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Atividade física e sociedade contemporânea

La actividad física y la sociedad contemporánea

Physical activity and contemporary society

 

Professor Doutor, pesquisador, membro da equipe da USP

do Núcleo de Estudos, Ensino e Pesquisa do Programa de Assistência

Primária de Saúde Escolar – PROASE

José Eduardo Costa de Oliveira

prof.zedu@usp.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Na esteira histórica das práticas de atividades físicas no Brasil, a sociedade sempre vislumbrou – hora as questões afetas as dimensões biofisiológicas, a exemplo da performance e da aptidão para o esporte, rebocadas pela esportivização da Educação Física dos séculos XIX e inicio do XX; hora as questões que se relacionavam aos processos de promoção e manutenção da saúde de seus beneficiários, marcada pela concomitância cronológica dos tensos e intensos debates epistemológicos dos anos 80 (OLIVEIRA, 2011). Assim, na intenção de discutir e analisar a atividade física e as interfaces com a sociedade contemporânea, o presente ensaio apresenta duas perspectivas para aqui tratar o tema. A primeira, relacionada ao paradigma biofisiológico de qualidade de vida, e, portanto, o constructo das definições e o entendimento desse conceito; e, por fim, analisando as possíveis analogias entre a sociedade de consumo e as práticas de atividade física na atualidade. Numa perspectiva de uma análise conclusiva, afirma-se que a questão da atividade física e suas interfaces com a sociedade, que apresentaram relações diretas e positivistas com os conceitos de saúde e qualidade de vida, devem se fazer presentes nos debates que visam refletir, criticamente, os processos que norteiam as formas de prescrição, dos diversos afazeres físicos na sociedade contemporânea. Pois, a promoção e a manutenção da saúde dos beneficiários da Educação Física e do esporte são dois vieses legítimos das intervenções da área e positivos para a sociedade como um todo. No entanto, apregoa-se a possibilidade de que esses valores sejam efetivados dentro de um estrado que considere o sujeito que se movimenta, numa perspectiva mais sistêmica e menos cartesiana.

          Unitermos: Atividade física. Sociedade. Interfaces. Contemporaneidade.

 

Abstract

          In the wake of the historic practice of physical activities in Brazil, the company always envisioned - the hours biophysiologic questions related dimensions, such as the performance and suitability for the sport, towed by sportivization of Physical Education in the nineteenth and early twentieth centuries; hours issues that related to the processes of promoting and maintaining the health of its beneficiaries, marked by chronological coincidence of tense and intense epistemological debates of the 80s (OLIVEIRA, 2011). Thus, the intention to discuss and analyze the physical activity and interfaces with contemporary society, this paper presents two approaches to address the issue here. The first related to the paradigm biophysiological quality of life, and therefore the construct definitions and understanding of this concept, and, finally, analyzing the possible analogies between the consumer society and the practice of physical activity today. In terms of a definitive analysis, it is stated that the issue of physical activity and its interface with society, who had direct contacts with the positivist concepts of health and quality of life, must be present in the debates that aim to reflect critically the processes that guide the prescription forms, the various physical tasks in contemporary society. For the promotion and maintenance of health of the beneficiaries of Physical Education and sport are two biases legitimate operations of the area and positive for society as a whole. However, advocates the possibility that these values ​​are effected within a platform that addresses the subject that moves, in a more systemic and less Cartesian.

          Keywords: Physical activity. Society. Interfaces. Contemporary.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 17 - Nº 168 - Mayo de 2012. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Na esteira histórica das práticas de atividades físicas (AF) no Brasil, a sociedade sempre vislumbrou – hora as questões afetas as dimensões biofisiológicas, a exemplo da performance e da aptidão para o esporte, rebocadas pela esportivização da Educação Física (EF) dos séculos XIX e inicio do XX; hora as questões que se relacionavam aos processos de promoção e manutenção da saúde de seus beneficiários, marcada pela concomitância cronológica dos tensos e intensos debates epistemológicos dos anos 80 (OLIVEIRA, 2011).

