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Saúde mental dos enfermeiros que cuidam de portadores de transtornos

mentais em um Centro de Atenção Psicossocial de Belém

La salud mental de los enfermeros que cuidan a portadores de enfermedades mentales en un Centro de Atención Psicosocial de Belem

Mental health nurses caring for patients with mental disorders in a Psychosocial Care Center of Belem

 

*Enfermeira Graduada pela Universidade do Estado do Pará

**Enfermeira, Residente em Clínica Médica do Hospital Ophir Loyola

***Enfermeiro Doutorando em Motricidade Humana pela Universidad del Uruguay

Docente da Universidade do Estado do Pará

Chefe do Serviço de Arquivo Médico e Estatística (SAME)

****Enfermeira, Docente da Universidade do Estado do Pará

*****Acadêmica do Curso de Graduação em enfermagem

pela Universidade do Estado do Pará

(Brasil)

Bruna Daniely Guimarães Pinto*

Cristianne de Oliveira Arrais**

Mário Antônio Morais Vieira***

vieiramarioantonio@hotmail.com

Laura Ruth Jorge Silva****

Francinéia de Nazaré Castilho Maia****

Luciene dos Santos Paes*****

luciene.s.paes@gmail.com

 

 

 

 

Resumo

          A presente pesquisa busca compreender as repercussões das experiências vivenciadas pelos enfermeiros de um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) de Belém ao cuidar de pacientes portadores de transtornos mentais. O tema foi escolhido em virtude da saúde mental dos enfermeiros trabalhadores em saúde mental ainda ser pouco discutida no contexto da saúde do trabalhador e, também, por termos vivenciado algumas atividades no referido CAPS que nos suscitaram curiosidades acerca da saúde mental dos enfermeiros. Este trabalho teve por objetivos verificar como os enfermeiros lidam com os problemas dos usuários do CAPS, bem como identificar como esses problemas repercutem em sua saúde mental. Dessa forma, foi desenvolvida uma pesquisa descritiva-qualitativa, contendo uma atividade em grupo e um conjunto de perguntas abertas que foram gravadas, tendo como informantes quatro enfermeiros do CAPS. Os resultados da pesquisa foram significativos, pois nos mostraram que os enfermeiros em questão compartilham os mesmos sentimentos, aflições e sofrimentos relacionados as suas atividades laborais, elucidando que possuir uma pós-graduação na área da saúde mental e ter uma educação continuada na área fazem com que esses profissionais enfrentem com mais facilidade os estressores causados pelo trabalho.

          Unitermos: Saúde mental. Enfrentamento. Enfermeiro.

 

Abstract

          This research seeks to understand the impact of experiences by nurses in a Psychosocial Attention Center (CAPS) from Bethlehem to take care of patients with mental disorders. The theme was chosen because of mental health nurses working in mental heal this still little discussed in the context of workers' health and also to have experienced some activities in that we raised CAPS curiosities about the mental health of nurses. This work aimed to determine how nurses deal with the problems of users of CAPS, as well as identify how these issues resonate with their mental health. Thus, we developed a descriptive and qualitative, containing a group activity and a set of open questions that have been recorded, with four nurses as informants CAPS. The survey results were significant, as we have shown that nurses in question share the same feelings, distress and suffering related to their work activities, explaining that having a graduate degree in mental health and have a continuing education in the area make these professionals to more easily caused by work stressors.

          Keywords: Mental health. Coping. Nurse.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 161, Octubre de 2011. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Esta pesquisa busca verificar como os enfermeiros lidam com os problemas identificados nos portadores de transtornos mentais; constatar como se sentem diariamente ao sair de mais um dia de atuação no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS); e, identificar o que referem sobre as repercussões das experiências vivenciadas em sua saúde mental durante o desenvolvimento de sua atividade profissional.

