O exercício do bullying como prática excludente dos alunos do 7° ano do Ensino Fundamental El ejercicio del bullying como práctica excluyente de los alumnos de 7º año de Enseñanza Básica |
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*Discentes da graduação de licenciatura em Educação Física da Universidade Castelo Branco (UCB/RJ) **Co-orientador. Pós-graduado em elaboração e gestão de projetos sócio-esportivos pela UCB/RJ, graduado em Educação Física pela UCB/RJ *** Orientador. Mestre em Ciência da motricidade Humana pela UCB/ RJ Licenciado em Educação Física pela UCB/RJ. Docente da UCB/RJ (Brasil) |
André Luís Aleluia Lourenço* | Edinaldo Gomes* Fábio Tadeu Gallas Prata * | Nathalia dos Reis * Mário Amaral* | Francisco D’Urso* Prof. Esp. Mauricio Fidelis** Prof. Ms. Sérgio Tavares*** |
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Resumo O Bullying é um conjunto de ações violentas e repetitivas praticadas por um indivíduo ou grupo de indivíduos contra uma mesma vítima. São insultos, ameaças, acusações, gozações que levam a vítima à exclusão. Seus efeitos trazem danos psicológicos irreversíveis a suas vítimas, como depressão, insegurança e ansiedade. O bullying possui diversos tipos, podendo ser físico, verbal, sexual, psicológico ou virtual. Pode ocorrer em qualquer local onde as pessoas interajam, tendo maior destaque no meio escolar, sendo muito comum nas aulas de educação física. Ocorre, principalmente, em crianças de 11 a 14 anos e, é mais comum, nos alunos do 7° ano do Ensino Fundamental. Unitermos: Agressões e perseguições. Bullying. Ensino Fundamental.
Abstract Bullying is a set of violent and repetitive actions practiced by an individual or a group of individuals against the same victim. There are insults, threats, charges, jokes that lead the victim for the exclusion. Its effects bring irreversible psychological damages for its victims as depression, insecure and anxiety. Bullying has many types, they may be physical, oral, sexual, psychological or virtual. It can occur in any place where people interact with each other, taking the biggest highlights at school environment, being very common in physical education classes. It occurs, mainly, with children between 11 and 14 years old and, it’s more common with students of the 7° period of Elementary School. Keywords: Aggression and persecution. Bullying. Elementary School.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 163, Diciembre de 2011. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
A violência é um fator marcante na sociedade brasileira. É preocupante em todas as suas formas e variações, e não está restrita a determinada instituição ou região. Ela atinge todas as camadas da sociedade e seus efeitos são os mesmos, independente de classe social, religião ou sexo. A escola, como espelho dessa sociedade na qual está incluída, também sofre os prejuízos da violência.
Atitudes violentas podem interferir diretamente no sistema de aprendizagem e na progressão cognitiva, emocional e sensorial do aluno, Por isso, brincadeiras que ultrapassem os limites suportáveis, que variam de acordo com o grau de tolerância de cada indivíduo, acabam se caracterizando como forma de violência e causando danos muitas vezes irreversíveis para este aluno.
Todas essas agressões, sistemáticas e impactantes, que ocorrem com frequência no seio escolar, recebem o nome de bullying. Segundo Tavares e Ferreira (apud GUIMARÃES, 2009) bullying é uma palavra de origem inglesa que tem como raiz o termo bull, que é um termo utilizado para designar pessoa cruel, intimidadora e/ou agressiva.
O bullying pode ocorrer de diversas formas e possui diferentes tipos de vítimas, com diferentes reações. Neste trabalho, procura-se elucidar as características dessas vítimas e de seus agressores, com ênfase nos prejuízos causados nos alunos atingidos por essa violência, principalmente na educação física escolar.
O presente artigo tem como objetivo propor uma reflexão sobre a prática do bullying no âmbito escolar, em especial nas aulas de educação física, onde este problema é bastante recorrente.