    Entretanto, é também a partir da década de 80 que outras mudanças na área ocorreram. Entre elas, a presença de outros campos do saber, especialmente das ciências sociais, mas também das ciências humanas, que começaram a participar de maneira mais efetiva dos debates e embates da EF, questionando esta predominância na forma de ver e prescrever atividades físicas, tanto nos campos escolares como nos não-escolares, em razão de novas questões advindas da percepção da complexidade das ações humanas, bem como das mudanças nas exigências mercadológicas, em relação à atuação do profissional na sociedade, e, em face à transcendência da área para fora dos campos apenas escolares (KUNZ, 2003).

    Nesse sentido, passou-se a estudar a atividade física dentro de uma visão mais ampla, priorizando a multidisciplinariedade, onde o homem cada vez mais deixa de ser percebido como um ser essencialmente biológico, sendo visto numa perspectiva mais abrangente, considerando-se os processos sociais, históricos e culturais que norteiam o seu "movimentar-se".

    Considerando o que foi exposto, e na intenção de discutir e analisar a atividade física e as interfaces com a sociedade contemporânea, o presente ensaio apresenta duas perspectivas para aqui tratar o tema. A primeira, relacionada ao paradigma biofisiológico de qualidade de vida, e, portanto, o constructo das definições e o entendimento desse conceito; e, por fim, analisando as possíveis analogias entre a sociedade de consumo e as práticas de atividade física na atualidade.

As interfaces positivistas (e positivas) entre atividade física e sociedade contemporânea

    Assim, o ensaio inicia a discussão apresentando a visão que, tanto no passado recente como na atualidade, tem legitimado a relação entre a atividade física e sociedade. Ou seja: a qualidade de vida sob a ótica – apenas - biofisiológica.

    Na sociedade atual, capitalista, de bens de consumo, este paradigma tem se descortinado sob uma perspectiva das ciências biológicas, o que resultou numa ênfase dos processos de mercantilização dessas práticas corporais na sociedade, a exemplo do caso brasileiro, constituindo-se o principal modelo nessa relação.

    Sendo assim, e a par das evidências de que o homem contemporâneo utiliza-se cada vez menos de suas potencialidades corporais, fruto da eminente tecnologização da sociedade, e que o baixo nível de atividade física é fator decisivo no desenvolvimento de doenças degenerativas, também como conhecidas como patologias hipocinéticas, ou seja: oriundas da falta ou da pouca movimentação do corpo. Sustenta-se a hipótese da necessidade de se promoverem mudanças no estilo de vida social, levando o sujeito a incorporar a prática de atividades físicas ao seu cotidiano. Tese também partilhada por esse texto.

    Nessa perspectiva, o interesse da EF em conceitos como “atividade física”, “estilo de vida” e “qualidade de vida”, “bem estar”, “estilo de vida ativo” e etc., vem adquirindo relevância e instigando a produção de trabalhos científicos vários, constituindo um movimento no sentido de valorizar ações voltadas para a determinação e operacionalização de variáveis que possam contribuir para a melhoria do bem-estar do indivíduo, por meio do incremento do nível de atividade habitual da população, de onde depreende-se que o principal argumento teórico utilizado está fundamentado no paradigma contemporâneo do estilo de vida ativa.

    Tal estilo tem sido apontado por vários setores da comunidade científica, como um dos fatores mais importantes na elaboração das propostas de promoção de saúde na população. Este entendimento fundamenta-se em pressupostos elaborados dentro de um referencial teórico que associa o estilo de vida saudável ao hábito da prática de atividades físicas, e, conseqüentemente, a melhores padrões de saúde.

    Este referencial toma a forma de um modelo, na medida em que constitui o protótipo contemporâneo no qual se fundamenta a maioria dos estudos envolvendo a relação - positiva e positivista - entre atividade física e sociedade contemporânea.

    Identifica-se neste modelo, a interação das dimensões da promoção da saúde e da atividade física dentro de um movimento denominado de - Movimento Vida Ativa - o qual vem sendo desencadeado no âmbito da Educação Física e das ciências do esporte, cujo eixo epistemológico centra-se no referido incremento do nível de atividade habitual da população em geral (NAHAS, 2001).

    O pressuposto sustenta a necessidade de se proporcionar um maior conhecimento, por parte da população, acerca dos benefícios da AF, e de se aumentar o envolvimento com atividades que resultem em movimentos produzidos pelos músculos esqueléticos, desaguando em gasto energético acima dos níveis de repouso. Pressuposto este, que define o próprio conceito de – atividade Física. E como resultado, torna os indivíduos mais ativos.

