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Educação Física e gênero: práticas docentes 

e suas implicações nas escolas de Araxá, MG

Educación Física y gênero: prácticas docentes y sus implicancias en las escuelas de Araxá, MG

 

*Graduada em Educação Física pelo Centro Universitário do Planalto de Araxá (UNIARAXÁ)

Bolsista do Programa de Iniciação Científica do Uniaraxá (PIBIC/FAPEMIG: 2009-2010)

Cursando Especialização em Esportes e Atividades Físicas Inclusivas pela Universidade Federal

de Juiz de Fora (UFJF) e Aluna Especial de Mestrado em Educação Física

pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM)
**Professro orientador. Centro Universitário do Planalto de Araxá

Suéllen Cristina Vaz de Oliveira*
Sérgio Cardoso Barcelos**

suellenc.oliver@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Sendo a questão de gênero construída social e culturalmente, a escola constitui um local importante de representações e manifestações nesse campo, capaz de identificar e expressar valores e ações. No caso específico da Educação Física, que aborda principalmente a questão motora, as representações e expressões de gênero podem ser bem nítidas na escola, possibilitando estudos para análise das interações, fragilidades e potencialidades tanto dos/as professores/as quanto alunos/as perante as questões de gênero. O presente estudo teve como propósito identificar durante o desenvolvimento das atividades nas aulas de Educação Física do ensino fundamental, 6º ano, as representações, ações e reações dos professores/as e alunos/as, frente às manifestações de expressão de gênero. O estudo abarcou cinco escolas do município de Araxá-MG que apresentaram o maior número de alunos matriculados no ano de 2009, sendo uma em cada setor da cidade. A pesquisa, que apresenta característica qualitativa, foi realizada através da combinação entre a pesquisa bibliográfica e a de campo. As técnicas utilizadas abrangeram o uso de questionários aplicados aos professores/as e alunos/as, e também, por meio de observações das aulas de Educação Física. Esta pesquisa permitiu constatar a necessidade de uma reflexão sobre as estratégias pedagógicas que são utilizadas nas aulas de Educação Física, na busca de um melhor convívio e desenvolvimento das atividades, respeitando as diversidades entre os gêneros. Chegou-se a essa conclusão, pois se constatou que existem certos conflitos e dificuldades dos/as educadores/as no enfrentamento das questões de gênero presentes na cultura escolar. A partir das respostas dos/as professores/as de Educação Física, percebeu-se a necessidade de uma formação continuada através de palestras e cursos abordando a temática pesquisada, envolvendo diversos segmentos da escola nela envolvidos. Constatou-se a necessidade destas atualizações no sentido de desenvolver um processo de ensino-aprendizagem mais eficaz e seguro aos professores/as que, ao longo da pesquisa de campo e das observações feitas evidenciaram algumas dificuldades na aplicabilidade dos conteúdos ligados a hábitos higiênicos, sexuais e comportamentais de meninos e meninas. O estudo, além de diagnosticar algumas dificuldades nas práticas docentes ligadas a gênero durante as aulas de Educação Física do 6º ano, permitiu reflexões sobre os padrões tradicionais de relacionamento entre homens e mulheres, no sentido da reconstrução e ressignificação de experiências de crianças e adolescentes em sua diversidade de gênero. A perspectiva dessas reflexões foi à superação de preconceitos e estereótipos presentes no repertório motor, social, afetivo e cognitivo dos/as alunos/as e na representação dos/as próprios/as professores/as.

          Unitermos: Educação Física Escolar. Gênero. Educação.