Metodologia
Para concretização dos objetivos o estudo foi conduzido através de pesquisa de experimental com aplicação de questionário do tipo ex factum/post factum, em uma amostra de 43 alunos de uma escola no bairro de Realengo/RJ, com abordagem quantitativa, tendo como público-alvo os alunos do 7° ano do Ensino Fundamental praticantes de Bullying. Os instrumentos utilizados nestes questionários para coleta de dados foram baseados na opinião dos estudantes acerca de alguns aspectos da vida escolar relacionados ao bullying e a análise dos dados coletados será apresentada no tópico “Resultados e Discussão”. O questionário ex factum foi montado a partir de uma pesquisa realizada na Heriot-Watt University, de Edinburgh, na Inglaterra. A avaliação post factum teve como base o questionário da instituição inglesa Kidscape, que há anos dedica-se ao tema Bullying.
Desenvolvimento
e seus tiposBullying
O bullying é um conceito específico e muito bem definido, uma vez que não se deixa confundir com outras formas de violência. Apresenta características próprias, dentre elas, o atributo de causar traumas psíquicos em suas vítimas e envolvidos, pois suas atitudes são agressivas, intencionais e repetidas.
Comportamentos agressivos e anti-sociais [...]. Sem termo equivalente na língua portuguesa, define-se universalmente como um conjunto de atitudes agressivas, intencionais e repetitivas que ocorrem sem motivação evidente, adotado por um ou mais alunos contra outro(s), causando dor, angústia e sofrimento... são algumas das manifestações do comportamento bullying. (FANTE, 2005, p. 28 e 29).
O bullying se distingue em duas formas: o bullying direto, forma mais comum entre os agressores masculinos; e o bullying indireto também conhecido como agressão social, forma mais comum em bullies femininos e crianças, que se caracteriza por forçar a vítima ao isolamento social. Isolamento este, obtido através de uma grande variedade de técnicas que incluem: espalhar comentários, recusa em se socializar com a vítima, intimidar outras pessoas que desejam se socializar com a vítima, criticar o modo de vestir ou outros aspectos socialmente significativos (incluindo a etnia da vítima, religião, incapacidades, etc.).
A manifestação do bullying é diferente das brigas que freqüentemente acontecem provocadas por motivos eventuais. Para Fante (2005), essas brigas acontecem e acabam. O bullying, ao contrário, é considerado uma agressão que se apresenta de forma velada, através de comportamentos cruéis, contra a mesma vitima, e seu poder de destruição é considerado perigoso à escola e à sociedade como um todo, devido aos prejuízos psíquicos que causa nos envolvidos. Nesse processo estão envolvidas pessoas que se encaixam em um dos três papéis (alvo ou vítima, autor ou agressor e testemunha), sendo que todos precisam de atenção por parte de profissionais, da escola, da família e de toda a sociedade. Freqüentemente, tal realidade envolve e transforma a pessoa em vítima, interfere negativamente nos seus processos de aprendizagem devido à excessiva mobilização de emoções, de medo, de angustia e de raiva reprimida.
Trata-se de um problema mundial, encontrado em todas as escolas, que vem se disseminando largamente nos últimos anos. Em todo o mundo, de acordo com Fante (2005), as taxas de prevalência de bullying revelam que de 5% a 35% dos alunos estão envolvidos no fenômeno. No Brasil, através de pesquisas realizadas em instituições públicas e privadas, foram comprovados índices elevados de educandos envolvidos.
O bullying ocorre quando um ou mais alunos passam a perseguir, intimidar, humilhar, chamar por apelidos cruéis, excluir, ridicularizar, demonstrar comportamento racista e preconceituoso ou, por fim, agredir fisicamente, de forma sistemática, e sem razão aparente, outro aluno. (RAMOS, 2008, p.1 e 2).
O bullying se apresenta de diversas formas podendo ser físico, virtual, verbal, moral, sexual, psicológico e material. Com o advento da tecnologia, atualmente o bullying do tipo virtual, também conhecido como Cyberbullying, vem ganhando mais destaque. Segundo a revista Nova Escola (Junho/ Julho 2010), na internet e no celular, mensagens depreciativas se espalham rapidamente e tornam o bullying ainda mais perverso. Como o espaço virtual é ilimitado, o poder de agressão se amplia e a vítima se sente acuada mesmo fora da escola. E, o que é pior, muitas vezes ela não sabe de quem se defender.
Tipos de vítimas de Bullying e suas reações
Misturado ao medo, cresce naquele que sofre a violência, o ódio, o desejo de vingança e as fantasias de destruir os agressores. Essas fantasias, um dia, poderão se transformar em realidade fazendo das antigas vítimas, os futuros agressores. O bullying, quando não assistido de forma adequada, pode oferecer riscos e conseqüências para a escola e os alunos, tanto para o agressor quanto para a vítima e a testemunha.