    Neste cenário, entende-se que esse referido incremento constitua um fator fundamental de melhoria da saúde pública.

    No entanto - saúde - de acordo com Bouchard (1991) é definida como uma condição humana com dimensões físicas, sociais e psicológicas, cada uma caracterizada por um continuum, com pólos positivos e negativos.

    A saúde positiva estaria associada à capacidade de apreciar a vida e resistir aos desafios do cotidiano e a saúde negativa associar-se-ia à morbidade e, no extremo, à mortalidade.

    Em contrapartida aos conceitos da década de 90, a (OMS) Organização mundial de Saúde, baseado na proposta da Carta de Ottawa (1986), definiu - saúde - como o processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria da sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle deste processo, ou a capacitação do individuo para atuar diretamente na melhoria de sua qualidade de vida.

    Atualmente, a OMS define o conceito de - saúde – como o estado razoável de harmonia entre o indivíduo e sua própria realidade, conferindo-lhe autonomia e capacidade de intervenção nesse processo.

    Neste mesmo ínterim, OMS também definiu - qualidade de vida - como a percepção do indivíduo de sua posição na vida, no contexto da cultura e do sistema de valores nos quais ele vive, considerando seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações.

    Recentemente, a relação atividade física e saúde vem sendo gradualmente substituída pelo enfoque da qualidade de vida, o qual tem sido incorporado ao discurso da EF e das ciências do esporte.

    Para a - aptidão física - retoma-se Bouchard (1991, p. 14), adotando-se enquanto definição:

    (...) um estado dinâmico de energia e vitalidade que permita a cada um, funcionando no pico de sua capacidade intelectual, realizar as tarefas do cotidiano, ocupar ativamente as horas de lazer, enfrentar emergências imprevistas sem fadiga excessiva, sentir uma alegria de viver e evitar o aparecimento das disfunções hipocinéticas.

    Nesta definição, distinguem a aptidão física relacionada à saúde, da aptidão física relacionada à capacidade esportiva. A primeira reúne os aspectos biofisiológicos responsáveis pela promoção da saúde; a segunda refere-se aos aspectos promotores do rendimento esportivo.

    Na literatura, várias são as posições que corroboram e admitem esta relação direta entre a atividade física e qualidade de vida, e também identificam nas sociedades industrializadas, a atividade física enquanto fator preponderante de qualidade de vida, quer seja em termos gerais, quer seja relacionada à saúde (BARBANTI, 1990).

    Em todas essas relações positivas para a sociedade, ressalta-se, mas também advindas – apenas – de uma ótica biofisiológica que o presente ensaio estabeleceu entre atividade física e sociedade até o momento, todas, reiteram a prescrição de exercícios enquanto fator preponderante de prevenção de doenças e melhoria da qualidade de vida.

    Diferentes visões e conceitos sobre os temas supracitados foram apresentados. Correspondem a visões bastante disseminadas e aceitas no domínio da EF e do Esporte. Em comum, nestas análises, encontra-se o acentuado viés biológico que as marca e as caracteriza. Este, historicamente também tem sido à base da formação dos profissionais.

A atividade física e as interfaces com as Ciências Sociais

    O presente texto compreende que a questão não parece suficientemente resolvida - somente – do ponto de vista positivista e exposto até o momento. Pois, a relação entre atividade física, saúde, qualidade de vida e sociedade, envolve uma multiplicidade de questões, e, sendo assim, resolvê-la exclusivamente pelo paradigma biologicista ou naturalista é desconhecer a complexidade do tema.

    O ser humano não pode ser reduzido à dimensão, apenas, biológica, pois, é fruto de um processo e de relações sociais bem mais amplas e abrangentes.

    Neste contexto, as Ciências Sociais, ótica do presente ensaio, a exemplo das ciências biológicas que referenciaram os argumentos anteriores, também oferece importante aporte para o debate, ao conceber o homem segundo uma lógica distinta daquela estritamente biofisiológica.

    No entender das Ciências Sociais, a realidade não é um dado singular, e sim uma construção social que varia segundo a história, as diferentes estruturas e os diferentes processos sociais.

    Na perspectiva naturalista, pouca atenção tem sido dada aos interesses políticos e econômicos associados à saúde, à aptidão física e aos estilos de vida ativa. Conforme pode ser verificado nos conceitos que o ensaio trouxe no início da discussão.

