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O professor de Educação Física frente aos 

desafios do culto ao corpo na sociedade atual

El profesor de Educación Física frente a los desafíos del culto al cuerpo en la sociedad actual

 

Especialista em Educação Física Escolar

Universidade Federal de Santa Maria

(Brasil)

Gabriela Machado Ribeiro

gabimacrib@yahoo.com.br

 

 

 

 

Resumo

          O presente estudo pretende trazer à discussão como os aspectos sócio-histórico-culturais contribuíram ao longo da história da humanidade com o processo de construção e concepção de corpo vigente no momento.

          Unitermos: Culto ao corpo. Educação Física.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 161, Octubre de 2011. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    No atual cenário que se encontra a sociedade, marcado por grandes transformações, sobretudo tecnológicas, onde a produção e transmissão de informações acontecem com extraordinária velocidade, num processo de globalização não só político-econômico como também cultural, o corpo também tem sido utilizado como um veículo de propagação de informações, tendências e valores.

    Atualmente tem-se o corpo como um espetáculo, sendo usado para chamar a atenção das pessoas nos anúncios comerciais que nada tem a ver com o corpo em si só. Com o intuito de compreender o processo de construção e concepção de corpo vigente no momento, buscamos tecer alguns apontamentos acerca dos aspectos sócio-histórico-culturais que contribuíram ao longo da história da humanidade com esse construto.

Entendimento corpo: resgatando algumas concepções

    Ao fazermos uma breve retrospectiva podemos constatar que na Idade Média, período caracterizado pela grande religiosidade e culto ao divino, o corpo era tido como objeto de pecado. Acreditava-se que o corpo sentia os desejos, era submetido a tentações, induzia a práticas impróprias, comprometendo a pureza do ser. Nesse período, o essencial era manter a uma alma pura, livre de todo e qualquer pecado a fim de alcançar a vida eterna no paraíso.

    Com o fim da era medieval, a igreja deixa de ser o grande centro, perde-se em parte a figura de divindade e o homem passa a preocupar-se mais consigo. Outro fator contribuinte com essa volta do olhar a si foi o forte declínio da aristocracia. Os reis e rainha representavam para seus súditos o arquétipo de divindade na terra. Assim, o povo ao perder a referência de perfeição, começou a passos lentos, preocupar-se consigo mesmo.

    Com a ascensão da racionalidade, a Idade Moderna é marcada pela “separação” do corpo e da alma. Essa segmentação serviu como suporte para os estudos científicos, servindo como “princípio que autoriza a razão e a ciência, como uma instituição, a conhecer e dominar o corpo humano” (Silva, 1999 p. 11).

    Com a difusão dos estudos de fisiologia e o desvendamento do corpo humano desde suas partes as mais externas até as partes menores e mais complexas, o corpo passa a ser considerado a partir da perspectiva cartesiana, assumindo um caráter reducionista. A exaltação excessiva da racionalidade descarta por completo quaisquer fatores não-intelectuais, tais como emoções, sentimentos e sensações.

    Nesse período com a estruturação e ascensão da Medicina, os médicos assumem um papel importante no cenário social, estimulando o homem a voltar-se para a sua dimensão corporal. Através do discurso médico, o homem passa a acreditar em si como produtor de suas próprias energias abandonando a crença de que sua vitalidade, força e saúde eram recompensa pela sua devoção e culto ao divino. Ao se difundirem as consultas e a prática dos interrogatórios médicos a fim de identificar o mal que afligia os pacientes, esses passaram a incitar os enfermos a voltar à atenção para seu corpo, suas sensações, sintomas, etc.

    Os princípios pregados pela medicina atrelam-se à educação e a política trabalhando na formação de novos indivíduos necessários para a ordem socioeconômica capitalista que se estabelece na humanidade. Multiplicam-se as pesquisas dos médicos e higienistas sobre o funcionamento do corpo humano procurando conhecê-lo para melhor dominá-lo e dele dispor. Neste contexto a educação do físico dos indivíduos institui-se como uma necessidade na nova ordem social que emerge na instalação da sociedade industrial.

    Outro fator que contribuiu significativamente para a transformação da relação dos indivíduos com seus corpos, foi o desfecho das duas grandes Guerras Mundiais ocorridas do início até a metade do século XX. Neste contexto, ao serem destituídos os grandes ideais e as certezas que norteavam a humanidade, o homem é estimulado a voltar-se para o individualismo, para a própria imagem, para o culto ao próprio corpo, último reduto de apego fidelidade e adoração (Fontes 2006, p. 122 ). Tendo como pressuposto o fato de que as ideologias do passado estavam extintas, a própria saúde (que se configura como obtenção de boa forma física), passa a se impor como praticamente o único e exclusivo desejo e dedicação do povo.

