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Uma história do futebol feminino brasileiro: superando preconceitos

Una historia del fútbol femenino brasileño: superando prejuicios

 

*Licenciado em Educação Física. Mestre e Doutor em Educação pela USP

Atualmente é professor Adjunto I do Departamento de Educação Física

da Universidade Federal de Lavras, UFLA

**Licenciado em Educação Física. Mestre em Educação pela PUCCAMP

Atua como professor e coordenador dos Cursos de Bacharela e Licenciatura

em Educação Física da Faculdade de Pindamonhangaba, FAPI

Prof. Dr. Fabio Pinto Gonçalves dos Reis*

fabioreis@def.ufla.br

Prof. Ms. Ivan Eduardo de Abreu Arruda**

profivanarruda@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O artigo analisa a participação da mulher no futebol brasileiro, com o objetivo de evidenciar que há muito tempo as mulheres protagonizam histórias de superação no futebol brasileiro, ainda que tenham pouca visibilidade, seja na mídia esportiva, clubes e associações esportivas, na educação física escolar ou nas políticas públicas. Constatou-se que mesmo com toda essa problemática, as mulheres brasileiras têm conseguido se adentrar no universo futebolístico, alcançando lugares de destaque independente do setor em que estiverem inseridas, pois a vontade de jogar ou o amor pelo futebol é mais forte que qualquer tipo de pressão ou discriminação social

          Unitermos: Mulher. Futebol institucionalizado. Preconceito.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 163, Diciembre de 2011. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Existe uma parte da história do futebol no Brasil que é menos conhecida, é a que diz respeito à inserção da mulher nesse “mundo” eminentemente masculino. Não há dúvidas que o número de mulheres atuantes no futebol brasileiro tenha aumentado quando comparado às décadas anteriores, bem como são expressivas as conquistas que elas alcançaram no decorrer destes anos, como a participação em Olimpíadas e Mundiais e o credenciamento de árbitras na Federação Internacional de Futebol (FIFA), situações estas que vem marcando a trajetória feminina no universo futebolístico.

    E nos dias atuais, as mulheres continuam ampliando a sua participação no futebol brasileiro? E no futebol mundial, as nossas brasileiras possuem alguma contribuição para a sua crescente evolução? Como será o futuro dessa e outras mais mulheres que vierem a se inserir no mundo do futebol? São questionamentos como esses que tentaremos esclarecer no decorrer desse texto, pois este trabalho discute a participação da mulher no futebol brasileiro, com o objetivo de evidenciar que há muito tempo as mulheres protagonizam histórias de superação de barreiras no futebol brasileiro, ainda que tenham pouca visibilidade, seja na mídia esportiva, clubes e associações esportivas, na educação física escolar ou nas políticas públicas.

    Para analisar a inserção feminina no futebol, foi necessário utilizar como fontes de pesquisa livros de esportes e educação física, matérias jornalísticas, periódicos, publicações recentes sobre a temática e a consulta a arquivos de instituições de renome no futebol brasileiro e mundial. Por intermédio da análise dos conteúdos foi possível desenvolver este artigo que foi dividido em duas partes, sendo relatado inicialmente, um breve histórico da evolução da participação feminina no futebol brasileiro e por último, a situação atual da mulher brasileira no contexto da institucionalização do futebol. E, no decorrer do texto, poderemos perceber se a sociedade brasileira ainda considera que futebol é uma área reservadamente masculina, ou seja, se é coisa pra “macho”.

Perspectivas históricas do feminino no futebol brasileiro

    O futebol foi criado na Inglaterra no século XIX, com indícios de práticas semelhantes há centenas de anos atrás. O processo de esportivização do futebol levou-o a se espalhar pelo mundo, inclusive no Brasil, onde sofreu uma série de transformações que popularizou e massificou o esporte, integrando-o em nossa cultura, consolidando-o como o esporte “número um” da sociedade brasileira a partir da segunda metade de século XX.

    Devido a esta aculturação, surge em nossa sociedade uma crescente busca pelo esporte e a necessidade em acompanhar os seus principais acontecimentos, que de acordo com Salles, Silva e Costa (1996) absorvem a atenção de milhões de espectadores, indiferente às condições sociais, políticas, religiosas e de gênero.

