Características e estruturação do treinamento mental. Artigo de revisão Características y clasificación del entrenamiento mental. Artículo de revisión |
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Graduando em Educação Física Universidade do Estado de Santa Catarina (Brasil) |
Thiago Eloi Santos Sarraff |
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Resumo O treino mental é uma variável importante no desenvolvimento e aquisição de habilidades motoras. O objetivo deste estudo de revisão bibliográfica é caracterizar a prática mental e estruturá-la, abordando principalmente os aspectos psicológicos desta prática. Pode-se concluir que o treino mental é uma ferramenta que auxilia no desenvolvimento e na aquisição das habilidades, obedecendo a uma estrutura ideal, respeitando as individualidades do praticante e as especificidades de cada modalidade. Unitermos: Prática mental. Habilidade motora. Psicologia do esporte.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 161, Octubre de 2011. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
O ser humano possui características diferenciadas dos outros animais, e entre elas a possibilidade de usar a imaginação. A capacidade de recriar experiências a partir de nossa mente, imaginando eventos que ainda estão a ocorrer, é uma característica importante e que pode ser usada como ferramenta para a prática de determinada atividade.
Utilizando o artifício da imaginação, pode-se introduzir a idéia da prática mental, ou treinamento mental, que é utilizada para efetuar mudanças no comportamento e auxiliar no processo de ensino-aprendizagem de determinada habilidade na ausência de movimentos físicos. (TONELLO et al., 2009)
O treinamento mental é definido por Magill (1998) como recapitulação cognitiva de uma habilidade física na ausência dos movimentos físicos e explícitos. Pode ser explicado a partir de duas hipóteses diferentes: psicológicas e fisiológicas (Marques; Lomônaco apud TONELLO et al., 2009).
Segundo a hipótese fisiológica, os efeitos do treinamento mental são atribuídos a fatores orgânicos tais como a estimulação subliminar da musculatura envolvida no movimento. A outra vertente, psicológica, procura atribuir fatores como motivação do sujeito, capacidade de imaginação ou atenção seletiva à explicação dos efeitos da prática mental (TONELLO et al., 2009).
Mackay (1981) sustenta que as unidades musculares são preparadas como resultado do imaginário do praticante de uma ação. Durante o treinamento mental os trajetos neuromotores adequados são ativados, e essa ativação reforça os padrões de coordenação que são desenvolvidos.
De acordo com Schmidt (1993), logo que os indivíduos imaginam um movimento ocorre uma pequena atividade elétrica na musculatura que participa do movimento real, insuficiente para produzir movimento muscular, porém perceptível a equipamentos eletromiográficos.
Apesar de existirem duas vertentes para a análise da prática mental, parece que a perspectiva fisiológica, por ser quantitativa, é muito mais enfatizada.
O objetivo deste estudo de revisão bibliográfica é reunir as informações a respeito das características principais do treino mental e, a partir do que for coletado, esboçar uma estrutura mínima para a realização da prática mental, de modo que seja mais simples introduzir esta prática no cotidiano de nossos alunos e atletas.
Métodos
Por tratar-se de uma revisão bibliográfica, este estudo se ateve a pesquisa na base de dados Scielo. Utilizou-se como descritores as palavras-chave: treinamento mental, prática mental, mentalização, desempenho, performance e imagética motora.
Logo após a coleta dos artigos, pesquisou-se nas referências a fim de achar outros artigos não encontrados nas fontes de dados citadas. O processo a seguir foi o de leitura minuciosa de cada um dos artigos, destacando as idéias principais, convergentes e divergentes entre os artigos reunidos. A partir de então iniciou-se a produção da redação do artigo, dentro das normas vigentes.
Revisão
No período clássico da história, século V a.C., Platão e Descartes já mostravam preocupação com a utilização de técnicas mentais para aprendizagem e memorização (Santos apud Becker, 1996). Tzachou-Alexandri apud Becker (1996) relata que nesse mesmo período era comum haver nos ginásios de Atenas locais para a prática da mentalização, com objetivo de treinar não só o corpo, mas também a mente.