 

Abstract

          As a matter of socially and culturally constructed gender, school is an important site of performances and demonstrations in the field, able to identify and express values and actions.In the specific case of Physical Education, which primarily addresses the issue motor, representations and expressions of gender can be quite sharp in school, enabling studies to analyze the interactions, both weaknesses and strengths of the teachers, the students as before the gender issues. This study aimed to identify during the development of activities in physical education classes in the 6th grade, representations, actions and reactions of teachers and students, and face the manifestations of gender expression. O estudo abarcou cinco escolas do município que apresentaram o maior número de alunos matriculados no ano de 2009, sendo uma em cada setor da cidade. The study encompassed five schools in the municipality that had the largest number of students enrolled in 2009, one in each sector of the city. A pesquisa, que apresenta característica qualitativa, foi realizada através da combinação entre a revisão bibliográfica e pesquisa de campo. The research, which presents qualitative characteristic, was accomplished through the combination of literature review and field research. As técnicas utilizadas foram de campo, realizada através de questionários aplicados aos professores/as e alunos/as, e também, por meio de observações das aulas de Educação Física. The techniques used were field technique, was obtained from questionnaires answered by teachers and students, and also, through observations of physical education classes. Esta pesquisa permitiu constatar a necessidade de uma reflexão sobre as estratégias pedagógicas que são utilizadas nas aulas de Educação Física, na busca de um melhor convívio e desenvolvimento das atividades, respeitando as diversidades entre os gêneros. This research revealed the need for reflection on the pedagogical strategies that are used in physical education classes in search of better living and development activities, respecting the differences between genders. Chegou-se a essa conclusão, pois se constatou que existem conflitos e dificuldades dos/as educadores/as no enfrentamento das questões de gênero presentes na cultura escolar. Was reached that conclusion, since it was found that there are conflicts and difficulties of educators in the face of gender issues present in the school culture. A partir das respostas dos/as professores/as de Educação Física, percebeu-se a necessidade de uma formação continuada através de palestras e cursos abordando a temática pesquisada, envolvendo diversos segmentos da escola nela envolvidos.  Constatou-se a necessidade destas atualizações no sentido de desenvolver um processo de ensino-aprendizagem mais eficaz e seguro aos professores/as que, ao longo da pesquisa de campo e das observações feitas evidenciaram algumas dificuldades na aplicabilidade dos conteúdos ligados a hábitos higiênicos, sexuais e comportamentais de meninos e meninas. From the answers of the teachers, the physical education realized the need for continuing education through lectures and courses addressing the topic searched, involving various segments of the school involved in it. It was the need for these upgrades in order to develop a teaching-learning process more effective and safe for teachers that, throughout the field research and observations showed some difficulties in the applicability of the content linked to hygienic habits, and sexual behavior of boys and girls. O estudo, além de diagnosticar algumas dificuldades nas práticas docentes ligadas a gênero durante as aulas de Educação Física do 6º ano, permitiu reflexões sobre os padrões tradicionais de relacionamento entre homens e mulheres, no sentido da reconstrução e ressignificação de experiências de crianças e adolescentes em sua diversidade de gênero. The study, in addition to diagnosing some difficulties in teaching practices related to gender during physical education classes in the 6th grade, allowed reflections on the traditional patterns of relationships between men and women, towards the reconstruction and reinterpretation of experiences of children and adolescents in diversity of gender. A perspectiva dessas reflexões foi à superação de preconceitos e estereótipos presentes no repertório motor, social, afetivo e cognitivo dos/as alunos/as e na representação dos/as próprios/as professores/as. The prospect of these reflections was the overcoming of prejudices and stereotypes present in the motor repertoire, social, emotional and cognitive of the students and own representation of teachers.

          Keywords: Physical Education. Gênero. Gender. Educação. Education.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 161, Octubre de 2011. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Percebe-se que a questão de gênero vem sendo retratada ao longo da civilização, na qual há uma delimitação de diferenças entre homens/mulheres, meninos/meninas. O termo gênero começou a ser utilizado mais intensamente no século XX, nos anos 70, procurando desvincular a discussão das relações sociais entre os sexos de seu aspecto puramente biológico (PEREIRA, 2004).

    Desta maneira, é importante atentar para o conceito de gênero que se trata do modo como as características sexuais são entendidas e expostas ou, então como são estabelecidas na sociedade juntamente com seu o seguimento histórico. Apesar dos caracteres sexuais que definem a questão de gênero, o ambiente em que o ser humano está inserido influenciará diretamente a postura e a representação do menino ou menina nas relações sociais.