    Também no entender deste, esta visão assumiu uma postura eminentemente individualista e biologicista, no qual elaborou-se o conceito de vida fisicamente ativa, independentemente de uma análise cultural, econômica e política, desconsiderando as contradições estruturais que limitam as oportunidades de diferentes grupos sociais.

    Diante desta complexidade, alerta-se para a necessidade de se examinar outros apontadores, que transcenda a explicação, apenas, biológica das práticas de atividades físicas na sociedade contemporânea. Que transcenda a visão do beneficiário da EF, como um corpo a se entalhado, esculpido, moldado pela prática de atividades físicas. Que o sujeito não seja concebido – apenas – como um amontoado de músculos, de ossos, ligamentos, órgãos e etc., esperando pelas adaptações fisiológicas que o exercício pode proporcionar.

    Neste sentido, os conceitos avalizados pelos autores supracitados devem ser reavaliados em uma perspectiva distinta.

    Saúde e qualidade de vida devem ser interpretadas considerando-se o universo social no qual se encontram inseridos os sujeitos. Sendo que, para tanto, decorre daí a necessidade de avaliá-los - também - na perspectiva das Ciências Sociais.

    Atividade física e qualidade de vida, portanto, devem ser entendidas enquanto fenômenos que se inter-relacionam com as diversas dimensões do ser humano, a exemplo da psicológica, sócio-cultural, e também a biológica (BETTI, 2001). E não somente desta última, que tem sido objeto de inúmeros estudos na comunidade científica, e tem dominado os procedimentos metodológicos de investigação na área.

    No entanto, em boa parte da literatura especializada da EF e das ciências do esporte, onde se relacionam as variáveis - atividade física e sociedade - não são especificadas, ao menos de forma clara, as definições conceituais e operacionais relativas ao constructo destes termos.

    Portanto, a falta de um consenso em torno de sua definição, tem levado muitos estudiosos a empregar o termo “qualidade de vida” de forma reduzida e indiscriminada, desconsiderando sua riqueza e complexidade. Geralmente, associam-no ao conceito restrito de saúde, no sentido de ausência de doenças e de bem-estar físico, preterindo o sujeito social.

    Assim, alerta-se para fato, ao constatar a hegemonia da definição de qualidade de vida, relacionada – apenas - a fatores morfofisiológicos, decorrentes da atividade física. Afirma-se também que ela é utilizada de forma prolixa, resultante do conjunto de benefícios atribuídos ao exercício físico, controle do estresse e estilo de vida.

    Ao situar este problema no âmbito da área da EF, sustenta-se que o pouco rigor conceitual, corrobora com os objetivos de reduzir, artificialmente, suas complexidades e dificulta sua compreensão e interpretação.

    Numa ótica com um viés sócio-cultural, concorda-se com Minayo (2000), que - qualidade de vida - é uma noção eminentemente humana, sendo o ser humano um ser, também - eminentemente social - e que se aproxima do grau de satisfação encontrado na vida familiar, amorosa, social, laboral e ambiental.

    Pressupõe-se assim, uma síntese cultural de todos os elementos que determinada sociedade considera, como seu padrão de conforto e bem-estar.

    Este conceito remete, pois, a uma relatividade cultural, por tratar de uma construção social e historicamente determinada, concebida segundo o grau de desenvolvimento de uma sociedade específica.

    Parâmetros subjetivos (bem-estar, felicidade, amor, prazer, inserção social, liberdade, solidariedade, espiritualidade, realização pessoal) e objetivos (satisfação das necessidades básicas e das necessidades criadas pelo grau de desenvolvimento econômico e social de determinada sociedade: alimentação, acesso à água potável, habitação, trabalho, educação, saúde e lazer) se - interagem dentro da cultura - para constituir a noção contemporânea de qualidade de vida.

    Em razão da relação entre atividade física e sociedade de consumo, afirma-se que a sociedade capitalista moderna enfatiza o consumo, a competitividade e o individualismo, o que influencia o modo como se prescreve e como se realiza atividades físicas contemporaneamente.

