ela ficava dizendo que o menino tava morrendo de fome... ela diz que não tem fé em menino que só mama se sustente... ela diz que meu leite é fraco (Morganite).

    À medida que se emite cobranças a cerca da atuação da mulher frente à prática e julgamentos sobre a capacidade do leite materno em suprir as necessidades do filho, pode provocar na mãe, sentimentos conflitantes e ocorrer à desvalorização do aleitamento. Nessa ocasião, é conveniente ressaltar que a atuação da mulher frente o aleitamento materno, pode em grande parte, serem atribuídas às orientações e conselhos recebidos das pessoas com quem ela convive.

    No período da amamentação, a mulher sofre inúmeras influências do entorno social, e muitas vezes elas acabam por interferir na sua decisão de continuar oferecendo ao filho o leite materno de forma exclusiva, vindo a introduzir outros alimentos (MACHADO; BOSI, 2008).

    A percepção da mulher a respeito da opinião que sua mãe expressa sobre a amamentação, é um fato relativamente importante para a manutenção da mesma. Algumas falas apontam para grandes chances da interrupção do aleitamento materno, tornando essas mulheres menos favorecidas por tentarem incorporar o conselho advindo por essas pessoas.

    A minha mãe... devido o meu leite ser pouco. Aí minha mãe fica dizendo: dá um mingualzinho pra ela!... aí eu to tentando dá, mais ela não ta querendo! (Obsidiana).

    Minha mãe quer que eu dê aquele leite!... NAN 1, mais eu ainda num to dando não, por que não tamos pudendo comprar ainda ... quando o pai dela começar a da a pensão nois vamos comprar ... eu acho que por enquanto não precisava não por que eu tenho é muito leite. Ele toma e fica com a barrigona, oh! (Turquesa).

    As opiniões dos familiares, em especial o das mães das mulheres lactantes, devem ser consideradas um pilar fundamental na sua atitude frente à prática. Os conselhos e sugestões recebidos dessas pessoas foram levados em conta, refletindo diretamente no modo de agirem, trazendo um novo comportamento delas, juntos às crianças. Diante da ambivalência de sentimentos conflitantes, se a mulher pretendia manter a amamentação exclusiva, acaba por desconstruir as idéias feitas a respeito do aleitamento. Nesse sentido, é bom não esquecer o papel exercido pela opinião dos parentes sobre a amamentação.

Considerações finais

    A prática do aleitamento materno apresentou-se sensivelmente fragilizada em decorrência de aspectos resultantes da influência da cultura familiar, em muitos casos expressados claramente pelas mulheres, inclusive sendo demonstrado passivamente em alguns discursos. Sua percepção e crenças surtiram como reflexo do que foi praticado e aconselhado em seu ambiente.

    Se por um lado, os relatos revelaram o papel pedagógico dos profissionais de saúde, cabe enfatizar que muitas mães parecem ter recebido as orientações passivamente, fato esse devido suas condutas mostrarem-se na maioria dos casos alicerçado aos conselhos, costumes, valores, práticas aprendidas e ou transferidas pelos seus familiares. Frente estes aspectos, a cultura familiar se revelou como influência de significante relevância sob o aleitamento materno.

    Mediante essa tendência, torna-se necessário uma atitude familiar essencialmente positiva no sentido de hábitos culturais satisfatórios que envolvam o aleitamento materno. Torna-se indispensável, portanto, conscientização por parte dos familiares envolvidos, de que a mulher precisa de apoio no processo de adaptação quanto ao seu papel materno. É de extrema importância que as pessoas com quem ela convive tenham a mesma direção, o mesmo entendimento, que o aleitamento materno deve ser preferencialmente o único alimento a ser ofertado ao bebê nos seus seis primeiros meses de vida.

    Dessa forma, sendo o aleitamento materno um processo facilmente influenciado pela cultura familiar, torna-se necessário desenvolver estratégias de promoção baseado no contexto cultural, adequado à população-alvo. No entanto, reportamos aqui a necessidade de inclusão dos membros familiares nos programas de promoção ao aleitamento, principalmente aqueles mais próximos das mães, que representam papel importante em suas vidas. Ao passo que expuserem seus costumes, experiências, valores e crenças, com relação a essa prática, receberão informações que direcionarão a atitudes mais coerentes. Dessa forma, será mais fácil estabelecer efetivamente a amamentação nas próximas gerações, vez que estarão mais preparados em relação à transferência dos seus conhecimentos.

