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Apontamentos sobre a carreira de Rolando Ferreira Júnior

sob a perspectiva de alguns conceitos de Pierre Bourdieu

Apuntes sobre la Carrera de Rolando Ferreira Junior bajo la perspectiva de algunas ideas de Pierre Bourdieu

 

Graduandos em Educação Física

UFPR

(Brasil)

Amanda Letícia Nunes Perna

Cristiano Copetti Rodriguez | Elaine Aparecida de Oliveira

Murilo Fernando Junkes Vieira | Neri Carneiro Lobo Júnior

Nicolly Janine Batista | Yuri Rafael Dias

ccr142@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          A elaboração deste artigo tem por objetivo analisar a carreira do ex-atleta Rolando Ferreira Júnior fazendo um paralelo entre o seu ingresso no basquetebol e sua passagem pela Liga Americana de Basquete (NBA), utilizando como referencial teórico alguns conceitos do sociólogo francês Pierre Bourdieu e as suas conseqüentes influências.

          Unitermos: Pierre Bourdieu. Rolando Ferreira Júnior. NBA. Basquetebol.

 

          Trabalho apresentado à disciplina História da Educação Física, sob a orientação do professor André Mendes Capraro.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 164, Enero de 2012. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    O basquetebol foi trazido ao Brasil por Augusto Shaw no ano de 1894, sendo um dos primeiros países a conhecer a modalidade que se difundiu rapidamente entre as mulheres e posteriormente entre os homens, e teve como primeiro clube o América Futebol Clube. As primeiras competições de basquetebol realizadas neste país começaram no ano de 1912, seguidos pelo primeiro torneio da América do Sul, em 1915. A seleção brasileira foi convocada pela primeira vez em 1922, para os Jogos Latino-Americanos, e em 1933 foi criada a Federação Brasileira de Basquetebol.1

    Durante o período de adaptação a esse esporte no Brasil, a modalidade passou por crises e exaltações2, que por fim caracterizam o basquetebol atual. É hoje um dos principais esportes no mundo e o Brasil, dentro deste sub-campo3, já consagrou vários atletas4 e conquistou vários campeonatos5. Apesar de não ser incorporado por toda a população brasileira, tem crescido e alcançado lugares mais altos, inclusive com representantes nas ligas européias e na mais conhecida e importante liga do basquetebol americana, a NBA.

Rolando Ferreira Júnior. Foto: jornaldelondrina.com.br (09/09/2011)

    Ao brevemente contextualizar o basquetebol mundial e, principalmente, o brasileiro, é relevante tentarmos compreendê-lo a partir de alguns conceitos de Pierre Bourdieu: campo esportivo, capital simbólico e poder simbólico. Tal exercício – ainda que em estágio inicial – será balizado na vida de um jogador brasileiro desta modalidade, Rolando Ferreira Júnior. A proposta, então, consiste em melhor compreender (racionalizar) as atitudes tomadas por atletas, técnicos, preparadores físicos e todos os envolvidos no sub-campo basquetebol.

    De modo didático, tendo em vista que se trata de uma pesquisa de iniciação científica, apresentaremos inicialmente as relações existentes entre os conceitos sociológicos, para, na seqüência, os correlacionarmos à carreira de Rolando Ferreira Junior, mostrando sinteticamente sua influência no sub-campo basquetebol e seu poder e capital simbólico adquiridos durante e após sua carreira na NBA.

Breves considerações sobre alguns conceitos de Pierre Bourdieu

    Iremos fazer uma breve apresentação dos principais conceitos deste sociólogo, sendo eles: Campos, Habitus e o de Capital Simbólico, de maneira que este último se divide em três outras vertentes: Capital Social, Cultural e Econômico.

    Bourdieu explica a Teoria dos Campos como: "espaços estruturados de posições (ou de postos) cujas propriedades dependem das posições nestes espaços, podendo ser analisadas independentemente das características de seus ocupantes (em parte determinadas por elas)" (BOURDIEU, 1983, p. 89).

    Em suma, o campo é um espaço de luta, e busca definir quais os seus objetos de disputa e quais são os seus interesses particulares dentro de cada sub-campo, sendo que estes são discutidos e percebidos somente por pessoas com um embasamento suficiente para atuar no campo. Como o próprio Bourdieu cita: "é preciso que haja objetos de disputas e pessoas prontas para disputar o jogo, dotadas de habitus que impliquem no conhecimento e reconhecimento das leis imanentes do jogo, dos objetos de disputas, etc." (BOURDIEU, 1983, p. 89).

