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A pele na vitrine do comércio do corpo

La piel en la vitrina del comercio del cuerpo

 

*Graduada em Fisioterapia pela Universidade Guilherme Guimbala, ACE Joinville

Especialista em Fisioterapia Dermato Funcional pelo Instituto Brasileiro

de Terapias de Ensino, IBRATE, PR.

**Graduada em Educação Física. Mestranda do Curso de Pós-graduação

em Educação da Universidade Regional de Blumenau, FURB

***Doutor em Educação pela Universidade Federal da Bahia, UFBA

Professor do Departamento de Educação Física da Universidade Federal de Sergipe, UFS

Izabela de Marqui Weber*

izinhaweber@hotmail.com

Camila da Cunha Nunes**

camiladacunhanunes@gmail.com

Fabio Zoboli***

zobolito@gmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Cada vez mais o corpo vem se constituindo como território a ser explorado pelo mercado nos atuais moldes das políticas neoliberais. Essa mercantilização faz girar toda uma gama de valores/significados que acabam por dar bases de ação a uma infinidade de práticas corporais dentro de uma determinada sociedade/cultura. Essa aculturação, por sua vez, faz girar um emaranhado de saberes impulsionado pelas tecnologias no âmbito das mais variadas ciências. O presente artigo é resultado de uma investigação bibliográfica e seu objetivo é discutir sobre a tríade: cultura, ciência e mercado focados em torno do corpo. Diante desse panorama o texto elenca questões contemporâneas que contribuem para pensar e rever o corpo enquanto meio primário da relação sujeito, outro e mundo.

          Unitermos: Corpo. Pele. Ciência. Cultura. Mercado do corpo.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 165, Febrero de 2012. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    O corpo na sociedade contemporânea cada vez mais se apresenta como um suporte de signos de posicionamento social. A aparência física é neste contexto, um valor simbólico a ser buscado para que o sujeito seja bem “apresentado” no seu contexto e nas suas relações pessoais/sociais.

    Os padrões de beleza a partir da aparência física são construídos historicamente através de símbolos culturais e imaginários sociais que subjetivam e objetivam os sujeitos dentro de uma determinada cultura.

    Partindo desta perspectiva este texto vem apresentar o corpo como fator de mercado fazendo a articulação do mesmo com a cultura e com a ciência. A partir dessa tríade dissertasse sobre algumas práxis sociais que envolvem o corpo e a pele – como parte dele.

    Este texto parte de uma análise crítica de alguns elementos sociais no que tange o corpo e suas complexas relações com a cultura, mercado e ciência. Neste sentido ele é descrito a partir de uma abordagem qualitativa.

    Para se compreender o corpo a partir do contexto cultural o mesmo precisou ser analisado na sua constituição histórica, bem como na sua contingência atual onde mercado e ciência se aliam para fazer do corpo um produto a ser consumido. Para melhor desvelarmos essa trama buscamos através de uma pesquisa bibliográfica argumentos teóricos para discutir um conjunto integrado de práxis fundamentadas a tríade cultura, ciência e mercado com foco no corpo.

    Num primeiro momento o corpo é apresentado na sua dimensão cultural e na conjuntura do mercado. Numa etapa posterior a pele é descrita como território de demarcação dos signos da beleza. As tensões estabelecidas no texto chamam a atenção no sentido de que a cultura e as tecnologias do corpo contribuem para a manutenção e reprodução de todo um sistema de produção econômica.

O corpo e sua dimensão cultural na conjuntura de mercado

    O existir humano se dá através do corpo. Pelo corpo o humano estabelece suas relações consigo mesmo, com o outro e com o mundo. O sentir, o pensar e o agir, caracterizam a existência e a vida humana, essa tríade, no entanto, não se dá de modo fragmentado e linear, mas sim, através de uma rede complexa de interações que se dão na dimensão corporal humana. Pelo corpo eu percebo, pelo corpo eu analiso e pelo corpo eu (com) existo no mundo.

    A estrutura biológica do homem lhe permite sentir, pensar e agir, porém, a cultura é quem dá os sentidos/significados desse sentir, pensar e agir. O ser humano é um animal cultural e no seu corpo estão inscritas suas demarcações e seus emblemas culturais como que uma segunda pele.