    O século XX é marcado por diferentes significações atreladas ao corpo. Fontes (2006, 124) acena três estatutos culturais básicos:

    “corpo representado, visto e descrito pelo olhar da igreja, do estado e do artista; o corpo representante, um corpo ativo, autônomo quanto às suas práticas, consciente do seu poder político e revolucionário, porta-voz do discurso de uma geração, contestador, sujeito desse próprio discurso e agente propositor e defensor de reformas que vão da sexualidade à política; e o corpo apresentador de si, aparentemente a serviço de uma cultura que se pauta pelo efêmero e pelo imediato, caracterizado como porta-voz de forma e não de conteúdo”.

    Dessas representações corporais, a concepção de corpo apresentador de si mesmo vêm se alastrando no imaginário social. Essa disseminação teve início nos anos 80, após um período de mobilizações e manifestações políticas, artísticas, e pacifistas a favor de um mundo livre solidário e pacífico. Após essa fase de lutas e contestações, os indivíduos, desencantados com o desenrolar de suas reivindicações, tornam-se descrentes dos ideais de coletividade e solidariedade e passam focalizar suas atenções para si mesmos, incorporando os princípios capitalistas atrelando esses, inclusive, no trato do próprio corpo. Esse período é marcado pelo surgimento das grandes academias de ginástica e shopping centers, os quais passam a configurar redutos de tendências modistas, consumo desenfreado, vitrines de estereótipos de beleza.

    Na década de 90 esse processo de consumo e culto ao corpo sofre uma aceleração impar. Institui-se uma necessidade exacerbada de enquadramento nos padrões de beleza vinculados a mídia. Já não basta o longo tempo desprendido nas academias em busca da boa forma física, urge o imediatismo. De carona com esse novo imperativo a medicina, a farmacologia e os profissionais especializados em trabalhar e desenvolver as formas físicas conquistam um espaço no mercado, o qual se mantém em constante crescimento. Emergem as cirurgias plásticas, regimes, silicones, próteses, cremes, suplementos alimentares entre outros que exercendo grande fascínio e desejo de aquisição de boa parte da população.

    A Educação Física nessa trajetória toda, bem como os mais diversos segmentos sociais, sempre seguiu a lógica social vigente em cada período. Instaura-se no âmbito educacional no auge da industrialização, com o intuito de contribuir com a disciplinarização e domesticação dos corpos, a fim de torná-los mais servis e úteis para o trabalho.

    Atualmente, essa forte presença do corpo na mídia e a preocupação desmedida com as formas esteticamente perfeitas acenam um conjunto de questões a serem debatidas na área da Educação Física. Os interesses do mercado, a extrema da magreza, da leveza, das formas bem definidas, da hipertrofia muscular, superação dos limites do próprio corpo tem se apresentado como um grande desafio aos profissionais da Educação Física, sejam eles atuantes na área escolar ou não.

    Em seu imaginário, as pessoas em geral, têm o professor de Educação Física como um possuidor de um corpo com “boa aparência física”, saudável, apto a praticar as diversas modalidades esportivas e a superar limites. Nessa perspectiva alimentam a idéia de que o trabalho desses deve pautar-se na valorização da aptidão física, do desempenho atlético, da performance, na superação máxima dos limites do corpo em busca de um resultado.

    Esse anseio de inserção nos moldes estéticos impostos pela mídia e a imagem social sustentada acerca do professor de Educação Física, exigem desse uma postura muito crítica com relação ao assunto.

    O professor de Educação Física deve buscar alternativas de trabalho que suscitem o hábito do “se cuidar” no grupo em que está trabalhando, que respeite as limitações dessas pessoas que incentivem o desenvolvimento de suas possibilidades e, em especial, considere cada indivíduo na sua totalidade, procurando superar essa concepção difundida de trato ao corpo como um mero objeto.

Algumas considerações

    Compreendemos que é papel do professor de Educação Física promover junto aos seus alunos ou grupo de trabalho reflexões acerca desse ideal de corpo e forma física vinculados aos meios de comunicação em massa. Para tanto é necessário que os professores de Educação Física superem a prática pautada exclusivamente em gestos mecanizados, automatizados e com o único objetivo de obter algo visível em troca, e incitem o valorização da prática de uma atividade pelo prazer que essa proporciona, pelas relações interpessoais que essa pode propiciar, bem como pelo desvelar-se, e o descobrimento de possibilidades e potencialidades corporais que as atividades físicas podem possibilitar.

Bibliografia

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