    Segundo Caron (2008) entender a questão do gênero perpassa por uma construção social, que significa que, é constituído de modo plural, pois há vários modos de ser homem e várias formas de ser mulher, influenciadas é claro pelas classes sociais, raça e outros aspectos culturais. Apesar de analisarmos a questão do gênero basicamente pelas divisões baseadas no sexo, esta não permite que perceba-se as representações e apresentações das diferenças sexuais, haja visto que a questão do gênero é construída socialmente e culturalmente. Durante essa construção constituímos algumas diferenças entre os gêneros, e para melhoria da convivência e respeito das pessoas dos diferentes gêneros, atualmente, discussões em relação a essa temática causa novos desafios. Um destes desafios se encontra no âmbito educacional, onde permitirá estudos analisando a convivência que respeite as diferenças, as fragilidades e potencialidades de cada pessoa, visto que a família e, simultaneamente, o gênero influenciam as práticas escolares, bem como os processos de ensino aprendizagem.

    É necessário frisar que a escola é fundamental no processo de formação dos alunos e alunas, na missão de proporcionar a eles conhecimentos, discussões e posicionamentos a respeito das relações humanas e profissionais. Na escola a convivência entre meninos e meninas deve ser pensada e articulada com as propostas pedagógicas de cada educador no sentido de formação sem distinção da questão do gênero.

    No caso específico da Educação Física, que aborda principalmente a questão motora, as representações e expressões de gênero podem ficar bem nítidas, como por exemplo, nas valências físicas, onde segundo estereótipos já criados pelos próprios pesquisadores e/ou pela sociedade, os meninos têm mais força, mais velocidade e mais agilidade do que as meninas. Logo as representações e relações interpessoais entre gêneros ficam acirrada, no sentido, de exposição e definição de possibilidades e qualidade de movimento dos alunos em relação ao das meninas.

    A questão a ser discutida perpassa o fato das atividades oferecidas, pelas influências sócio-culturais que cada menino e menina manifesta no meio em que vive, pois a individualidade de cada aluno deve ser trabalhada levando em consideração experiências vivida anteriormente para que o professor/a elabore um planejamento adequado, fazendo com que essas experiências influenciem diretamente em seu aprendizado, lembrando que cada indivíduo possui um nível de aprendizado adquirido pela sua adaptação cultural.

    Compreende-se que a questão de gênero deve ser discutida como um assunto de extrema importância no processo de formação do professor/a, para que assim possa agregar junto a Educação Física novas propostas aos currículos e conseqüentemente dar-lhes uma aplicabilidade concreta e produtiva.

    Percebe-se que a Educação Física apresenta particularidades importantes no tocante ao gênero, tornando importantes as reflexões sobre sua prática na escola, revendo a linguagem utilizada, a metodologia docente e a formação profissional, voltando intencionalmente o seu foco para a questão do gênero, no sentido de promover uma nova prática pedagógica, incorporada nessas reflexões (PEREIRA NETTO, 2004).

    Desta forma o objetivo deste estudo pretendeu identificar durante o desenvolvimento das atividades nas aulas de Educação Física do 6º ano, as representações, convivência, ações e reações dos/as professores/as, alunos e alunas, analisando as questões de expressão de gênero, as relações expressas entre alunos e alunas e as relações expressas entre alunos/as e professores/as.

    Temos como objetivos específicos: identificar se a participação dos/as alunos/as nas atividades é mista ou separada por questões de gênero; verificar se existe diferença e preferência dos/as professores/as na prática pedagógica em turmas mistas e separadas; analisar se os/as professores/as têm ou não problematizado questões de gênero durante as aulas; analisar a relação dos alunos e alunas durante o período de aula.