    O corpo de cada ser humano detém parte da memória universal. A história do corpo no seio de uma cultura torna-se inseparável da história da totalidade dessa cultura. Assim, compreender o que o corpo representa dentro de um contexto cultural nos obriga a decodificar o processo cultural no qual ele se construiu. O corpo é fruto da história-memória coletiva e individual. Sendo assim, para ser melhor compreendido o corpo nos impõem a condição de persegui-lo pelos rastros e movimentos – não regulares – deixados por ele no curso dos tempos, na cultura.

    Na conjuntura social deste início de século percebemos cada vez mais o capitalismo – na sua configuração neoliberal – transformar tudo em “objetos e coisas”, transformar tudo em “produto de consumo”. O corpo não fica fora deste contexto e vira mercadoria numa cultura permeada pelos signos da beleza, virilidade e juventude.

    O corpo cada vez mais vem sendo atravessado por discursos que supervalorizam seu caráter material reduzindo o mesmo a sua condição de objeto. Há um sem fim de ciências que vêem no corpo uma opção de mercado rentável. Desta forma surge a partir do corpo toda uma gama de produtos a serem consumidos pelos sujeitos que são subjetivados por valores binários tais como: feio X belo, jovem X velho e gordo X magro. Criam-se a partir desses binários as valorações, ou seja, as relações de poder: “ser gordo é ser feio, ser magro é ser bonito”. São atribuídos valores as diferenças e então as pessoas começam a consumir a partir dessa valoração simbólica disseminada culturalmente. Quem é feio consome para ficar bonito e quem já é bonito consome para permanecer bonito – a cultura cria assim as chamadas necessidades de consumo.

    É comum vermos propagandas onde são anunciados produtos a partir das características corporais e nas entrelinhas percebemos as relações de poder envolvidas: “se seus cabelos estão ficando grisalhos e brancos, compre tal produto e se mantenha jovem”. “Se suas roupas não servem mais em você, tome esse produto ou compre esse aparelho que em poucos dias você ficara bonita e irresistível perdendo até 05 quilos por mês”. E assim, a partir de padrões corporais vão se proliferando valores sociais ao corpo, obrigando quem está fora e quem esta dentro dos mesmos a consumir de modo desenfreado.

    Neste sentido Del Priore (2000, p. 94) menciona que:

    a beleza instituiu-se como prática corrente, pior, ela consagrou-se como condição fundamental para as relações sociais. Banalizada, estereotipada, ela invade o cotidiano através da televisão, do cinema, da mídia, explodindo num todo – o corpo nu, na maioria das vezes – ou em pedaços, pernas, costas, seios e nádegas. Nas praias, nas ruas, nos estádios ou nas salas de ginástica, a beleza exerce uma ditadura permanente, humilhando e afetando os que não se dobram ao seu império.

    Os indivíduos ficam expostos a vitrines que prometem um corpo livre de gorduras e rugas, um corpo viril e forte, uma mente cada vez mais capaz para ficar atenta e espantar a tristeza que deprime. Pílulas, alimentos, aparelhos de ginástica, cremes e toda uma gama de mercadorias prometem uma maior juventude, uma maior beleza, um corpo com valor simbólico mais elevado.

    Este corpo permeia em meio à lógica capitalista estabelecido pela ciência e a sociedade como um produto. A cultura propaga e dissemina um padrão de corpo que faz gerar um mercado, este mercado por sua vez faz girar várias ciências que tem no corpo seu mote de pesquisa. Assim a engrenagem cultura, ciência e mercado se arrastam e se puxam mutuamente.

    Na menção de Peres (2009) à imagem de corpo de nossa cultura racionalizada, cientifizada e industrializada, reduz o mesmo a um objeto de uso em conformidade com os interesses econômicos, políticos e ideológicos de outros grupos ou classes sociais, fazendo com que o corpo se tornasse uma ferramenta de produção, que traria lucro e crescimento econômico ao meio no qual está inserido não garantindo a cultura do corpo.

    Na segunda metade do século XX o culto ao corpo ganhou uma dimensão social inédita: entrou na era das massas. Industrialização e mercantilização, difusão generalizada das normas e imagens, profissionalização do ideal estético com a abertura de novas carreiras, inflação dos cuidados com o rosto e com o corpo: a combinação de todos esses fenômenos funda a idéia de um novo movimento da história da beleza feminina e, em menor grau, masculino (Goldenberg, 2002, p. 8 apud Garrini, 2007).