Na escola, quando não se toma providência, esse problema tende a se alastrar e mais alunos poderão vir a se tornar autores. De acordo com Fante (2005, p.32), algumas vítimas “[...] em casos extremos, podem tentar ou cometer suicídio. Os autores podem se tornar adultos agressivos, adotarem a prática de violência familiar, ou mesmo apresentar comportamentos anti-sociais, inclusive criminosos”. Aqueles que não superarem o sofrimento vivido poderão crescer com sentimentos negativos, reforçando uma baixa auto-estima, tendo problemas de relacionamento na fase adulta, inclusive de apresentarem comportamento agressivo.
O Bullying possui três tipos de vítimas, que se diferenciam quanto à reação diante da violência a qual estão sendo submetidas. A vítima típica é fisicamente mais frágil, se comparado aos seus companheiros, tem medo de sofrer algum dano, de ser fisicamente ineficaz nos esportes e nas brigas, tem dificuldades de se impor e não apresenta comportamento agressivo. Geralmente relacionam-se melhor com adultos do que com crianças de sua idade. A vítima provocadora é o aluno provocador, mas que não possui habilidades para lidar com as conseqüências de suas provocações. Briga quando é atacada, mas não consegue resolver a situação. Pode apresentar características de hiperatividade ou ser inquieta, dispersiva e ofensora. Já a vítima agressora é o aluno que transfere todo seu sofrimento para outro, reproduzindo as agressões sofridas em um aluno mais frágil que ele. Contribui com o aumento no número de vítimas.
Segundo Fante (2005), existem ainda dois papéis fundamentais que protagonizam este fenômeno e que devem ser destacados. O agressor, que geralmente é fisicamente maior, mais dinâmico nos esportes e nas brigas. Vangloria-se de sua superioridade, intimida, ameaça, domina e subjuga os outros alunos. Tem dificuldades em aceitar normas, irrita-se com facilidade e não aceita ser contrariado, é visto como o aluno mal, frio e antipático. Pode se envolver em condutas anti-sociais, como o roubo, vandalismo e consumo de bebida alcoólica. E o espectador, que é o aluno que testemunha todo o sofrimento da vítima, mas não tem coragem de denunciar por medo de represália dos agressores. Com medo de se transformar no próximo alvo, o aluno que testemunha as agressões tende a se afastar da vítima, contribuindo com o processo de exclusão.
Vítima e suas características
A vítima de bullying tende a ser alguém aparentemente mais frágil do que o agressor e cujas características, tanto físicas como psicológicas, a distingue da massa de alunos, tornando-a facilmente identificável e propiciando a prática de bullying, já que esta não pode se refugiar entre a massa de estudantes.
Uma pesquisa realizada pela ONG Plan Brasil e divulgada em 2010, constatou que cerca de 30%, de um total de cinco mil alunos do 6° ao 9° anos do Ensino Fundamental entrevistados em todo o país, sofreram algum tipo de agressão na escola, e destes, 17% estiveram envolvidos em casos de bullying.
A grande maioria destes alunos atingidos pelo bullying tem entre 11 e 14 anos e cursa o 7° ano do Ensino Fundamental. Os meninos, segundo a pesquisa, são os mais atingidos, 12,5% contra 7,6% das meninas. Porém, as garotas sentem mais, do ponto de vista psicológico. Ficam mais tristes, magoadas e aborrecidas.
De acordo com Castanheira (apud PINHEIRO, 2007), há certas características que influenciam a criança/adolescente a ser vítima de bullying, tais como: características de personalidade (sinceridade, timidez, introversão, calma, etc.); ser novo na turma ou na escola; ter poucos amigos; ser superprotegido pelos pais; pertencer a grupos diferentes da maioria (religiosos, étnicos, etc.); possuir características físicas que o diferenciem da maioria (obesidade, magreza, coxear, gaguejar, usar óculos e/ou aparelho dos dentes, possuir piercings, cor da pele, etc.); possuir necessidades educativas especiais; ter interesses diferentes da maioria (poesia, leitura, línguas estrangeiras, etc.); usar roupas não adequadas à sua idade; demonstrar interesses diferentes da maioria (política, religião, etc.); ter problemas de saúde (asma, bronquite, alergias, diabetes, problemas de pele, etc.); ser portador de síndrome de down; ser superdotado; tirar boas notas ou muito mais.