Metodologia

    Trata-se de uma pesquisa qualitativa, que foi realizada através da combinação de pesquisa bibliográfica e de campo. Enquanto procedimento amplo de raciocínio, também caracterizado como modo de observação, foi utilizada a análise de conteúdos segundo Minayo (1994, p.75-76), que nos abrange as seguintes etapas do método: “pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultados obtidos e interpretação”, visando uma melhor aplicabilidade na estruturação da pesquisa. Com base em Minayo (1994 et al, p.69) esta fase aponta três finalidades: estabelecer uma compreensão dos dados coletados, confirmar ou não os pressupostos da pesquisa e/ou responder as questões formuladas, e ampliar o conhecimento sobre o assunto pesquisado.

    A pesquisa bibliográfica foi realizada valendo-se das seguintes técnicas: levantamento bibliográfico inicial, correspondente aos temas-chave: (Educação Física Escolar, Gênero e Educação); análise textual; análise interpretativa; análise crítica.

    A pesquisa de campo associada ao corpo teórico, proporcionou uma interpretação e análise mais clara permitindo atingir os objetivos desta pesquisa. Foi realizado o levantamento das escolas, da área urbana do município de Araxá, tendo como critério de seleção os setores da cidade e nos setores, a escola com o maior número de alunos matriculados no ano de 2009, perfazendo-se assim, com a concordância da direção na realização da pesquisa, concordância e participação do professor/a na pesquisa e atuação do mesmo/a no Ensino Fundamental (6º ano).

    Com relação à técnica de coleta de dados, foi utilizado: observação, com utilização de um diário de campo, com “categorias” fixadas a partir das pesquisas bibliográficas, sendo feito o registro detalhado de todos os acontecimentos relativos à prática pedagógica dos professores e professoras do ensino fundamental de Araxá-MG, e as expressões desenvolvidas pelos alunos e alunas durante as aulas de Educação Física; e, questionário, para os professores, traçando facilidades, fragilidades e preferências de ministrar aulas para meninos e/ou meninas. Questionário aos alunos e alunas identificando suas considerações a respeito do desenvolvimento de atividades entre meninos e meninas.

    Os dados foram colhidos nos períodos das aulas de Educação Física, no turno da manhã e da tarde, na qual foram observadas 03 aulas de cada turma do 6º ano. Foram entrevistados 4 alunos e 4 alunas de cada turma mista de 6º ano, de cada escola. O critério de seleção dos/as alunos/as foi feito de forma aleatória, ou seja, após a explanação do que seria a entrevista, foram selecionados os alunos que se propuseram a responder as questões.

Resultados e discussão

    Através do levantamento realizado a respeito das escolas do município, e a obediência dos critérios citados anteriormente, contou-se com a participação na pesquisa seis professores/as de Educação Física atuantes no 6º ano de ensino fundamental, porém um/a deles/as não respondeu o questionário por completo.

    Dessa forma, diagnosticou que três escolas desenvolviam aulas mistas (Setor Oeste, Leste e Norte) e duas desenvolviam aulas separadas por sexo (Setor Sul e Centro). Sob bases biológicas, a Educação Física tem construído papéis diferenciados para os sexos optando, por vezes, pela separação destes, onde dois dos/as docentes expôs que possuem uma facilidade maior na condução do trabalho realizado com os/as alunos/as em relação às diferenças sexuais. Porém, dois professores/as relatam a importância de um trabalho coletivo, visando à preparação desde a infância ao futuro para um melhor convívio entre os gêneros. Tais constatações mostram-nos que a separação de meninos e meninas nas aulas de Educação Física desconsidera a articulação do gênero com outras categorias, a existência de conflitos, exclusões e diferenças entre pessoas do mesmo sexo, além de impossibilitar qualquer forma de relação entre meninos e meninas.

    Na perspectiva se existe ou não diferença na prática pedagógica aplicada aos meninos e meninas, quatro dos/as docentes relataram não haver, pois procuram utilizar a mesma para que não se sintam diferentes, porém são necessárias certas variações na forma pedagógica pela própria estruturação do gênero. Um/a dos/as docentes afirmou ter diferença na prática pedagógica aplicada aos meninos e meninas, sendo a mesma na execução de uma determinada tática, sistema esportivo, na prática dos elementos básicos de cada modalidade; e outro/a alegou que em certos momentos apresenta diferença na prática pedagógica.