    Ao passo que o futebol ganhava preferência nacional, os esportes de elite como o remo e a equitação foram perdendo espaço, inclusive entre as mulheres, que passaram a ir aos gramados como se estivessem indo a uma festa, e assim elas se aproximavam do futebol como torcedora comportada e recatada nas arquibancadas dos estádios. Entretanto, no momento em que o futebol passou a ser praticado por negros e pessoas de classes populares houve um afastamento da presença feminina no meio futebolístico, onde as mulheres não deveriam mais ir aos estádios e nem se misturar com os jogadores, pois as mulheres que se envolvessem neste esporte seriam marginalizadas, não sendo consideradas de “boa família”.

    Conforme Salles, Silva e Costa (1996), as primeiras partidas de futebol feminino foram realizadas na Praia do Leblon, em 1975, por um grupo de empregadas domésticas. Uma outra versão para o inicio do futebol feminino seria a ocorrência de um jogo beneficente realizado por atrizes do teatro de revista (vedetes), cariocas e paulistas, em 1959 no estádio do Pacaembu.

    Thomaz Mazzoni (apud Franzini, 2005) defende a teoria de que o futebol feminino teria ocorrido pela primeira vez em 1940, no confronto entre paulistas e cariocas, disputado no Pacaembu entre equipes do São Paulo Futebol Clube e do América Futebol Clube, enquanto Witter (1990) afirma que o 1º jogo de futebol feminino teria sido disputado em 1913 em São Paulo, no Tremembé Futebol Clube, entre times dos bairros da Cantareira e do Tremembé.

    Ao passo que as mulheres se levantavam de seus lugares nas arquibancadas e adentravam no gramado, os jornais brasileiros da década de 1940 reconheciam a existência de 10 equipes de senhoritas futebolistas em regular atividade na cidade do Rio de Janeiro. Estas equipes não representavam os grandes clubes cariocas, e sim clubes constituídos nos subúrbios cariocas, com enormes problemas estruturais, mas que proporcionavam as mulheres a oportunidade praticarem futebol, independente de ser a modalidade de praia, campo, salão ou society.

    O Primavera Futebol Clube para formar a sua equipe feminina publicou um anúncio em um jornal local, convocando moças de 15 a 25 anos a comparecerem na sede do clube para ingressarem no futebol. O surgimento destes times despertou amores e ódios entre jornalistas e desportistas brasileiros. Enquanto os jornais paulistas destacavam com grande entusiasmo as partidas de futebol feminino, creditando seriedade ao movimento, desportistas cariocas recebiam com estranheza e preocupação as notícias que chegavam dos subúrbios cariocas. A preocupação e a indignação foi tanta que, José Fuzeira escreveu e enviou uma carta ao presidente Getúlio Vargas em abril de 1940, solicitando a sua atenção para a calamidade que estava para acontecer com a juventude feminina brasileira. A carta possuía o seguinte conteúdo:

    Refiro-me, Senhor Presidente, ao movimento entusiasta que está empolgando centenas de moças, atraindo-as para se transformarem em jogadoras de futebol, sem se levar em conta que a mulher não poderá praticar esse esporte violento sem afetar seriamente, o equilíbrio fisiológico das suas funções orgânicas, devido à natureza que a dispôs a ser mãe. (...)

    Ao que dizem os jornais, no Rio já estão formados nada menos de 10 quadros femininos. Em São Paulo e Belo Horizonte também já estão constituindo-se outros. E, neste crescendo, dentro de um ano é provável que, em todo o Brasil, estejam organizados uns 200 clubes femininos de futebol, ou seja: 200 núcleos destroçadores da saúde de 2.200 futuras mães, que, além do mais, ficarão presas de uma mentalidade depressiva e propensa aos exibicionismos rudes e extravagantes; pois, desde que já se chegou à insensatez inqualificável de organizar-se pugnas de futebol com um grupo de cegos a correrem, às tontas, atrás de uma bola cintada de guizos, não será de admirar que o movimento feminino a que nos estamos reportando seja o ponto de partida para, no decorrer do tempo, as filhas de Eva se exibirem também em assaltos de luta livre e em justas da “nobre arte”, cuja nobreza consiste em dois contendores se esmurrarem até ficarem babando sangue. (apud FRANZINI, 2005, p. 05).