Referências

  • BOSI, M. L. M.; MACHADO, M. T. Amamentação: um resgate histórico. Cadernos ESP - Escola de Saúde Pública do Ceará. v. 1, n. 1, jul./dez. 2005

  • BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Comissão Nacional de Ética em Pesquisa. Normas para pesquisa envolvendo seres humanos: (Res. CNS 196/96 e outros) Brasília, DF, 1996. Acesso em: 19/09/2008.

  • BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Saúde da Criança: nutrição infantil. Aleitamento materno e alimentação complementar. Caderno de Atenção Básica, Brasília, n. 23, 2009a.

  • BRASIL. Ministério da Saúde. Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher, PNDS - 2006. Brasília: Ministério da Saúde, 2008.

  • FROTA, M. A.; MAMEDE, A. L.; VIEIRA, L. J. S.; ALBUQUERQUE, C. M.; MARTINS, M. C. Práticas culturais sobre aleitamento materno entre famílias cadastradas em um programa de saúde da família. Revista da Escola de Enfermagem da USP. São Paulo, v. 43, n. 4, dez. 2009.

  • GONÇALVES, A. C.; BONILHA, A. L. L. Crenças e práticas da nutriz e seus familiares relacionadas ao aleitamento materno. Rev Gaúcha Enferm. Porto Alegre, RS, v. 26, n. 3, p. 333-44, dez. 2005.

  • GUILIANI, E. R. J.; LAMOUNIER, J. A. Aleitamento materno: uma contribuição científica para a prática do profissional de saúde. Jornal de Pediatria. Rio de Janeiro, v. 80, n. 5, 2004.

  • ICHISATO, S. M. T.; SHIMO, A. K. K. Vivência da amamentação: lactogogos e rede de suporte. Ciência, Cuidado e Saúde, Maringá, v. 5, n. 3, p. 355-362, set./dez. 2006.

  • MACHADO, M. M. T.; BOSI, M. L. M. Compreendendo a prática do aleitamento exclusivo: um estudo junto a lactantes usuárias da rede de serviços em Fortaleza, Ceará, Brasil. Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil. Recife, v. 8, n. 2, jan./mar, 2008.

  • MASCARENHAS, M. L. W.; ALBERNAZ, E. P.; SILVA, M. B.; SILVEIRA, R. B. S. Prevalência de aleitamento materno exclusivo nos 3 primeiros meses de vida e seus determinantes no Sul do Brasil. Jornal de Pediatria. Porto Alegre, v. 82, n. 4, jul./ago, 2006.

  • MATTOS, P. L. C. L. A entrevista não-estruturada como forma de conversação: razões e sugestões para sua análise. Rev. Adm. Publica. v. 39, n. 4, p. 823-847, jul./ago. 2005.

  • MINAYO, M. C. S. O Desafio do Conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 8ª ed. São Paulo: Hucitec, 2004.

  • MINAYO, M. C. S.; SANCHES, O. Qualitativo-Quantitativo: Oposição ou Complementaridade? Caderno de Saúde Pública, 1993, n. 9, v. 3, p. 239-262.

  • NOVAES, J. F.; LAMOUNIER, J. A.; FRANCESCHINI, S. C. C.; PRIORE, S. E. Efeitos a curto e longo prazo do aleitamento materno na saúde infantil. Nutrire: Rev. Soc. Bras. Alim. Nutr., São Paulo, SP, v. 34, n. 2, p. 139-160, ago. 2009.

  • NUNES, J. M.; OLIVEIRA, E. N.; VIEIRA, N. F. C. Concepções de puérperas adolescentes sobre o processo de amamentar. Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste. Fortaleza, v. 10, n. 2, abr./jun, 2009.

  • RAMOS, V. W.; RAMOS, J. W. Aleitamento materno, desmame e fatores associados. Ceres Nutrição & Saúde. v. 2, n. 1, p. 43-50, 2007.

  • SANETO, JG; ANJOS, JL. Educação física e antropologia: a utilização da categoria cultura. Lecturas: Educación Física y Deportes, Revista Digital. Buenos Aires, ano 15, n. 153, fevereiro março 2011 http://www.efdeportes.com/efd153/a-utilizacao-da-categoria-cultura.htm

  • TEIXEIRA, M. A.; NITSCHKE, R. G.; GASPERI, P.; SIEDLER, M. J.; Significados de avós sobre a prática do aleitamento materno no cotidiano familiar: a cultura do querer-poder amamentar. Texto & Contexto – Enfermagem. Florianópolis, v.15, n.1, jan./mar. 2006.

Outros artigos em Portugués

  www.efdeportes.com/
Búsqueda personalizada

EFDeportes.com, Revista Digital · Año 17 · N° 169 | Buenos Aires, Junio de 2012  
© 1997-2012 Derechos reservados