    Foi permitido constatar que em algumas aulas, a prática pedagógica aplicada pelos/as professores/as eram igualitárias para ambos os sexos, porém, até mesmo nestas aulas haviam adaptações, variações da mesma pela própria estruturação do gênero, conforme relatada anteriormente.

    Pelas explanações feitas pelos/as professores/as não diagnosticamos dificuldade na aplicabilidade de seus conteúdos em relação aos gêneros. Nota-se que meninos e meninas nem sempre mantêm nítidas as divisões de gênero, estando por vezes separados e noutras juntos, o que, nas aulas de Educação Física, nem sempre ocorre sem muitos conflitos, perante estas circunstâncias os docentes devem tomar providências. Dessa forma, apenas um dos professores admitiu possuir dificuldade na aplicabilidade dos conteúdos em relação aos gêneros, especificamente em conteúdos envolvendo a dança, visto que este docente é do sexo masculino.

    Visto que são inúmeros os conflitos e as dificuldades dos educadores no enfrentamento das questões de gênero presentes na cultura escolar, especialmente nas aulas de Educação Física, pois se trata de valores e normas culturais que se transformam muito lentamente (SOUZA e ALTMANN, 1999). Fatos que nos levam a uma reflexão sobre a forma na qual lecionamos, visto que questões de gênero e ensino-aprendizagem são acompanhadas por processos de evoluções e transformações ao longo da vida.

    A respeito do/a alunos/as, percebe-se que dentre o questionamento do que eles/as menos gostavam nas aulas de Educação Física, (no caso em turmas mistas) a resposta mais destacada foi dividir as aulas com os diferentes gêneros, mostrando uma maior incomodação masculina (20,8%; e 8,3% em relação ao total de meninas) perante a presença feminina durante o desenvolvimento das aulas, por questões de habilidade, relacionamento e a não identificação das mesmas com certas práticas esportivas, na qual foi citada em sua grande maioria, o futebol, sendo este considerada por eles masculina “esporte de homem é de homem e de mulher é de mulher”; “elas não gostam das mesmas brincadeiras que a gente gosta”; “elas não sabem jogar”; “elas são manhosas”. Já para as meninas, o que menos gostam é o futebol, 33,4% relacionado ao número total de meninas e 16,6% relativo ao número total de alunos e alunas; para elas a modalidade é considerada chata, possuindo dificuldades em sua execução (falta de habilidade), e além do mais, caracterizam-no como esporte masculino, na qual podem se machucar “é muito chato, é um jogo que você machuca muito”, “não é brincadeira de mulher”; “os homens que gostam muito e as mulheres gostam de várias outras coisas”.

    Algumas alunas argumentaram que não sabiam jogar. A falta de interesse estava diretamente relacionada ao significado que atribuem à atividade física como sendo masculina ou feminina, conforme Louro (1997 apud ANDRADE e DEVIDE, 2006) ressalta: “É indispensável questionar não apenas o que ensinamos, mas o modo como ensinamos e que sentidos nossas/os alunas/os dão ao que aprende” (p. 64). O desprazer gerado pela imposição as leva a buscarem formas de se protegerem (a auto-exclusão) dos confrontos e erros possíveis ao jogarem com os alunos que “sabem jogar”, evitando constrangimentos, excluindo-se do jogo (ALTMANN, 2002 apud ANDRADE e DEVIDE, 2006).

    Rangel (1997 apud ARAUJO et al, 2008) cria pressupostos que explicam sobre as divergências motivacionais existentes entre ambos os sexos, onde se supõe que os alunos do sexo masculino consideram as aulas de Educação Física mais motivantes, pois valorizam a realização e o status já as meninas valorizam as brincadeiras e as amizades. Sobre tal situação, vemos que alunos de sexo feminino acabam não tendo seus desejos e expectativas atendidas e, conseqüentemente, o nível motivacional é menor em comparação com o masculino, gerando assim, possíveis exclusões.