    O capital molda os corpos de acordo com seus próprios requisitos, ao mesmo tempo em que, os corpos internalizam em seu modo de agir desejos corporais, vontades, necessidades e relações sociais estabelecidas pelo meio social em que estão inseridos, (por vezes expressos abertamente como lutas coletivas fundadas na classe, comunidade ou identidade) da parte do trabalhador (HARVEY, 2004).

    Desta forma, a sociedade contemporânea assiste deslumbrada à passagem dos “corpos perfeitos”, que invadem progressivamente todos os espaços da vida moderna (POLI NETO e CAPONI, 2007).

    O corpo, para ser bonito na atualidade, deve seguir a regra do padrão estético culturalmente difundido e disseminado, ou seja, é fabricado um padrão visual e estético preestabelecido, que deve ser buscado e consumido pela sociedade. Nesse início de século XXI o padrão caracteriza-se pelo biótipo longilíneo e magro, como aqueles de modelos vistos em campanhas televisivas, mídia escrita e outdoors. Para Garrini (2007):

    a mídia encontrou no “corpo perfeito” o discurso ideal para a difusão dos produtos e dos serviços de beleza, como os cosméticos, os moderadores de apetite, as cirurgias plásticas, as clínicas de estéticas e academias esportivas, entre outros. Ela adquiriu um imenso poder de influência sobre os indivíduos, massificou a paixão pela moda e tornou a aparência uma dimensão essencial na sociedade.

    Um corpo de aparência jovem, com músculos “talhados”, pele lisa e sem manchas, dentre milhares de outros atributos que cada vez mais nos aproximam dos Deuses gregos, e que cada vez menos nos distanciam da condição humana natural.

    Por falar em Deuses gregos, quando falamos em beleza e a exaltação da mesma, de imediato nos remetemos ao Deus grego Narciso, que é o símbolo do culto ao corpo. Narciso era um deus que apaixonou-se por sua beleza de tal forma que passava horas do dia se contemplando nas águas de um lago. Certo dia, de tão apaixonado que estava, atirou-se no lago na ânsia e tocar-se. Narciso morreu entorpecido pela sua beleza, apaixonado pelo seu reflexo.

    De igual forma, nos dias atuais vemos pessoas entorpecidas pelos seus corpos, corpos esses que tem como referencia o belo culturalmente criado e reinventado. Só nos reconhecemos enquanto “belos” se nossos corpos se refletirem no espelho social do signo de beleza. Narcisos continuam morrendo em pleno século XXI, eles morrem de anorexia, vigorexia, de complicações ocorridas em mesas de cirurgia plástica, morrem lipoaspirados.

    Este entorpecimento na busca do corpo belo, do ideal de beleza pauta posturas ascéticas que se aproximam cada vez mais do sem vida. Prova disso é o resultado de uma pesquisa realizada em 2004 pela Strategy one com 3200 mulheres entre 18 e 64 anos em 10 (dez) países e publicada pela “Revista Época” no mesmo ano. Constatou-se através desta pesquisa que no Brasil o peso e a beleza do corpo influenciam mais na auto-estima que sucesso na profissão, fé religiosa ou número de amigos. Apenas 7% das mulheres brasileiras se consideram bonitas e, por causa disso, 54% delas se dizem dispostas a fazer cirurgias plásticas. Outro dado interessante da pesquisa foi de que 10% das mulheres entrevistadas aceitariam perder 25% da inteligência desde que isso as tornasse 25% mais belas.

    Esses resultados nos fazem perceber que cada vez mais um número maior de pessoas estão com dificuldades de lidar com o próprio corpo. Não são raras as pessoas que se envergonham com sua auto-imagem corporal: o obeso, o baixinho, o não bronzeado, a mulher com celulite, a pessoa com deficiência e tantos outros, todas vítimas da ridicularização de companheiros e estranhos, passando, muitas vezes, pela rejeição dentro do seu próprio grupo.

    Não estamos afirmando aqui que não se deve ter auto-estima, afinal a mesma é de fundamental importância para que o sujeito possa ter uma vida saudável e também para que ele se relacione de forma mais tranquila dentro de seu contexto social. No entanto, compactuamos com Silva (2001) quando a mesma alerta para um narcisismo que diverge da ideia popular de amor pela própria beleza, devendo ser entendido em seu sentido clínico, como um distúrbio do caráter, uma obsessão que impede alguém de entender aquilo que é inerente ao domínio do eu e da autogratificação e aquilo que não lhe é inerente.