É comum encontrar na literatura outros termos para designar a prática mental: treino mental, imagem mental, treinamento mental, ensaio mental, visualização, ensaio visual de comportamento motor. Nesta revisão todos serão tratados com o mesmo significado.
De acordo com Samulski apud Fonseca et al. (2008) pode-se dividir em três formas distintas a prática mental de uma habilidade:
Auto-verbalização, caracterizada pela repetição mental e descrição verbal do movimento;
Auto-observação, sendo definida como a observação mental do próprio movimento, na qual o indivíduo se observa mentalmente praticando o movimento, sendo ele neste caso o expectador do próprio movimento;
Ideomotor, que é a imaginação e sensação cinestésica do próprio movimento, onde o indivíduo executa mentalmente o movimento, passando a ser o ator.
O treinamento mental é muito utilizado para efetuar mudanças no comportamento e auxiliar no processo de aprendizagem (TONELLO et al., 2009). Esta prática mental pode ser explicada através de duas hipóteses distintas: as psicológicas e as fisiológicas (Marques; Lomônaco apud TONELLO et al., 2009).
Tonello et al. (2009) sugere que, partindo do pressuposto psicológico pode-se entender que fatores como motivação, capacidade de imaginação ou a atenção seletiva são capazes de influenciar os resultados obtidos através da mentalização.
Sobre a perspectiva fisiológica, Franco (2002) diz que um movimento imaginado e exercitado mentalmente produz micro contrações e conseqüentemente uma melhora da coordenação neuromuscular. Desta forma é possível constatar um efeito fisiológico significativo, pois é detectada uma maior irrigação sanguínea na musculatura envolvida. Mackay (1981) sustenta a idéia que as unidades motoras são preparadas para o movimento durante a prática mental, já que uma pequena atividade elétrica é percebida na musculatura envolvida. Durante o treino mental essa ativação ajuda a estabelecer e a reforçar os padrões de coordenação adequados para o desenvolvimento e aprimoramento de uma habilidade.
Para explicar a hipótese fisiológica Schmidt (1993) afirma que ao indivíduo imaginar um movimento, uma atividade elétrica ocorre na musculatura que participaria do movimento real, porém tão pequena que não atinge a amplitude necessária para gerar o movimento propriamente dito. Sendo assim, ao imaginar uma ação, a informação é disparada ao Sistema Nervoso Central e conseqüentemente aos músculos, proporcionando o treinamento com ausência de movimentos reais.
Becker (1996) acredita que uma sessão de treinamento mental pode atuar sobre os sistemas sensoriais através de quatro dimensões distintas: visual, cinestésica, auditiva e emocional.
Na dimensão visual, segundo Becker (1996), o atleta é capaz de se imaginar realizando uma ação, e por isso ele pode obter informações relevantes sob a perspectiva corporal, externa e interna, isto é, posição corporal, seqüência e modelos de ação motora.
Já a dimensão cinestésica aborda a imaginação da percepção que o atleta vivencia, antes, durante e depois da ação motora (BECKER, 1996). Deste modo os mecanismos proprioceptivos recebem informações dos músculos, ossos e sistema vestibular.
A terceira dimensão citada por Becker (1996), auditiva, caracteriza-se pelo registro de ruídos que ocorrem durante uma ação motora real, seja este ruído interno ou ruído do ambiente em torno do atleta. A utilização desta dimensão da imaginação, somada às anteriores, contribui para o aumento do rendimento de atletas (BECKER, 1996).
A última dimensão, porém não menos importante, que aborda Becker (1996) em sua tese é a emocional. A visualização das emoções que podem ocorrem em situações de competição é uma técnica de imaginação, que pode aumentar o poder de controle das situações de estresse por um atleta.
Com relação às hipóteses psicológicas, Martin (2001) aponta alguns benefícios principais:
Eliminação das distrações do ambiente;
Menor chance de pensar em aspectos negativos;
Motivar para a prática real;
Auxiliar na aprendizagem das sensações das habilidades;
Auxiliar no desenvolvimento de habilidades de autocontrole e concentração.