    Atualmente, dentro do campo da Saúde Mental, é preconizada a valorização do trabalhador de saúde mental na produção do ato de cuidar, onde se atribui ao enfermeiro características ímpares como: o cuidado, o conhecimento, a atenção minuciosa, a compreensão, o medo e o amor pela profissão. Dessa maneira, o trabalho de enfermagem em saúde mental pode ser considerado desgastante “devido às situações adversas como o sofrimento decorrente do adoecimento, a proximidade da morte de clientes e o desempenho de atividades consideradas repulsivas, desgastantes e atemorizadoras”, parafraseando Bianchini (1999). Nesse sentido, cabe ao profissional enfermeiro cuidar de indivíduos adoecidos e promover o seu bem-estar geral. Assim, o envolvimento dos enfermeiros que trabalham em atividades específicas de saúde mental acaba sendo muito intenso a ponto dos mesmos não identificarem suas vulnerabilidades e sua saúde mental, ou quando o fazem, deixam-nas de lado e, com isso, tornam-se mais expostos aos efeitos negativos do estresse e de outros agravantes que podem gerar neles problemas de saúde mental (BRITTO, 2006). Nesse contexto, é que propomos analisar quais as repercussões das experiências vivenciadas pelos enfermeiros do CAPS ao cuidar de pacientes portadores de transtornos mentais no seu fazer cotidiano.

    Ressalta-se que a saúde mental dos enfermeiros que cuidam de portadores de transtornos mentais não é um tema muito pesquisado nem na área de saúde mental (que tem priorizado as discussões em torno das mudanças no cuidado do louco e no entendimento da loucura), nem no campo da saúde do trabalhador (que tem acumulado estudos em organizações privadas e industriais).

Método

    Para dar conta dos questionamentos apresentados, realizamos uma pesquisa do tipo descritiva, uma vez que visa descrever as características de uma determinada população ou fenômeno ou o estabelecimento de relações entre variáveis, envolvendo o uso de técnicas padronizadas de coleta de dados, assumindo, em geral, a forma de levantamento (GIL, 1991). Utilizou-se uma abordagem qualitativa.

    O local do estudo foi o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), localizado na cidade de Belém-PA.

    Os sujeitos foram os 4 enfermeiros (E1, E2, E3, E4) que atuam no referido centro. Os critérios de inclusão foram: a) ter idade igual ou superior a 25 anos; b) ter um tempo de trabalho igual ou superior a 1 ano no CAPS; e c) assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

    A produção dos dados ocorreu em dois momentos. No primeiro momento foi realizado uma atividade em grupo com os sujeitos da pesquisa, onde apresentamos um conjunto de imagens/fotos e cada sujeito foi orientado a escolher 3 imagens/fotos de acordo com a seguinte questão norteadora: o que pensa em relação às experiências vivenciadas diariamente durante o seu trabalho no CAPS e que repercussão elas têm na sua vida? Durante esse momento, utilizamos o estímulo auditivo com a música “Bicho de Sete Cabeças”. O momento foi filmado e o denominamos pré-tarefa.

    No segundo momento foi realizado individualmente, uma entrevista semi-estruturada gravada e, posteriormente, transcritas, com questionamentos básicos que oferecem amplo campo de interrogativas. Essa etapa denomina-se tarefa.

    Uma vez obtida as respostas das entrevistas realizou-se a análise do conteúdo das mesmas, seguindo a técnica da categorização proposta por Bardin. A análise dos dados se deu em 3 etapas cronológicas: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados (interpretação).

    Respeitando os preceitos éticos, esta pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa envolvendo Seres Humanos (CEP) do Curso de Enfermagem da Universidade do Estado do Pará, protocolo (CAAE): 0038.0.321.000-10.

Resultados e discussão

    O perfil dos entrevistados são todos do sexo feminino, com idade variando entre 40 e 47 anos, perfazendo um total de quatro entrevistados; dois são casados e dois são solteiros; todos têm mais de 10 anos de formação; quanto à pós-graduação, dois possuem título de Mestre em Doenças Tropicais e o restante é especialista em alguma área; nenhum possui pós-graduação em Saúde Mental e/ou Psiquiatria; o tempo de trabalho no CAPS varia de 3 a 5 anos.