    Estar fora dos padrões da estética é uma realidade muito árdua, uma vez que a ditadura da beleza humilha a quem não se dobra a seus padrões. Um exemplo é a senhora/mulher que entra na academia porque quer enrijecer o seio flácido pela idade, pois não consegue mais amar o marido de luzes acesas por vergonha. Esta mulher é um sujeito envenenado pela cultura do corpo belo. A jovem que vai a óbito por anorexia morreu de objetivação da mesma cultura: “sentiu na carne”.

    Um corpo não é envenenado só biologicamente quando consome algum tipo de alimento contaminado, ele também é envenenado pelos signos culturais. A anoréxica esta envenenada de padrões que ela consome para ser bela, ela traz tatuada na carne a intoxicação de um corpo que se alimenta de sua própria fome de ser belo e definha como que por um processo de auto-fagia, porque a beleza é verbo.

    Para Garrini (2007) ter um corpo “perfeito”, “bem delineado”, “em boa forma” consagra o homem e representa a vitória sobre a natureza, o domínio além do seu corpo, o controle do seu próprio destino.

    Hoje somos o que aparentamos. Estamos, portanto, expostos ao olhar do outro, sem lugar para se esconder, se refugiar. Estamos totalmente a mercê do outro, já que o que existe está à mostra. Somos vulneráveis ao olhar do outro, mas, ao mesmo tempo, precisamos desse olhar, de sermos percebidos; caso contrário, não existimos. O olhar do outro serve, assim, como uma espécie de referência sobre o nosso próprio corpo, sobre nossa estética, sobre os modos de nos vestirmos.

    Sob este viés, na menção de Garrini (2007) o corpo passou a ser um valor cultural que integra o indivíduo a um grupo, e ao mesmo tempo o destaca dos demais. Privilegia-se a aparência como um fator fundamental para o reconhecimento social do indivíduo.

    Cada vez mais o discurso da beleza dita normas que viram regras para muitos que pautam sua rotina diária na busca constante destes ideais de beleza. Busca-se o tônus muscular, o cabelo sem grisalhos, a barriga sem gordura e a pele jovem e macia. Segundo Garrini (2007):

    cada vez mais, há interesse pelas mediações que contemplam o consumo exacerbado da preparação do corpo na tentativa de retardar o envelhecimento corporal com cirurgias plásticas, implantes de silicones, tratamentos estéticos para pele, cabelos, além de exercícios em parques e academias de ginásticas e musculação.

    A pele, como superfície de contato do corpo com o mundo externo, cada vez mais tem sido alvo de investimentos científicos na área da estética e da saúde. E por consequência o “mercado da pele” também acaba por crescer pautado na ciência e no mercado da beleza e da juventude.

    A beleza como componente cultural é marca de toda e qualquer cultura, de toda e qualquer época histórica. O movimento dessas re-des-construções dos signos de beleza estão muito ligados a questões cientificas – que cada vez mais buscam e criam estratégias tecnológicas avançadas – e a questões econômicas – que se apropriam dessa ciência para lançar seus produtos no “mercado do corpo”. A pele tem uma “sessão com muitas prateleiras” dentro desse mercado.

    A maquiagem é um dos principais elementos nesse jogo de aparências que tem por objetivo manipular os traços naturais através da arte. É dada a pele um tom de beleza com a manipulação de cosméticos que nela são aplicados a fim de dar cores e exaltar a beleza dos traços e contornos do rosto.

    Na pré-história, mulheres e homens utilizavam cores extraídas da terra, de frutos, flores, perfumes, óleos, penas de pássaros, peles de animais, pedras preciosas e mil outras coisas, para embelezamento, mostrando aos outros, que eram diferentes.

    O realce dos olhos, bocas e bochechas, são os principais ingredientes de uma boa maquiagem e vem sendo utilizados desde os tempos do Egito Antigo e da Grécia, porém na época eram produtos usados pelos nobres, e a realeza. No entanto, a partir do século XX a maquiagem começou a ser comercializada com preços mais acessíveis.

    Atualmente a maquiagem é a peça chave para melhorar a aparência, e por esse motivo muitas pessoas trabalham e ganham dinheiro nesse meio. Pois as mudanças do corpo causadas pela temporalidade biológica, faz com que cada vez mais indivíduos busquem pelo retardo do envelhecimento procurando assim o seu ideal estético, funciona (GOETZ et al., 2008).