    Já o conceito habitus, o sociólogo define da seguinte maneira: “O habitus, sistema de disposições adquiridas pela aprendizagem implícita ou explícita que funciona como um sistema de esquemas geradores, é gerador de estratégias que podem ser objetivamente afins aos interesses objetivos de seus autores sem terem sido expressamente concebidos para esse fim. Há toda uma reeducação a ser feita para escapar à alternativa entre finalismo ingênuo [...] e a explicação do tipo mecanicista (que tornaria esta transformação por um efeito direto e simples de determinações sociais). Quando basta deixar o habitus funcionar para obedecer à necessidade imanente do campo, e satisfazer às exigências inscritas (o que em todo campo constitui a própria definição de excelência, sem que as pessoas tenham absolutamente consciência de estarem se sacrificando por um dever e menos ainda o de procurarem a maximização do lucro específico). Eles têm assim, o lucro suplementar de se verem e serem vistos como perfeitamente desinteressados “ (BOURDIEU, 1983, p. 94).

    Simplificando a citação, o habitus gera e organiza as práticas sociais e é ele o responsável pela geração de normas e regras que vem de encontro a um grupo específico, criando assim uma sucessão de condutas e afins. O habitus é de certa forma um produto do funcionamento do campo e por conseqüência uma condição para que este exista.

    Em relação ao Capital Simbólico ele diz que: “[…] o poder simbólico é, com efeito, esse poder invisível o qual só pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que não querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo o exercem.” (BOURDIEU, 1989, p. 08)

    “O reconhecimento do poder simbólico só se dá ‘na condição de se descreverem as leis de transformação que regem a transmutação das diferentes espécies de capital em capital simbólico e, em especial, o trabalho de dissimulação e de transfiguração (numa palavra, de eufemização) que garante uma verdadeira transubstanciação das relações de força fazendo ignorar-reconhecer a violência que elas encerram objetivamente e transformando-as assim em poder simbólico, capaz de produzir efeitos reais sem dispêndio aparente de energia’” (BOURDIEU, 1989, p. 15).

    Podemos entender o capital simbólico então como um símbolo de poder de um grupo em relação ao outro seja ele cultural, econômico ou social que define qual a instituição dominante e qual a instituição dominada. Toda instituição possui um poder simbólico mesmo que este não atinja um nível muito considerado e é ele o responsável pela violência simbólica que acarreta em lutas cotidianas pelo monopólio do poder dentro do campo.

Uma reflexão pautada na vida profissional de Rolando Ferreira Júnior

    Apresentados os conceitos do sociólogo, iremos associá-los à vida e carreira de Rolando Ferreira Júnior. Paranaense de 2 metros e 14 centímetros de altura começou a jogar basquetebol no Colégio Estadual do Paraná, no ano de 1976; em 1978 começou a treinar no Círculo Militar do Paraná e logo após foi convidado a jogar em São Paulo. Em 1984 foi convocado para seleção brasileira e em 1988 foi jogar na NBA. Como primeiro brasileiro a entrar na Liga; foi a partir do Time da Universidade de Houston que o atleta ingressou na NBA e pelo Portland Trail Blazers que jogou durante um ano e meio, período no qual se profissionalizou. Hoje, professor da Universidade Tuiuti do Paraná (UTP), Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Colégio Medianeira e Clube Duque de Caxias. Tem formação de graduação e mestrado em Educação Física, pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).

    Em contato realizado no dia 04 de junho de 2011 com Rolando Ferreira Júnior, perguntamos sobre mudanças apresentadas em sua vida em relação ao capital simbólico, poder simbólico e o conceito de campo, após e durante sua passagem pela Liga Norte-Americana. O jogador afirmou que adquiriu, nas suas próprias palavras, “[...] muito status simbólico, por ter sido o primeiro brasileiro a entrar na NBA, mas não passou disso.”

    As mudanças apresentadas em sua vida foram consideráveis: primeiro foi convocado para a seleção paranaense e depois a brasileira; seguiu sua carreira na NBA, o que influenciou o início da carreira de muitos jogadores; como o atleta afirma: “Fui um exemplo. Não era uma coisa impossível de ser alcançada”. Como primeiro brasileiro na Liga Norte-Americana, abriu portas para o Brasil no exterior, de modo que, ao voltar, todas as questões referentes à NBA, era o indivíduo mais consultado. Acrescentou ainda: “Eu lutei pra chegar lá, mas não lutei para me manter lá”.

    Explorando um pouco mais de seu capital simbólico adquirido, podemos falar sobre sua participação em duas Olimpíadas: Seul (1988) e Barcelona (1992). Como explicou o atleta, possuía ainda status suficiente para ter participado de uma terceira (Atlanta, 1996), porém havia sofrido uma lesão e não poderia participar dos treinos, de qualquer forma, o técnico da seleção brasileira da época sabia de seu potencial e o convocou. Contudo, Rolando não achou justo com os outros atletas que estavam participando regularmente das preparações e recusou o convite.

    Outro aspecto importante para ressaltar está no fato de que durante sua estada na NBA o jogador recebeu importantes propostas de contrato com empresas como Nike e Tiger, sendo que neste momento era muito seleto o grupo de atletas que obtinham chances de contrato com esta última.

