Respostas metabólicas do exercício em diferentes situações: jejum e após ingestão de carboidrato Respuestas metabólicas del ejercicio en diferentes situaciones: en ayunas y luego de la ingestión de carbohidrato Metabolic responses to exercise in different situations: fasting and after carbohydrate ingestion |
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*Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Santa Cruz, RN **Centro Universitário Metodista IPA, Porto Alegre, RS (Brasil) |
Ana Paula Trussardi Fayh* Natália Steyer** Jerri Luiz Ribeiro** |
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Resumo O objetivo desse estudo foi comparar a oxidação de lipídeos e o dispêndio energético durante duas situações alimentares: jejum e pós-ingestão de carboidrato. Foram avaliados 10 indivíduos do sexo masculino, com idade média de 23,40 ± 3,06 anos, que realizaram teste de cargas progressivas em esteira rolante para determinação do consumo máximo de oxigênio (VO2máx). Cada voluntário realizou dois testes submáximos com intensidades de 60% do VO2máx, sendo orientados a permanecer em exercício durante uma hora ou até a exaustão. Trinta minutos antes de cada exercício submáximo, foram ingeridos 350 ml de uma das bebidas compostas por: maltodextrina (1g/kg/peso) e placebo. Durante o exercício, os indivíduos foram monitorados pelo ergoespirômetro e freqüencímetro. A oxidação de lipídeos foi predita pelo quociente respiratório, e o desempenho foi verificado pelo tempo de exercício. Para comparar os parâmetros metabólicos nos dois testes submáximos, utilizou-se teste t para amostras independentes. Não foram observadas diferenças significativas nos tempo de exercício (p=0,590), oxidação de lipídeos (p=0,771) e dispêndio energético (p=0,706) nos exercícios submáximos, após a ingestão das diferentes bebidas. Com isso, a ingestão de carboidratos antes da realização do exercício aeróbico não foi capaz de diminuir a oxidação de lipídeos nem aumentar o desempenho em indivíduos saudáveis do sexo masculino. Unitermos: Nutrição. Atividade física. Lipólise. Maltodextrina. Dispêndio energético.
Abstract The aim of this study was to compare the lipids oxidation and the energy consumption during two alimentary situations: fasting and after carbohydrate ingestion. Eleven male individual were evaluated, at an average age of 23.40 ± 3.06 years old, that accomplished tests of progressive loads in a treadmill for determination of the maximum oxygen consumption (VO2max). Each volunteer carried out two submaximal tests at 60% of VO2max intensity, being advised to remain exercising during one hour later or until the exhaustion. Thirty minutes before each test, 350 ml of a drink composed by maltodextrin (1g/kg of weight) or placebo was ingested. During the test, the volunteers were monitored by an ergospirometer and a heart rate frequency monitor. The lipids oxidation was predicted by the breathing quotient, and the performance was verified by the time of exercise. In order to compare the metabolic parameters from the two tests, a t test for independent samples was applied. Significant differences were not observed in the test timing (p=0.590), lipids oxidation (p=0.771) and energy consumption (p=0.706) during the submaximal tests, even after the ingestion of the different drinks. As a result, carbohydrate ingestion before an aerobic exercise was not able to reduce the lipids oxidation nor to increase the performance of male healthy individuals. Keywords: Nutrition. Physical activity. Lipolysis. Maltodextrin. Energy consumption.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 165, Febrero de 2012. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
Os ácidos graxos são substratos energéticos que representam uma fonte importante de energia durante exercícios de intensidade leve, moderada ou prolongada, e também no estado de jejum (CURI et al., 2003). Vários pesquisadores concordam que a utilização relativa dos ácidos graxos como fonte de energia para a prática esportiva reduz com o aumento da intensidade do exercício, ao passo que sua utilização aumenta com a duração da mesma (FRIEDLANDER et al, 1999; ROMIJN et al, 2000).
O exercício provoca alterações metabólicas e fisiológicas no organismo, tomando mais eficaz a lipólise e consequentemente diminuindo o uso de glicogênio muscular como fonte energética. É a oxidação dos ácidos graxos durante o exercício que permite que a atividade física seja mantida por períodos mais prolongados e retarda a depleção do glicogênio e a hipoglicemia (SILVEIRA et al., 2003). Durante o exercício, hormônios como epinefrina e glucagon ligam-se a receptores beta-adrenérgicos, que promovem a ativação da enzima lípase hormôniosensível, e consequentemente lipólise no tecido adiposo (De BOCK et al., 2008). A hidrólise do triacilglicerol fornece moléculas de ácidos graxos, que serão convertidos em energia, e glicerol, que por sua vez poderá ser captado pelo fígado e servir como precursor de glicose através da gliconeogênse (SILVEIRA et al., 2003).