Agressor
Existem evidências de que as crianças provenientes de famílias problemáticas, em que não há um devido acompanhamento do educando e onde haja mais experiências desagradáveis do que agradáveis, tenham tendência a se tornar agressores.
Daí que as suas vítimas potenciais sejam aquelas crianças em situação inversa, ou seja, aquelas cujas famílias vêm muitas vezes à escola, o que demonstra uma preocupação com os educandos que os agressores não têm da parte das suas famílias (MCCARTHY et al apud PINHEIRO, 2007). Outro aspecto com relação à família é que os agressores tendem a pertencer a famílias que são caracterizadas como tendo pouco carinho ou afeto, com problemas em partilhar os seus sentimentos e, normalmente, existe uma distância emocional entre seus membros.
São geralmente jovens com problemas emocionais ou com problemas de aprendizagem. Sentem-se impotentes para resolver os problemas do quotidiano.
O agressor está consciente dos seus atos: o objetivo é humilhar o outro para sentir que tem controle. São jovens que têm necessidade de dominar e vencer, são pouco tolerantes à frustração, pouco persistentes, sem perspectivas de futuro.
O agressor é aquele que frequentemente implica com os outros, ou que lhes bate ou faz outras coisas desagradáveis sem uma boa razão. Os agressores têm dificuldades em fazer amigos, consequentemente têm poucos amigos. Sentem-se infelizes com relação à escola. Envolvem-se muito em comportamentos de risco para a saúde (tabaco, álcool e drogas).
Os quadros abaixo (PINHEIRO, 2007) relacionam as principais características das vítimas durante o processo de agressão:
Prejuízos causados nos alunos atingidos pelo Bullying
O Bullying tem como vetor a violência que se apresenta de forma velada por meio de comportamentos cruéis, intimidadores, repetitivos e prolongados contra uma mesma vítima, causando-lhe danos psíquicos graves, pois a forte carga emocional que experimenta devido ao medo constante, bloqueia sua agressividade e prejudica o bom funcionamento mental, as funções de raciocínio, abstração e o interesse por si mesmo e pelo aprendizado.
Os danos causados pelo bullying podem ser irreversíveis, pois o aluno atingido por ele, pode se fechar para o mundo ao seu entorno como modo de proteção, perder a auto-estima, a motivação pela vida e até mesmo tentar o suicídio como maneira de se livrar do problema. Para quem pratica, pode até parecer brincadeira. Mas para as vítimas, o bullying pode causar traumas por muitos anos. O impacto das agressões depende da auto-estima da vítima. Quanto mais baixa, maiores as chances de essa vítima carregar o sofrimento por mais tempo.
Em entrevista ao jornal Folha Dirigida (13 a 19 de Maio de 2010), a psicóloga e psicoterapeuta Adriana Tagura Ioels, relata que a somatização do trauma gerado pelo bullying pode causar gastrite, problemas cardíacos, esquizofrenia e psicoses. “Já atendi uma pessoa de 50 anos e que sofre até hoje por ter sido vítima de bullying. Muitas vezes, as pessoas ficam marcadas”. A psicóloga frisa ainda que “Muitas vezes, a vítima não fala. Várias até acham que merecem o sofrimento, por não se relacionarem bem com os colegas”.
O medo constante e repetitivo bloqueia a agressividade e o bom funcionamento mental, prejudicando as funções de raciocínio, abstração, interesse por si mesmo e pelo aprendizado, além de estender-se a outras faculdades mentais ligadas à autopercepção, concentração, auto-estima e capacidade de interiorização. (FANTE, 2005, p. 24).
Os alunos sentem-se humilhados, desrespeitados, irritados e até desamparados. Suas reações demonstram que não conhecem e nem vislumbram alternativa. Reproduzem a situação social em que vivem, perpetuando-as, não sem muito sofrimento. As conseqüências geradas pelo bullying são tão graves que os adolescentes sentem-se inferiorizados, sem capacidade para transformar suas metas em realidades.
Bullying nas aulas de Educação Física
As discussões a respeito do Bullying também são bastante pertinentes no âmbito da educação física escolar. Ainda hoje, podemos encontrar esta disciplina pautada por um modelo reducionista em que o corpo, a aptidão física e o desempenho são os objetivos mais importantes. A prática esportiva privilegia os alunos que possuem um bom desempenho e que estão aptos a praticar as modalidades esportivas associadas à velocidade, força, impacto e resistência.