Para aumentar a eficácia do treinamento mental, é importante que sua prática seja estruturada. Martin (2001) propõe que o primeiro passo para a prática mental seja o relaxamento. O autor explica que se uma pessoa está com um estado de ansiedade ou excitação muito elevado, torna-se difícil imaginar as sensações vivenciadas ao se executar determinada habilidade.
Evidências apontam que o treino mental associado aos procedimentos de demonstração do movimento e de relaxamento pode aumentar a aquisição de habilidades motoras (WARNER & MCNEILL, 1988), sendo inclusive mais benéfico que nenhum treinamento ou tão benéfico quanto o treinamento real.
Souza e Scalon (2004) sugerem três posições para a realização do treinamento mental: em pé, sentada ou deitada. Cada posição assume um momento de prática ideal:
A posição em pé permite ao praticante efetuar o treinamento dentro de uma competição, por exemplo;
A posição sentada permite ao praticante, por exemplo, executar o treinamento minutos antes de entrar no jogo;
E por último, na posição deitada o atleta fica mais acomodado, facilitando o relaxamento.
Além da posição do praticante, Souza e Scalon (2004) sugerem que o treinamento mental aconteça no local onde é realizado o treinamento real ou ainda o local da competição, sempre individualmente e com duração aproximada de quinze minutos.
Considerações finais
Através dos estudos aqui discutidos, pode-se concluir que apesar de o treinamento mental poder ser utilizado como variável importante no treinamento de atletas, tanto para melhoria da performance como para aquisição de habilidades motoras, este deve ser estruturado como qualquer tipo de treinamento. Isto quer dizer que a prática mental necessita ser planejada individualmente, considerando as individualidades de cada praticante e as especificidades de cada modalidade.
Sugere-se que outros estudos investiguem como a prática mental pode influenciar no desempenho de habilidades na prática real, inclusive diferenciando modalidades, faixas etárias e gênero. Ainda, como sugestão, há de se verificar como a prática mental pode ser efetiva nos processos de reabilitação.
Referências
BECKER, B. J. El efecto de técnicas de imaginación sobre patrones electroencefalográficos, frecuencia cardiaca y en el rendimiento de practicantes de baloncesto con puntuaciones altas y bajas en el tiro libre. Barcelona: Universidade de Barcelona, 1996. (Tese de Doutorado em Psicologia)
FONSECA, F. S. et al. Demonstração e Prática Mental na Aquisição de Habilidades Motoras. Revista de Desporto e Saúde da Fundação Técnica e Científica do Desporto. 4(2): 61-66, 2008.
FRANCO, G. S. Psicologia no Esporte e na Atividade Física. São Paulo: Manole, 2000.
MACKAY, D. G. The problem of rehearsal or mental practice. Journal of Motor Behavior. 13, 274-285, 1981.
MAGILL, R. A. Aprendizagem Motora: Conceitos e Aplicações. São Paulo: Edgar Blücher, 1998.
MARTIN, G. L. Consultoria em psicologia do esporte: orientações práticas em análise do comportamento. (Trad. Aguirre, N. C.) Campinas: Instituto de análise do Comportamento, 2001. SAMULSKI, D. Psicologia do Esporte. São Paulo: Manole, 2002.
SCHMIDT, R. A. Aprendizagem e performance motora: dos princípios o treino. (Trad. Bastos, F.C. & Ribeiro, O.C. F.) São Paulo: Movimento. 1993.
SOUZA, A. P. S.; SCALON, R. M. O Treinamento Mental como uma variável significativa na performance de atletas e na aprendizagem de habilidades motoras. EFDeportes.com, Revista Digital. 10, 75, 2004. http://www.efdeportes.com/efd75/mental.htm
TONELLO, M. G.; CHEREGUINI, P. A. C.; GOYOS, A. C. N. Treino mental: estratégias para uma melhor eficácia. EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, 14, 137, 2009. http://www.efdeportes.com/efd137/treino-mental-estrategias-para-uma-melhor-eficacia.htm
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