    A carta foi encaminhada do gabinete da presidência à divisão de Educação Física do Ministério da Educação e Saúde que, repassou o conteúdo da carta à sua subdivisão de Medicina Especializada, que deu parecer favorável à proibição da prática do futebol por mulheres. Todos estavam preocupados com os riscos que o futebol poderia causar a saúde da mulher, principalmente na sua capacidade reprodutiva. Logo em seguida a este fato, o jornal A Gazeta Esportiva publicou em junho do mesmo ano a opinião do primeiro médico brasileiro especialista em medicina esportiva, o Dr. Leite de Castro, sobre a prática do futebol feminino. A reportagem explicava:

    (...) não é no futebol que a juventude feminina se aperfeiçoará. Pelo contrário, é o futebol o esporte que lhe trará defeitos e vícios; alterações gerais para a própria fisiologia delicada da mulher, além de outras conseqüências de ordem traumática, podendo comprometer seriamente os órgãos da reprodução (ovário e útero) (apud FRANZINI, 2005, p. 06).

    A função da mulher era de contribuir para o fortalecimento da nação, gerando filhos saudáveis e, para que isto fosse alcançado era necessário que as mulheres preservassem a sua saúde, portanto o futebol feminino representava um “desvio de conduta” inaceitável aos olhos do Estado Novo e da sociedade. Todas estas ações contrárias ao desenvolvimento da modalidade levaram o governo a instituírem o Decreto-Lei nº. 3199, o qual criava o Conselho Nacional Desportos (C.N.D.) e também proibia as mulheres de praticarem esportes incompatíveis com a sua natureza. Esta lei atendeu aqueles que condenavam a existência do futebol feminino, fazendo com que essa primeira tentativa de organização profissional da modalidade chegasse a um triste fim.

    No ano de 1965, o C.N.D. regulamentou instruções para as entidades desportivas do país através da Deliberação nº. 07/65, proibindo a prática entre as mulheres do futebol, futebol de salão, futebol de praia, entre outros esportes. Mesmo com esta proibição, muitas mulheres continuaram a praticar o esporte, como é o caso das empregadas domésticas cariocas, que se encontravam no Leblon para jogarem e, as atletas do Clube Federal, que inicialmente praticavam outros esportes e através de brincadeiras entre elas começaram a praticar o futebol, tornado esta entidade o 1º clube a implantar a prática do futebol feminino.

    Esta Deliberação perdurou até ano de 1979, quando foi revogada pelo próprio CND através da Deliberação nº. 10/79. Esta revogação permitiu a criação de departamentos de futebol feminino em vários clubes do país e, a fundação da 1ª Liga de Futebol Feminino do estado do Rio de Janeiro no ano de 1981, que realizou o 1º evento de futebol de praia feminino, na época noticiado nos jornais com diversas denominações: I Campeonato de Futebol de Praia Feminino do Rio de Janeiro; I Campeonato Feminino de Praia; I Torneio de Futebol de Praia do Rio de Janeiro; I Campeonato Estadual Feminino de Futebol de Praia.

Surgimento do futebol feminino institucionalizado no Brasil

    Constata-se que o futebol feminino institucionalizado iniciou-se em meados da década de 1980, pois esta prática começou a ter um pouco mais de reconhecimento. Foi em 1981 que surgiu um segundo clube de futebol de praia trabalhando com a categoria feminina: o Esporte Clube Radar, criado pela fusão de outras equipes de futebol de praia. Este fato deu repercussão à modalidade, gerando o interesse de diversas empresas a apoiarem e patrocinarem diversos campeonatos, algo que pode ser verificado através das denominações destes torneios e campeonatos, como é o caso do I Campeonato de Praia Feminino do Rio de Janeiro – Coppertone Open de Futebol Feminino, I Torneio de Futebol Society Feminino – Casas Pernambucanas, I Copa Regine’s Cinzano de Futebol Feminino e a Copa Unibanco de Futebol Feminino.

    Em 1983 houve a realização do I Campeonato Carioca de Futebol de Campo Feminino, o qual o E.C. Radar sagrou-se campeão, assim como nos anos posteriores (1984, 1985 e 1986), recebendo o título de Tetracampeão Estadual. Ainda no ano de 1981, realizou-se no Rio de Janeiro o Coppertone Copacabana Beach, com a participação de equipes internacionais da França, Espanha e Portugal, com ampla cobertura da mídia.

    A partir de então, com o reconhecimento do futebol feminino pelo C.N.D., a mídia passou a exibir os jogos, especificamente a Rede Bandeirantes, que detinha na época um grande espaço dedicado ao esporte e que para preencher estes espaços, abriu oportunidades para o futebol feminino, certamente por interesses econômicos e não para romper com os valores sexistas da sociedade.

