Hip-Hop, Rap e lazer: entenda o que o jovem quer lhe dizer El Hip-Hop, el Rap y el tiempo libre: entender lo que los jóvenes quieren decir |
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*Mestrando em Ciências da Motricidade UNESP de Rio Claro/SP. Bolsista pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq **Professora Adjunta UNESP de Rio Claro/SP ***Bacharel em Educação Física - UEL |
Daniel Bidia Olmedo Tejera* Carmem Maria Aguiar** Leandro Dri Manfiolete*** (Brasil) |
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Resumo Este artigo versará sobre o rap como possibilidade de lazer de jovens no contexto urbano. Em muitas cidades do Brasil, jovens tem se encontrado em espaços públicos como metrôs e praças, para juntos, vivenciarem os preceitos da cultura hip-hop de uma forma lúdica, colocando e expondo seus conhecimentos e experiências de vida através do rap de improviso, espécie de repente da juventude atual. Trazer esse assunto à tona no âmbito acadêmico, e interessante à medida que gera a possiblidade de amplitude da compreensão das práticas juvenis contemporâneas por parte dos educadores, que muitas vezes lêem sobre hip-hop nos materiais didáticos fornecidos pelo governo, mas não entende de fato, a linguagem de seus alunos. Unitermos: Hip-Hop. Rap. Lazer.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 162, Noviembre de 2011. http://www.efdeportes.com/ |
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Registros revelam que em meados de século XVIII, lazer, trabalho e meio ambiente não apresentavam uma linha de separação clara entre si. As colheitas eram realizadas simultaneamente com danças, cantos e alegria, o que fazia disso um momento único, sem haver dicotomia entre trabalho e lazer onde o tempo era regido por fenômenos da natureza, como estações do ano e o posicionamento do sol (BAHIA, 2005).
Foi a partir do surgimento da sociedade industrial que a fluência da relação entre lazer e trabalho sofreu grandes transformações. A partir desse momento, as pessoas passaram a ter que se deslocar de suas casas para o local de trabalho, - trabalho e moradia passam a não dividir mais o mesmo espaço - extinguindo o trabalho artesanal. O tempo deixa de ser regido pelos fenômenos da natureza e passa ser cadenciado de acordo com o trabalho (BRUHNS, 1997 apud CAPI, 2006, p17).
Para Marcellino (2002), estes e outros fatores levaram os pensadores do século XIX a refletir sobre o lazer. No continente europeu, o trabalho agora industrial, explorava em demasia os operários de forma a desrespeitá-los como seres humanos, fato este que propiciou vários manifestos em forma de obra literária, porém, somente no início do século XX, nos Estados Unidos e na Europa foram desenvolvidos estudos do lazer de uma forma sistemática.
Essa sistematização dos estudos do lazer, a partir da década de 50, passou a ser aderida nas sociedades urbano-industriais de forma geral, tanto nas capitalistas quanto socialistas. Já no Brasil, os estudos da temática só evoluíram 50 anos após a evolução já ocorrida na Europa, o principal motivo deste fato, é que na Europa o interesse por essa modalidade de estudo se deu devido à industrialização, entretanto no Brasil, o mesmo está relacionado ao processo de urbanização. As universidades brasileiras deram início às pesquisas a partir dos anos 70, que foram se desenvolvendo de forma relevante até a década de 90. Período em que surgem muitas teses sobre o tema, principalmente interligadas com a produção cultural e a educação (MARCELLINO, 2002).
Pode-se dizer atualmente, que o lazer é um fenômeno advindo da sociedade urbana, caracterizado como uma esfera social importante na vida moderna para mudanças de ordem moral e cultural. Embora o principal objetivo das atividades de lazer seja o divertimento e o descanso, é importante que esta prática colabore também para um terceiro item importante do lazer: o desenvolvimento, que pode ser pessoal e social. Juntando divertimento, descanso e desenvolvimento, temos os 3D`s do lazer (MARCELLINO, 2002).
O lazer além de carregar como características fundamentais o descanso, o divertimento e o desenvolvimento pessoal e social, também é um eficiente veículo promotor de educação. Embora pareça não estabelecer uma relação direta, a educação e o lazer caminham lado a lado, ao passo que, o desfrutar do lazer muitas vezes pode ser decorrente de um determinado processo educacional, é um privilegiado espaço de crescimento crítico e criativo.