    Ficar velho está ficando cada vez mais difícil dentro do contexto da modernidade onde a cada dia a longevidade e o prolongamento da juventude vão se popularizando como que um “valor moral” – condição – do qual as pessoas precisam se enquadrar. A pele, como ícone da manifestação da juventude é alvo que exige do sujeito cuidado e atenção para que o mesmo se aproprie de posturas a fim de se constituir como sujeito pertencente ao grupo dos belos e dos jovens.

    Neste sentido, como menciona Ortega in Rago, Orlandi e Veiga-Neto (2005) o modelo biomédico dominante define o envelhecimento exclusivamente em termos de declínio à idade adulta, como um estado patológico, uma doença a ser tratada. Os sinais da idade tornaram-se marcas de aversão e patologia.

    Ao mesmo tempo a velhice é reconstruída como um estilo de vida mercadológico que conecta os valores mercadológicos da juventude com as técnicas de cuidado corporal para mascarar a aparência (KATZ apud MORRIS, 2000 in ORTEGA, 2005).

    Para Teixeira (2001) essa valorização da juventude, afirma que na área dos cosméticos “qualquer um que inventar um produto rejuvenescedor pode transformar-se da noite para o dia num bilionário”.

    a mídia, apresentada aqui como um meio de reproduzir divulgar e formar conceitos, há décadas estampa em suas capas modelos de mulheres, para serem o exemplo de corpo a ser seguido. Com esforço e trabalho físico, homens e mulheres são persuadidos a alcançar a aparência desejável. As revistas também abordam notícias sobre dietas, moda, beleza. E assim paralelamente parece multiplicar-se academia, spas, centros estéticos, tratamentos fisioterápicos, entre outros meios que visam promover o corpo saudável. (LACERDA e QUEIRÓS, 2004).

    Milani, João e Farah (2006) e Mondo e Rosas (2010) citam que nesse âmbito dermato-funcional, a fisioterapia estética vem se destacando, podendo atuar em várias disfunções faciais e corporais. A comprovação científica dos métodos e técnicas utilizadas pela fisioterapia mostra a eficácia no tratamento de enumeras patologias. (SILVA; VINADÉ e COSTA, 2010).

    Mas também contamos com uma “ajudinha” da linguagem utilizada em reportagens, quando diz respeito aos males enfrentados para atingir o ideal de beleza. (LACERDA e QUEIRÓS, 2004). Oening e Braz (2010) citam como exemplo, o fibro edema gelóide mais conhecido como celulite que é uma afecção que provoca deficiência na circulação sanguínea e linfática. Porém esse é abordado pela mídia como “furinhos” que podem ser solucionados com novos tratamentos. O mercado da beleza cresce incontrolavelmente e a tecnologia tem que acompanhar, pois as pessoas buscam o novo para alcançarem seus objetivos. (LACERDA e QUEIRÓS, 2004).

    Na menção de Ribeiro (2010) a mídia vai ainda mais além, conjugando cirurgia plástica a um ideal de beleza moderno, você pode ter um corpo perfeito sem fazer tanto esforço “é melhor tirar, do que malhar”. A citação abaixo é a evidência do que afirmamos, é melhor submeter o corpo a uma lipoaspiração do que criar hábitos saudáveis de atividade física:

    para que as veias se contraiam e o sangramento seja menor, o cirurgião injeta meio litro de soro fisiológico misturado com adrenalina nas partes do corpo previamente demarcadas com pincel atômico. São oitenta picadas em menos de dois minutos. O ritmo frenético não para. Através de um corte de 1 centímetro de largura feito pouco acima cóccix, o médico introduz uma cânula com 30 centímetros de comprimento e 4 milímetros de diâmetro, parecida com um espeto de churrasco feito de teflon. A gordura entra por um buraco na ponta e é sugada pela cânula. A sucção pode ser feita tanto por uma seringa com vácuo encaixada no final da cânula quanto por um tudo plástico ligado a um aparelho aspirador (...). O médico empurra e puxa o espeto sem parar (...). Depois de quinze minutos cavoucando para direita e para esquerda, ele descansa (...). É preciso um pouco de força e velocidade para vencer as placas de gordura (...). Terminada a cirurgia o médico sai da sala e tira o avental. Sua camisa está encharcada de suor. (GOLDENBERG e RAMOS in GOLDENBERG 2002, p. 22).