    Por isso, coube no início deste, refletir acerca da concepção de saúde imperante nesta sociedade, pois nela, o papel desempenhado pelos meios de comunicação de massa é da maior importância. Mesmo que para tanto, o presente texto tenha referenciado algumas definições sob o aval de autores e de óticas estritamente biologicista.

    Seja como objeto, mercadoria ou força de trabalho, o corpo é moldado e aperfeiçoado, tornado apto à produção, domesticado para favorecer o aumento da produtividade (as ginásticas nos locais de trabalho – a ginástica laboral - sempre foram acompanhadas do discurso da saúde dos trabalhadores nas empresas, mas, sempre ocultaram os objetivos que visavam o aumento da produtividade do sistema, bem como a redução dos custos com os afastamentos médicos dos funcionários. Portanto, a redução dos custos das empresas).

    As estratégias de venda do corpo, com o surgimento de novos produtos e de novas necessidades o torna cada vez mais um produto privilegiado da lógica industrial. Afirma-se também, que embora os discursos empregados utilizem a saúde como aspecto legitimador, a utilização das diferentes técnicas de treinamento físico, têm uma preocupação maior com a estética corporal. Cabe questionar se estas estratégias se desenvolvem para melhorar a qualidade da EF ou se constituem, apenas, em estratégias de mercado.

    A lógica do mercado determina o estilo de vida considerado “saudável”, bem como os padrões de comportamento e os modelos de corpo que devem ser vendidos e consumidos pelas diferentes classes sociais. A questão parece estar antes, fortemente dominada por um viés ideológico, do que necessariamente por indicadores de bem-estar e de saúde.

    Se antes o corpo estava escondido, envergonhado, camuflado, em função das injunções de natureza religiosa, a partir da modernidade ele passa a ser cada vez mais exposto, tornando-se continuamente um dos principais produtos difundidos pela indústria cultural (OLIVEIRA, 2011).

    Sendo assim, torna-se possível estabelecer um paralelo na realidade em que se encontra a área de EF e de esporte, e sua principal atuação na sociedade, e como o professor, ao trabalhar diretamente com o corpo, participa de um processo de transmissão cultural. Devendo por isso, estar atento para não se tornar vítima de opressões e modismos do mercado neoliberal de bens de consumo.

    Outro conceito que deve ser ressaltado é aquele relacionado ao conhecimento escolar e a cultura de massa, que, nesse mesmo ínterim observa-se que a crescente massificação da sociedade, proveniente da "indústria cultural", e veiculada pelos meios de comunicação, atinge profundamente a escola, que não está preparada para superar as contradições dessa sociedade de consumo (ADORNO, 1980).

    Além de não associar a teoria e a prática, a educação formal também não tem possibilitado aos alunos pensar e construir o conhecimento crítico, colocando a linguagem escrita como principal, deixando de lado as linguagens falada, musical e corporal. Valorizando o pensamento conceitual, em detrimento do pensamento criador.

    Desse ponto de vista, uma educação que vise o desenvolvimento do ser por inteiro, compreende a aprendizagem como significativa, quando há uma intersecção entre saber e conhecimento.

    É também na experiência estética, onde o sentir e o pensar estão associados, que se desenvolve a capacidade criadora, a qual permite perceber e sentir melhor o mundo. A base de toda situação de aprendizagem deveria ser estética. Tal capacidade criadora não ocorre apenas na arte, ainda que nela encontre várias formas de expressão (HEGEL, 2001).

    Reconhece-se que no desenvolvimento da consciência estética, o movimento e a expressão corporal cumprem importantes papéis.

    A auto-expressão, a criatividade e o prazer proporcionados por estas atividades corporais são ótimas defesas contra a massificação de idéias e valores dominantes, uma vez que fortalecem o individualismo.

    Por outro lado, no processo de massificação, é muito provável que as imagens dos divertimentos de massa que atingem as pessoas, tornem a imaginação limitada e os indivíduos acabem, apenas, reproduzindo o pensamento coletivo.

    Ainda na esteira daquilo que Adorno (1980) denominou de - influência da indústria cultural na sociedade - e, quando relacionada à prática de AF, observada em dois caminhos, quanto à atuação e o efeito dessa indústria no fenômeno de massificação da sociedade, pois existe a possibilidade de que os conteúdos das mensagens ou produtos divulgados por essa, sejam usados, tanto para o esclarecimento, como para o bloqueio do senso crítico, e, conseqüente à manipulação dos indivíduos.