    Na atividade em grupo, observamos que os sujeitos expressaram por meio das imagens/fotos escolhidas, sentimentos de angústia, aflição e sofrimento ao serem lotadas no CAPS, pois não possuíam pós-graduação em psiquiatria e/ou saúde mental e, também, por não terem recebido nenhum tipo de capacitação antes de serem inseridas no serviço. Muito dos conhecimentos adquiridos na área foi com o esforço dos próprios enfermeiros, através de estudos e compartilhamento de experiências com os demais profissionais da instituição.

    Foi destacada a importância da família na reabilitação do portador de transtorno mental, onde o trabalhador enfermeiro acaba por dividir com os familiares a responsabilidade de tratar e/ou curar o usuário acompanhado pelo serviço.

    A atividade de acolhimento, foi citada com ênfase durante a atividade em grupo, onde se destacou a importância de uma boa receptividade do profissional para com o usuário, uma vez que ao sair do acolhimento, a maioria dos usuários tem melhora, podendo ter alta o mais rápido possível do serviço. Notamos então, que o acolhimento, assim como as atividades de escuta ao usuário e familiares se caracterizam por serem atividades complexas e que exigem esforço físico e mental do enfermeiro para o seu desenvolvimento, pois a maioria dos profissionais enfermeiros acaba entrando em conflito por não saberem o limite da sua atuação como profissionais.

    Outra sensação expressada na atividade foi a de frustração quanto ao plano terapêutico aplicado ao usuário, pois em algumas ocasiões o usuário acaba não correspondendo de forma satisfatória aos objetivos traçados.

    Curiosamente, observamos as semelhanças entre os sentimentos e vivências dos sujeitos da pesquisa, expressados na pré-tarefa. Como efeito disso, notamos que os indivíduos envolvidos na pesquisa escolheram praticamente as mesmas figuras, dando-lhes, conseqüentemente, as mesmas interpretações subjetivas.

    Como mencionamos no método, agrupamos as idéias e pontos comuns em seus discursos e, a partir deles, estabelecemos o processo de categorização dos resultados, onde identificamos as seguintes categorias: Repercussões do trabalho sobre a saúde mental dos enfermeiros; O sofrimento no trabalho; Estratégias de enfrentamento; Família e trabalho; Trabalho no CAPS x outro trabalho.

    Na categoria 1, repercussões do trabalho sobre a saúde mental dos enfermeiros,notamos nas falas de todos os entrevistados que, um ambiente de trabalho inadequado, principalmente no que diz respeito à estrutura física, é algo que prejudica o desenvolvimento das atividades terapêuticas, ocasionando um sentimento de desprazer nos enfermeiros da referida instituição.

    “[...] O ambiente é muito quente. Durante os atendimentos nós (profissionais e usuários) ‘pingamos’ tanto de suor que as vezes eles (os usuários) perdem até a vontade de falar” (E1).

    “[...] O local não é adequado, eu trabalho no período da tarde, onde eu atendo num ambiente extremamente insalubre, é muito quente e não conseguimos desenvolver um bom trabalho.” (E2).

    Observamos que o prazer no trabalho em saúde mental está ligado diretamente à assistência ao usuário e às condições oferecidas pelo ambiente de trabalho. Segundo Martins (2000), saber que de algum modo ocorreu a sua contribuição humana, através do cuidado, gratifica e proporciona recompensa emocional ao profissional. Outros estudiosos, como Guimarães & Grubits (1999), relatam que os fatores ambientais (falta de equipamentos, estrutura e recursos humanos), são fontes causadoras de estresse, sendo este último, um dos males que mais afeta a saúde mental dos profissionais em questão.

    Conjuntamente aos fatores estressantes, a vulnerabilidade orgânica e a capacidade de avaliar, de enfrentar situações conflitantes do trabalho, podem levar a uma ameaça do desequilíbrio da homeostase do organismo, com resposta somática e psicossocial, sendo os efeitos mais conhecidos os cardiovasculares, do sistema nervoso central, psicológicos e comportamentais (SOUZA et al, 2002).

    De acordo com Bianchi (1990) a freqüência a cursos de pós-graduação poderia resultar na diminuição dos estressores percebidos pelos enfermeiros.

    Na categoria 2, o sofrimento no trabalho, os entrevistados relatam situações de sofrimento como a realização de atividades desgastantes física e mentalmente, as manifestações físicas do desgaste mental, e as relações profissional-usuário e profissional-profissional.