Nos estágios iniciais de jejum, os substratos energéticos armazenados são utilizados para produzir energia e o fígado mantém os níveis de glicose sanguínea. O tecido adiposo libera os ácidos graxos pelo processo da lipólise, sendo estes o principal substrato energético durante o jejum (SMITH, MARKS & LIEBERMAN, 2007). As reservas de lipídios em nosso organismo são inúmeras vezes superiores àquelas de carboidratos, o que explicaria a preferência do nosso organismo pelos lipídios em condições basais e principalmente de jejum, aumentando a disponibilidade de glicose para outros tecidos (sistema nervoso, sanguíneo e imunológico), os quais são essencialmente mantidos à custa desse substrato (HAWLEY, 1994).
No combate à gordura corporal, todas as armas parecem atraentes, desde as práticas mais simples até as mais sacrificantes, como o treinamento físico em jejum. Tendo em vista que o mito da lipólise aumentada durante o exercício executado em jejum data de décadas, e que os achados da literatura são bastante inconsistentes e discrepantes, torna-se importante que estudos adicionais descrevam a utilização de lipídeos como fonte de energia em diferentes situações alimentares. Com isso, o objetivo desse estudo é avaliar se existe diferença na oxidação de lipídeos entre as situações alimentares de jejum e após uma suplementação de carboidrato.
Métodos
Delineamento do estudo
O presente estudo tem caráter experimental randomizado para comparar as respostas metabólicas do exercício em duas situações: no jejum e no estado pós-alimentado.
Amostra
A população estudada foi composta por 10 voluntários do sexo masculino, saudáveis, não fumantes, não atletas e que não faziam uso de suplementos alimentares. Todos os indivíduos aceitaram participar voluntariamente do estudo mediante a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido em duas vias previamente aprovadas pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Centro Universitário Metodista IPA (nº 13/2009 de 09/03/2009).
Procedimentos para coleta de dados
Todos os voluntários realizaram uma entrevista inicial para verificar se atendiam aos critérios de inclusão do presente estudo. Foi realizada uma anamnese contendo questões sobre suas atividades diárias e hábitos alimentares. Além disso, foi solicitado a todos os indivíduos o preenchimento de um recordatório alimentar de 24 horas, para que identificar seus padrões alimentares e, com isso, realizar orientações individuais pertinentes aos momentos pré-coletas. A partir dessa entrevista, foram agendadas três novas visitas ao laboratório, para a realização do teste de esforço máximo e dos testes submáximos com a intervenção dietética (testes experimentais).
Teste de esforço máximo e antropométrico
Inicialmente, os indivíduos realizaram avaliação da composição corporal, onde foram aferidas as dobras cutâneas do abdômen, coxa e peitoral, para a determinação do percentual de gordura (JACKSON & POLLOCK, 1978). Todos os indivíduos realizaram um teste de cargas progressivas em esteira rolante da marca Imbramed até a exaustão. Após um aquecimento de 3 minutos caminhando a 5 km/h na esteira, aumentou-se a velocidade da esteira em 0,5 km/h a cada 30 segundos. O teste foi interrompido após solicitação voluntária do indivíduo, no momento em que ele não possuía capacidade em manter o exercício. O consumo máximo de oxigênio (VO2máx) foi determinado com a utilização do equipamento de ergoespirometria da marca VO 2000 (USA), e do ciclo ergômetro da marca The Byke, Cybex (USA). Durante todo o teste foram obtidos os valores de consumo de oxigênio (VO2), da produção de CO2 (VCO2), e da ventilação (VE). A freqüência cardíaca (FC) foi obtida através de um monitor de freqüência cardíaca da marca Polar. A partir dos resultados, foram determinados os limiares ventilatórios (LV) e o VO2máx, que foi determinado como o maior valor obtido em períodos de 30 s durante o teste.