    Através do questionário realizado com os/as alunos/as pode-se constatar que cerca de 50% das meninas e 39,6% dos meninos acham legais aulas mistas. E que 43,75% e 58,3% respectivamente, não gostam que as aulas sejam mistas, pela diversidade de interesse, comportamento e habilidade.

    Em relação à problemática específica da categoria gênero, um estudo realizado em uma escola, Colégio Pedro II (CUNHA JÚNIOR, s/d), revelou que os/as alunos/as expressam conceitos/opiniões estereotipados e preconceituosos, tais como: "Futebol é coisa para homem!"; "O esporte de menina é o queimado!”. Em relação às características comportamentais, as meninas eram vistas como grupo frágil, submisso e desprovido de qualidade nas habilidades motoras, e os meninos como fortes, hábeis, resistentes e valentes (CUNHA JUNIOR, 1995 apud CUNHA JÚNIOR, s/d).

    Dessa forma o cerne dessa problemática é voltado à implementação do paradigma da aptidão física e em sua tendência sexista. Nesta medida, devemos construir estratégias que visem alcançar mudanças a respeito desta concepção de Educação Física majoritária no país, buscando uma reflexão sobre a cultura corporal.

    Em suma, os espaços atribuídos para o desenvolvimento das aulas é freqüentemente dominado pelos meninos, na qual tente uma maior participação dos mesmos. Cabe ressaltar que existe a divisão física/espacial entre meninos e meninas nas aulas de Educação Física, porém a divisão cultural e simbólica quando em uma aula livre são evidentes, por exemplo, o professor ou a professora deixam os alunos e alunas realizarem qualquer atividade, neste momento a divisão de papéis sociais fica clara, pois os meninos jogam futebol e as meninas dançam ou conversam fora da quadra esportiva destinada às aulas. Observou-se que o desenvolvimento de aulas mistas gera incomodo aos alunos, do gênero masculino, fator que propicia e torna evidentes questões de exclusão, ocorrendo principalmente com meninas, não sendo excluídas de jogos simplesmente por questões de gênero, mas por serem consideradas mais fracas e menos habilidosas que seus/suas colegas. Essa segregação e exclusão dos indivíduos podem ocorrer das mais diversas formas: através de práticas corporais, gestos da professora, do professor ou dos alunos e alunas e também através dos silêncios, das ausências. A persistência de uma Educação Física que não reflete sobre suas práticas e seu papel na formação de seus alunos e alunas acabam colaborando para a formação dos estereótipos e preconceitos. Dessa forma, tendo a consciência de que a formação dos sujeitos ocorre em diversas instâncias sociais, entre elas a escola, não podemos ignorar o papel da Educação Física, uma vez que este campo de saber trata diretamente das questões ligadas ao corpo. Cabe então repensar o papel desse conteúdo escolar, buscando novas formas de ensino e novas relações sociais, através de uma formação continuada, sendo trabalhadas de maneira transversal, com constância, nas mais diversas formas, envolvendo também, outras disciplinas.

    Cabe ao professor/a de Educação Física quebrar paradigmas e adaptar as aulas para todos os alunos, como recurso para evitar exclusões entre meninos e meninas, a fim de articular idéias pré-concebidas sobre a sexualidade, do esporte à dança. Se a escola e a Educação Física são limitadas por idéias já pré-estabelecidas, por outro lado devemos lembrar que a escola e a Educação Física são também responsáveis pela construção de novas concepções de cultura e que é possível criar estratégias, propostas e atividades que proporcionem aos alunos novas aprendizagens corporais. É necessário, uma escola que proporcione treinamento e orientação aos docentes, que vise essa questão como uma mudança consciente e elaborada profissionalmente, ou seja, através de estudos e reciclagem. Isso é de fato, interessante, porque intuição, prática e experiência nem sempre são suficientes para cuidar da educação de seres humanos.