    Futuramente esses contratos acabaram não vingando por uma “falta ou falha de comunicação” entre o atleta e as empresas interessadas. A primeira proposta feita ao atleta foi da empresa Tiger, seguida pela Nike que também demonstrou interesse em financiar o jogador. Após um tempo analisando as duas propostas Rolando Ferreira Júnior optou por efetuar o contrato com a Tiger, pois traria a ele naquele momento um maior nível de status, então recusou o contrato com a Nike. Ao contatar a empresa Tiger para assinar os documentos necessários foi informado que os recursos financeiros da mesma tinham se esgotado e não haveria mais a possibilidade de contrato. Assim entrou novamente em contato com a Nike para tentar resgatar a proposta de contrato, porém a Nike informou-lhe que já tinha fechado todos os contratos pendentes e que não havia mais nenhuma verba disponível para incorporá-lo ao grupo de atletas que a Nike financiava. Desta maneira o jogador acabou desprovido de qualquer patrocínio ou representação comercial devido a uma busca por maior status.

    O conceito de habitus, como explicado anteriormente, dita as regras e organiza o sub-campo. Possui especificidades dentro de cada sub-campo, porém, na visão do atleta, não é um conceito que pode ser relacionado diretamente com sua carreira, e sim ao campo esportivo.

    Em relação à teoria dos campos, Rolando Ferreira Júnior afirmou que no sub-campo do basquetebol, a principal relação com sua carreira que pode ser afirmada é a de poder simbólico, que “fica muito mais evidente e clara”.

    Sobre a influência atual no basquetebol, o jogador afirma que é influente em termos, pois a balança do poder simbólico não é estática, assim, em Curitiba, ainda possui um poder maior, mas nacionalmente seu poder é mais restrito aos conhecedores do esporte. Ter reconhecimento apenas por seu nome vai contra seus princípios morais, pois quer ser visto e acessado pelas pessoas por seu reconhecimento profissional e pessoal.

Considerações finais

    A partir dos conceitos apresentados e dos próprios relatos do atleta podemos concluir que o principal conceito que podemos correlacionar à carreira de Rolando Ferreira Júnior é o de poder simbólico, que teve seu auge na entrada do atleta na NBA, mas que hoje se restringe a um índice menor, conseqüentemente sua influência no sub-campo basquetebol também se restringiu.

    O atleta teve uma importante colaboração para a realização deste artigo por ser Mestre em Educação Física, tendo estudos referentes diretamente aos conceitos de Pierre Bourdieu, além de sua vivência prática no esporte. Desta forma facilitou a comunicação entre os autores deste artigo e o agente pesquisado.

Notas

  1. Sítio: http://www.cbb.com.br/conheca_basquete/basquete_no_brasil_new.asp - acessado em 16/06/2011.

  2. Estas crises e exaltações são caracterizadas pelas dificuldades e alterações feitas desde a criação do basquetebol em 1891, as quais foram realizadas pelo próprio criador (James Naismith) para tornar o jogo menos agressivo e que fosse possível de realizá-lo no rigoroso inverno de Massachussets.

  3. O sub-campo é uma subdivisão de campo, conceito sociológico do filósofo Pierre Bourdieu, e define objetivos de disputa e interesses particulares referentes a um interesse maior, dos campos sociológicos.

  4. Atletas estes que podemos exemplificar com o nosso agente de pesquisa, Rolando Ferreira Júnior, e jogadores brasileiros da NBA em 2008/2009 como Leandro Matheus Barbosa, Maybyner Rodney Hilário e Anderson Varejão.

  5. Em Pan-americanos, o basquetebol brasileiro participou de 14 edições do torneio masculino e 13 no feminino. Foram quatro vezes em que os rapazes conquistaram a medalha de ouro: Cáli, na Colômbia (1971); Indianápolis, nos Estados Unidos (1987); Winnipeg, no Canadá (1999) e Santo Domingo, na República Dominicana (2003). No feminino conquistou três títulos: Winnipeg, no Canadá (1967); em Cáli, na Colômbia (1971); e em Havana, Cuba (1991). 

Referências

  • BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Lisboa: DIFEL, 1989.

  • BOURDIEU, Pierre. Questões de Sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983.

  • BOURDIEU, Pierre. Coisas Ditas. São Paulo: Brasiliense, 1990.

  • Entrevista com o jogador Rolando Ferreira Júnior. Data: 04 de junho de 2011.

  • FERREIRA Jr., Rolando. NBA, CBB e NLB: Relações de Poder no Universo Organizacional do Basquetebol Brasileiro. Dissertação de Mestrado em Educação Física, 2008.

  • FERREIRA Jr., Rolando; Cavichiolli, Fernando Renato; Augusto, Vitor do Nascimento. NBA, NLA e as Ligas Européias: uma leitura através de conceitos sociológicos. Curitiba, 2008.

  • http://www.cbb.com.br/index.asp - acessado em 16/06/2011.

  • http://www.coladaweb.com/educacao-fisica/basquete - acessado em 16/06/2011.

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