    Pela primeira vez na história do Maracanã, em 1986, o Radar e a Portuguesa disputaram uma final de Campeonato Carioca de Futebol de Campo Feminino durante a preliminar do clássico Fla x Flu, partida esta que deu o título de Tetracampeão carioca ao clube Radar. O E.C. Radar colecionou títulos nacionais e internacionais de grande expressão, como o Tricampeonato da Taça Brasil (criado em 1983), o Tetracampeonato Brasileiro e o Campeonato Mundial Interclubes de 1987. Todas estas conquistas estimularam o nascimento de diversos clubes, dos quais a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) já havia cadastrado cerca de 40 mil jogadoras.

    Devido à inexistência de uma seleção brasileira feminina oficial, o E.C.Radar representou o Brasil no I Torneio Internacional de Futebol Feminino realizado na China em 1988, conquistando o 3º lugar, portanto, durante os anos de sua existência, o clube Radar serviu como referencial na formação da seleção brasileira, disputando também o Campeonato Mundial de Futebol Feminino em 1991, alcançando a 9ª colocação. Historicamente este clube teve grande importância no desenvolvimento do futebol feminino na década de 1980, sendo o seu presidente, o senhor Eurico Lyra, considerado o 1º grande incentivador do futebol feminino, por isso, com o encerramento das atividades do clube no ano de 1988, ocorreu uma estagnação temporária da modalidade, principalmente na cidade do Rio de Janeiro.

    Até o fim da década de 1980, o futebol feminino apresentou elevação técnica, aumento do nº. de praticantes, melhoria da estrutura das competições e o surgimento de novas equipes, não só no estado do Rio de Janeiro, mas também em São Paulo, Minas Gerais, Distrito Federal, Rio Grande do Sul, entre outros. Ao analisarmos a década de 1990, encontramos a criação do Campeonato Sul-Americano de Futebol de Campo, o qual a seleção brasileira conquistou o Tricampeonato invicto nas três primeiras edições do torneio (1991, 1995, 1998). Temos também a criação da Taça Brasil de Clubes de Futsal Feminino em 1992, competição que possui regularidade até os dias atuais e, mais duas edições do Mundial Feminino de Futebol de Campo Feminino, onde o Brasil manteve a 9ª colocação em 1995 na Suécia e conquistou a 3ª colocação em 1999 nos Estados Unidos.

    Foi a partir dos Jogos Olímpicos de Atlanta em 1996 que o futebol de campo feminino passou a ser considerado uma modalidade olímpica, onde a seleção brasileira alcançou um ótimo aproveitamento na competição, conquistando a 4ª colocação, assim como nos Jogos Olímpicos de Sydney em 2000. Sobre a atuação da seleção feminina em Atlanta o jornalista Maurício Cardoso, em seu artigo “Flores do Campo” publicado na Revista Veja de 30 de outubro de 1996, faz o seguinte comentário:

    Faz quinze anos que as mulheres jogam bola no Brasil, mas o futebol feminino nunca foi levado a sério. Até que veio a Olimpíada de Atlanta, em que o time brasileiro conseguiu um honroso quarto lugar e mostrou que o futebol também é coisa de mulher. Uma nova era começou. (apud SALLES, SILVA e COSTA, 1998, p.107).

    As Olimpíadas de Atlanta representou para a mulher desportista mais uma conquista, principalmente para a mulher brasileira, que se via limitada em relação a pratica do futebol. Devido a isto, ocorreu uma elevação na procura do futebol feminino pela classe média e com isso a mídia volta a se interessar pela modalidade, e novos torneio e campeonatos regionais passam a ser organizados. Entretanto para que essas competições se tornassem viáveis para a mídia, era necessário à valorização do atributo estético das atletas, tornando o empreendimento lucrativo. Ainda em reportagem da Veja, Cardoso diz:

    Como no futebol masculino, a competência dos jogadores é fundamental para transformar o esporte em um empreendimento comercial. Mas no jogo das mulheres, ao contrário dos homens, isso não é suficiente. Os clubes estão exigindo que além de saber bater sua bolinha às jogadoras sejam bonitas. (...)

    O Corinthians, de São Paulo (...) contratou Sisi, Márcia Taffarel e Roseli, jogadoras da seleção olímpica, e reforçou seu ataque com Millene, modelo de 17 anos (…) (apud SALLES, SILVA e COSTA, 1998, p.108).