É importante ressaltar que quando falamos em educação e processos educativos, não estamos nos limitando a conceitos de ensino e aprendizado escolar de maneira isolada das concepções sociais e culturais. Pelo contrário, pois entre educação, sociedade e cultura existe uma forte interatividade geradora de idéias, valores, modos de viver e interpretar a vida (AGUIAR, 1999).
Surgindo também nesse contexto de crise da industrialização, – e conseqüentemente de aumento de violência e desemprego – o hip-hop emerge de um contexto urbano. Criado no distrito do Bronx – cidade de Nova Iorque, Estados Unidos – por jovens negros e imigrantes caribenhos como uma forma de expressão cultural, o hip-hop vem à tona na mesma época dos movimentos de contracultura (SILVA, 1999).
Os guetos de Nova Iorque dos anos 60/70 foram o local do surgimento de contingentes juvenis não-brancos reunindo-se para falar, cantar, desenhar e dançar suas criações a partir dos resíduos tecnológicos da cidade e de suas experiências de vida. (CORNIANI, 2002, p. 5)
A fim de transformar a violência das gangues em disputas sadias, Afrika Bambaataaa, um dos principais organizadores das festas de rua, passou a organizar tais festas objetivando converter as “rixas” em duelos que envolviam expressões artísticas divididas em quatros elementos: “Mc” (que faz as rimas), “Dj” (que toca o som), “Break” (a dança) e “Grafite” (artes plásticas).
A idéia de Afrika Bambaataa era transformar o negativismo das gangues em energia positiva, pois perdera o melhor amigo em uma guerra das gangues, no tempo que fizera parte de uma gangue. Cansado disso, pensou em fazer algo para mudar esta situação, as pessoas estavam cada vez mais ocupados com o Hip-Hop, em mostrar suas habilidades da melhor forma possível nas festas. (VENTURA, s.d.)
O rap é uma manifestação da linguagem falada, incorporada a uma melodia que trabalha uma base rítmica repetitiva, geralmente trás crônicas dos habitantes de um determinado grupo social (ROSA, 2004). Pires (2007) se refere ao rap como o pilar central do hip-hop, esse estilo musical usa a forma básica de expressão: a voz. Na sua essência original, a voz permanece praticamente numa mesma nota. Originário do canto falado da África ocidental, o rap foi adaptado à música jamaicana da década de 1950 e influenciado pela cultura negra dos guetos americanos quando chegou junto com os imigrantes caribenhos para se unir aos demais elementos do hip-hop, período pós-guerra (SILVA, 1999). O rap dentro da cultura juvenil em questão teve início com o mc se limitando a empolgar as pessoas enquanto o dj tocava o som. Com o tempo, as rimas foram ficando mais elaborada, fator decisivo para arrancar aplausos da multidão (VENTURA, s.d.).
Embora o rap tenha sido aderido pelo mercado fonográfico, a sua prática enquanto arte de rua se consistia em desafios improvisados, sem escrita ou elaboração prévia. Desta forma, a modalidade de rap que abordaremos nessa pesquisa é o rap de improviso, espécie de poesia oral baseada no desafio e improviso, mecanismo parecido com o encontrado em manifestações como o repente e o cururu. Aqueles que fazem rap de improviso se expressam através do canto improvisado com base nas suas vivências e conhecimentos. No momento da criação dos versos os temas são variados, são de acordo com o local e o ambiente (BARROS, 2002). O rapper vivencia os fatos históricos, sociais, econômicos e políticos, os quais, através da emoção e da imaginação, recriam esse real em forma de versos (BARROS, 2002).
Essa vivência e recriação da realidade dos participantes em forma de verso, pode ser vista também em manifestações parecidas, em outros tipos de grupos sociais, como é o caso do “povo da Barra”– comunidade que vive semi-isolada na Barra da Aroeira, região norte do Brasil – assim denominado pelas povoações vizinha. Na comunidade mencionada, cantigas de roda, músicas, repentes e parlenda servem como meio de memorização, transmissão de saberes, crenças e valores. É um momento de se expor pensamentos e visões da realidade que os cerca (AGUIAR, 1999).
O canto de improviso é em geral uma manifestação da cultura popular, que pode ser entendida como uma forma de classificar pensamentos e ações das populações mais pobres de uma sociedade, é a cultura da classe desfavorecida, que não detém poder (SANTOS, 1994).
Nas principais capitais do Brasil, principalmente em São Paulo, muitos desafios de rima acontecem nos espaços públicos da cidade. Organizado por jovens que acreditam no ideal do movimento hip-hop, as batalhas de mc`s são duelos entre participantes cujo objetivo é mostrar ao público presente quem tem a maior capacidade de se impor sobre o outro através da técnica e habilidade com o ritmo e as palavras, num tempo determinado de aproximadamente 40 segundos.