Testes experimentais
Cada voluntário realizou dois testes submáximos em esteira rolante na intensidade de 60% do VO2máx, denominados de testes experimentais. A ordem dos testes foi randomizada através de um sorteio prévio. Em ambos os testes, os voluntários foram orientados a comparecer em jejum de 4 horas no local citado anteriormente. Todos os indivíduos realizaram as duas sessões de exercício com ingestão prévia de uma das bebidas. O protocolo de exercício consistiu de um período de incremento de velocidade da esteira até a estabilização da carga alvo, cerca 10 minutos de duração. Após este período de adaptação, os voluntários foram instruídos a permanecerem em uma hora ou até não possuir mais capacidade de manter o exercício. Durante todo o período de exercício, o indivíduo foi monitorado pelo ergoespirômetro e freqüencímetro. A oxidação de gordura durante o exercício foi determinanda pelo quociente respiratório (QR).
Bebidas
Trinta minutos antes de iniciar o exercício, os voluntários ingeriram 350ml de uma das duas diferentes bebidas, definidas por randomização. As bebidas foram classificadas da seguinte forma: bebida carboidrato – constituída de 1g de maltodextrina sabor tangerina por quilograma de massa corporal do voluntário, reconstituída em água; bebida placebo – constituída de suco com mesmo sabor da bebida à base de maltodextrina, e sem adição de açúcar, da marca Clight® (composição: 0g de CHO). Todas as bebidas foram preparadas pelo mesmo pesquisador e os voluntários não tinham conhecimento do conteúdo da bebida ingerida.
Análise estatística
Os dados foram estruturados e analisados utilizando o pacote estatístico SPSS versão 17.0 para Windows. Os testes de Shapiro-Wilk e Levene foram utilizados para verificar os pressupostos de normalidade e homogeneidade das variâncias, respectivamente. Para comparar os parâmetros metabólicos e de desempenho dos exercícios nas duas situações, foi utilizado teste t para amostras independentes. Os resultados foram expressos em média ± desvio padrão e o nível de significância aceito foram de p< 0,05.
Resultados
Os dados de caracterização da amostra estão descritos na tabela 1. Os voluntários eram adultos jovens, com composição corporal sugestivas de indivíduos que realizam treinamento de força, caracterizada por um índice de massa corporal acima do ideal, mas um percentual de gordura baixo. O consumo máximo de oxigênio obtido através do teste de esforço máximo nos aponta que esta amostra não era treinada em exercícios aeróbicos.
Tabela 1. Dados de caracterização da amostra (n=10)
Para controlar os efeitos da ingestão de nutrientes no período de 24h antes do exercício submáximo, que poderia contribuir para os efeitos de desempenho durante o exercício, os indivíduos foram orientados a preencher um recordatório de 24h antes da realização do exercício. A média de ingestão de carboidratos nas 24h precedentes da realização do exercício com ingestão de carboidrato foi de 55,2±6,9% e os valores para as 24h antes do exercício antes da ingestão do placebo foram de 53,7±7,8%. Não se observou diferenças significativas na ingestão de carboidratos (p=0,353), assim como na ingestão de proteínas e lipídeos (p=0,280 e p=0,783, respectivamente).
A tabela 2 mostra os dados de comparação dos testes experimentais, realizados com a ingestão prévia das diferentes bebidas. Devido ao fato dos voluntários terem permanecido diferentes quantidades de tempo em exercício, optou-se por mostrar os dados de quociente respiratório (QR) e freqüência cardíaca (FC) aos 30 minutos de exercício e também os valores médios apresentados durante cada teste. Não houve diferença significativa em nenhuma variável metabólica com a ingestão das diferentes bebidas.
Tabela 2. Dados dos testes experimentais (n=10)
Discussão
A literatura disponibiliza poucos estudos com objetivo de comparar a oxidação de lipídeos em jejum e no estado pós-alimentado. Ainda, diferentes protocolos de exercício e ergômetros utilizados pelos autores dificultam a comparação dos achados do presente estudo. Como a utilização de ácidos graxos como substrato energético aumenta com a duração do jejum (SMITH, MARKS, LIEBERMAN, 2007), possivelmente o período de 4h foi insuficiente para mostrar o aumento da oxidação de lipídeos durante o exercício.