    Nas edições do Campeonato Paulista de Futebol Feminino que estavam previstos para acontecer em 1997 e 2001, as jogadoras antes de tudo, precisavam ter o seu visual aprovado para poderem entrar em campo, ou seja, a competência técnica das atletas não se mostrava preponderante na formação de uma equipe, a mulher atleta passou a ser tratada como um enfeite, um bibelô, com o objetivo de enfeitiçar os olhos dos homens, para atrair mais público. Conforme Vasconcelos e Knijnik (2003), os dirigentes da Federação Paulista queriam unir a imagem do futebol à feminilidade, onde eles poderiam alcançar um campeonato tecnicamente bom e bonito.

    O futebol provocou e ainda provoca estigmas de difícil aceitação, pois não é incomum ouvirmos pessoas ou até mesmo a mídia dizer que tal atleta possui mais características masculinas do que femininas, quando não são chamadas de lésbicas ou sapatões. É fato que as lésbicas entram sem medo em espaços predominantemente masculinos, quebrando paradigmas contra sua discriminação, entretanto não é o esporte que dá origem ao homossexualismo, mas a sociedade que dá origem a homossexualidade no esporte. A reportagem do jornal O Dia de 24 de abril de 1997 reforça a presença desse estigma ao relatar os comentários da filha caçula de Garrincha[2] sobre o momento em que ela informou a mãe sobre a prática do futebol: “Ela só quer que eu arrume um namorado. Tem medo que pensem que eu sou sapatão, revela, aos risos”. (apud SALLES, SILVA e COSTA, 1998, p.113).

    Muitos jornalistas daquela época ainda se colocavam contra a existência do futebol feminino, por isso alguns deles publicavam reportagens discutindo as possíveis opções sexuais das jogadoras, como o trecho visto anteriormente, outros faziam à cobertura das partidas de forma irônica, desrespeitando a participação feminina no futebol, como podemos verificar na matéria de João C. Pedroso publicada no Jornal do Brasil de 13 de abril de 1997: “Ih! Não sei não, esse Vasco e Fluminense está muito esquisito. Muito toquinho, muita gentileza. Parece que tem um bando de mocinhas em campo. Parece não, torcedor incauto. Tem mesmo”. (apud SALLES, SILVA e COSTA, 1998, p.113).

    Todas essas barreiras não afetaram no desenvolvimento do 1º Mundial de Futebol de Campo Feminino na categoria Sub-19 que ocorreu em 2002 no Canadá, o qual a seleção brasileira conquistou o 4º lugar. Acompanhando o Mundial, ocorreram no mesmo ano o Campeonato Sul-Americano de Futebol de Campo Feminino Sub-19, competição esta que a seleção brasileira sagrou-se campeã e, o I Campeonato Brasileiro de Seleções de Futsal Feminino, do qual o time que representava o estado de São Paulo conquistou o título, ficando a seleção do Paraná em 2º lugar. No ano seguinte, a seleção brasileira conquistou novamente o Campeonato Sul-Americano, tornando-se Tetracampeã, novamente invicta e, conquistou também o título de campeã Pan-americano, na República Dominicana.

Considerações finais

    Constatou-se que as mulheres no decorrer da história, eram excluídas de algumas atividades sociais, como é o caso do esporte, na qual sua aceitação só passou a acontecer devido as lutas que muitas mulheres enfrentaram para que conseguissem alcançar esse e outros direitos.

    No futebol não poderia ser diferente, ainda mais por se tratar de um esporte que contempla a força e a virilidade masculina, aspectos contrários à característica feminina. Podemos dizer que a participação da mulher brasileira no futebol só foi e continua sendo possível graças a uma conjunção de fatores, entre eles destaca-se a resistência feminina, a democratização do país ocorrida a partir de 1980 e as discussões ocorridas no campo acadêmico da Educação Física/Esporte.

    Ainda hoje, as mulheres sofrem com as dificuldades e discriminações existentes para a inserção das mesmas no futebol brasileiro, como a falta de políticas públicas, escassez de campeonatos regulares em algumas regiões do país, salários inferiores ao adequado e pouco interesse da mídia. Mesmo com toda essa problemática, as mulheres brasileiras tem conseguido se adentrar no universo futebolístico, alcançando lugares de destaque independente do setor em que estiverem inseridas, pois a vontade de jogar ou o amor pelo futebol é mais forte que qualquer tipo de pressão ou discriminação social.

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