    “Ao sair de um dia de trabalho no CAPS me sinto exaurida, completamente exaurida! Tudo somos nós enfermeiras. Somos chamadas para resolver qualquer problema, então fico muito desgastada [...]” (E1).

    Segundo Marazina (1991), o trabalhador da saúde mental atende a uma demanda de alta complexidade e não trata somente das categorias psicopatológicas ou psicanalíticas. Ele tem que se haver com questões sociais como a fome, a pobreza, desestruturação familiar, desemprego, falta de redes sociais de apoio para as pessoas, além das psicoses causadas pelo esmagamento do sujeito pela sociedade atual.

    No depoimento de E2, notamos que o sofrimento se manifesta muitas vezes através do corpo, no somático, e que a partir disso, é que o profissional se dá conta do excesso de trabalho e da carga mental que disponibiliza para realizá-lo.

    “[...] Já teve momentos de eu ficar extremamente ansiosa, comecei a desenvolver uma dispnéia de causa desconhecida, uma fraqueza que não sabia de onde era, começava a chorar; procurei atendimento e descobri que não tinha nada de orgânico, era tudo estafa mental [...]” (E2)

    De acordo com Turato (2003), as somatizações podem ser definidas, entre outros modos, como o processo através do qual os conflitos profundos do âmbito psíquico, uma vez não resolvidos satisfatoriamente, usam a via corporal para um necessário alívio, levando a transtornos manifestados no corpo.

    No indicador relações interpessoais existem mobilizações de sentimentos na relação profissional-profissional, demonstrando que esse aspecto também merece atenção no cotidiano de trabalho. O convívio relacional é fonte de apoio bem como de conflitos, como observamos na fala de E4:

    “(...) Como o grupo é bastante heterogêneo, posso dizer que me relaciono de forma excelente com alguns colegas e de forma regular com outros e bom com outros, porque o grupo é muito heterogêneo e fica difícil dizer que agente se dá bem de forma excelente com todo mundo”.

    A falta de integração da equipe e de espaços de escuta e reflexão podem ser identificados como fatores que contribuem para o adoecimento dos trabalhadores e, parafraseando Ramminger (2005), dois caminhos diferentes podem abrir espaço para o adoecimento: o de não encaixar-se no modo de trabalho que a equipe de saúde mental exige e o aparecimento do trabalhador-militante, que, por seu envolvimento afetivo, sobrecarrega e desgasta o cotidiano de trabalho, por exigir mais tarefa e esperar que o colega também se responsabilize tanto quanto ele.

    Na categoria 3, estratégias de enfrentamento, notamos que os entrevistados utilizam diversas estratégias de enfrentamento ao se deparar com o sofrimento do outro.

    “Ah, eu vou pro cinema [...]” (E1).

    “Agente tenta não absorver, fazemos as reuniões de grupo dos funcionários, as sextas-feiras temos atividades internas onde agente se trabalha porque agente precisa disso[...]” (E2).

    “Eu tento usar a estratégia da cooperação, da ajuda mútua, tentando não prejudicar os atendimentos dos usuários [...]” (E3).

    “Qualquer problema de trabalho que eu tenha no CAPS eu tento compartilhar com meus colegas [...]” (E4).

    Segundo Bianchi (1990), o lazer constitui uma estratégia individual de enfrentamento que envolve habilidades de desenvolver estratégias interiores para enfrentar o estresse causado pelo trabalho.

    No relato de E4 notamos que o mesmo procura dividir com a equipe qualquer problema que surja em relação ao trabalho desenvolvido com o usuário. De acordo com Pitta (1999), esse mecanismo de defesa é denominado redução do peso de responsabilidade, onde a mesma é diluída entre os vários profissionais de saúde.

    Constituem também estratégias de enfrentamento, o suporte dos colegas de trabalho, por vivenciarem as mesmas situações no dia-a-dia da referida instituição, o que é evidenciado na fala de E3.