    A violência que o corpo sofre com uma lipoaspiração é digna de comparação com os suplícios realizados no século XVII em Paris muito bem descritos por Foucault (2001) na obra “Vigiar e punir”. Porém a cirurgia estética e suas violências estão cada vez menos doloridas, pois a tortura gerada pela dor é compensada pelo olhar do outro e pelo reconhecimento social. Doce submissão que muitas mulheres hoje sustentam vitimizadas por uma cultura de consumo machista.

    Mesmo que tais procedimentos possam ter altos custos emocionais, físicos e/ou financeiros, eles se justificam amplamente pelas recompensas emocionais, sociais e/ou materiais proporcionadas pela beleza ou pela dissimulação de imperfeições propiciadas por eles (TEIXEIRA, 2001.)

    A cultura da estética na contemporaneidade acaba subjetivando as mulheres, questionando sua verdadeira identidade (corpo), ou seja, não se permite ter rugas, envelhecer, ou ter uma pinta no rosto, isso é sinal de irregularidade estética, portanto tida como feia – fora do padrão. Há uma batalha contra o tempo, inimigo feminino, batalha esta totalmente desleal onde há uma manipulação e um mercado de massa envolvido.

    Não há como escapar, a juventude é a condição necessária para a beleza, e a velhice a condição quase que suficiente para sua ausência, e isso se justifica, pois a medida que a idade avança, a velhice deteriora o corpo, acentua o que já não era belo ou lhe retira a beleza que ostentava (TEIXEIRA, 2001).

    Cada ruga, cada grama, leva-a ao desespero. Aprisionada as máquinas, ao personal trainner, as drogas anabolizantes, essa mulher se vê como escrava da imagem de Barbies, Xuxas, Galisteus e quejandos. Ela é cada vez mais aquilo que o outro quer que ela seja, precisa ou deixa que ela seja (DEL PRIORE, 2000, p. 94)

    Na menção de Lacerda e Queirós (2004) parece que o corpo que temos não passa de um corpo-rascunho, o qual está sempre em situação provisória, sujeito a qualquer intervenção, para alcançar o a perfeição, que na maioria das vezes teima em não chegar.

    Na menção de Russo (2005) somos assim pressionados culturalmente a concretizar em nosso corpo, o corpo ideal que a nossa cultura nos impõe. Para tal temos uma infinidade de produtos a serem consumidos. E assim, o corpo se instaura quase que como uma religião. Permeados pela tríade cultura, ciência e mercado estabelecemos nossos rituais sagrados, pois nosso corpo é também o “corpo nosso de cada dia”. Amém.

Considerações finais

    Ao final deste escrito podemos perceber que o corpo hoje, não é só o que temos, mas o que somos, é nossa identidade, nos facilita ou dificulta a relação com os outros. Vários signos de posicionamento social criam-se em torno do corpo. Estes signos são criados culturalmente e fazem girar toda uma tecnologia cientifica, todo um mercado.

    Isso se materializa quando observamos que em muitos momentos este corpo é objeto de valorização exagerada dando oportunidade de crescimento no “mercado do músculo” e ao consumo de bens e serviços destinado à “manutenção deste corpo”. Entretanto, o corpo ideal não diz respeito somente ao controle do peso e das medidas, revela também funções psicológicas e morais. Pois deixar-se feio é interpretado como uma má conduta pessoal, então o desconforto social e a baixa auto-estima são sem dúvidas as principais queixas dos pacientes que buscam seu ideal de beleza.

    Sendo assim, mudar seu corpo é também mudar sua vida, e as intervenções estéticas decorrentes desse processo traduzem-se em gratificações sociais. Assim para nós profissionais da área da saúde que estamos aptos a atuar nesse meio que cresce incontrolavelmente, devemos estudar, criar, e nos aprofundar sobre esse males que assombram a todos que buscam pelo seu ideal de beleza.

    Os estudos dos profissionais da área da saúde não podem se reduzir as suas dimensões biológicas, mas também em nível da sociologia, antropologia e da filosofia. Todas estas áreas do conhecimento precisam ser utilizadas enquanto ferramentas de reflexão crítica num esforço para redimensionar a compreensão do corpo a partir de suas vinculações sociais, políticas e econômicas permeadas sempre por um contexto cultural.

    Ao provisório término deste texto tem-se a consciência de que ele, como todo trabalho, será sempre (re)interpretado à luz de novas teorias, fatos e documentos. O tempo e a história sempre terão novos olhares para novas reflexões e interpretações, pensar diferente seria ir a desencontro à essencialidade do mesmo.

Referencias

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