A ação do “rimador” de utilizar na sua criação fatos que aconteceram recentemente – desde notícias da semana até a cor da roupa do adversário –, impressiona os olhos de quem comparece para apreciar este tipo de arte, que é também um jogo cuja principal ferramenta é a criatividade e o bom desempenho com as palavras.
Partimos da premissa de que a batalha de mc`s combina os aspectos “tempo” e “atitude” de maneira integrada, ou seja, ela acontece no tempo livre do trabalho ou qualquer outra obrigação, através de uma atitude de liberdade de escolha cujo fim principal da atividade seja ela própria, considerada neste contexto como um momento de vivência do lazer.
Tempo e atitude são condições básicas para que uma atividade seja caracterizada como momento de lazer (MARCELINO, 2002). Além das batalhas de rap de improviso acontecerem nessas condições, elas também costumam estar permeadas por outros fatores que determinam tal atividade como um ato de lazer, como o desenvolvimento pessoal e social que esta atividade requer dos participantes, sejam competidores ou apenas apreciadores.
A relevância desse artigo justifica-se na importância de identificar os pontos fortes do Hip-Hop como instrumento de educação através do lazer e para o lazer. Tentaremos com este ensaio, alertar os olhares dos profissionais da Educação Física, sob a relevância que se pode ter com a inserção da cultura do movimento de rua na educação de crianças e jovens, seja através de meios formais ou informais.
No caderno do aluno, material didático utilizado por alunos da rede estadual, pode-se encontrar no volume voltado a 8ª Série/9º ano na disciplina de Educação Física, uma parte dedicada ao hip-hop, porém, é notável a necessidade do tema ser mais aprofundado, para poder ser melhor explorado no ambiente educacional, tanto pelo professor como o aluno, que muitas vezes já trás algo dessa prática do próprio bairro.
Por fim, devemos ressaltar que o presente ensaio não tem a intenção de mostrar o hip-hop como a solução, mas como uma alternativa de lazer para os jovens, bem com uma possibilidade de instrumento educacional para educadores de instituições escolares e não escolares.
Referências
AGUIAR, C. M. Procedimentos lúdicos e cultura. Revista Motriz, Rio Claro/SP, v. 05, n.01, p. 22-27, 1999.
BAHIA, M. C. Lazer – Meio Ambiente: em busca das atitudes vivenciadas nos esportes de aventura. Dissertação (Mestrado em Educação Física) UNIMEP, Piracicaba - SP, 2005.
BARROS, M. L. A. A literatura popular para além da Modernidade. In: Anuário de literatura, n. 10. Florianópolis - SC, 2002
CAPI, A. H. C. Lazer e esporte nos clubes social-recreativos de Araraquara. Dissertação (Mestrado em Educação Física) UNIMEP, Piracicaba - SP, 2006.
CORNIANI, F. R. Rap: Manifestação popular urbana. In: INTERCOM – sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Salvador/BA, 2002.
MARCELLINO, N. C. Estudos do lazer: uma introdução. 3ª ed. Campinas: Autores Associados, 2002.
PIRES, J. R. X. Da tropicália ao hip-hop: contracultura, repressão e alguns diálogos possíveis. Trabalho de conclusão de curso (Departamento de História). PUC-Rio - RJ, 2007.
ROSA, C. M. Cultura rap nas conexões das linguagens artísticas. In: Arte em Pesquisa: especificidades – Anpap, v.1 p. 384-291. Pós-Graduação em Artes da UnB – Brasília – DF, 2004.
SANTOS, J. L. O que é cultura. Ed. Brasiliense – São Paulo - SP, 1994.
SOUZA, I. C.; NISTA-PICCOLO, V. L. Hip Hop e Educação Física Escolar: Possibilidades de Novas Tematizações. In: I Congresso Brasileiro Científico Popular de Educação Física - CAEF FCT/ UNESP, 2006.
SILVA, J. C. G. Arte e educação: a experiência do movimento hip-hop paulistano. In: ANDRADE, E. N. A. (Org.) Rap e educação, rap é educação. São Paulo: Summus, cap. 2, p. 23-38, 1999
VENTURA, B. História da Cultura Hip Hop. Overmundo, [s.d.]. Disponível em: http://www.overmundo.com.br/overblog/historia-da-cultura-hip-hop. Acesso em: 14/05/2011.
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