    Destacamos a participação dos enfermeiros no grupo focal como forma de trabalhar o sofrimento do outro, de acordo com as experiências de cada um dos trabalhadores, sendo uma estratégia que aparece como forma de escuta mútua no trabalho. Observa-se que existe na referida instituição uma atividade nas sextas-feiras denominada de atividades internas, que visa resolver os problemas administrativos, conflitos internos com supervisão, somados à atividades de relaxamento, ioga, entre outros.

    Na categoria 4, família e trabalho, constatamos nos relatos que os enfermeiros tentam conciliar as questões familiares com as laborais, de forma que o trabalho não interfira na família e vice-versa.

    Podemos evidenciar na fala de E1 a relação direta entre estabilidade do relacionamento família-trabalho e bem-estar geral, ficando evidente a importância da família na manutenção da saúde mental desses profissionais.

    “[...] Acho que independente de você ter 2, 3 ou 4 empregos, sua relação com família tem que estar funcionando direitinho. Aí ‘tá’ tudo certo.” (E1)

    A família é entendida como rede primária de interação social e provedora de apoio indispensável à manutenção da integridade física e psicológica do indivíduo. Assim, a família torna-se referência nas crenças, valores e comportamentos do indivíduo, à medida que pune ou premia suas atitudes, orientando-o quanto à forma de agir (CAMPOS, 2004).

    Notamos também que conciliar as questões familiares com as laborais, muitas vezes pode ser dificultoso.

    “[...] tenho que equilibrar, porque tem as atividades diárias e os nossos compromissos, então é bem exaustivo.” (E2).

    O estresse provocado pela dificuldade em conciliar as demandas de trabalho e da família acarreta conflitos que podem serem considerados como a conseqüência de toda prática que provoca desequilíbrio nesta díade, nos momentos em que existe uma incompatibilidade na realização de atividades nas duas esferas (COOPER & LEWIS, 2000; FARIA, 2001; SERRA, 2001).

    Nos relatos de E3 e E4 observamos que há uma separação entre as atividades laborais e familiares, permitindo assim a menor interferência possível das questões de trabalho na família e vice-versa, pois a família e o trabalho são dois espaços sociais que levam as pessoas a vivenciarem experiências que delimitam “de algum modo a identidade pessoal e social” (CHANLAT, 1996).

    “[...] eu não levo trabalho ‘pra’ casa, uso o horário de trabalho para o trabalho e o horário da minha casa, da minha família ‘pra’ a minha família.” (E3).

    “Dedico cada turno a sua função [...] eu acho que fim de semana e feriado é ‘pra’ você curtir com a sua família, seja lá de que jeito for.” (E4).

    Acreditamos então, que a principal atitude adotada é a de tentar manter os assuntos de cada domínio na área do mesmo, evitando-se assim que conflitos originários de um deles sejam levados a interferir no outro.

    Na categoria 5, trabalho no CAPS x outro trabalho, notamos que todos possuem outro emprego em alguma outra instituição e que as opiniões divergem em relação às interferências que enfrentam devido possuírem outro emprego.

    Podemos evidenciar nas falas de E1, E2 e E4 que o fato de trabalhar em outra instituição não atrapalha as atividades realizadas no CAPS, enquanto que E3 relata o contrário, afirmando que ir ao CAPS depois de ter saído de uma atividade em outro emprego causa um desgaste físico e mental, interferindo nas suas atividades diárias quando vem de plantão noturno para o CAPS, prejudicando no sentido “latu sensu” a prestação do serviço a população assistida naquele dia no referido Centro de Atenção Psicossocial.

    “Também exerço a docência. Não tenho intercorrências [...] Até me ajuda, pois acabo exercendo a função de pesquisadora e isso me ajuda muito no CAPS.” (E1).

    “Trabalho no Hospital de média e alta complexidade com crianças cardíacas [...] Quando chego no CAPS parece ser uma nova vida, porque apesar de ser um trabalho estressante, agente se diverte com os usuários e passa a ser um trabalho prazeroso.” (E2).