De acordo com Faria Junior e Faria (1999, p. 376), a educação física é uma disciplina que não tem sido poupada pelas manifestações de violência e as brigas geralmente começam por motivos banais, como uma discussão por causa de uma rixa desportiva.
Na educação física, a vítima é objeto de bullying dos colegas, seja por ela apresentar características físicas que destoam dos demais colegas, quer ainda por ser baixo e frágil. Apresenta aspecto físico diferenciado dos padrões impostos por seus colegas (magro e/ou gordo) e tem pouco rendimento nos esportes e em lutas devido à coordenação motora pouco desenvolvida.
Já os agressores são mais fortes do que seus colegas de classe, o que lhes dá vantagem em determinadas brincadeiras, esportes e lutas. Utilizam suas habilidades dentro da aula de educação física como meio de violência. Fazem parte de um grupo fechado, constituído por uma minoria, que apresenta um código de ética, onde impera um líder, que estabelece as regras, e quem não o respeitar não pode fazer parte deste grupo.
O Bullying ocorrre com mais freqüência quando os conteúdos das aulas estão voltados para a competição, o que acaba por resultar em uma alteração no comportamento das turmas. A violência existente entre os estudantes nas escolas é frequentemente acentuada nas disputas esportivas, que acabam por se tornar um reflexo do cotidiano escolar.
Fante (2005) chama a atenção do profissional de educação, para que fique atento a alunos agressivos ou violentos, porque em alguns casos o que se poderia interpretar como brincadeiras próprias da idade pode ser fonte de grande constrangimento e sofrimento a colegas mais tímidos, calados ou mais fracos, normalmente mais novos, com prejuízo sócio-educacional e emocional.
O gênero, segundo Oliveira e Votre (2006), atravessa esta questão nas aulas de educação física, pois as meninas se tornam um alvo fácil da crueldade dos agressores, devido à pequena ou nula participação das mesmas, nas aulas de educação física. Os meninos, por sua vez, são considerados fracos se não mostrarem o desempenho esperado pelos seus pares. A desqualificação e rejeição se dão pelos estereótipos esperados de cada sexo, construídos pela sociedade, segundo os quais as meninas têm que ser graciosas e frágeis, e não devem participar de jogos de impacto ou viris, e os meninos devem ser agressivos.
Resultados e discussão
Através da pesquisa realizada, podemos observar quanto o problema do bullying é frequente no meio escolar. Do total de alunos que responderam ao questionário utilizado, cerca de 85% afirmaram já ter batido, ameaçado ou implicado com seus colegas de turma. Quando questionados sobre quantos colegas de turma eles achavam que estavam fazendo alguma dessas coisas, 60% responderam “mais de 4”, e 20% “entre 3 ou 4”. Estas duas questões mostram a grande incidência deste tipo de prática no grupo entrevistado.
Em princípio, trata-se de um problema mundial, sendo encontrado em toda e qualquer escola, não estando restrito a nenhuma instituição: primária ou secundária; pública ou privada; rural ou urbana; católica, metodista, evangélica, espírita ou demais religiões. Pode-se afirmar que as escolas que não admitem a ocorrência de bullying entre seus alunos desconhecem o problema ou se negam a enfrentá-lo. (BOTELHO, 2007, p. 59)
Podemos destacar ainda, a grande quantidade de entrevistados (80%) que disseram já ter sofrido algum tipo de violência por parte de seus irmãos ou irmãs. Paralelo a isso, 75% dos alunos que responderam ao questionário afirmaram ter praticado algum tipo de violência em seus irmãos ou irmãs, e desses, 60% afirmaram que praticaram tais atos muitas vezes. Sobre isso, Tavares e Ferreira (apud FERNANDEZ, 1994) relatam que o tratamento que estes alunos recebem dos pais ou do ambiente em que convivem, contribui para a violência de seus atos, demonstrando apenas que o seu comportamento na escola é um reflexo das agressões sofridas e que apenas transferem aos outros o tratamento dado a elas mesmas.