    Certamente, devemos convir que todos os profissionais da área da educação deveriam ter uma formação que privilegiasse o olhar para o desenvolvimento integral do ser humano, levando em consideração aspectos intelectuais, físicos, emocionais e sociais.

    O problema mais pontual, a meu ver, é que muitas vezes dificuldades observadas nos alunos esbarram em limitações pessoais dos educadores, que precisam de apoio e orientação. Necessitam de uma formação consistente que lhes possibilite rever sua postura, buscar o auto-conhecimento e o desenvolvimento de suas habilidades pessoais e profissionais.

    Volto a pensar em nossos professores e na capacidade que precisam desenvolver para escutar, olhar e refletir sobre as necessidades de cada aluno. É dessa forma que o/a educador/a abre espaço para que o seu aluno manifeste a individualidade. O ser é muito mais do que uma representação definida pelo aspecto fisiológico e cultural; ele guarda em si todas as características da humanidade. Cabe ao educador preocupar-se com essas questões, tão fundamentais e estruturais. Mas para isso tem de submeter-se à própria crítica, fundamentada em investigações que levem ao auto-conhecimento.

    É papel do professor/a revisar conceitos, discriminar o que é fruto de preconceito e condicionamento em suas posturas e intervenções.

Considerações finais

    Com todo o processo de observação e questionários realizados pode-se constatar que os/as professores/as do município de Araxá devem rever e refletir sobre sua prática atual na escola, voltando intencionalmente ao foco gênero, no sentido de promover uma nova prática pedagógica, incorporada nessas reflexões. Pois, nota-se que existe uma insegurança por parte dos mesmos em relação à aplicabilidade dos conteúdos e até mesmo sobre as questões que envolvem o tocante gênero.

    Podemos identificar que a participação dos alunos nas aulas são mistas em três escolas pesquisadas, e em duas são separadas por gênero. Para a maioria dos professores não existe diferença na prática pedagógica aplicada aos meninos e meninas, porém procuram utilizar a mesma atividade para que não se sintam diferentes, sendo necessária a variação da forma pedagógica pela própria estruturação do gênero. A preferência da maioria deles é por turmas mistas pela oportunidade de interação e trabalho coletivo, visando à preparação desde a infância ao futuro para um melhor convívio entre os gêneros. A maioria dos docentes relatou não possuir dificuldade na aplicabilidade dos conteúdos em suas aulas em relação aos gêneros, mas durante a observação realizada das aulas constatou-se certos conflitos e dificuldades por eles apresentados. O gênero masculino é mais participativo no desenvolvimento das aulas de Educação Física do que o gênero feminino. No relacionamento entre os gêneros existem muitas divergências, devido à presença de estereótipos e preconceitos enraizados nos diversos setores de convívio humano.

    Este estudo, além de diagnosticar as práticas docentes que determinassem questões de gênero durante as aulas de Educação Física do 6º ano, permitiu reflexões sobre os padrões tradicionais de relacionamento, para que assim, possamos, como professores/as trabalharmos na reconstrução e ressignificação de experiências motoras de meninos e meninas, superando os preconceitos e estereótipos presentes no repertório motor, social, afetivo e cognitivo dos/as alunos/as e na representação dos/as próprios/as professores/as.

    Sendo assim, através dos resultados obtidos, sugerimos que os profissionais de Educação Física revejam suas diretrizes pedagógicas, na qual percebemos a necessidade de uma formação continuada, através de palestras, cursos abordando a temática pesquisada, envolvendo diversos segmentos, para que através destas atualizações possam desenvolver um processo de ensino-aprendizagem eficaz, propiciando segurança ao professor/a na aplicabilidade dos conteúdos e visando à formação dos/as alunos/as.

    Devido à versatilidade da temática de estudos do gênero e também pelo estudo restrito à alunos/as de apenas um nível de ensino acreditamos que este pode ser um pontapé inicial em busca da realização de outras pesquisas envolvendo a temática pesquisada, e que visem proporcionar uma relação com mais equidade entre os seres humanos.

Referências bibliográficas

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