    “Trabalho na SESMA, no Pronto Socorro com atendimento e de urgência e emergência. Como eu sou plantonista, vir para o CAPS no outro dia, eu venho cansada [...] Tem essa interferência mesmo no desgaste mental e físico de uma noite de plantão.” (E3)

    “Trabalho em outra instituição, pela SESMA e em relação às repercussões entre CAPS e o outro trabalho, pra mim elas são positivas porque eu consigo resolver muitas coisas lá com esse aprendizado daqui do CAPS [...]” (E4)

    Para Miranda et al. (2005), a política atual mantém o achatamento e a inexistência de reajuste salarial, levando a maioria dos profissionais à dupla ou tripla jornada de trabalho, somada à sobrecarga de trabalho, cansaço e estresse, pode prejudicar a prestação de serviço ao paciente.

    Entre os horários de trabalho existentes o que causa um maior número de perturbações é o trabalho noturno, devido o organismo humano estar adaptado ao trabalho durante o dia e ao descanso e reconstituição das energias durante a noite. Assim, o trabalho noturno exige atividade do organismo quando ele está predisposto a descansar, e vice-versa. Também a sociedade é organizada para um ciclo diário de trabalho-lazer-sono. A execução do trabalho noturno é influenciada por fatores como o ritmo circadiano, tipo de atividade e características individuais, acarretando alterações do sono, distúrbios gastrintestinais e cardiovasculares, desordens psíquicas e desajustes da vida social e familiar (GRANDJEAN, 1998; IIDA, 1998). Todos estes fatores afetam a qualidade da assistência prestada ao cliente, porém, sob a ótica da ergonomia, estes fatores comprometem primeiramente a saúde física e mental do trabalhador com conseqüências negativas sobre a sua capacidade para o trabalho e sua qualidade de vida, como foi observado no relato de E3 que, além das atividades no CAPS, desenvolve trabalho noturno.

Considerações finais

    O estudo realizado oportunizou analisar as repercussões das experiências vivenciadas pelos enfermeiros de um CAPS de Belém ao cuidar de portadores de transtornos mentais. Abordar essa temática foi um desafio, haja vista que existem poucos estudos e pesquisas na área da saúde do trabalhador que transcorram acerca da saúde mental do mesmo.

    Enfatizamos que os estressores laborais, na maioria das vezes, acabam por provocar sinais e sintomas emocionais, assim como são somatizados pelo organismo, interferindo nas relações profissional-usuário, profissional-profissional e profissional-família. Em contrapartida, o enfermeiro, à sua maneira, encontra ou pode encontrar um suporte sobre o qual possa se apoiar durante a sua atuação, como pudemos observar nesta pesquisa. Porém nem todos os indivíduos têm os mesmos recursos emocionais e conseguem “suportar” bem o envolvimento que têm com o usuário. Desta forma, nos parece ser de extrema importância pensar neste cuidador: será que ele está preparado para lidar emocionalmente com toda a carga que lhe é depositada durante os atendimentos realizados? Sua formação contempla, e de que maneira contempla, os aspectos subjetivos de sua atuação?

    Nesse contexto, consideramos que a realização de pós-graduação profissional na área da saúde mental é essencial para a atuação, uma vez que permite além da troca de vivências com outros profissionais o contato com a teoria, reforçando as competências gerais do profissional, o que pode contribuir positivamente na avaliação dos estressores no trabalho. Ademais, o papel da capacitação e educação continuada é considerado como auxiliar da formação técnica para atuar no campo da saúde mental, permitindo aos profissionais de saúde mental o mesmo acesso de informação, o que reflete maior entrosamento entre equipe e melhor desenvolvimento no trabalho.

    Diante disso, cabe aos órgãos competentes dos recursos humanos das instituições preconizar a divulgação de capacitações aos profissionais que ingressam nas instituições, com vistas a importância que este conhecimento pode representar na qualidade do trabalho do enfermeiro e, conseqüentemente, em seu equilíbrio físico e psíquico.

    O estudo foi relevante, pois poderá subsidiar pesquisas posteriores em uma temática ainda pouco explorada e, também, importante para o CAPS por possibilitar o conhecimento do perfil dos profissionais enfermeiros da instituição, bem como a elaboração de estratégias para prevenir e/ou tratar o adoecimento mental de tais profissionais.

Referências

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