O resultado do questionário usado pelo presente artigo revela-nos ainda, que 65% do total de alunos entrevistados disseram se sentir mais fortes em relação aos rapazes da sua turma, contra apenas 10% que afirmaram sentir-se menos forte em relação aos seus pares. Segundo a Revista Nova Escola (Junho/ Julho 2010), o bullying possui sempre um agressor, uma vítima e uma platéia que acabam por compactuar com a agressão enquanto o agressor passa a representar uma pessoa forte perante o grupo, uma espécie de ídolo, aquele que é o mais forte e normalmente adota esse comportamento em função da cultura em que ele esta inserido. De acordo com NETO (2005), “a maioria dos alunos não se envolve diretamente nos atos e geralmente se cala para não ser a próxima vítima”, com isso os agressores acabam se tornando mais poderosos e achando que podem tudo. O autor afirma ainda, que a forma como reagem ao bullying permite classificar os alunos como auxiliares (participam ativamente da agressão), incentivados (incitam e estimulam o autor), observadores (só observam ou se afastam) ou de defensores (protegem o alvo ou chamam um adulto para interromper a agressão).
A análise dos dados coletados pelo questionário ex factum utilizado nesta pesquisa, revela-nos que no grupo de amostragem utilizado, com um total de 41 alunos, 20% possuem práticas pouco excludentes, o que demonstra estarem pouco inclinados à prática do bullying; 56% têm práticas classificadas como excludentes, demonstrando estarem estes inclinados à prática do bullying e; 24% possuem práticas consideradas muito excludentes, o que caracteriza estes como muito inclinados à prática do bullying.
Após a intervenção feita pelo grupo, podemos verificar uma pequena mudança no modo de pensar do grupo analisado. Questionados no protocolo post factum sobre quem estes achavam serem os culpados das agressões, intimidações e assédios que ocorriam em seu âmbito escolar, 37% deram respostas consideradas pouco excludentes, como “do agressor”, ou “de quem bate”; a taxa de respostas consideradas com tendências excludentes, como “dos pais”, “da sociedade”, ou “das pessoas”, não se alterou se comparada ao questionário ex factum, mantendo-se em 56%; já as respostas consideradas muito excludentes, como “da vítima”, ou “de quem apanha”, tiveram uma visível diminuição, passando a 7%.
Conclusão
As discussões a respeito do fenômeno bullying não se exaurem, devido à atualidade e diversidade de embasamentos que cercam este tema. O bullying é extremamente perigoso por representar atitudes muito violentas e constantes, que acabam afetando a vida social de sua vítima e, principalmente, trazendo danos muitas vezes irreversíveis ao desenvolvimento psicológico da mesma, tais como: diminuição da auto-estima, depressão, insegurança, ansiedade, distúrbios psicossomáticos, medo e grande timidez.
Segundo Medina (2008), a educação é um processo pelo qual os indivíduos buscam o desenvolvimento de todas as suas potencialidades, sempre no sentido de uma auto-realização, e em conformidade com a própria realização da sociedade. Citando Saviani, o autor afirma ainda que a educação deve tornar o homem cada vez mais capaz de conhecer os elementos de sua situação, para intervir nela, transformando-a no sentido de uma ampliação da comunicação e da colaboração entre os homens.
A Educação Física é uma disciplina que propicia a seus alunos uma grande exposição nas aulas práticas de suas potencialidades e limitações, sendo estes, fatores que proporcionam o surgimento do bullying, acarretando em uma gama imprevisível de conseqüências. Porém, apesar da complexidade e importância do problema, uma busca por referências literárias que abordem este tema, mostra o quanto os programas educacionais voltados para a prevenção do bullying na área de Educação Física são escassos.
É necessário, portanto, que a Escola enfrente, com a seriedade que o problema requer as agressões entre os alunos, deixando de ver o bullying apenas como brincadeira entre crianças. Buscando instrumentos que combatam eficazmente a violência no âmbito escolar; reconhecendo e enfrentando este problema; adotando posturas comprometidas; e identificando as causas que levam os estudantes a serem agressivos com seus colegas. É vital que todos (pais, alunos e professores) tomem conhecimento a respeito do assunto e que entendam que, diante de uma situação tão grave, não se pode ficar omisso.
Na educação física escolar, esse comportamento de superioridade em nome do auto-rendimento esportivo não deve ser incentivado. O educador físico deve ter uma visão ampla no sentido de utilizar suas aulas para promover uma integração social, evitando a tendência de se privilegiar os alunos com maior força física e/ou habilidade exacerbada. A aula de educação física é um excelente instrumento para se conscientizar esses agressores em potencial quanto à prática do bullying.