    Assim, as intervenções da EF estão sempre correndo o risco de adotar e transmitir a cultura massificada, por ignorar o fato de que estes são efetivamente atingidos por ela.

    Como solução, o texto sugere partir, constantemente, dessa cultura de massa, e em cima dela, construir a cultura elaborada.

Considerações finais

    Face ao que foi exposto, numa perspectiva de uma análise conclusiva, o presente ensaio assevera que a questão da atividade física e suas interfaces com a sociedade, que apresentaram relações diretas e positivistas com os conceitos de saúde e qualidade de vida, devem se fazer presentes nos debates que visam refletir, criticamente, os processos que norteiam as formas de prescrição dos diversos afazeres físicos na sociedade contemporânea.

    Pois, a promoção e a manutenção da saúde dos beneficiários da EF e do esporte são dois vieses legítimos das intervenções da área e positivos para a sociedade como um todo. No entanto, apregoa-se a possibilidade de que esses valores sejam efetivados dentro de um estrado que considere o sujeito que se movimenta, numa perspectiva mais sistêmica e menos cartesiana.

    Sendo assim, “saúde” não pode ser tratada como uma variável exclusivamente biológica. Elementos sociais, políticos, culturais e econômicos estão envolvidos na discussão sobre o assunto, e, obrigatoriamente devem ser considerados, se o objetivo for compreender a questão de maneira mais aprofundada.

    Embora a EF seja, historicamente, fortemente marcada pelo través biológico, as contribuições das Ciências Sociais e Humanas não podem ser desprezadas, uma vez que ampliam a percepção do estudioso e apontam para novos campos de pesquisa e de intervenção.

    A presente discussão enfatiza como a sociedade tem segregado os grupos de pessoas, e como a Educação Física tem participado, intimamente, deste processo, mesmo involuntariamente, através da sociedade de consumo que procura por estereótipos.

    Percebe-se como há necessidade de mudanças nos planos de ensino (quando o tema se relaciona a formação profissional, principalmente), para que essa ótica – apenas - biofisiológica não seja imperante nos processos de intervenção na área. Não que ela não tenha sua importância, e sim, o problema consiste na sua predominância.

Referências bibliográficas

  • ADORNO, T. W. et al. Aesthetics and politics. New York: Verso, 1980.

  • BARBANTI, V. J. Aptidão Física: um convite à saúde. São Paulo: Manole, 1990.

  • BETTI, M. Educação física e sociologia: novas e velhas questões no contexto brasileiro. In: CARVALHO, Y.M. de; RUBIO, K. (Org.). Educação física e ciências humanas. São Paulo: Hucitec, 2001. p. 155-169.

  • Carta de Ottawa sobre a Promoção da Saúde (1986). Extraído de http://www.saudeemmovimento.com.br/conteudos/conteudo_exibe1.asp?cod_noticia=202. Acesso em 09/02/2012.

  • BOUCHARD, C. Heredity and the path to overweight and obesity. Medicine and science in sport and exercise, 23(3): 285-91, 1991.

  • HEGEL, G. W. Cursos de Estética. São Paulo: Edusp, 2001/06. 4 vols.

  • KUNZ, E. Formação profissional em Educação Física: revisões e alienações. Revista Motrivivência, v.15, n.20-21, 2003.

  • MINAYO, M. C. S.; HARTZ, Z. M. A.; BUSS, P. M. Qualidade de vida e saúde: um debate necessário. Ciência & Saúde Coletiva, n. 5, p. 7-18, 2000.

  • NAHAS, M. V. Atividade Física, Saúde e Qualidade de Vida. 2ª ed. Londrina: Editora Midiogra f, 2001.

  • OLIVEIRA, José Eduardo Costa de. O Campo de atuação do profissional de Educação Física e do Esporte. Lecturas Educación Física y Deportes (Buenos Aires). v. 161, p. 1-13, 2011. http://www.efdeportes.com/efd161/o-campo-de-atuacao-de-educacao-fisica.htm

  • ____. O Esporte e a arte na sociedade. Lecturas Educación Física y Deportes (Buenos Aires). v. 162, ano 16, p. 1-11, 2011. http://www.efdeportes.com/efd162/o-esporte-e-a-arte-na-sociedade.htm

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