O substrato energético a ser utilizado durante a prática de exercícios físicos, como a oxidação de lipídios, depende da interação entre vários fatores, como a intensidade do exercício, sexo, o nível de treinamento, concentração de ácidos graxos livres plasmáticos, quantidade de carboidrato disponível e fatores hormonais (YANNIS & SMITH, 1999; WELKER & SOUZA, 2002), de forma que nem todo exercício contará com os lipídios como principal fonte energética (HAWLEY, 2001).
Com resultados similares ao presente estudo, de Bock e colaboradores (2008) não observaram diferenças na taxa de oxidação de lipídeos em indivíduos do sexo masculino que se exercitaram em bicicleta estacionário em jejum ou no estado pós-alimentado. No entanto, foi observada uma menor quebra de glicogênio no estado de jejum, sem ser possível estabelecer se esta diferença foi benéfica para o desempenho aeróbico ou não. Horowitz e colaboradores (1997) realizaram um estudo cujo objetivo foi analisar se o consumo de carboidratos durante o exercício poderia reduzir a oxidação de gordura. Os autores não observaram diferença na oxidação de gordura durante exercício aeróbico quando comparados estados de jejum e pós-consumo de carboidrato.
Os resultados acerca dos efeitos do jejum sobre a oxidação de gorduras ainda são contraditórios. Utter e colaboradores (1999) estudaram as respostas hormonais em atividades aeróbicas em duas diferentes situações: em jejum de 12h e com ingestão prévia de carboidratos. De acordo com os resultados deste estudo, o jejum levou a uma maior oxidação de gorduras, refletida através de um menor QR. Como esperado, as taxas de glicose e insulina também foram menores no jejum. No entanto, os níveis de cortisol praticamente duplicaram nesta situação, o que pode levar a uma maior utilização de proteínas musculares como fonte energética. Da mesma forma, Leelaywuat e colaboradores (2005), comparando indivíduos de ambos os sexos, mostraram que a ingestão de carboidratos reduziu a oxidação de lipídeos. Estes resultados discrepantes podem ser devido ao pequeno tamanho amostral dos estudos e dos diferentes protocolos de exercício.
Além do pequeno tamanho amostral, este estudo apresenta outras limitações. O fato de avaliarmos indivíduos não treinados pode ter contribuído para não verificarmos diferenças entre os grupos, uma vez que a utilização de lipídios como substrato energético aumenta à medida que se tem mais tempo de treinamento (ROMJIN et al, 1993). Indivíduos treinados apresentam maiores quantidades de enzimas lipolíticas nas células musculares quando comparados com indivíduos sedentários. O treinamento, principalmente se for aeróbio, induz ao aumento da densidade de capilares no tecido adiposo, assim como sua capacidade de oxidação dos ácidos graxos. Dessa forma, indivíduos treinados iniciam o processo de oxidação lipídica previamente do que indivíduos sedentários, que devem permanecer mais tempo em atividade para metabolizar os lipídios (FRIEDLANDER, CASAZZA & HORNING, 1999).
Outra limitação do presente estudo seria a exclusão das mulheres na amostra. Existem evidências de que a utilização de lipídios como fonte de energia durante o exercício aeróbico pelas mulheres seja superior do que a utilização pelos homens (ROMJIN et al, 2000). Estudos prévios demonstraram que elas possuem maior facilidade de utilizar os ácidos graxos como fonte de energia durante o exercício devido sua maior quantidade no organismo (FROBURG & PERSEN, 1984; TARNAPOLSKY et al, 1995). Além disso, a utilização da máscara para a captação dos gases pode ocasionar desconforto, que limitaria o tempo de permanência do voluntário no exercício. Como sugestões para futuros estudos, a adoção de refeições padrões antes dos testes poderia contribuir para efetivar os resultados, uma vez que o recordatório de 24h conta com a memória do indivíduo.
Em conclusão, este estudo não encontrou diferenças significativas na oxidação de gordura e desempenho físico na prática de exercício físico em jejum. Da mesma forma, o uso de bebida carboidratada não foi eficaz para aumentar o dispêndio energético nem alterar a freqüência cardíaca dos indivíduos. São necessários mais estudos que comparem a oxidação de lipídeos nessas diferentes situações alimentares, para que se esclareçam os aspectos controversos encontrados.
Referências
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FRIEDLANDER, A. L.; CASAZZA G. A.; HORNING, M. A. Endurance training increases fatty acid turnover but not fat oxidation, in young men. J Appl Physiol, v.86, p. 2097 – 2105, 1999.
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