É próprio do pensar certo..., a aceitação do novo que não pode ser negado ou acolhido só porque é novo... Faz parte igualmente do pensar certo a rejeição mais decidida a qualquer forma de discriminação. A prática preconceituosa de raça, de classe, de gênero ofende a substantividade do ser humano e nega radicalmente a democracia. (Freire, 2009:36)
Nós, profissionais de educação física, devemos buscar meios para prevenção deste problema desde a educação infantil, seja a interação entre gêneros, classes sociais ou etnias, trabalhando de forma a proporcionar a esses alunos experiências diversas, uma vez que “a literatura estrangeira mostra que, quanto mais precoces sejam as intervenções, melhores são os resultados quanto à redução e ao controle de bullying nas escolas” (Lopes e Saavedra, 2003: 119). De acordo com Botelho (2007, p.69), após iniciadas, estas estratégias de prevenção e de controle ao bullying deverão acompanhar o estudante pelas etapas de ensino fundamental e médio, sendo inseridas como conteúdo específico da disciplina de educação física.
A presente pesquisa nos leva a concluir, portanto, que o bullying, desumano, violento e constrangedor em sua essência, requer especial atenção de todos, escola e família, para que seus efeitos, quando não puderem ser combatidos de imediato, ao menos não tragam tantos prejuízos psicossociais à sua vítima, preservando a imagem, a identidade e a dignidade da mesma.
Deve-se dar especial atenção ao aluno que demonstrar a necessidade de resgatar a auto-estima. Trata-se de garantir condições de aprendizagem a todos os alunos, seja por meio de incrementos na intervenção pedagógica ou de medidas extras que atendam as necessidades individuais. [...] A escola, ao considerar a diversidade, tem como valor máximo o respeito às diferenças – não o elogio à desigualdade. As diferenças não são obstáculos para o cumprimento da ação educativa; podem e devem, portanto, ser fator de enriquecimento. (BRASIL, PCN, 1997, p. 97)
Referências
BOTELHO, R.G., SOUZA, J.M.C. Bullying e educação física na escola: características, casos, conseqüências e estratégias de intervenção. Revista de Educação Física, 2007. Brasil. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC/SEF, 1997.
FANTE, Cléo. Fenômeno bullying: Como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz. Campinas: VERUS, 2005.
FARIA JUNIOR, A.G, FARIA, E.J.C. Didática de educação física. In: FARIA JUNIORAG et al., organizadores. Uma introdução à educação física. Niterói: Corpus, 1999; 341-83.
FERNANDEZ, A. A mulher escondida na professora: uma leitura psicopedagógica do ser mulher, da corporalidade e da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
Folha Dirigida (13 a 19 de Maio de 2010). Grupo Folha Dirigida.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 2009.
GUIMARÃES, J. R. Violência escolar e o fenômeno ‘bullying’. A responsabilidade social diante do comportamento agressivo entre estudantes. 2009. Disponível em: http://jusvi.com/artigos/41126.
LOPES NETO AA, SAAVEDRA LH. Diga não para o bullying – programa de redução do comportamento agressivo entre estudantes. Rio de Janeiro: ABRAPIA, 2003.
MEDINA, João Paulo Subirá. A Educação Física cuida do corpo... e “mente”. 24° edição. Campinas: Papirus, 2008.
NETO, A.L.N. Bullying comportamento agressivo entre estudantes. Jornal de Pediatria - Vol. 81, Nº5(supl), 2005.
OLIVEIRA, F.F. e VOTRE, S.J. Bullying nas aulas de aula de Educação Física. Porto Alegre, v.12, n. 02, p. 173-197, maio/agosto de 2006.
ONG PLAN BRASIL, Estudo Bullying Escolar no Brasil. 2010. Disponível em: http://www.plan.org.br/index.html
PINHEIRO, Luíza (2007). Bullying: O perfil da vítima. http://sites.google.com/site/bullyingemportugal/
RAMOS, A. K. S. Bullying: A Violência Tolerada na Escola. 2008. Disponível em: http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/802-4.pdf.
Revista Nova Escola. Ed. Abril. Ano XXV. n° 233. Junho/Julho 2010.
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